Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1397/09.2BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:02/11/2021
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:REEMBOLSO DE IVA
PRAZO "ACELERADO"
PRAZO NORMAL
JUROS INDEMNIZATÓRIOS
Sumário:
I. O regime de “prazo acelerado” previsto no n.º 5 do Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de dezembro, na redação que lhe foi conferida pelo Despacho Normativo n.º 31-A/2008, de 12 de junho, tem como pressuposto que os elementos enviados via transmissão eletrónica de dados estejam corretos e completos.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I. RELATÓRIO

P….., SA (doravante Recorrente) veio apresentar recurso da sentença proferida a 18.12.2012, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada, na qual foi julgada improcedente a ação administrativa especial por si apresentada, que teve por objeto o despacho de 16.11.2009, da Diretora de Serviços de Reembolsos da então Direção-Geral dos Impostos.

Nas alegações apresentadas, a Recorrente concluiu nos seguintes termos:

A. De acordo com o n.º 8 do artigo 22.º do Código do IVA, na redacção à data dos factos, os "reembolsos de imposto, quando devidos, deverão ser efectuados pela Direcção-Geral dos Impostos até ao fim do 3.º mês seguinte ao da apresentação do pedido, findo o qual poderão os sujeitos passivos solicitar a liquidação de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º da lei geral tributária".

B. Não obstante, segundo o n.º 9 o mesmo preceito, o "Ministro das Finanças pode autorizar a Direcção-Ceral dos Impostos a efectuar reembolsos em condições diferentes das estabelecidas nos números anteriores, relativamentc a sectores de actividade cujo volume de negócios seja constituído essencialmente por operações previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º ou relativamente às quais a obrigação de liquidação do imposto seja da responsabilidade do adquirente".

C. Neste âmbito, o n.º 5 do Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de Dezembro, na redacção que lhe foi conferida pelo Despacho Normativo n.º 31-A/2008, de 12 de Junho, determina que o "IVA cujo reembolso, de valor superior a € 10 000, for solicitado por sujeitos passivos que efectuem operações [activas] isentas ou não sujeitas que conferem o direito a dedução, ou relativamente às quais a obrigação de liquidação do imposto seja da responsabilidade do adquirente e que representem, pelo menos, 75 % do valor total das transmissões de bens e prestações de serviços do respectivo período, e que não seja o primeiro reembolso, será restituído no prazo de 30 dias a contar da data da recepção do respectivo pedido" (sublinhado nosso).

D. Já o n.º 6 do antedito Despacho Normativo condiciona a concessão de qualquer reembolso à observância de um conjunto de pressupostos, de entre os quais importa salientar a "Inexistência de quaisquer divergências entre o valor dos campos da declaração periódica e o correspondente ao somatório das respectivas parcelas dos outros elementos referidos no n.º 1 do presente, despacho normativo [relações de fornecedores, clientes e regularizações], incluindo o anexo a que se refere a alínea c) do n.º 7 do artigo 23.º do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI)".

E. Tal como resulta dos preceitos citados, o enquadramento de dado pedido de reembolso no prazo "acelerado'" de restituição de 30 dias depende unicamente da observância dos requisitos aí vertidos.

F. A Recorrente demonstrou atempadamente - quatro dias após a apresentação do pedido de reembolso - que os pressupostos em apreço se encontravam verificados, maxime que as operações isentas ou não sujeitas que conferem o direito à dedução por si realizadas, nesse período, configuravam mais de 75% do total das suas operações.

G. Nem a Fazenda Pública nem o tribunal a quo assinalaram, como motivo justificativo para a rejeição do enquadramento do pedido de reembolso de IVA solicitado pela Recorrente no regime de restituição de 30 dias, vertido no n.º 5 do Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de Dezembro, qualquer requisito, de natureza substantiva ou formal, mencionado nos supracitados n.os 5 e 6 do diploma regulamentar em apreço.

H. O único motivo que é apontado pela Recorrida e pelo tribunal a quo para o efeito prende-se com a falta da menção "RC" na relação de fornecedores apresentada pela Recorrente.

I. A interpretação do n.º 5 do Despacho Normativo n.° 53/2005, de 15 de Dezembro, ensaiada pelo tribunal a quo encontra-se ferida de ilegalidade, porquanto rejeita a subsunção de factos não controvertidos - v.g., que a Recorrente realizou, no período de imposto em apreço, operações activas isentas ou não sujeitas que conferem o direito à dedução que totalizam mais de 75% do total das suas operações activas - com base em argumentos extraordinários em face da lei de natureza meramente formal ou burocráticos e que não se afiguram, nos termos daquele diploma regulamentar, motivo justificativo para a não concessão do reembolso no prazo reduzido de 30 dias.

J. Segundo a sentença recorrida, sem a aposição da menção "RC" na relação de fornecedores a Autoridade Tributária e Aduaneira não tinha meios de determinar quais as operações passivas que se encontravam reflectidas na sua declaração periódica de IVA.

K. Ora, tal não corresponde à verdade, já que, como consta da alínea D) do probatório fixado pela sentença recorrida, a Recorrente endereçou, no dia 18 de Agosto - quatro dias após a apresentação da declaração periódica e vinte e seis dias antes do termo do prazo para a restituição do IVA (atendendo ao prazo de 30 dias constante do n.º 5 do Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de Dezembro) - uma comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira, contendo uma descrição detalhada das suas operações da qual resultava, de forma evidente, a sua inclusão no regime "acelerado" de reembolso.

L. A desconsideração da comunicação endereçada pela Recorrente à Autoridade Tributária e Aduaneira colide com o princípio de liberdade de prova consagrado no artigo 72.º da LGT e artigo 50.º do CPPT, em sede de procedimento tributário.

M. Se, porventura, dúvidas existissem quanto à completude ou exactidão dos dados apresentados, sempre deveria a Autoridade Tributária e Aduaneira ter notificado a Recorrente para a prestação dos elementos adicionais que se revelassem necessários à descoberta da verdade material, ao abrigo dos princípios do inquisitório e da colaboração entre a Autoridade Tributária e Aduaneira e os contribuintes, vertidos no artigo 55.º, artigo 58.º e n.º 1 e 4 do artigo 59.º, todos da LGT.

N. Considera, assim, a Recorrente que o tribunal a quo incorreu num erro de julgamento, por violação de lei.

O. Como tal, e não tendo o reembolso de IVA sido pago no prazo de 30 dias previsto no n.º 5 do Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de Dezembro, entende a Recorrente serem devidos juros indemnizatórios, ao abrigo da alínea a) do n.º 3 do artigo 43.º da LGT, contados a partir do dia 14 de Setembro de 2008 até ao dia 30 de Novembro do mesmo ano, dado o inegável prejuízo em que incorreu, com o protelamento da restituição do IVA no prazo legalmente previsto para o efeito.

IV. DO PEDIDO

Nestes termos, e nos mais de Direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, anulando-se a sentença sub judice por violar o disposto no Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de Dezembro, na redacção que lhe foi conferida pelo Despacho Normativo n.º 31-A/2008, de 12 de Junho, com as legais consequências, designadamente, determinação do pagamento, pela Recorrida à Recorrente, dos juros indemnizatórios, no montante de € 41.281,97 (quarenta e um mil, duzentos e oitenta e um euros, noventa e sete cêntimos)”.

A Recorrida não apresentou contra-alegações.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e efeito suspensivo.

O Ilustre Magistrado do Ministério Público neste TCAS foi notificado nos termos do art.º 146.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), ex vi art.º 279.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

Colhidos os vistos legais, vem o processo à conferência.

É a seguinte a questão a decidir:
a) Há erro de julgamento, em virtude de se reunirem os requisitos para pagamento do reembolso no prazo previsto no n.º 5 do Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de dezembro?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“                                                                             A)

A autora está enquadrada no regime de periodicidade mensal, tendo apresentado um pedido de reembolso de IVA, no montante de € 4.829.461,16 na declaração periódica relativa a Julho de 2008 e submetida a 14 de Agosto de 2008, cf. fls. 6/73 do processo administrativo em apenso.


B)

Da declaração periódica identificada na alínea anterior constam os seguintes valores:

Campo 90 – 54.379.428,15

Campo 10 - 7.705.204,71

Campo 7 - 30.405.950,00

Campo 8 - 3.527.639,28

cf. fls. 74 do apenso.


C)

A Administração Tributária entendeu que a permilagem das operações, com base na declaração identificada em A) é de 72,7% e teve em conta o seguinte cálculo (cf. fls. 74 do apenso):

% =        Campo 7 + Campo 8 da declaração periódica

Campo 90- Campo 10 da declaração periódica

54.379.428,15 - 7.705.204,71 = 46.674.223,44

30.405.950,00 + 3,527.639,28 = 33.933.589,28

33.933.589,28 = 72,7%

46.674.223, 44

D)

A 18 de Agosto de 2008, foi elaborado um requerimento pela Autora dirigido à Direcção Geral dos Impostos onde se refere o seguinte: "A P….. (...) vem por este meio complementar a informação disponibilizada por via do envio em 14 de Agosto de 2008, da declaração periódica de IVA do mês de Julho de 2008 (...) Tal informação é necessária para apurar correctamente o rácio de 75% do valor total das transmissões de bens e prestações de serviços do respectivo período representado pelas operações isentas ou não sujeitas (...)

Muito embora desconhecendo a metodologia de cálculo do referido rácio utilizada pelos serviços do IVA, cremos que é determinado da seguinte forma:

% = Campos 7 e 8 da Declaração do IVA

Campos 1,5,3,7 e 8 da Declaração 

Ora, este critério não corresponde à letra da lei pois no campo 3 das declarações periódicas de IVA da P….. (bem como de todos os sujeitos passivos) são incluídas, para além das transmissões de bens e prestações de serviços em que a lei exige que seja feita a inversão do sujeito passivo, como:

- Aquisições de serviços de construção civil:      €739.123,83

- Aquisições intracomunitárias de outros bens: €302.425,75

- Aquisições de serviços ao estrangeiro:              € 94.744,77

E cujo total ascende a € 1.136.294,35 (Documento 2), valor que deverá ser expurgado do mencionado campo 3, resultando assim um rácio do período de 75%, pelo que V. Exas. dispõem de todos os elementos necessários para procederem ao reembolso de € 4.829.461,16 no prazo de 30 dias (...)", cf. fls. 78/79 do apenso.

E)

Em 17 de Novembro de 2008, deu entrada na Direcção Geral dos Impostos, um requerimento da Autora dirigido ao "Director Geral dos Impostos" a solicitar que se processem os juros indemnizatórios ao abrigo do art. 43.º da LGT, tendo em conta que o prazo dos 30 dias para o reembolso, conta-se a partir da data do pedido de reembolso, que ocorreu a 14 de Agosto de 2008, e como tal, aquele prazo já tinha sido ultrapassado, cf. fls. 75/77 do apenso.


F)

Em 9 de Fevereiro de 2009, foi emitido o Ofício n.º …..da Direcção de Serviços de Reembolsos dirigido à Autora, com o seguinte teor: "Assunto: Notificação nos termos do artigo 60.º da LGT (...)" que anexa o seguinte "Projecto de decisão" onde se extrai o seguinte: "(...) a proposta de decisão é no sentido de deferimento parcial, conforme despacho de 2009.02.03 da Senhora Directora de Serviços de Reembolsos (...) exarado na informação n.º …..da Direcção de Serviços de Reembolsos, da qual se transcreve as partes que ora relevam: (...) O pedido de reembolso em causa, foi enquadrado nos termos do n.º 8 do artigo 22.º do CIVA, ou seja, com um prazo limite de pagamento até ao final do terceiro mês seguinte ao da apresentação do pedido, no caso em apreço até ao final do mês de Novembro de 2008.

(...)

Em 2008.11.27, apresentou o pedido de juros indemnizatórios agora em apreciação (...) importa referir que para efeitos de determinação da percentagem de 75% a que se refere o n.º 5 do Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de Dezembro referida, é efectuado o calculo que resulta do quociente entre o somatório dos campos 7 e 8 da declaração periódica do IVA e o campo 90 expurgado do campo 10, da mesma declaração. Da consulta ao sistema informático, nomeadamente as declarações periódicas, verifica-se que a percentagem das operações em causa, para o período de 08.07, é apenas de 72% pelo que, foi aquele pedido de reembolso enquadrado nos termos do n.º 8 do artigo 22.º do CIVA. (...) Se assim for entendido, afigura-se serem devidos juros indemnizatórios no montante de€4.234,05, relativos ao pedido de reembolso do período de o8.07, calculados sobre o valor de € 4.829.461,16, à taxa de 4%, desde 2008.12.01 até 2008.12.08, conforme demonstração da liquidação que se anexa.", cf. fls. 83/84 do apenso.


G)

Em 2 de Março de 2009 a Autora respondeu em sede de direito de audição, cf. fls. 86/111 do apenso.

H)

Em 27 de Outubro de 2009, foi elaborada a Informação n.º …..da Direcção de Serviços de Reembolsos, onde foi mantido o despacho de 3 de Fevereiro de 2009 e consequentemente foi entendido que o pedido de reembolso relativo ao período de 08.07, foi correctamente enquadrado nos termos do n.º 8 do artigo 22 do CIVA, cf. fls. 209/211 do apenso.

I)

Sobre informação identificada na alínea anterior, foi exarado o seguinte despacho pela Directora de Reembolsos da Direcção Geral dos Impostos, em 16 de Novembro de 2009 "Concordo. Converta-se em definitivo o despacho de deferimento parcial referente ao pedido de juros indemnizatórios do sujeito passivo em apreço, atento os fundamentos constantes da informação." cf. fis. 209 do apenso.

J)

Em 20 de Novembro de 2009, foi emitido o Ofício n.º ….., da Direcção de Serviços de Reembolsos, registado com aviso de recepção, dirigido à ora Autora, da decisão final relativo ao pedido de juros indemnizatórios referente ao período 08.07, cf. fls. 214/215 do apenso.

K)

Em 25 de Novembro de 2009, foi assinado o aviso de recepção referido na alínea anterior, cf. fls. 213 do apenso.

L)

Em 11 de Dezembro de 2009, deu entrada a presente Acção Administrativa Especial, neste tribunal, cf. fls. 2 dos autos.

M)

No anexo de fornecedores junto com a declaração periódica submetida pela Autora relativa ao período de 08.07, não consta o prefixo "RC” em nenhuma das suas linhas, cf. fls. 23 e segs do apenso”.

II.B. Refere-se ainda na sentença recorrida:

“Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou do exame dos documentos, não impugnados, designadamente do Processo Administrativo, bem como das informações oficiais constantes dos autos”.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Do erro de julgamento

Considera a Recorrente que o Tribunal a quo errou no seu julgamento, na medida em que se reúnem os pressupostos de aplicação do n.º 5 do Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de dezembro, na redação que lhe foi conferida pelo Despacho Normativo n.º 31-A/2008, de 12 de junho, pelo que lhe são devidos juros indemnizatórios desde o 30.º dia contado da apresentação do pedido de reembolso.

Vejamos então.

O Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) é um imposto plurifásico, que assenta numa estrutura de entrega e respetiva dedução, pelos vários intervenientes na cadeia, até ao consumidor final, que o suporta, sem o poder deduzir.

O direito à dedução do IVA é um direito que assiste aos sujeitos passivos deste imposto, desde que os bens e os serviços, a que respeita tal imposto a deduzir, sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis[1].

O IVA funciona, pois, pelo método indireto subtrativo, de acordo com o qual o sujeito passivo deduz, ao imposto liquidado nos seus outputs, o imposto liquidado nos respetivos inputs.

Trata-se de um reflexo do princípio da neutralidade, subjacente a este imposto, que, no que toca ao direito à dedução em específico, se reflete na necessidade de o IVA não condicionar os produtores a alterar o seu processo produtivo.

Face a esta mecânica do IVA, o sujeito passivo pode encontrar-se em situações de crédito de imposto.

Estando o sujeito passivo nessa situação, cumpre, então, chamar à colação o art.º 22.º do Código do IVA (CIVA), nos termos do qual:

“4 - Sempre que a dedução de imposto a que haja lugar supere o montante devido pelas operações tributáveis, no período correspondente, o excesso é deduzido nos períodos de imposto seguintes.

5 - Se, passados 12 meses relativos ao período em que se iniciou o excesso, persistir crédito a favor do sujeito passivo superior a (euro) 250, este pode solicitar o seu reembolso.

(…)

8 - Os reembolsos de imposto, quando devidos, devem ser efetuados pela Direção-Geral dos Impostos até ao fim do 3.º mês seguinte ao da apresentação do pedido, findo o qual podem os sujeitos passivos solicitar a liquidação de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º da lei geral tributária.

9 - O Ministro das Finanças pode autorizar a Direcção-Geral dos Impostos a efetuar reembolsos em condições diferentes das estabelecidas nos números anteriores, relativamente a sectores de atividade cujo volume de negócios seja constituído essencialmente por operações previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º ou relativamente às quais a obrigação de liquidação do imposto seja da responsabilidade do adquirente.

10 - O Ministro das Finanças pode estabelecer, por despacho, de acordo com os critérios previstos no artigo 85.º, a obrigatoriedade de os sujeitos passivos apresentarem, juntamente com o pedido de reembolso, documentos ou informações relativos às operações que determinaram aquele pedido, sob pena de o reembolso não se considerar devido para efeitos do n.º 8.

11 - Os pedidos de reembolso são indeferidos quando não forem facultados pelo sujeito passivo elementos que permitam aferir da legitimidade do reembolso, bem como quando o imposto dedutível for referente a um sujeito passivo com número de identificação fiscal inexistente ou inválido ou que tenha suspenso ou cessado a sua atividade no período a que se refere o reembolso…”.

Neste contexto, há que atentar no Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de dezembro (considerando as alterações ao mesmo efetuadas pelo Despacho Normativo n.º 31-A/2008, de 12 de junho), que estabelece normas relativas aos reembolsos solicitados pelos sujeitos passivos através da declaração periódica prevista no art.º 40.º do CIVA.

Como resulta do preâmbulo deste despacho normativo, a motivação inerente ao mesmo prende-se com o objetivo de fomentar a utilização das novas tecnologias, potenciando controlos e decisões resultantes de análises automáticas.

Assim, nos termos do mencionado Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de dezembro, na redação então vigente:

“1 - Todos os sujeitos passivos que solicitem reembolsos através da declaração prevista no artigo 40.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA) devem remeter a respetiva declaração periódica dentro do prazo legal e por transmissão eletrónica de dados, através do sítio www.e-financas.gov.pt, acompanhada dos seguintes elementos:

a) Relação, conforme o modelo do anexo n.º 1 do presente despacho, com identificação dos clientes a quem, com referência ao período declarativo, foram efetuadas as transmissões de bens e as prestações de serviços referidas na alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, previstas em legislação especial, sem liquidação do IVA, com direito a dedução e indicação do respetivo valor;

b) Relação, conforme o modelo do anexo n.º 2 do presente despacho, com identificação, por campo da declaração periódica, dos fornecedores de bens ou serviços e das importações em que, com referência ao período declarativo, tenha havido liquidação de imposto, com indicação do respetivo valor de aquisição, do IVA dedutível e, se for caso disso, das situações em que por força da lei o sujeito passivo adquirente dos bens ou destinatário dos serviços se substitui ao fornecedor na liquidação do imposto;

c) Relação, conforme o modelo do anexo n.º 3 do presente despacho, com identificação, quando for caso disso, dos sujeitos passivos a que respeitam as regularizações mencionadas no campo 40 do quadro 06 da declaração periódica relativa ao período declarativo e indicação do respetivo valor líquido de imposto e do IVA regularizado.

2 - Nas relações previstas no número anterior, poderão ser incluídos num único valor e até ao limite de 5% do montante total de cada relação:

a) No que respeita à referida na alínea a), as transmissões de bens ou prestações de serviços de montante inferior a (euro) 5000, efetuadas a clientes sediados em Portugal;

b) No que respeita à referida na alínea b), os bens ou prestações de serviços de montante inferior a (euro) 5000, adquiridos a fornecedores sediados em Portugal;

c) No que respeita à referida na alínea c), as operações a que respeitem regularizações de imposto não previstas nos artigos 23.º a 25.º do CIVA e inferiores a (euro) 1000.

3 - Nas relações previstas no n.º 1, no que respeita às referidas nas alíneas a) e b), a identificação das transmissões de bens efetuadas com clientes e fornecedores sediados fora da União Europeia efetua-se mediante menção dos respetivos documentos aduaneiros.

4 - Havendo crédito de imposto reportado de período anterior, de valor superior a 25% do reembolso pedido, e sendo o imposto dedutível do período inferior ao reembolso pedido, deverão ser submetidas, quando ainda não apresentadas, as relações referidas no n.º 1, correspondentes aos períodos, no máximo de três, cujos reportes estão a influenciar o reembolso.

5 — O IVA cujo reembolso, de valor superior a € 10 000, for solicitado por sujeitos passivos que efetuem operações isentas ou não sujeitas que conferem o direito a dedução, ou relativamente às quais a obrigação de liquidação do imposto seja da responsabilidade do adquirente e que representem, pelo menos, 75 % do valor total das transmissões de bens e prestações de serviços do respetivo período, e que não seja o primeiro reembolso, será restituído no prazo de 30 dias a contar da data da receção do respetivo pedido.

6 - A concessão de qualquer reembolso depende ainda da verificação cumulativa dos seguintes requisitos:

a) Inexistência de quaisquer divergências entre o valor dos campos da declaração periódica e o correspondente ao somatório das respetivas parcelas dos outros elementos referidos no n.º 1 do presente despacho normativo, incluindo o anexo a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias (RITI);

b) Não se encontrar o sujeito passivo em situação de incumprimento declarativo relativo a IVA e a imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC) ou imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), consoante o caso, com referência a períodos de imposto anteriores;

c) Existência de conta bancária de que o sujeito passivo seja titular, confirmada pela respetiva instituição de crédito;

d) Da prestação de garantia, não obstante o disposto no n.º 7 do artigo 22.º do CIVA, desde que a quantia a reembolsar exceda (euro) 1000 e se trate de:

1) Primeiro pedido de reembolso; ou

2) Pedido de reembolso na sequência de cessação de atividade do sujeito passivo ou do seu enquadramento no disposto no n.º 4 do artigo 28.º, no n.º 1 do artigo 54.º ou no n.º 1 do artigo 61.º, todos do CIVA.

(…) 8 - A não verificação de qualquer das condições referidas no n.º 6 determina a suspensão do prazo de concessão do reembolso e a contagem de juros previstas no n.º 8 do artigo 22.º do CIVA, que será notificada ao sujeito passivo.

9 - O prazo de concessão do reembolso será ainda suspenso quando o sujeito passivo não tenha posto à disposição dos serviços competentes elementos por estes solicitados que permitam averiguar da sua legitimidade ou do correto apuramento do imposto.

10 - Se passados seis meses não for cumprida a obrigação a que se refere o número anterior, a suspensão converte-se, automaticamente, no indeferimento do reembolso nos termos do n.º 11 do artigo 22.º do CIVA, após notificação ao sujeito passivo.

11 - O presente despacho aplica-se aos pedidos de reembolsos relativos ao mês de junho de 2006 e subsequentes, no caso de sujeitos passivos de periodicidade mensal, e ao 2.º trimestre de 2006 e subsequentes, no caso de sujeitos passivos de periodicidade trimestral.

12 - Os parâmetros e a eficácia do sistema de indicadores de risco implementado bem como, em geral, as novas metodologias de controlo adotadas serão objeto de avaliações globais e periódicas, constantes de relatório a submeter ao Ministro das Finanças até 31 de Março do ano seguinte àquele a que respeita” (sublinhados nossos).

Refira-se que a redação do n.º 5 do despacho normativo foi-lhe dada pelo já mencionado despacho normativo n.º 31-A/2008, de 12 de junho, em virtude de os casos de IVA devido pelo adquirente (reverse charge) originarem situações de crédito de imposto frequentes, visando-se, pois, que não sejam criados “constrangimentos financeiros desnecessários”, pelo que “por uma questão de equidade, os sujeitos passivos cujas operações estejam em mais de 75 % abrangidas pela regra de inversão devem beneficiar de um prazo de reembolso de 30 dias, à semelhança do que já sucede com sujeitos passivos de outros sectores de atividade cujas operações sejam maioritariamente isentas ou não sujeitas com direito a dedução”.

Portanto, verifica-se que no art.º 22.º do CIVA se prevê um prazo geral de reembolso do IVA, de 3 meses a contar do respetivo pedido, abrindo-se portas a que seja previsto regime especial noutros casos, o que decorre do despacho normativo a que temos vindo a fazer referência, concretamente do seu n.º 5, que prevê um prazo mais curto, de 30 dias, no caso de pedidos de reembolso de valor superior a 10.000,00 Eur., quando relativos a sujeitos passivos que efetuem operações isentas ou não sujeitas que conferem o direito a dedução, ou relativamente às quais a obrigação de liquidação do imposto seja da responsabilidade do adquirente e que representem, pelo menos, 75 % do valor total das transmissões de bens e prestações de serviços do respetivo período.

O que está aqui em causa é se a falta de menção “RC” na relação de fornecedores remetida pela Recorrente, aquando da apresentação do pedido de reembolso, é suficientemente ponderosa para não ser aplicável o regime do n.º 5 despacho normativo ou se, tal como refere a Recorrente, tal não é suficiente, tendo, de todo o modo, sido suprida tal falta pela própria, em requerimento apresentado uns dias depois de efetuado o pedido de reembolso.

Em termos de aplicação do despacho normativo em causa, é, desde logo, de ter em conta ser necessário, designadamente:
a) Apresentar a declaração periódica dentro do prazo legal;
b) Com a declaração periódica, apresentar, entre outros documentos, a relação de fornecedores, de acordo com o modelo constante do despacho normativo; como decorre da instrução n.º 7 do anexo 2, “[a] coluna 2 destina-se à indicação do NIF quer de fornecedores nacionais quer de fornecedores pertencentes a outros países da União Europeia. No caso em que a liquidação e dedução do imposto tenha sido efetuada pelo adquirente dos bens ou pelo destinatário dos serviços, deve ser mencionado o NIF do declarante, indicando obrigatoriamente na coluna 1 o prefixo RC”;
c) Inexistirem divergências entre o valor dos campos da declaração periódica e o somatório das parcelas dos elementos adicionais mencionados no n.º 1.

Não se verificando as condições referidas no n.º 6 (sublinhe-se que este n.º 6, ao utilizar a palavra “ainda” tem implícito o cumprimento das demais condições, designadamente o envio dos elementos via transmissão eletrónica dados), há uma suspensão do prazo de concessão do reembolso e a contagem dos juros indemnizatórios é feita nos termos do já citado art.º 22.º, n.º 8, do CIVA (cfr. n.º 8).

Ora, no caso, não é controvertido que o anexo 2 apresentado pela Recorrente, relativo aos fornecedores, não continha a menção “RC”, o que impedia, através de controlo automático, aferir as transações relativas a reverse charge.

Na declaração periódica (DP) na qual foi solicitado o reembolso constavam os seguintes valores [cfr. facto B)]:

Campo 90 – 54.379.428,15

Campo 10 - 7.705.204,71

Campo 7 - 30.405.950,00

Campo 8 - 3.527.639,28

No caso, a administração tributária, para aferir a percentagem em causa e considerando os elementos enviados via transmissão eletrónica de dados, fê-lo com base nos seguintes cálculos:
a) No numerador, adicionou o valor das operações isentas (campos 7 e 8);
b) No denominador, considerou o total da base tributável (campo 90), à qual subtraiu o valor atinente às aquisições intracomunitárias de bens (campo 10).

Não é controvertido que o anexo concernente às transações intracomunitárias de bens e o anexo previsto na al. a) do n.º 1 do despacho normativo n.º 53/2005, relativo a clientes com operações isentas, estavam conformes com a declaração periódica.

Já o anexo previsto na al. b) do n.º 1 do despacho normativo n.º 53/2005 continha um valor total de 46.179.304,42 Eur. de valor das aquisições e de 8.962.946,05 Eur., de IVA deduzido, valor que coincide com o valor constante da DP a título de imposto a favor do sujeito passivo, desconsiderando as regularizações (campos 40 e 81). No entanto, o mesmo não permitia a identificação das operações relativas a reverse charge, como já referido, atenta a falta de identificação dessas situações.

Ora, se é certo que, como refere a Recorrente, a não aplicação do prazo de 30 dias depende da existência de incongruências nos somatórios dos anexos, incongruências essas que, prima facie, não se verificavam, como referimos, também é certo que o rácio calculado com base nestes valores se situava, tal como calculado pela AT, nos 72,7%, abaixo, pois, dos 75% exigidos.

Ou seja, face aos dados transmitidos com a declaração periódica, não eram identificáveis pela AT incongruências, mas também não se obtinha o valor de 75%, situação que não colide com o deferimento do pedido de reembolso, mas que implica que os juros indemnizatórios sejam calculados nos termos gerais.

O facto de a Recorrente ter apresentado um documento, logo a seguir ao pedido de reembolso, onde identifica os valores (em bloco) contidos no campo 3 e relativos a reverse charge (valor total de 1.136.294,35 Eur.), não altera este nosso raciocínio, porquanto tal documento vem assumir, no fundo, que os valores constantes do anexo B estavam incorretos, não contendo as situações relativas a reverse charge (que, aliás, reiteramos, não eram identificáveis pela falta de aposição do prefixo RC). Aliás, sublinhe-se que esse documento junto em agosto de 2008 apenas faz menções em bloco, não discriminando que situações estão na origem dos valores referidos.

Ora, assim sendo não se pode considerar que inexistam divergências entre os valores dos campos das declarações e os valores constantes dos anexos previstos no despacho normativo, simplesmente porque o Anexo B não tinha identificadas as situações relativas a reverse charge, ao contrário do que era exigido, o que implica que a contagem de juros passe a ser nos termos do art.º 22.º n.º 8 do CIVA.

Bem se compreende esta opção, porquanto a ratio do despacho normativo era a de permitir aferir, de forma automática, por cruzamento de dados informáticos, a reunião dos pressupostos, o que apenas se compadece nos casos em que os documentos estão todos corretamente preenchidos. Havendo erros de preenchimento ou falta de elementos, tal circunstância não redunda, naturalmente, no indeferimento do pedido de reembolso, tout court, mas exige uma intervenção manual da AT, por forma até a cumprir com o seu dever de colaboração – daí que não assista razão à Recorrente, no tocante à liberdade de prova ou à necessidade de cumprimento dos princípios do inquisitório e da colaboração.

Ou seja, o regime de “prazo acelerado” tem como pressuposto que os elementos enviados via transmissão eletrónica de dados estejam corretos e completos, pois só desta forma é possível a análise e controlo num espaço de tempo mais comprimido. Havendo necessidade de elementos adicionais, naturalmente que a AT pode e deve lançar mão dos meios ao seu alcance, designadamente para efeitos de cumprimento do dever de colaboração. No entanto, nestes casos já não estamos no âmbito de um processamento acelerado do pedido de reembolso, que, repetimos, pressupõe que toda a documentação apresentada com a declaração periódica esteja completa.

Assim, atento o exposto, o prazo para pagamento de juros indemnizatórios não será o prazo de 30 dias especial, mas o prazo de 3 meses geral.

Como tal, carece de razão a Recorrente.

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:
a) Negar provimento ao recurso;
b) Custas pela Recorrente;
c) Registe e notifique.


Lisboa, 11 de fevereiro de 2021


[A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores António Patkoczy e Vital Lopes]

Tânia Meireles da Cunha


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[1] Sobre o direito à dedução, v., v.g., os acórdãos do TJUE de 8 de junho de 2000, Midland Bank, C-98/98, EU:C:2000:300, de 1 de abril de 2004, Bockemühl, C90/02, EU:C:2004:206, n.º 38, e de 15 de julho de 2010, Pannon Gép Centrum, C368/09, EU:C:2010:441, n.º 37 e jurisprudência aí referida.