Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1505/17.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:09/17/2020
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:JUROS INDEMNIZATÓRIOS,
CÔMPUTO.
Sumário:O termo final do cômputo dos juros indemnizatórios é a data do processamento da respetiva nota de crédito (n.º 5, do art 61.º do CPPT), e não a data do reembolso do imposto indevidamente pago.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

E.... – A......, Lda., apresentou, ao abrigo do disposto no artigo 170.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), ex vi artigo 146.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), execução das sentenças proferidas no âmbito do processo de impugnação judicial com o n.º 190/02, que correu termos no Tribunal Tributário de Lisboa e que anulou parcialmente a liquidação adicional de IRC, referente ao ano de 1992, peticionando a condenação do Ministério das Finanças/Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar juros indemnizatórios sobre o montante de imposto indevidamente pago, contados desde o termo do prazo para o seu pagamento (07/01/1997) e a pagar juros de mora contados desde 01/08/2017 até 10/07/2017.

O Tribunal Tributário de Lisboa julgou: i) extinta a instância por inutilidade superveniente da lide quanto ao pedido de condenação da Entidade Executada pagar à Exequente o valor correspondente a juros de mora e ii) parcialmente procedente a execução.
Inconformada, a FAZENDA PÚBLICA, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:
«A. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão proferida em 21.03.2019 pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou a execução de julgados aqui recorrida, no segmento correspondente à alínea b).1. da parte V. Decisão, que condenou a AT a pagar juros indemnizatórios, à taxa legal de 4%, sobre a quantia de IRC paga na sequência das correções efetuadas no valor de 3.875.564$00 (€19.331,23), contados desde a data do pagamento do imposto até à data do reembolso do imposto (10/07/2017).

B. Salvo o devido respeito, a Douta Sentença, aqui recorrida, errou tanto no que se refere à interpretação da matéria de facto fixada nos presentes autos, como na interpretação e aplicação das normas legais a esses mesmos factos, razão pela qual se pugna presentemente pela sua revogação, no que concerne ao segmento correspondente à alínea b).1. da Decisão.

C. A Douta Sentença, entendeu e bem, na sua fundamentação, que o artigo 61º, n.º. 5, do CPPT estabelece que os juros indemnizatórios são contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito, em que são incluídos.

D. Concluindo, de acordo com o normativo supra referido, que no que se refere ao período de contagem dos juros indemnizatórios, aplica-se, no presente caso, o disposto no artigo 61°, n.º 5, do CPPT.

E. Contudo, decidiu a Douta Sentença, em oposição ao defendido anteriormente, e em violação do disposto no artigo 61°, n.º 5, do CPPT, decide na alínea b).1. condenar a AT a pagar juros indemnizatórios, contados desde a data do pagamento do imposto até à data do reembolso do mesmo, concretizada em 10.07.2017, e não, como devia, até à data do processamento da respetiva nota de crédito, que no caso em apreço foi em 2017.07.04.

F. Tendo em conta que a data do processamento da respetiva nota de crédito é anterior à data do efetivo reembolso do imposto, a Douta Sentença concede mais juros indemnizatórios ao Exequente do que aqueles a que este tem direito, violando o artigo 61º, n.º. 5, do CPPT, e em contradição com a fundamentação e conclusões anteriormente retiradas.

G. Igualmente a Douta Sentença, não se pronuncia sobre o alegado na Contestação, que defendeu que os juros indemnizatórios, a serem devidos, deviam incidir apenas sobre a quantia de €10.489,00, correspondente ao valor de imposto indevidamente pago, e não sobre valor de 3.875.564$00 (€19.331,23).

H. Facto articulado na Contestação apresentada pela AT e referido na Douta Sentença, mas do qual esta não extrai nenhuma conclusão, decidindo, sem fundamentar, que os juros indemnizatórios incidem sobre a quantia de IRC paga na sequência das correções efetuadas no valor de 3.875.564$00 (€19.331,23), quando o imposto indevidamente pago foi apenas de €10.489,00.

I. Como referido nos artigos 8.º e 9.º da Contestação e passamos a citar: “ Com efeito, considerando que a douta sentença de 08.01.2016 apenas considerou parcialmente procedente a impugnação, o valor a restituir seria de €10.489,00 e não de €19.610,87, como efetivamente o foi por lapso da AT.” assim, o “(…) cálculo de eventuais juros indemnizatórios teria que incidir sobre de €10.489,00 e não sobre €19.610,87.”

J. Referindo igualmente a Contestação (cfr artigos 10.º e 11.º) que a AT, já iniciou os procedimentos para a emissão da correspondente nota de débito ao Exequente com os valores a mais que lhe foram pagos, nomeadamente € 9.121,87 e a título de juros de mora €343, 88.

K. Factos referidos na Contestação e sobre os quais a Douta Sentença, não se pronunciou, nem decidiu, como devia.

L. Nestes termos, a Douta Sentença aqui recorrida, omitiu pronuncia sobre os factos alegados, no articulado da Contestação, decidindo em violação do proferido na Sentença de 08.01.2016.

M. Sentença de 08.01.2016 que apenas considerou parcialmente procedente a impugnação, logo o valor a restituir seria de €10.489,00 e os juros indemnizatórios deviam incidir sobre este valor, correspondente ao imposto efetivamente pago.

N. Aliás, a Douta Sentença aqui em recurso deu como facto provado que foi proferida sentença em 08/01/2016, que julgou a impugnação judicial parcialmente procedente e anulou a liquidação de IRC do ano de 1992, por forma a ser considerada uma matéria colectável de 6.296.329$00, ou seja, 31.405,96€, com a correspondente anulação dos juros compensatórios proporcionais (cfr. pontos 9 a 11) dos Factos Provados.

O. Assim, em consonância com os factos dados como provados nos pontos 9. e 11. devia a Douta Sentença, ter considerado como facto provado que o valor de imposto sobre o qual incidem os juros indemnizatórios a pagar pela AT seria apenas de €10.489,00 como alegado na Contestação.

P. Tendo em conta que da concretização do Acórdão proferido no processo de impugnação judicial nº 190/02.5.2 do Tribunal Tributário de Lisboa, resultou que o lucro tributável constante da liquidação impugnada, deve ser parcialmente anulado no montante de € 23 495,86, facto que implicou a anulação de imposto na quantia de € 9 304,36.

Q. Quanto aos juros compensatórios, do Acórdão proferido, resulta que estes foram anulados no valor de € 1 184,64

R. Dado que os juros compensatórios foram anulados em 80% ao abrigo do Decreto-Lei nº 124/96 de 10/08, os juros pagos / exigidos foram apenas em 20% do seu valor.

S. Pelo exposto, o valor total anulado e que concretiza o Acórdão é € 10 489,00 (€ 9 304,36 + € 1 184,64), valor que deveria ter sido consequentemente o valor a ser reembolsado, e que por lapso da AT não foi.

T. Todavia, devido a erro material na execução do Acórdão, erro esse referido na Contestação apresentada pela AT, foi emitido o reembolso nº 2017 3…… no montante de € 19 610,88, pago através de transferência bancária emitida em 2017.07.05.
U. Assim, para regularização do excesso recebido, foi emitida a nota de cobrança nº 2017 9….. no montante de € 9121,87, paga dentro do prazo de cobrança voluntária em 2018.01.30

V. Sendo a quantia exequenda efetivamente recebida de € 10 489,01 (€ 19 610,88 - € 9 121,87).

W. Mais se refere que foram pagos juros de mora por atraso na execução do Acórdão no montante líquido de € 395,42 (€ 739,30 - € 343,88), assim discriminados: i)Reembolso nº 2017 3….. no montante de € 739,30 pago através de transferência bancária emitida em 2017.09.27;ii)Nota de cobrança nº 2017 9…. no montante de € 343,88, paga dentro do prazo de cobrança voluntária em 2018.01.30.

X. Esta última nota de cobrança foi emitida pelo mesmo motivo da nota de cobrança referente à quantia exequenda, ou seja, regularização do excesso recebido, cujo apuramento dos juros de mora por atraso na execução do Acórdão.

Y. Nestes termos, designadamente através dos quatro documentos que presentemente juntamos aos autos (Doc 1 concretização - quantia exequenda; Doc 2 concretização - juros de mora; Doc 3 Informações da DSGCT e Doc 4 guia de pagamento (prints do sistema), nomeadamente através dos prints do sistema informático relativos à guia de pagamento nº 82…… no montante de € 17 396,01 (quantia exequenda), onde consta a anulação de juros compensatórios de € 8 859,48 (80% dos juros compensatórios liquidados), podemos concluir que o valor anulado e que concretiza o Acórdão é de € 10 489,00

Z. Deste modo requer-se que seja incluído nos Factos dados como provados, o texto com o seguinte teor: “O valor total anulado e que concretiza o Acórdão é € 10 489,00.”, no seguimento e em consonância do factos anteriormente dados como provados nos pontos 9 a 11, da Douta Sentença, aqui recorrida.

AA. Nestes termos, a Douta Sentença aqui em recurso, erra no seu julgamento quanto aos factos dados como provados e à aplicação da lei aos mesmos, tendo em conta que devia ter dado como provado, o facto do valor anulado e que concretiza o Acórdão proferido no processo de impugnação judicial nº 190/02.5.2 do Tribunal Tributário de Lisboa, ser apenas de € 10 489,00 e decidido em conformidade, nomeadamente que os que os juros indemnizatórios a pagar pela AT apenas incidem sobre este montante, e (independentemente do valor dado como provado), são apenas até à emissão da nota de crédito.

Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Exas., deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser incluído/aditado aos factos dados como provados o facto agora solicitado, e revogada a sentença recorrida no segmento decisório impugnado, com as legais consequências.»
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A recorrida, devidamente notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações.
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Foram os autos a vista da Magistrada do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

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A questões invocada pelo Recorrente Fazenda Pública nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir consiste em aferir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito na parte referente à condenação de pagamento de juros indemnizatórios, nomeadamente, quer quanto ao termo final do prazo de contagem de juros, quer quanto à quantia sobre a qual incidem os juros indemnizatórios.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«1. A Exequente apresentou impugnação judicial contra a liquidação adicional de IRC do ano de 1992, no valor de 5.707.793$00 - cf. petição de impugnação a fls. 2 a 16 do processo n.º 190/02 apenso aos autos;

2. A impugnação judicial referida no ponto anterior correu termos sob o n.º 190/02 no Tribunal Tributário de Lisboa – cf. autos de impugnação n.º 190/02 apenso aos autos;

3. No âmbito do processo n.º 190/02 referido no ponto anterior foi proferida sentença em 18/10/2010, que julgou a impugnação judicial procedente e condenou a Fazenda Pública a anular a liquidação de IRC do ano de 1992, na parte referente às correcções impugnadas – cf. sentença a fls. 192 a 203 do processo n.º 190/02 apenso aos autos;

4. No âmbito do processo n.º 190/02, o Tribunal Tributário de Lisboa entendeu que «Começando pelas correcções ao quadro 20, campo 207 (provisões além dos limites legais), invoca a impugnante vício de falta de fundamentação e a não aplicação aos mesmos do disposto no art.º 18º, n.º 1, do CIRC. (…) Face a esta falta de fundamentação do acto impugnado, quando à concreta correcção, procede o vício de falta de fundamentação. No que respeita às correcções ao quadro 20, campo 220 (importâncias devidas pelo aluguer de viaturas sem condutor), invoca a impugnante vício de falta de fundamentação e o facto de uma das viaturas elencadas (…) ser uma viatura ligeira de mercadorias. (…) Por conseguinte, também quanto a estas correcções verifica-se o vício de falta de fundamentação. Quanto às correcções relativas a subcontratos (…) não resultando suficientemente explanada e provada a realidade subjacente à correcção, tal é invalidante do próprio acto tributário, nesta parte. Face ao exposto, verifica-se a invalidade do acto tributário, no que respeita à correcção relativa à rubrica de subcontratos. (…), no que toca à correcção relativa a deslocações e estadas (…) a Administração Fiscal não logrou ilidir (…) a presunção da veracidade da contabilidade (…) esta circunstância é invalidante do próprio acto tributário, nesta parte. (…)» - cf. sentença, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a fls. 192 a 203 do processo n.º 190/02 apenso aos autos;

5. No âmbito do processo n.º 190/02, o Tribunal Tributário de Lisboa julgou provado que «A) Foi emitida pela Administração Fiscal liquidação adicional de IRC (…) em nome da Impugnante, relativa ao exercício de 1992, no montante de 5.707.793$00. B) Os serviços de fiscalização tributária preencheram Mapa de Apuramento de IRC (…) onde são evidenciadas as correcções efectuadas que fundaram a liquidação adicional referida em A) (…): “Quadro 20 Campo 207: corrige-se o montante de Esc. 706.109,00 referente ao valor das provisões (…).Quadro 20 Campo 227: corrige-se o montante de Esc. 128.824,00 referente a importâncias devidas pelo aluguer de veículos (…).Quadro 20 Campo 230: corrige-se o montante de Esc. 7.474.589$00, que se desdobra nas seguintes rubricas e contas: - 62.1. – Subcontratos – 2.992.736$00 (…). – 62232 – Conservação e reparação – 1.851.512$00 (…). – 62227 – Deslocações e estadas – 2.630.341$00 (…).» - cf. sentença, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a fls. 192 a 203 do processo n.º 190/02 apenso aos autos;

6. A Fazenda Pública apresentou recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul da sentença identificada no ponto 3. que correu termos sob o n.º 04588/11 – cf. acórdão a fls. 239 a 246 do recurso n.º 04588/11 apenso aos autos;

7. Por acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 29/11/2011 foi concedido provimento parcial ao recurso referido no ponto anterior e foi revogada a sentença referida no ponto 3. na parte em que anulou a liquidação impugnada quanto ao efeito das correcções da conta 62.1 – Subcontratos e da conta 62227 – Deslocações e estadas e os autos foram devolvidos à primeira instância para fixação da factualidade provada e não provada - cf. acórdão a fls. 239 a 246 do recurso n.º 04588/11 apenso aos autos;

8. No âmbito do recurso n.º 04588/11, o Tribunal Central Administrativo Sul entendeu que «Quanto às duas primeiras correcções (Quadro 20, campos 207 e 220), julgamos acertado o veredicto da sentença (…). Focalizando as demais correcções (Quadro 20, Campo 230) cumpre começar pela anotação que a impugnante expressamente aceita as referentes (…) conta 62232 – Conservação e reparação, determinante do acréscimo de 1.851.512$00 (…).
Quanto ao restante teor da correcção proposta para a conta 62.1 – Subcontratos, bem como da formulada para a conta 62227 – Deslocações e estadas, temos por suficiente a fundamentação (…) pela AT; (…) torna-se obrigatório afirmar o erro de julgamento (…) com relação a este aspecto (…) sucede que o julgamento factual produzido em 1ª instância se apresenta ausente (…), pelo que (…) se impõe (…) a sequente fixação da factualidade provada e não provada (…)» - cf. acórdão, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a fls. 239 a 246 do recurso n.º 04588/11 apenso aos autos;

9. No âmbito do processo n.º 190/02 foi proferida sentença em 08/01/2016, que julgou a impugnação judicial parcialmente procedente e anulou a liquidação de IRC do ano de 1992, por forma a ser considerada uma matéria colectável de 6.296.329$00, ou seja, 31.405,96€, com a correspondente anulação dos juros compensatórios proporcionais – cf. sentença a fls. 363 a 374 do processo n.º 190/02 apenso aos autos;

10. No âmbito do processo n.º 190/02, o Tribunal Tributário de Lisboa julgou provado que «C) A impugnante contabilizou na conta 62101 a factura (…) no montante de 495.632$00 e na conta 7211 a factura (…) emitida em nome da mesma entidade e pelo mesmo montante (…). D) A Impugnante realizou o mesmo procedimento contabilístico relativamente às facturas constantes de fls. 33 a 38 dos autos, totalizando estas o montante de 1.409.782$00 (…). E) A Impugnante contabilizou no exercício de 1992, na conta 6227 – Deslocações e Estadas, o montante total de 660.191$00 (…). F) A Impugnante contabilizou nova documentos intitulados “Recibo de Deslocação” (…)no montante total de 1.970.150$00 (…).» - cf. sentença, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a fls. 363 a 374 do processo n.º 190/02 apenso aos autos;

11. No âmbito do processo n.º 190/02, o Tribunal Tributário de Lisboa entendeu que «No que concerne à correcção efectuada ao nível das despesas qualificadas como “subcontratos”, no montante parcial de 1.905.414$00 (cfr. alíneas C) e D) do probatório) (…) porque a errada consideração como custo do montante de 1.905.414$00 não teve qualquer impacto ao nível do lucro tributável porque a Impugnante contabilizou como proveito o mesmo montante, porque a correcção efectuada provocou distorções falsas na tributação da empresa, é de anular a correcção efectuada (…). Quanto à correcção ao Quadro 20, campo 230, conta 62227 (deslocações e estadas) no montante de 660.191$00 (…) sendo de por isso de manter a correcção efectuada (…). Quanto à não aceitação do custo no montante de 1.970.150$00 respeitante às despesas de deslocação e estada dos sócios gerentes (…) (alínea G) do probatório), considerando igualmente o princípio do primado da substância sobre a forma, não será de hesitar na consideração da ilegalidade da correcção efectuada (…) é a impugnação procedente nesta parte. (…) é a impugnação de proceder parcialmente, sendo de anular, a par das correcções já anuladas por sentença (…) (que perfazem o montante de 834.933$00 ou 4.164,63€), as correcções efectuadas no montante de 3.875.564$00 ou 19.331,23€ (…)» - cf. sentença, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a fls. 363 a 374 do processo n.º 190/02 apenso aos autos;

12. A Fazenda Pública apresentou recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul da sentença identificada no ponto 9. que correu termos sob o n.º 09551/16 – cf. acórdão a fls. 442 a 450 do recurso n.º 09551/16 apenso aos autos;

13. Por acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 09/06/2016 foi negado provimento ao recurso referido no ponto anterior - cf. acórdão a fls. 442 a 450 do recurso n.º 09551/16 apenso aos autos;

14. Por ofícios de 15/06/2016, o acórdão referido no ponto anterior foi remetido à Entidade Executada e à Exequente – cf. ofícios a fls. 454 e 455 do recurso n.º 09551/16 apenso aos autos;

15. A presente execução foi apresentada em 25/07/2017 – cf. comprovativo de envio de e-mail a fls. 1 dos autos;

16. No dia 10/07/2017, a Entidade Executada restitui à Exequente a quantia de €19.610,88, a título de colecta de IRC – cf. acordo (artigo 12º da petição inicial e artigo 8º, parte final, da contestação);

17. Em 02/10/2017, a Entidade Executada pagou à Exequente a quantia de €739,00, a título de juros de mora - cf. acordo (artigo 5º da contestação e artigos 2º e 3º do requerimento a págs. 196 do SITAF).
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Nada mais se provou com interesse para a decisão da questão referente à inutilidade parcial e superveniente da lide e para a decisão da causa.
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O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para as decisões da questão referente à inutilidade parcial e superveniente da lide e para a causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos e na posição das partes vertidas nos articulados e requerimentos identificados nos factos provados.»

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Com base na matéria de facto supra transcrita, o Meritíssimo Juiz do TT de Lisboa julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide quanto ao pedido de condenação da Entidade Executada pagar à Exequente o valor correspondente a juros de mora, e no segmento b1) da sentença julgou parcialmente procedente a execução, condenando-se, para além do mais, a entidade executada ao pagamento de juros indemnizatórios, sobre a quantia de 19.331,23€, contados desde a data do pagamento do imposto até à data do reembolso do imposto (10/07/2017).

A Recorrente Fazenda Pública não se conforma apenas com parte do decidido, nomeadamente, na parte referente à condenação de pagamento de juros indemnizatórios, nomeadamente, quer quanto ao termo final do prazo de contagem de juros, quer quanto à quantia sobre a qual incidem os juros indemnizatórios.

Discorda ainda a Fazenda Pública com a decisão recorrida na parte em que entendeu que os juros indemnizatórios incidem sobre o montante de 19.331,23€.

Efetivamente, a Recorrente entende que a sentença recorrida não se pronuncia sobre o alegado na contestação de que os juros indemnizatórios a serem devidos deviam incidir sobre a quantia de 10.489,00€, correspondente ao valor do imposto efetivamente pago, e que encontra respaldo nos pontos 9 e 11 da matéria de facto dada como provada. Deve ainda ser aditada a matéria de facto o enunciado na conclusão Z) das alegações de recurso.

Apreciando.

Antes de mais, para a prova do erro de julgamento de facto imputado à sentença recorrida a Recorrente vem requerer a junção de vários documentos.

Cumpre decidir.

Sobre esta matéria regula o disposto o art. 651.º do CPC, que prevê a junção de documentos no caso previsto no art. 425.º do CPC (ou seja, quando a sua apresentação não tenha sido possível até aquele momento) ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância.

In casu, os documentos cuja junção se pretende consistem em informações e detalhes das notas de cobrança e reembolso que já deveriam constar do processo administrativo, sendo que em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância revelam-se indispensáveis para a boa decisão da causa.

Pelo exposto, admite-se a junção dos documentos.

Cumpre então, aditar aos factos provados factualidade com interesse para a decisão da causa, ao abrigo do art. 662.º, n.º 1, do CPC, nos seguintes termos:

18) No dia 04/07/2017 foi emitida a nota de crédito a favor da Impugnante no valor de 19.610,88€, respeitante à liquidação de IRC de 1992, e paga à Impugnante no dia 10/07/2017 (cf. documento junto com as alegações de recurso).

19) Em 20/12/2017 foi efetuado à Impugnante pela AT o “débito de reembolso” no valor de 9.121,87€ de modo a obter a reposição do montante de reembolso pago e referido na alínea anterior, na parte em que foi pago em excesso (cf. documento junto com as alegações de recurso, informações de 18/05/2017 e 21/11/2017).

A convicção do Tribunal para dar como provado tais factos fundou-se nos documentos supra referidos que não foram impugnados pela parte contrária, e que não são contrariados por quaisquer outros documentos junto aos autos. Por outro lado, tais factos encontram-se alegados, de igual modo, na contestação, e também não foram impugnados pela Impugnante. Ademais, das informações constantes dos autos resulta demonstrado o erro no cálculo do montante a restituir à Impugnante na sequência da anulação parcial da liquidação de 1992.

Portanto, como conclui a Recorrente na conclusão Z), não carecendo de ser discriminado no probatório, resulta da conjugação da factualidade aditada nos pontos 18) e 19) da matéria de facto, que o valor a restituir à Impugnante foi apurado e devolvido em excesso, tendo sido, posteriormente, corrigida tal situação.

Deste modo, o valor sobre o qual deve ser calculado os juros indemnizatórios é de 10.489,00€ (19.610,88€ - 9.121,87€), que corresponde ao imposto indevidamente pago pela Impugnante, na sequência da anulação das correções impugnadas.

Ora, a sentença recorrida não concretizou o valor exato sobre o qual deveriam ser calculados os juros indemnizatórios, mas apenas por referência à “quantia de IRC paga na sequência das correções efetuadas no valor de 3.875.564$00 (€19.331,23)”. Por outro lado, a verdade é que também não tomou posição expressa sobre o concreto valor sobre o qual deveriam ser calculados os juros indemnizatórios que foi suscitada na contestação. Sublinhe-se, de igual modo, que esse concreto valor alegado resultou provado (cf. pontos 18 e 19 dos factos aditados), não tendo sequer sido impugnados pela Impugnante.

Contudo, e pese embora a sentença recorrida não se referir expressamente sobre os factos alegados na contestação, a verdade é que acaba por assumir posição (ainda que implícita) no sentido de os desconsiderar como relevantes, tomando por referência outros valores (indeterminados pois refere-se à quantia de IRC pagas referentes às correções que foram anuladas por vício de anulação de lei, e não ao concreto imposto indevidamente pago), e portanto, não estamos perante uma omissão de pronúncia, mas antes um erro de julgamento de facto, ao não se ter apurado o montante do imposto indevidamente pago que resulta da anulação das correções.

Como vimos, face aos documentos que foram juntos aos autos, e à não impugnação dos valores apresentados na contestação, o valor de imposto indevidamente pago é conforme supra exposto no montante de 10.489,00€, e nessa medida, a sentença recorrida enferma de erro de julgamento da matéria de facto, devendo ser revogada nesta parte.

Prosseguindo.

Invoca ainda a Recorrente Fazenda Pública, quanto ao termo final do prazo de contagem de juros, que os juros indemnizatórios apenas são devidos até à data do processamento da nota de crédito, nos termos do disposto no n.º 5, do art. 61.º do CPPT, que in casu, é anterior à data do efetivo reembolso do imposto. Portanto, entende que a sentença recorrida errou ao entender que são devidos juros indemnizatórios até à data do efetivo reembolso.

Vejamos.

Sobre a extensão temporal do direito a juros indemnizatórios dispõe o art. 61.º, n.º 5 do CPPT: “Os juros são contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos.”

Destarte, aquele preceito legal é claro ao estatuir que o termo do cômputo dos juros indemnizatórios é a data do processamento da respetiva nota de crédito – nesse mesmo sentido, v. acórdão do STA de 19/09/2018, proc. n.º 0462/14.

Na verdade, a sentença recorrida ao estipular o dies ad quem do cômputo dos juros indemnizatórios como sendo a data do reembolso do imposto enferma de erro de julgamento de direito, pois deveria ter limitado o cômputo até a data do processamento da respetiva nota de crédito, in casu, o dia 04/07/2017 (ponto 18 da matéria de facto aditada), portanto, sem mais considerações por desnecessárias, a sentença recorrida deve ser revogada nesta parte.

Em suma, o recurso procede integralmente, e nessa medida a sentença recorrida deve ser revogada na parte recorrida, nomeadamente, na parte sobre a qual incide os juros indemnizatórios, bem como a extensão temporal dos mesmos.

Assim sendo, e face ao supra exposto, os juros indemnizatórios devem ser calculados sobre a quantia de 10.489,00€, calculados até ao processamento da respetiva nota de crédito, in casu, o dia 04/07/2017.

Em matéria de custas o artigo 527.º do CPC consagra o princípio da causalidade, de acordo com o qual paga custas a parte que lhes deu causa. Vencida na presente causa a Recorrida, esta deu causa às custas do presente processo (n.º 2), e, portanto, deve ser condenada nas respetivas custas (n.º 1, 1.ª parte).

Contudo, a Recorrida não tendo apresentado contra-alegações não é responsável pelo pagamento da taxa de justiça – cf. acórdão do STA de 13/12/2017: “I - As custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (artigos 529.º n.º 1, do CPC, e 3º, nº 1, do RCP).
II – A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente (artigos 529º, nº 2, e 6º, nº 1, do CPC) e apenas é devida no seu pagamento pela parte que demande (artigo 530.º n. 1, do CPC).
III - O Recorrido que não contra-alegue não é, em caso algum, responsável pelo pagamento de taxa de justiça, o qual não lhe é exigível ainda que no recurso fique vencido (artigos 7º, nº 2, do RCP, e 37º, nº 4, da Portaria nº 419-A/2009, de 17 de Abril); IV – Se, porém, o Recorrido ficar vencido no recurso é, nos termos gerais, responsável pelo pagamento das custas (artigo 446º do CPC).”

Sumário (art. 663.º, n.º 7 do CPC)

O termo final do cômputo dos juros indemnizatórios é a data do processamento da respetiva nota de crédito (n.º 5, do art 61.º do CPPT), e não a data do reembolso do imposto indevidamente pago.

DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida na parte recorrida, nos termos supra expostos.
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Custas pela Recorrida, que não é responsável pelo pagamento da taxa de justiça porque não contra-alegou.
D.n.
Lisboa, 17 de setembro de 2020.


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Cristina Flora

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Tânia Meireles da Cunha

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Susana Barreto