Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:75/21.9BEBJA
Secção:CA
Data do Acordão:07/28/2021
Relator:LINA COSTA
Descritores:INFORMAÇÃO PROCEDIMENTAL
INTIMAÇÃO
INUTILIDADE SUPERVENIENTE.
Sumário:I. O direito à informação procedimental, consagrado no artigo 268º, nº 1, da CRP e densificado nos artigos 82º e seguintes do CPA, confere ao interessado o direito de obter uma informação sobre o andamento de um procedimento administrativo, aberto ou ainda em curso, que lhe diga directamente respeito;

II. Se no prazo legalmente previsto para o efeito, a Administração nada responde ou não satisfaz na íntegra ou em parte o pedido de informação que lhe foi dirigido, dá azo à instauração pelo interessado da acção administrativa urgente de intimação, prevista nos artigos 104º e seguintes do CPTA;

III. Se na resposta apresentada nos autos, a Entidade requerida esclarece que não informou a Requerente das decisões que recaíram sobre as reclamações deduzidas ou forneceu o comprovativo da notificação para audiência prévia, porque não proferiu essas decisões nem efectuou essa notificação, é satisfeito o pedido de informação procedimental, na medida do possível, do que efectivamente resulta do procedimento administrativo a que respeita;

IV. Em face do que deve ser declarada a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em sessão do Tribunal Central Administrativo Sul:

F....., requerente nos autos de acção de intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões instaurados contra o Município de Portel, inconformada, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida em 21.4.2021, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, que decidiu julgar a presente intimação improcedente e, em consequência, absolveu a Entidade Requerida dos pedidos.

Nas respectivas alegações, a Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem:
«1° Não é compreensível a recusa de resposta do Sr. Presidente da Câmara perante um dever legal de decidir que é inerente às suas funções.
2° Tendo em conta as missivas enviadas ao Sr. Presidente só o tribunal poderia desbloquear a situação de impasse criada pelo silêncio do mesmo.
3º A recorrente não pode ver sufragados os seus direitos pelo silêncio da Administração.
4° A Administração está obrigada a pronunciar-se.
5º A recorrente invocou e demonstrou ser titular de um interesse pessoal e legítimo, para poder aceder à informação administrativa pretendida.
6º Tais direitos encontram-se constitucionalmente reconhecidos como direitos fundamentais nos termos dos arts. 18° e 268° da Constituição da República Portuguesa.
7°Todos os cidadãos têm o direito de ser informados pela Administração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sejam diretamente interessados, bem como o de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas.
8º A sentença proferida impede a recorrente de ver o seu direito à informação concretizado.
9° Não tendo sido satisfeito o pedido formulado pela recorrente no exercício do direito à informação, não restava à mesma senão o recurso à intimação da entidade administrativa competente para o efeito pretendido.
10° É precisamente o que resulta do art. 104° do CPTA no seu n° 1:
"1 - Quando não seja dada integral satisfação a pedidos formulados no exercício do direito â informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, o interessado pode requerer a correspondente intimação, nos termos e com os efeitos previstos na presente secção."
11° Não foi dada satisfação à pretensão da recorrente, no sentido de lhe ser prestada a informação que peticionara.
12° A intimação é o exercício de um direito que permite à recorrente ver satisfeita as suas pretensões,
13° A decisão do Tribunal a quo é subjetiva, não contribui para a salvaguarda de direitos fundamentais da ora recorrente, tais como o seu direito à informação e a possibilidade de subida de escalão.
14° O Tribunal a quo errou ao ter julgado improcedente o pedido de intimação.
15° Salvo melhor opinião, na situação objeto dos autos, que se insere no âmbito do direito à informação procedimental, verifica-se que, ao que aqui importa, o ora recorrido não deu satisfação à pretensão da requerente, no sentido de lhe ser prestada a informação que peticionara.
16° Não está em causa a condenação na prática do ato, como erroneamente entendeu a decisão recorrida.
17° Até porque, do probatório nada consta que permita concluir pela efetiva satisfação integral do solicitado pela requerente, ora recorrente.».

Notificado para o efeito, o Recorrido não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, não emitiu parecer.

Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente, o processo vem à sessão para julgamento.

A questão suscitada pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 a 3 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consiste, no essencial, em saber se a sentença recorrida incorreu em erro ao julgar improcedente o pedido de intimação.

A sentença recorrida considerou provada, com relevância para a decisão da causa, a seguinte matéria de facto:

«1. Em 01/08/2018, foi enviado um email, dos serviços da Câmara Municipal de Portel, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e nos termos do qual foi a Requerente informada que lhe foi atribuída a classificação de desempenho adequado nos anos de 2004, 2006 e 2007, mediante a aplicação dos critérios de ponderação curricular definidos pelo Conselho Coordenador de Avaliação – cfr. documento 1 junto com o Requerimento Inicial;

2. Em 12/10/2018, por não concordar com a avaliação por ponderação curricular que lhe foi atribuída, a Requerente apresentou Recurso Hierárquico, cujo o conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. documento 2 junto com o Requerimento Inicial;

3. Em 23/10/2018, foi proferida Informação Interna, pelos serviços da Câmara Municipal de Portel, dirigida ao Presidente da Câmara Municipal de Portel, nos termos da qual foi referido o seguinte: “Como aliás reconhece expressamente a recorrente, os elementos que agora refere o n.º 1 do seu recurso, não constavam, por não terem sido por ela incluídos, no respetivo currículo. Logo, não podiam ser objeto de ponderação e consideração no âmbito da avaliação por ponderação curricular. Acresce que, quando notificada para efeitos de audiência prévia, a reclamante nada disse, nem apresentou qualquer elemento superveniente durante o procedimento de avaliação. Face ao exposto, entendo que neste momento, tendo já terminado o procedimento de avaliação, não é possível reabri-lo com fundamento em reconhecido erro da própria reclamante” – cfr. documento 3 junto com o Requerimento Inicial;

4. Em 25/10/2018, foi proferido Despacho, pelo Presidente da Câmara Municipal de Portel, tendo por base a informação referida no ponto anterior – cfr. documento 4 junto com o Requerimento Inicial;

5. Em 08/11/2018, a Requerente requereu a nulidade do Despacho referido no ponto anterior, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e nos termos do qual solicitou a avaliação em função dos critérios constantes na Ficha de Ponderação Curricular – cfr. documento 4 junto com o Requerimento Inicial;

6. A Requerente não obteve resposta ao Requerimento referido no ponto anterior – facto não controvertido;

7. Em 30/04/2019, a Requerente foi avaliada com a menção quantitativa de 3,80, e no que respeita à menção qualitativa, foi-lhe atribuída a nota final de Desempenho Adequado, tudo referente ao biénio de 2017/2018 – cfr. documento 5 junto com o Requerimento Inicial;

8. Em 15/05/2019, a Requerente apresentou Reclamação da decisão referida no ponto anterior, cujo o teor se dá aqui por integralmente reproduzida, e nos termos da qual, considera que a pontuação atribuída pelo avaliador deve ser alterada para Desempenho Relevante – cfr. documento 6 junto com o Requerimento Inicial;

9. Em 28/05/2019, foi proferida Informação Interna, pelos Serviços da Entidade Requerida, e dirigida ao Presidente da Câmara Municipal de Portel, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, e nos termos da qual se propôs o indeferimento da pretensão da reclamante, confirmando-se a homologação da classificação atribuída – cfr. documento 8 junto com o Requerimento Inicial;

10. Em 29/05/2019, foi proferido o Ofício ....., pelo Presidente da Câmara Municipal de Portel, dirigido à Requerente, nos termos do qual foi referido o seguinte: “Em resposta à reclamação da homologação da avaliação de desempenho atribuída no biénio 2017-2018 apresentada por v. Exa., em 15/05/2019, cumpre-me informar que, tendo por base a informação prestada pela chefe de Divisão Administrativa e Financeira que se anexa, e uma vez que, na qualidade de reclamante, não logra indicar nenhum facto concreto que imponha uma diferente avaliação, indefere-se a pretensão de reclamação, confirmando-se a homologação da classificação atribuída – cfr. documento 7 junto com o Requerimento Inicial;

11. Em 06/09/2019, a Requerente enviou um email, dirigido ao Presidente da Câmara Municipal de Portel, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e nos termos do qual referiu o seguinte: “Não concordando com o teor da Informação Interna relativa à minha reclamação da homologação da avaliação de desempenho do biénio 2017 – 2018, efetuada em 28/05/2019, pela Chefe de Divisão Administrativa e Financeira – Dr.ª R....., venho recorrer junto de V.ª Ex.ª para que seja revista a decisão proferida por seu despacho em 29/05/2019 e da qual foi notificada com carta registada com AR em 07/06/2019, porquanto que: 1 – O despacho de indeferimento proferido por V.ª Ex.ª foi efetuado com base na informação prestada pela Chefe de Divisão; 2 – As considerações constantes da Informação Interna e feitas pela Chefe de Divisão não correspondem à verdade; 3 – A funcionária tem a seu cargo um serviço de grande responsabilidade e que dentro das suas capacidades humanas sempre desempenhou com zelo; 4 – A classificação dada não reflete a realidade do meu desempenho profissional (…)”– cfr. documento 9 junto com o Requerimento Inicial;

12. A Requerente não obteve resposta ao email referido no ponto anterior – facto não controvertido;

13. Em 23/02/2021, a Requerente proferiu um Requerimento, dirigido ao Presidente da Câmara Municipal de Portel, nos termos do qual referiu o seguinte: “Na qualidade de mandatária da Sr.ª D.ª F....., conforme cópia da procuração que se anexa, venho ao abrigo do artigo 82.º do Código Administrativo solicitar informações sobre as reclamações apresentadas pela minha cliente relativamente aos assuntos supra referenciados.
No que respeita à avaliação de 2004, 2006 e 2007 solicita-se:
1 – Que me informe da decisão de V/Ex.ª, quanto ao pedido formulado pela minha cliente a 08/11/2018;
2 – Que me seja facultado o comprovativo da notificação enviada à minha cliente para o exercício de audiência prévia escrita na sequência do recurso apresentado pela mesma por não concordar com a avaliação por ponderação curricular que lhe foi atribuída.
No que respeita à avaliação de 2017-2018 solicita-se:
1 – A resposta de V/Ex.ª ao pedido de reclamação da minha cliente contra a decisão de indeferimento proferido após reclamação apresentada contra a homologação da avaliação de desempenho, decisão que teve por base a informação da Sr.ª Chefe de Divisão Administrativa e Financeira datada de 29 de maio de 2019.
Os pedidos apresentados pela minha cliente de revisão da decisão proferida pela Sr.ª Chefe de Divisão através do Ofício n.º ..... datado de 29/05/2019, foram remetidos a 6 de setembro de 2019 e 27 de julho de 2020, sendo que não é compreensível que até à presente data não tenha a minha cliente recebido qualquer resposta.
É pretensão da minha cliente resolver o assunto e causa de forma extrajudicial, contudo alerto, que nos termos do n.º 3 do art.º 82.º do Código Administrativo, as informações solicitadas devem ser fornecidas no prazo máximo de 10 dias com vista a que sejam conhecidas as resoluções definitivas, proferidas por V/Ex.ª quanto aos pedidos formulados pela minha cliente” – cfr. documento 10 junto com o Requerimento Inicial;

14. A Requerente não obteve qualquer resposta ao Requerimento referido no ponto anterior – facto não controvertido;

15. Em 18/03/2021, a Requerente enviou um email, dirigido ao Presidente da Câmara Municipal de Portel, nos termos do qual referiu o seguinte: “Na qualidade de Mandatária da Sr.ª D.ª F....., enviei a 24 de fevereiro do corrente ano a missiva em anexo, recebida pela vossa Instituição que a 25 de fevereiro. Estando ultrapassado o prazo previsto no art.º 82.º do Código Administrativo, venho uma vez mais averiguar do interesse do Município numa resolução extrajudicial, aguardando até ao final da semana pela resposta à comunicação anexa. Ultrapassado o referido prazo, não resta outra alternativa senão o recurso aos meios judiciais, tendo em conta os anos pelos quais o assunto se arrasta indevidamente” – cfr. documento 13 junto com o Requerimento Inicial;

16. A Requerente não obteve qualquer resposta ao Requerimento referido no ponto anterior – facto não controvertido.

MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA:

Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir.

MOTIVAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO:

Conforme especificado nos vários pontos da matéria de facto provada, a decisão da matéria de facto efetuou-se com base no exame dos documentos constantes dos autos, como referido em cada ponto do probatório.».

Nos termos do artigo 662º do CPC por constarem dos autos no SITAF e serem relevantes para a apreciação do recurso, aditamos os seguintes factos:

18. Em 31.3.2021 foi instaurada a presente acção;

19. Na resposta apresentada nos autos pelo Recorrido, foram prestadas as seguintes informações:
«3º - Na verdade, a Requerente não foi ouvida em sede de audiência prévia, como erradamente refere a Informação Interna de 23.10.2018 (cfr. Doc. nº 3 da p.i.).
(…)
8º - Porém, o Presidente da CMP não estava obrigado a apreciar e decidir o requerimento de 08.11.2018, como expressamente resulta do disposto no nº 2 do artigo 13º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que sobre a decisão de 25.10.2018 não tinha sequer decorrido um mês.
9º - E o mesmo se diga quanto à avaliação de desempenho referente ao biénio 2017/2018.
14º - Não está, assim, em falta qualquer decisão obrigatória do Requerido.».

Alega a Recorrente, em suma, que: a decisão do tribunal recorrido é subjectiva, não contribui para a salvaguarda dos seus direitos fundamentais, tais como o seu direito à informação e a possibilidade de subida de escalão; o seu pedido foi julgado improcedente, mas o Recorrido não deu satisfação à sua pretensão, pelo que não está em causa a condenação à prática de acto; e do probatório nada consta que permita concluir em sentido contrário.

Apreciando.

Na fundamentação de direito, o juiz a quo começa por enquadrar juridicamente o direito à informação, nos termos seguintes:
«O princípio do arquivo aberto ou da administração aberta, ora consagrado no art.º 17.º do CPA e no art.º 2.º e 5.º da Lei de Acesso e de Reutilização dos Documentos Administrativos (LARDA), aprovada pela Lei n.º 26/2016, de 22/08, conforma toda a atividade da Administração. No âmbito desse princípio, todas as pessoas, independentemente de deterem um interesse legítimo, têm legitimidade para requererem informações sobre os procedimentos levados a cabo pela Administração – cf. também o art.º 268.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP).
Tal princípio do arquivo aberto distingue-se, porém, do direito à informação procedimental, porquanto, no primeiro caso, o acesso à informação faz-se independentemente de estar a correr um procedimento, enquanto, no segundo caso, visa-se uma informação relativa a um procedimento aberto ou ainda em curso – cf. artigos 268.º, n.º 1, da CRP e 82.º e ss. do CPA.
Considerando esta distinção, é também usual discernir entre informação procedimental e não procedimental, fazendo reconduzir esta última categoria ao princípio do arquivo aberto.
Por via da informação procedimental pretende-se tutelar os interesses e as posições jurídico-subjetivas dos interessados num dado procedimento, ao passo que no âmbito da informação não procedimental ou do arquivo aberto visa-se garantir a publicidade e a transparência da atividade administrativa.».
Prosseguindo, com a qualificação da pretensão da Requerente/recorrente como informação procedimental:
«Nestes termos, o direito que a Requerente pretende exercer é um direito de informação procedimental e não um direito de informação mais lato e abrangido pelo arquivo aberto. A Requerente é parte interessada num procedimento em curso (a sua avaliação). Enquanto este procedimento não terminar – e então ficar abrangido pelo arquivo aberto – o acesso à informação procedimental pela Requerente fica dependente da existência de um prévio requerimento e da aferição da sua legitimidade face ao interesse – legítimo - que alegue. Essa aferição faz-se pontualmente, atendendo ao requerimento que o interessado faça e ao que aí alegue e prove.
No caso dos Autos, estão reunidos estes dois requisitos. A Requerente é parte interessada, uma vez que o procedimento ocorre contra esta, e existe um prévio requerimento, aliás vários.».
Terminando com a argumentação que suporta a decisão de improcedência:
«Contudo, em qualquer caso, o processo de intimação pressupõe a existência de documentos pré-constituídos ou materializados em poder da Administração e não pode servir para impor à entidade administrativa o dever de produzir novos documentos ou praticar atos administrativos ou regulamentares que se considerem em falta, ou organizar dossiers estruturados ou sínteses de documentação administrativa sobre determinada matéria, ou ainda esclarecer questões atinentes a anterior atuação administrativa.
Por outras palavras, a Entidade Requerida não tem o dever de criar ou adaptar para satisfazer o pedido.
Tendo em conta que a Entidade Requerida admitiu que a Requerente não foi ouvida em sede de audiência prévia, como erradamente refere a Informação Interna de 23/10/2018, e que não respondeu aos requerimentos da Requerente, porque, na sua ótica não tinha de o fazer, a prestação dos documentos e informações pretendidos traduz-se na produção de um novo documento, na medida que, na data de hoje, estes não existem.
Em caso de omissão indevida de resposta aos pedidos solicitados pela Requerente, esta deverá lançar mão de uma ação de condenação à prática do ato devido, e não de uma ação de intimação para a prestação de informações, uma vez que esta tem o propósito de efetivar o direito à informação e a consulta de documentos previamente existentes, que não é o caso em apreço.».

Ora, partindo do enquadramento jurídico efectuado quer do direito à informação quer do concreto pedido de informação da Recorrente, efectuado na sentença recorrida, importa agora dispor, ainda que sumariamente, sobre a acção de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, regulada nos artigos 104º a 108º do CPTA.
Trata-se de uma acção de natureza urgente que tem por objectivo tutelar o direito quer da informação procedimental quer da informação extra ou não procedimental [designada pelo juiz a quo de arquivo aberto], quando o correspondente pedido dirigido pelo particular à Administração, não tenha sido satisfeito, total ou parcialmente, por omissão ou por expressa recusa, no prazo legal cominado [nº 1 do artigo 104º].
No que ao caso em apreciação concerne tal prazo é o de 10 dias úteis, previsto no nº 3 do artigo 82º e contado de acordo com o artigo 87º [por se tratar de um prazo administrativo], ambos do CPA.
Decorrido este prazo sem que a informação procedimental requerida tenha sido integralmente satisfeita, o interessado dispõe de 20 dias seguidos [por se tratar de prazo processual, regulado pelo artigo 138º do CPC, e a acção ter natureza urgente, tramitando mesmo em férias, cfr. a alínea d) do nº 1 e nº 2 do artigo 36º do CPTA], contados nos termos do artigo 105º do CPTA, para instaurar a acção de intimação.
Recebido o requerimento inicial, a Administração é oficiosamente citada para responder, podendo justificar porque se manteve em silêncio ou não satisfez total ou parcialmente o pedido de informação que lhe foi dirigido. Ou prestar a informação requerida.
Na situação em apreciação a Recorrente em requerimento, subscrito por mandatária, solicitou ao Presidente da Câmara Municipal de Portel, ao abrigo do artigo 82º do CPA:

«(…) informações sobre as reclamações apresentadas pela minha cliente relativamente aos assuntos supra referenciados.
No que respeita à avaliação de 2004, 2006 e 2007 solicita-se:
1 – Que me informe da decisão de V/Ex.ª, quanto ao pedido formulado pela minha cliente a 08/11/2018;
2 – Que me seja facultado o comprovativo da notificação enviada à minha cliente para o exercício de audiência prévia escrita na sequência do recurso apresentado pela mesma por não concordar com a avaliação por ponderação curricular que lhe foi atribuída.
No que respeita à avaliação de 2017-2018 solicita-se:
1 – A resposta de V/Ex.ª ao pedido de reclamação da minha cliente contra a decisão de indeferimento proferido após reclamação apresentada contra a homologação da avaliação de desempenho, decisão que teve por base a informação da Sr.ª Chefe de Divisão Administrativa e Financeira datada de 29 de maio de 2019 (…) remetidos a 6 de setembro de 2019 e 27 de julho de 2020 (…)».

Não tendo obtido qualquer resposta, a Recorrente reiterou, por e-mail, de 18.3.2021, o pedido de informação procedimental, com a indicação de que na falta de informação no prazo legal, iria recorrer aos meios judiciais.
O que fez [antes ainda de terminar o prazo administrativo, facto que não assume qualquer relevância processual por se poder inferir do respondido pela Entidade requerida que não ia responder à Recorrente dentro desse prazo], instaurando a presente acção.
Do exposto resulta que foi o Recorrido deu azo à presente acção.
Na resposta apresentada e apesar de não incidir directamente sobre o que lhe foi solicitado, o Recorrido informou que:
- ao contrário do referido na Informação Interna de 23.10.2018, a Recorrente não foi ouvida em sede de audiência prévia – do que se retira que não lhe foi enviada qualquer notificação para aquele efeito e, consequentemente inexiste o respectivo e peticionado comprovativo, o que constitui a informação prestada sobre o pedido 2 relativo à avaliação de 2004, 2006 e 2007;
- o Presidente da Câmara Municipal de Portel não estava obrigado a decidir o requerimento de 8.11.2018, ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 13º do CPA, por não ter passado sequer um mês sobre a decisão proferida na matéria – do que decorre que não foi proferida decisão na sequência do identificado requerimento e é essa a informação prestada que respeita ao pedido 1 idem;
- pela mesma razão [por a decisão de indeferimento da reclamação de 15.5.2019 da avaliação de desempenho referente ao biénio 2017/2018 ter sido proferida há menos de dois anos], o Presidente também não respondeu à reclamação que a Recorrente deduziu daquele – a saber, também aqui não há resposta escrita que possa ser facultada/informada à Recorrente, e está informado o pedido 1 respeitante à avaliação de 2017-2018.
As respostas obtidas não satisfazem os pedidos formulados pela Recorrente porque não obteve a decisão, o comprovativo da notificação e a resposta, solicitados, mas satisfazem, na medida do possível, a informação procedimental em referência.
Com efeito, a acção regulada no artigo 104º e seguintes do CPTA tem por objectivo satisfazer a informação procedimental nos termos do artigo 82º do CPA, a saber, o interessado, desde que o requeira [e nos termos em que o requer], tem o direito de ser informado sobre o andamento dos procedimentos que lhes digam directamente respeito, bem como o direito de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles tiverem sido tomadas, abrangendo a indicação do serviço onde o procedimento se encontra, os actos e diligências praticados, as deficiências a suprir por si, as decisões adoptadas e quaisquer outros elementos solicitados.
Do que não se pode retirar que a Administração para satisfazer um pedido de informação seja obrigada a praticar um acto que no âmbito do correspondente procedimento administrativo não praticou. O direito à informação procedimental é satisfeito com a informação de que tal acto não foi praticado e, por isso, outra não pode ser a informação a prestar.
Se o interessado pretende impelir a Administração a praticar tal acto, por o considerar devido, deve instaurar acção administrativa adequada para o efeito.
Por outro lado, o facto de a Administração considerar não estar obrigada nos termos da legislação aplicável a decidir os requerimentos do interessado, não a dispensam de responder aos pedidos de informação procedimental que este lhe venha a dirigir.
Retornando ao caso em apreciação, independentemente do que vem alegar em sede de recurso sobre o seu direito à subida de escalão, a Recorrente formulou e dirigiu ao Recorrido um pedido de informação procedimental, enquadrável no artigo 82º do CPA [que é expressamente indicado no correspondente requerimento], pretendendo conhecer as decisões administrativas que, no seu entender, deveriam ter sido tomadas ou proferidas por este na sequência das reclamações que deduziu e especificou, no âmbito dos procedimentos administrativos referentes às suas avaliações de desempenho, bem como do comprovativo da notificação para audiência prévia que diz nunca ter recebido.
Assim, na pendência da acção foi satisfeito o direito à informação procedimental da Recorrente pelo que o juiz a quo deveria ter declarado a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, de acordo com o disposto na alínea e) do artigo 277º do CPC aplicável ex vi artigo 1º do CPTA em vez de julgar a acção improcedente.

Mais, porque a inutilidade lhe é imputável, nos termos dos nºs 3 e 4 do artigo 536º do CPC ex vi artigo 1º do CPTA, deveria ter considerado a Entidade requerida responsável pelas custas.

Responsabilidade que não se verifica no âmbito do presente recurso uma vez que o Recorrido não apresentou contra-alegações.

Em face do que deve ser concedido provimento ao recurso e a sentença recorrida revogada, na parte em que fundamenta e decide julgar a acção improcedente, substituindo-a por decisão que declare a extinção da instância com a causa indicada.

Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida na parte em que julgou a acção improcedente, e declarar a instância extinta por inutilidade superveniente da lide.

Custas pelo Recorrido, apenas em 1ª instância por não ter apresentado contra-alegações de recurso.

Registe e Notifique.

Lisboa, 28 de Julho de 2021.

(Lina Costa – relatora que consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Juízes integrantes da formação de julgamento, em turno, os Desembargadores Jorge Martins Pelicano e António Patkoczy).