Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2751/12.8BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:04/04/2019
Relator:SOFIA DAVID
Descritores:RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELA DELONGA NA ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA; APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO;
LEI N.º 67/2007, DE 31-12;
DECRETO-LEI N.º 48051, DE 21-11-1967;
VIOLAÇÃO DO DIREITO À JUSTIÇA EM PRAZO RAZOÁVEL;
DANOS;
TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA; NEXO DE CAUSALIDADE;
Sumário:I – Numa acção de responsabilidade do Estado pela delonga na administração da justiça, se o facto que funda a ilicitude iniciou-se em 2004 e terminou em 2010, não obstante a acção para a efectivação da responsabilidade do Estado já ter sido apresentada na vigência da Lei n.º 67/2007, de 31-12, haverá que aplicar-se a disciplina do Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967 aos factos ocorridos antes da vigência daquela última Lei;
II- Para aferir da ilicitude decorrente de um atraso na decisão judicial, há que considerar, primeiramente, de forma analítica o (in)cumprimento dos vários prazos legais para a prática dos vários actos e dos correspondentes prazos para a ocorrência das várias fases processuais, atendendo, ainda, às circunstâncias do caso concreto e designadamente: (i) à complexidade do caso; (ii) ao comportamento processual das partes; (iii) à actuação das autoridades competentes no processo; (iv) e à importância do litígio para o interessado;
III - Posteriormente, há que encetar um segundo raciocínio, já não analítico, mas global, em que a aferição do pressuposto da ilicitude decorrente da excessiva demora do processo ou do atraso na decisão judicial se afere pela totalidade do período de tempo em que tal processo se desenvolveu;
IV - Deve presumir-se a existência de danos não patrimoniais como consequência da demora excessiva de um processo judicial;
V- Na responsabilidade por facto ilícito há que aplicar a teoria da causalidade adequada, na sua formulação negativa, tal como vem formulada no art.º 563.º do Código Civil. Por conseguinte, o facto ilícito não só tem de constituir, em concreto, uma condição sine qua non do dano, como, em abstracto, aquele mesmo facto tem de ser capaz (tem de ser idóneo), em condições normais, para produzir o tipo de dano que se invoca. Igualmente, se para a produção do dano a condição é de todo indiferente ou só se tornou condição em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, essa condição não será causa adequada do dano que se alega;
VI - A demora na tramitação de um processo contra-ordenacional não pode ser entendida como causa adequada para os danos correspondentes às remunerações que o Recorrente deixou de auferir após a decisão condenatória do Banco Portugal, que o inibiu do exercício de funções de administração, direcção, gerência ou chefia em instituições de crédito e sociedades financeiras, ou dos danos de imagem e profissionais que se verificaram após aquela condenação.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I - RELATÓRIO
A..... intentou no Tribunal Administrativo de Círculo (TAC) de Lisboa a presente acção administrativa comum contra o Estado Português (EP), peticionando a condenação do R. no pagamento de uma indemnização de €25.000,00, pelos danos não patrimoniais sofridos e de uma indemnização de €728.093,22, por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora a contar da data da citação, até integral pagamento.
Por decisão proferida em 05-06-2018, foi a acção julgada parcialmente procedente e condenado o R. a pagar ao A., a título de indemnização por danos não patrimoniais, o valor de €6.000,00, acrescido de juros de mora contados a partir da data da prolação da sentença. Absolveu-se o Réu do demais peticionado.

Inconformado, o A. interpôs recurso da decisão proferida, tendo apresentado as suas alegações, onde formulou as seguintes conclusões:“1. As decisões judiciais devem ser fundamentadas. (arts. 205º, nº 1, da CRP e 154º do CPC). Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência - art. 607º, nº 4, do CPC. A falta de fundamentação da sentença tem por consequência a sua nulidade, nos termos do art. 615º, nº 1, c), do CPC, a qual tem de ser invocada no recurso, nos termos do número 4 do mesmo preceito.
2. Na sentença recorrida o Tribunal proferiu decisão na qual declarou os factos que considerou provados. Não foram considerados provados os factos alegados pelo autor na p.i., nos. Relativamente aos factos não provados, fez-se constar a seguinte decisão na sentença recorrida: «Factos não provados: inexistem, com relevância para a decisão da causa.». Não foi apresentada qualquer fundamentação. Tal decisão violou o disposto nos arts. 5º, 154º, 607º, nºs 3 e 4, e 608º, nº 2, do CPC. A interpretação das referidas normas promovida pelo Tribunal recorrido, no sentido vertido na sentença recorrida, violou claramente o disposto nos arts. 20º, nº 4, e 205º, nº 1, da CRP. Tal circunstância determina a nulidade da douta sentença recorrida, nos termos do art. art. 615º, nº 1, c) e nº 4, do CPC.
3. Os factos identificados na conclusão nº 2 eram importantes para a boa decisão da causa. Têm a ver com o percurso profissional do autor, com as legítimas expectativas que tinha para a sua carreira, com as consequências da prescrição do procedimento, com a responsabilidade por essa prescrição e com os prejuízos patrimoniais sofridos. Não poderiam ter sido ignorados pelo Tribunal sob pena de violação do disposto no art. 5º, nºs. 1 e 2 do CPC. Que foi o que sucedeu.
4. O Tribunal de recurso deve alterar a decisão sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa - art. 662º do CPC. No caso concreto dos factos alegados nos artigos 21º, 22º, 29º, 31º, 38º, 39º, 47º, 48º, 49º e 50º da p.i., existe prova documental nos autos que os comprovam e as testemunhas, ouvidas em audiência de julgamento prestaram depoimento sobre eles, conforme se demonstra na alegação do presente recurso. O processo oferece todos os meios probatórios necessários para o Tribunal de recurso considerar provados os referidos factos, o que se requer.
5. O estabelecimento e a actividade das instituições de crédito e sociedades financeiras são regulados pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), aprovado pelo Decreto-Lei nº 292/92, de 31 de Dezembro. Nos termos do referido diploma, na redacção em vigor em 2003, o início de actividade das instituições de crédito dependia do registo prévio no Banco de Portugal, o mesmo sucedendo no que respeitava aos respectivos membros dos orgãos de administração e fiscalização (arts. 65º, nº 1 e 69º do RGICSF). Nos termos do art. 116º do mencionado diploma, foi atribuída competência ao Banco de Portugal para sancionar as infrações, mediante a aplicação de coimas e sanções acessórias (art. 76º, nº 2, RGICSF).
6. No âmbito sancionatório, o art. 213º do RGICSF atribuiu ao Banco de Portugal a competência para o processo de ilícito de mera ordenação social previstos no referido diploma e aplicação das correspondentes sanções, que poderiam ser coimas, cujo valor variava consoante a gravidade da infração (arts. 210º e 211º do RGICSF) e sanções acessórias, especialmente previstas no caso pessoas singulares que exerciam funções de administração, direcção, gerência ou chefia em instituições de crédito e sociedades financeiras nos arts. 204º e 212º, nº. 1, c) do RGICSF).
7. No caso concreto das pessoas singulares, a sanção acessória traduzia-se na inibição do exercício das referidas funções pelo período ente seis meses e dez anos, consoante a gravidade da infração (art. 212º, nº 1, c) do RGICSF). Nos termos do art. 216º do mesmo diploma era admissível a suspensão preventiva de funções durante o decurso do procedimento. Findo este, a decisão que aplicava alguma das sanções acessórias previstas no art. 212º, nº1, c) e d), tornava-se imediatamente exequível e a sua exequibilidade só terminava com a decisão judicial que definitivamente a revogasse (art. 227º, nº 2, do RGICSF).
8. Em 19.02.2003, no âmbito do processo de contra-ordenação nº 8/02/CO, o Banco de Portugal deduziu acusação contra o Central -…., SA e outros 9 arguidos singulares, entre os quais figurava o autor. Por deliberação do Banco de Portugal, datada de 18.11.2003, o autor foi condenado na coima única de € 150.000,00 e na sanção acessória de inibição do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência, ou chefia em quaisquer instituições de crédito ou sociedades financeiras por um período de 6 (seis) anos (sentença recorrida, factos provados A e B).
9. Consta da decisão do Banco de Portugal, datada de 18.11.2003, que «a decisão de condenação em sanção acessória torna-se imediatamente exequível, só terminando a sua exequibilidade com decisão judicial que a revogue» (sentença recorrida, facto provado C).
10. Perante a decisão do Banco de Portugal, ao autor restavam apenas duas possibilidades: ou se conformava com a decisão e esta tornava-se definitiva, produzindo todos os efeitos jurídicos dela decorrentes, sendo, por essa razão, susceptível de execução nos termos dos arts. 79º, nº 1 e 88º do RGCO, ou não se conformava e interpunha recurso judicial com vista à sua impugnação (art. 59º do RGCO e art. 228º do RGICSF).
11. O autor não se conformou com a decisão do Banco de Portugal e apresentou, nos termos do artigo 59º do RGCO, requerimento de impugnação judicial da deliberação do Banco de Portugal - sentença recorrida, facto provado D. Impugnada a decisão administrativa que aplicou uma sanção e caso a autoridade administrativa não revogue a decisão de aplicação da coima (cfr. art. 62º, nº 2, do Regime Geral das Contraordenações), os autos são enviados ao ministério público, que os tornará presentes ao juiz, valendo este acto como acusação (cfr. nº 1 do referido art. 62º). Assim, quando recebe os autos, o ministério público passa a assumir o papel de titular do processo, podendo, para além de os apresentar ao juiz, nos termos referidos, optar por retirar a acusação, desde que se verifiquem os pressupostos formais do art. 65º - A do Regime Geral das Contraordenações, podendo, ainda, inclusive, requerer a conversão do processo em processo criminal, nos termos previstos no art. 76º do aludido regime, remetidos os autos ao tribunal, o ministério público passa a ser, nos termos expostos, o titular da pretensão punitiva.
12. O direito geral à tutela jurisdicional efectiva é concretizado, no âmbito da justiça administrativa, através da consagração, no artigo 268º da Constituição, de um conjunto de garantias dos particulares em face da Administração, onde se inclui o direito de impugnar quaisquer actos administrativos que os lesem. No seu âmbito normativo coexistem quatro "subdireitos" ou dimensões garantísticas: (1) o direito de acção ou de acesso aos tribunais; (2) o direito ao processo perante os tribunais; (3) o direito á decisão da causa pelos tribunais; (4) o direito á execução das decisões pelos tribunais. O direito de acção é o direito subjectivo de levar determinada pretensão ao conhecimento do orgão judicial, solicitando a abertura de um processo, com o consequente dever (direito ao processo) do mesmo orgão de sobre ela se pronunciar mediante decisão fundamentada (direito à decisão) e, consoante o sentido da decisão, exigir, se for o caso disso, a execução da decisão do tribunal proferida no caso (art. 205º - 3). O direito à tutela jurisdicional efectiva é uma garantia do demandante e, também, do demandado.
13. O conceito de prazo razoável, previsto no art. 20º, nº 4, da CRP, é um conceito indeterminado. O que significa, por um lado, que não é possível adiantar uma noção abstrata e, por outro lado, obriga à sua definição em cada caso concreto. Para o apuramento em concreto do conceito de prazo razoável devem ter-se em conta quatro critérios: (1) complexidade da causa; (2) comportamento do Estado; (3) comportamento das partes; (4) importância do litígio para o interessado.
14. Ao impugnar judicialmente a decisão do Banco de Portugal, o autor passou a ter direito a uma decisão do Tribunal. Tinha direito a apresentar os seus argumentos de facto e direito perante o Tribunal e de, com a máxima liberdade possível e de acordo com as regras processuais, apresentar os seus meios de prova. Tinha, também, direito a conhecer os argumentos de direito e de facto da parte contrária e a impugnar, nos mesmos termos, os seus meios de prova. Num processo equitativo. E, no final deste processo, caso lograsse convencer o Tribunal das suas razões, tinha direito a que fosse proferida uma decisão favorável aos seus legítimos interesses. Nisto se concretizava o seu direito à tutela jurisdicional efectiva, nos termos em que devem ser interpretados os arts. 20º, da CRP e 8º e 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
15. Como resulta do facto provado E, por ofício de 06.01.2004, o Banco de Portugal remeteu ao Procurador da República o processo de contra-ordenação nº 08/02/CO, acompanhado das petições apresentadas pelos diversos arguidos, entre as quais a do autor, o qual deu origem ao processo nº 9/04.5TFLSB. No facto provado W deu-se como assente que em 27.07.2010, neste último processo, foi proferida decisão declarando extinto o procedimento contraordenacional e reproduziu-se a decisão, a qual, resumidamente, refere que os factos ocorreram entre Novembro de 2000 e Julho de 2001, decorreram nada data do despacho mais de oito anos pelo que, considerando o disposto no art. 28º, nº 3, do RGCO, mostram-se prescritas as contra-ordenações objecto da decisão impugnada.
16- Em virtude da prescrição do procedimento verificou-se o seguinte:
- No que respeita à coima, porque a impugnação judicial tinha efeito suspensivo (art. 227º, nº 1, do RGICSF), com a verificação da prescrição extinguiu-se o correspondente direito à sua aplicação;
- No que respeita à sanção acessória, porque a impugnação judicial tinha efeito devolutivo (art. 227º, nº 2, do RGICSF), o autor sofreu integralmente as suas consequências. Deste modo foi aplicada uma sanção ao autor fundada numa decisão impugnada judicialmente mas que não foi objecto decisão judicial que a confirmasse ou revogasse em virtude de ter ocorrido prescrição. Ficou definitivamente privado da possibilidade de provar perante o Tribunal que a decisão administrativa que lhe aplicou uma sanção era ilegal e de obter a correspondente sentença caso fosse esse o entendimento do Tribunal.
17. O art. 22º da CRP determina que o Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus orgãos, funcionário ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.
18. O art. 9º da Lei 67/2007, de 31 de Dezembro, aplicável ao exercício da função jurisdicional por força do art. 12º do mesmo diploma, considera ilícitas as acções ou omissões dos titulares de orgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou dever objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos. Também existe ilicitude quando a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos resulte do funcionamento anormal do serviço.
19. Pode entender-se o mau funcionamento da administração da justiça como um conceito indeterminado que inclui as ações ou omissões processuais, deveres de natureza administrativa ou constitucional, ocorridos no âmbito da administração da justiça, imputáveis ou não ao comportamento concreto de um titular de órgão, funcionário ou agente determinado, que estejam em desacordo com o standard adequado de garantia da tutela jurisdicional efetiva, que se revela na prestação do serviço de justiça em cada momento e em cada ordem jurisdicional e que não estão a coberto do erro judiciário.
20. A existência de má administração da justiça, embora constitua, por norma, actividade ilícita por ser contrária às normas constitucionais, substantivas e processuais que regem o procedimento com vista à administração da justiça, só por si, não é susceptível de gerar responsabilidade civil nos termos dos arts. 22º da CRP e 12º da A Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, que aprovou o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas. Para que tal responsabilidade possa emergir é necessário que, de acordo com a lei substantiva, o art. 483º do CC, se verifiquem os seguintes requisitos: a) a existência de um facto ilícito; b) a existência de culpa do Estado ou de quem, legitimamente, actua em seu nome; c) a existência de danos que o direito considere relevantes; d) a existência de nexo de causalidade entre os danos sofridos e o facto ilícito.
21. Encontra-se provado que, por despacho de 27 de Julho de 2010, o Tribunal declarou verificada a prescrição do procedimento contra-ordenacional e determinou o arquivamento do processo de impugnação judicial apresentado pelo autor. Por força deste despacho, o autor não obteve decisão judicial do Tribunal, ou seja, não foi nem confirmada, nem revogada, a decisão do Banco de Portugal que lhe aplicou sanções - uma delas imediatamente exequível - decisão essa que o autor, oportunamente, havia impugnado judicialmente. Tal sucedeu porque o Tribunal, no prazo fixado por lei, não proferiu decisão transitada em julgado sobre a questão que lhe foi submetida. O que significa que o Estado, através do orgão que em seu nome administra a justiça, o Tribunal, violou o direito do autor à tutela jurisdicional efectiva prevista no art. 20º da CRP. Nisto constituiu o facto ilícito. Nisto constituiu o mau funcionamento da justiça.
22. A prescrição do procedimento contraordenacional foi consequência da falta de cuidado por parte do magistrado judicial e magistrado do ministério público que, no âmbito da tramitação do processo, não promoveram, nem asseguraram, o cumprimento dos prazos processuais de forma a evitar a referida prescrição. É neste facto que se funda a culpa do Estado pelo facto ilícito, consubstanciado na prescrição do procedimento e correspondente violação do direito do autor à tutela jurisdicional efectiva, nos termos do art. art. 10º da Lei 67/2007, de 31 de Dezembro.
23. O dano real directo ou imediato foi a perda / inutilização do seu direito à tutela jurisdicional efectiva (arts. 20º e 268º da CRP), na vertente direito a uma decisão do Tribunal sobre a questão que submeteu à sua apreciação: o direito do autor de apresentar os seus argumentos de facto e direito perante o Tribunal e de, com a máxima liberdade possível e de acordo com as regras processuais, apresentar os seus meios de prova. Tinha, também, direito a conhecer os argumentos de direito e de facto da parte contrária e a impugnar, nos mesmos termos, os seus meios de prova. Num processo equitativo. E, no final deste processo, caso lograsse convencer o Tribunal das suas razões, tinha direito a que fosse proferida, em prazo razoável, uma decisão favorável aos seus legítimos interesses. Este direito foi definitivamente prejudicado pela prescrição.
24. Os danos reais indiretos ou mediatos foram os seguintes:
- O autor foi sujeito à sanção acessória de inibição do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência, ou chefia em quaisquer instituições de crédito ou sociedades financeiras por um período de 6 (seis) anos, que lhe foi integralmente aplicada, sem que existisse uma decisão constitucionalmente legítima, com violação dos arts. 8º e 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem;
- O autor, sem que existisse uma decisão constitucionalmente legítima, foi impedido de exercer a sua profissão - administrador de instituição de crédito - para a qual se preparou ao longo da sua vida, começando em funções menores e, progressivamente, ascendendo às funções mais altas, e privado de auferir os respectivos rendimentos entre 18.11.2003 e 27.07.2010 com violação dos arts. 47º e 59º da CRP.
25. O facto ilícito culposo do Estado, praticado no âmbito da função jurisdicional, foi condição sine qua non dos danos sofridos pelo autor. Se não tivesse ocorrido a prescrição, por incumprimento dos deveres de cuidado na gestão do processo e no cumprimento dos prazos, teria havido uma decisão. Condenatória ou absolutória. Mas uma decisão, com o qual o autor teria sempre de se conformar. Não havendo decisão de mérito porque entretanto o procedimento prescreveu, no que respeita à sanção acessória, cuja aplicação foi consumada, os danos que o autor iria sofrer seriam sempre os indicados nos dois números anteriores das presentes conclusões. Eram danos previsíveis e são consequência directa do facto ilícito culposo.
26. A sentença recorrida não fez correcta aplicação do direito. Limitou-se, erradamente, a declarar que ocorreu facto ilícito em virtude de ter sucedido «uma ultrapassagem ténue do prazo razoável» (sentença recorrida, pág. 19). O que é manifestamente incorreto, pois, se houvesse apenas atraso na decisão, tal significava que o processo não tinha prescrito. Não tinha sido arquivado. Havia ainda possibilidade de o autor, no exercício do seu direito à tutela jurisdicional efectiva, vir a ter uma decisão favorável, caso lograsse convencer o Tribunal das suas razões. Não é a mesma coisa haver atraso na decisão e, pura e simplesmente, não haver decisão. São realidades substancialmente diferentes. As consequências são necessariamente diferentes também, pois são muito mais gravosas no segundo caso.
27. A violação do direito do autor à tutela jurisdicional efectiva, contrariamente ao que é afirmado na sentença recorrida, consumou-se na sua modalidade mais gravosa para o autor e para o Estado de Direito - a destruição do direito do autor a uma decisão judicial. Por facto ilícito culposo praticado no exercício da administração da justiça, ou seja, nas circunstâncias onde é menos expectável que o direito dos cidadãos seja violado. O autor, para além de ficar impossibilitado de obter uma decisão favorável, ainda viu consumada a aplicação de uma sanção sem que existisse decisão constitucionalmente legítima que a sustentasse, com privação de rendimentos. Portanto, consequências muito mais graves do que aquelas que existiriam se houvesse apenas mero atraso na decisão.
28. No que respeita aos danos patrimoniais, a sentença recorrida nada disse de concreto. Limitou-se a uma referência muito vaga e genérica: «... o Autor não logrou provar o nexo de causalidade entre a ilicitude e os danos, ou seja, o Autor não logrou que fora em virtude do atraso na justiça que sofrera os concretos danos peticionados» (sentença recorrida, pág. 22). Com todo o respeito, isto não é fundamentação. Nem de facto, nem de direito. O que se traduz, desde logo, na violação do disposto nos arts. 205º, nº 1, da CRP e 154º do CPC, que expressamente se invoca, o que tem por consequência a nulidade da sentença recorrida por violação dos arts. 608º, nº 2, e 615º, nº 1, b), do CPC.
29. Consequência directa e necessária da sanção ilícita que proibiu o autor de exercer a sua actividade profissional, foi a privação de auferir os respectivos rendimentos, que eram de 8.515,00 euros mensais, a que acrescia subsídio de refeição diário de 5,37 euros (facto provado Z). Com referência ao período de tempo durante o qual a proibição ilícita vigorou, o prejuízo efectivo do autor ascendeu a 728.093,22 euros. Foi este o pedido que o autor formulou na p.i. na parte respeitante aos danos patrimoniais. Este pedido deverá ser julgado procedente. Ao negar este direito ao autor a sentença recorrida violou o disposto no art. 483º do CC.
30. A decisão do Banco de Portugal constituiu uma mancha terrível na sua carreira longa e prestigiada e respeitabilidade profissional. Com a qual o autor não se conformou. Recorreu ao mecanismo processual de impugnação previsto constitucionalmente para se defender. Não só por causa das sanções, mas sim também, e fundamentalmente, para demonstrar perante o Tribunal que não eram verdadeiros os factos que lhe foram imputados. «Destruir» a mancha terrível que incidia sobre a sua carreira - a decisão do Banco de Portugal - e recuperar a sua respeitabilidade profissional. E obter a correspondente decisão judicial transitada em julgado. A prescrição do procedimento constituiu uma tragédia para o autor. Ficou definitivamente impossibilitado de demonstrar a sua inocência e de reabilitar o seu bom nome pessoal e profissional. O que para ele foi motivo de grande tristeza e abatimento (sentença recorrida, facto provado C, pág. 13). O autor sofreu, deste modo, danos que pela sua gravidade e consequências merecem a tutela do direito (art. 496º do CC). O autor, na p.i., pediu a condenação do Estado no pagamento da quantia de 25.000,00 euros. Não se trata de nenhuma fortuna, nem de forma de enriquecimento do autor á custa do lesante. Também não se trata de valor ridículo. Trata-se de um valor equilibrado para a gravidade dos danos não patrimoniais sofridos pelo autor. Razão porque deverá ser este o valor a atribuir ao autor no âmbito dos danos não patrimoniais.
Nestes termos e nos demais de direito deverá o presente recurso ser julgado provado e procedente e, consequentemente, ser proferido Acórdão que revogue a sentença e condene o réu Estado Português no pedido.

Em momento posterior, veio o A. rectificar as suas alegações de recurso requerendo que a conclusão 2 passasse a ter a seguinte redacção: “ Na sentença recorrida o Tribunal proferiu decisão na qual declarou os factos que considerou provados. Não foram considerados provados os factos alegados pelo autor na p.i., nos artigos 21º, 22º, 29º, 31º, 38º, 39º, 47º, 48º, 49º e 50º. Relativamente aos factos não provados, fez-se constar a seguinte decisão na sentença recorrida: «Factos não provados: inexistem, com relevância para a decisão da causa.». Não foi apresentada qualquer fundamentação. Tal decisão violou o disposto nos arts. 5º, 154º, 607º, nºs 3 e 4, e 608º, nº 2, do CPC. A interpretação das referidas normas promovida pelo Tribunal recorrido, no sentido vertido na sentença recorrida, violou claramente o disposto nos arts. 20º, nº 4, e 205º, nº 1, da CRP. Tal circunstância determina a nulidade da douta sentença recorrida, nos termos do art. art. 615º, nº 1, c) e nº 4, do CPC.”

O Recorrido EP nas contra-alegações formulou as seguintes conclusões: “ 1º - O Tribunal indicou as questões que lhe cumpria solucionar, de acordo com o despacho judicial que identificou o objecto do litígio e enunciou o tema da prova.
2º - Especificou os factos, com interesse para a decisão da causa, que considerou provados.
3º - Concluiu pela inexistência de factos não provados com relevância para a decisão da causa.
4º - Para os efeitos a que alude o artigo 607º nº 4 do CPC, para o efeito de fixar os factos materiais da causa, o juiz deve efectuar a análise crítica das provas, extraindo as ilações que possam resultar de presunção legal ou judicial (artigos 349º a 351º do CC) e atendendo a factos instrumentais, a factos que sejam complemento ou concretização de outros que tenham sido alegados e ainda aos factos notórios e aos que sejam de conhecimento oficioso do Tribunal (artigo 5º nº 2 do CPC).
5º - Da leitura da sentença recorrida decorre que foram cumpridos os mencionados requisitos legais, pelo que a mesma não enferma da invocada nulidade prevista no artigo 615º nº 1 alínea c) do CPC.
6º - No que se respeita à alteração da decisão sobre a matéria de facto pretendida pelo Autor (artigo 4º das conclusões do seu recurso), importa referir que o Autor aceitou o despacho judicial que fixou o objecto do litígio e o tema da prova, não tendo apresentado reclamação.
7º - Assim, no caso sub judice, o Tribunal apreciou a responsabilidade extracontratual do Estado pela violação da obrigação de proferir decisão em prazo razoável.
8º - Por outro lado, o Tribunal também ponderou a existência/inexistência de prejuízos sofridos pelo Autor em consequência da prescrição do procedimento contra-ordenacional e de ter sido impedido de exercer a actividade profissional de administrador em instituição de crédito ou em sociedade financeira, no período compreendido entre 18-11-2003 e 27- 07-2010.
9º - Deste modo, não merece acolhimento o entendimento perfilhado pelo recorrente.
10º - No que concerne aos danos patrimoniais peticionados, cabia ao Autor provar o nexo de causalidade entre a ilicitude e os prejuízos.
11º - Todavia, não provou que os alegados danos foram consequência do atraso na justiça.
12º - Relativamente aos danos morais o Tribunal teve por referência o preceituado no artigo 496º nº 4 do Código Civil e no artigo 41º da CEDH.
13º - O valor de €25.000,00 peticionado pelo Autor afigura-se excessivo, tendo em consideração os montantes pecuniários fixados pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, seguida pelos Tribunais portugueses.
14º - É de concluir que não se configura a nulidade invocada pelo Autor, prevista no artigo 615º nº 1 alínea b) do CPC.
15º - Em face do exposto, concluímos no sentido de que o recurso não merece provimento! ”

Colhidos os vistos, vem o processo à conferência.

II – FUNDAMENTAÇÃO
II.1 – OS FACTOS
Na decisão recorrida foi dada por provada a seguinte factualidade, que se mantém:
A. Em 19.02.2003, no âmbito do processo de contra-ordenação n.º 8/02/CO, o Banco de Portugal deduziu acusação contra o Central –….., SA e outros 9 arguidos singulares, entre os quais, figurava A..... (cfr. documento n.º1 junto aos autos com a petição inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
B. Por deliberação do Banco de Portugal, datada de 18.11.2003, A....., foi condenado na coima única de €150.000,00 e na sanção acessória de inibição do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência, ou chefia em quaisquer instituições de crédito ou sociedades financeiras por um período de 6 (seis) anos (cfr. documento junto aos autos em 09.11.2012 pelo Autor e documento junto aos autos em 08.04.2016, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
C. Consta da decisão condenatória, datada de 18.11.2003, que «A decisão de condenação em sanção acessória torna-se imediatamente exequível, só terminando a sua exequibilidade com decisão judicial que definitivamente a revogue» (cfr. documento n.º1 junto aos autos com a petição inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
D. A..... apresentou, nos termos do artigo 59.º do RGCO, requerimento de impugnação judicial da deliberação do Banco de Portugal (cfr. documento junto aos autos em 09.11.2012 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
E. Por ofício datado de 06.01.2004, o Banco de Portugal remeteu ao Procurador da República o processo de contra-ordenação n.º 08/02/CO, acompanhado das petições apresentadas pelos diversos arguidos, incluindo A....., o qual foi distribuído ao 2.º Juízo – 1.ª Secção – do Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa, em 27.01.2004, e deu origem ao processo n.º 9/04.5TFLSB (cfr. documento junto aos autos em 06.05.2016 pelo Autor e certidão junta aos autos em 27.06.2014, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
F. Aberta conclusão no processo n.º 9/04.5TFLSB, em 20.02.2004, foi proferido despacho a admitir os recursos apresentados pelos arguidos, incluindo A....., da decisão da autoridade administrativa que lhes aplicou uma coima no âmbito do processo n.º 8/02/CO e a designar para a realização da audiência de julgamento, as seguintes 8 datas: 20.09.2004, 21.09.2004, 27.09.2004, 28.09.2004, 06.10.2004, 07.10.2004, 18.10.2004 e 19.10.2004 (cfr. documento junto aos autos em 06.05.2016 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
G. Em 10.09.2004, no âmbito do processo n.º 9/04.5TFLSB, A....., entre outros, dirigiu ao juiz titular do aludido processo requerimento, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, e da qual consta designadamente o seguinte (cfr. certidão junta aos autos em 26.04.2016, que aqui se dá por integralmente reproduzida):
«(…)
1.º
Nas alegações de recurso os ora recorremos, por mera cautela, disseram o seguinte:
a) Foi divulgado pela comunicação social que pelos factos constantes do presente processo, o Banco de Portugal teria efectuada participação criminal;
b) Tal não só não consta do processo, como é totalmente desprovido de fundamento, pois violaria o disposto nos artigos 38º, 39º e 40º do RGCO e no artigo 208.º do RGICSF.
c) Nos termos dessas disposições legais, a ter-se verificado essa participação, o Banco de Portugal careceria dc absoluta falta de competência para decidir o presente processo, o que acarretaria a nulidade da decisão que, se argui, somente por mera a cautela e por dever de patrocínio.
2.º
Ao consultar hoje o processo, verificou o signatário que a fls. 3906 (com insistência nas fls. seguintes), se encontra um oficio da 9.º Secção do D1AP solicitando, no âmbito do Inquérito 14342/03.0TDLSB, certidão de todos os depoimentos e interrogatórios efectuados bem como das defesas apresentadas pelos arguidos e respectiva documentação anexa e da decisão do recurso, caso já tenha sido proferida.
3.º
No oficio é feita referência expressa ao processo 8/02/CO, do Banco dc Portugal.
4.º
A solicitação foi deferida, tendo sido enviada a certidão, com excepção da decisão do recurso, por ainda não ter sido proferida.
5.º
A certidão solicitada e a referência expressa ao processo de contra-ordenação que correu os seus termos no Banco de Portogal, permitem concluir que no lnq. 14342/03.0TDLSB se estão a realizar diligências com visto o apurar se os mesmos factos do processo de contra-ordenação podem constituir crime ou simultaneamente crime e contra-ordenação.
6.°
Pelos elementos solicitados e pela certidão enviada, parece também poder concluir-se que no processo se encontrem as primeiras 2401 folhas deste processo.
7.º
Ou seja, que o Banco de Portugal, antes da decisão, enviou o processo às autoridades competentes para o processo criminal por considerar que poderia haver concurso de infrações;
8.º
Quanto a esta matéria diz o artigo 208.º do RGICSF: "Se, pelo mesmo facto, uma pessoa responder simultaneamente a título de crime e a titulo de ilícito de mera ordenação social, seguir-se-á o regime geral, mas instaurar-se-ão processos distintos respectivamente perante o juiz penal e no Banco de Portugal, cabendo a este último a aplicação, se for caso disso, das sanções acessórios previstas no presente diploma";
9.º
Esta disposição especial derroga, em parte, o disposto nos artigos 20.º e 39° do Regime Geral das Contra- Ordenações (RGCO), mas não o disposto nos artigos 38.º e 40.º do mesmo Diploma.
Nos termos daquelas disposições enunciadas, decorre o seguinte:
a) Logo que o Banco dc Portugal se tenha percebido de que poderia verificar-se concurso de crime e de contra-ordenação, deveria enviar o processo ao Ministério Público, o que parece ter acontecido;
b) Nesse caso, a aplicação da coima passou a caber exclusivamente ao juiz competente para o julgamento do crime.
c) Em derrogação da lei geral (artigo 208.º do RGICSF), seriam instaurados dois processos distintos: um de natureza criminal para apurar a responsabilidade criminal e contra-ordenacional (com excepção da aplicação das sanções acessórias previstas no RGICSF) e outro no Banco dc Portugal exclusivamente pura apurar se poderia haver lugar à aplicação das sanções acessórias previstas no RGICSF.
d) Só no caso de o Ministério Público considerar que não haveria lugar para responsabilidade criminal é que o processo seria devolvido uo Banco dc Portugal que passaria então a ter todas as competências de instrução e de decisão.
O processo 8/02/CO do Banco de Portugal não foi instruído e conduzido tendo em vista somente averiguar se os factos eram passíveis da aplicação das sanções acessórias previstas no RGICSF.
12.º
0 processo n.° 8/02/CO do Banco de Portugal foi instruído e conduzido como se o Banco de Portugal continuasse com competência para aplicar (como aplicou) também es coimas previstas no RGICSF.
13.º
Para o que carecia de absoluta falta de competência.
14.º
Assim, a ter acontecido o que anterior mente sc alega, todo o processo seria nulo, incluindo as diligências que se encontram marcadas a partir do próximo dia 20 de Setembro.
15.º
A fim de obviar a que a partir de 20 de Setembro se pratiquem actos completamente inúteis, será conveniente que este Tribunal se cerifique qual o grau de conexão do Inq. 14342/03.0TDLSB com o presente processo e designadamente se o mesmo se iniciou por remessa dos elementos constantes do Processo 8/Q2/CO do Banco dc Portugal.
16.º
Nestes termos, requer que este Tribunal recolha junto da 9.º Secção do DIAP - Inq. 14342/03.OTDLSB - a confirmação ou não do atrás exposto,
17.º
A não ser possível a diligência requerida ou a respooliva resposta antes do próximo dia 20 de Setembro, requerem a suspensão do presente processo e a desmarcação das diligências marcadas a partir de 20 de Setembro, inclusive, a fim de obviar a que sejam praticados actos completamente inúteis.
(…)».
H. Em 17.09.2004, no âmbito do processo n.º 9/04.5TFLSB, tendo-se levantado a questão do concurso de responsabilidade criminal e contra-ordenacional pelos mesmos factos atinentes aos presentes autos, foi proferido despacho pelo juiz titular do processo, com o teor que se dá aqui por integralmente reproduzido, designadamente, para que fosse oficiado o DIAP para informar sobre a existência de inquérito criminal e, em caso afirmativo, se brevemente iria ser proferido despacho final, sendo ainda dado sem efeito as datas designadas para o julgamento (cfr. certidão junta aos autos em 26.04.2016, que aqui se dá por integralmente reproduzida e artigo 4.º da petição inicial aperfeiçoada apresentada em 05.05.2016).
I. Por ofício datado de 08.10.2004, o Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, informou o juiz titular do processo n.º 9/04.5TFLSB de que « (…) corre termos por este Departamento um inquérito relativo a factos atinentes ao processo de que foram extraídas as cópias que nos foram enviadas. O inquérito em causa, com o NUIPC 14.342/03.0TDLSB encontra-se em investigação, não sendo previsível que venha a ser proferido em breve o despacho final.» (cfr. documento junto aos autos em 06.05.2016 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
J. Em 18.01.2005, a procuradora-adjunta do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa informou o juiz titular do processo n.º 9/04.5TFLSB, de que o objecto do inquérito n.º 14.342/03.0TDLSB “tem por base a mesma factualidade” (cfr. documento junto aos autos em 06.05.2016 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
K. Em 10.05.2005, no processo n.º 9/04.5TFLSB, na sequência da conclusão de 06.05.2005, foi proferido despacho, tendo sido determinado que os autos aguardassem a prolação de despacho final no âmbito do processo n.º 14.342/03.0TDLSB “e, concretamente, pela prolação do despacho final para que, então, na posse de todos os elementos, se possa constatar se, da mesma factualidade resultaram indícios da prática de ilícito(s) criminal (ais), caso em que resulta subtraída à entidade administrativa a competência material para a aplicação de sanções principais no âmbito contra-ordenacional” (cfr. documento junto aos autos em 06.05.2016 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
L. Em 20.07.2006, no processo n.º 14.342/03.0TDLSB, foi proferido despacho de encerramento do inquérito e ordenado que fosse extraída certidão desse despacho a ser remetida ao processo n.º 9/04.5TFLSB do 2.º Juízo, 1.ª Secção, do Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa (cfr. documento junto aos autos em 08.04.2016, que se dá aqui por integralmente reproduzido).
M. Em 23.08.2006, o DIAP informou o juiz titular do processo n.º 9/04.5TFLSB que no processo de inquérito n.º 14.342/03.0TDLSB foi proferido, em 20.07.2006, despacho final de arquivamento (cfr. documento junto aos autos em 06.05.2016 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
N. Em 04.10.2006, foi proferido despacho a declarar a cessação da causa impeditiva do desenvolvimento dos termos do processo n.º 9/04.5TFLSB e procedeu-se ao agendamento de várias sessões de julgamento, para as seguintes datas: 17.09.2007, 18.09.2007, 19.09.2007, 24.09.2007, 25.09.2007, 26.09.2007, 01.10.2007, 02.10.2007, 03.10.2007, 15.10.2007, 16.10.2007, 17.10.2007 e 18.10.2007 (cfr. documento junto aos autos em 06.05.2016 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
O. Em 16.10.2007, realizou-se a sessão de continuação da audiência de julgamento do processo n.º 9/04.5TFLSB tendo sido proferido despacho a indeferir a requerida junção de documentos do CBI ao Banco de Portugal, do que o Ministério Público interpôs recurso, em 22.10.2007 (cfr. certidão junta aos autos em 27.06.2014, que se dá aqui por integralmente reproduzida).
P. A audiência de julgamento realizada no processo n.º 9/04.5TFLSB teve início em 17.09.2007 e o seu termo em 02.07.2008 com as alegações orais, sofrendo diversas vicissitudes processuais, designadamente, requerimentos relativos a escusas de determinadas testemunhas em prestar depoimento e a interposição de diversos recursos de despachos de indeferimento de prova (cfr. certidão junta aos autos em 27.06.2014 e acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19.02.2009, que se dá aqui por integralmente reproduzida).
Q. Em 31.07.2008, no âmbito do processo n.º 9/04.5TFLSB, foi proferida sentença a negar provimento ao recurso de impugnação apresentado por A..... e, em consequência, a condená-lo, pela prática, em concurso real efectivo heterogéneo, das seguintes contra-ordenações: desobediência ilegítima a determinações do Banco de Portugal na coima de €17.500,00, falsificação de contabilidade por omissão de garantias prestadas na coima de €10.000,00, falsificação de contabilidade por registos contabilísticos de operações de substância, na coima de €10.000,00, prestação de informações falsas ao Banco de Portugal, na coima de €10.000,00, e na coima única de €55.000,00 e, bem assim, na sanção acessória de inibição do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência ou chefia em quaisquer instituições de crédito, por um período de seis anos (cfr. documento junto aos autos em 09.11.2012 pelo Autor e documento junto aos em 06.05.2016, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
R. Da sentença proferida em 31.07.2008, no âmbito do processo n.º 9/04.5TFLSB, foram interpostos diversos recursos, que foram admitidos em 11.11.2008 (cfr. documento junto aos autos em 06.05.2016 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
S. Em 19.02.2009, no processo n.º 10219/08, o Tribunal da Relação de Lisboa proferiu acórdão, que se dá aqui por integralmente reproduzido, da sentença proferida no processo n.º 9/04.5TFLSB e, bem assim, de despachos interlocutórios, apreciando, em primeiro lugar, os recursos intercalares, designadamente o recurso do Ministério Público do despacho proferido no decurso da sessão de 16.10.2007 da audiência de julgamento que indeferiu a requerida junção de reportes do CBI ao Banco de Portugal (por considerar que com o provimento desse recurso fica prejudicado o conhecimento de todas as demais questões suscitadas, incluindo as atinentes ao mérito da causa, ou seja, o recurso da decisão final), e decidindo revogar o referido despacho e ordenando que o mesmo fosse substituído por outro que admitisse a requerida junção aos autos dos reportes do Banco arguido e, em consequência, anulando o acórdão final proferido, e determinando o reenvio do processo para novo julgamento (cfr. documento junto aos autos em 09.11.2012 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
T. Em 03.04.2009, no âmbito do processo n.º 9/04.5TFLSB, o juiz de direito proferiu despacho nos termos do qual tomou conhecimento do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa e declarou-se impedido, tendo ordenado a remessa dos autos à distribuição (cfr. documento junto aos autos em 06.05.2016 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
U. Em 14.04.2009, ocorreu a redistribuição do processo n.º 9/04.5TFLSB do 2.º Juízo, 1.ª Secção, para o 1.º Juízo, 3.ª Secção (cfr. certidão junta aos autos em 27.06.2014, que se dá aqui por integralmente reproduzida).
V. Em 09.06.2010, no âmbito do processo n.º 9/04.5TFLSB, o arguido J....., veio solicitar a declaração da prescrição do processo de contra-ordenação e o arquivamento dos autos (cfr. certidão junta aos autos em 27.04.2016, que se dá aqui por integralmente reproduzida).
W. Em 27.07.2010, no âmbito do processo n.º 9/04.5TFLSB, foi proferida decisão declarando extinto o procedimento contra-ordenacional nos presentes autos, que se dá aqui por integralmente reproduzida e do qual consta o seguinte (cfr. documento junto aos autos em 09.11.2012 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida):
«(…) Na decisão administrativa da entidade supervisora imputa-se a prática de quatro contra- ordenações, as quais se reportam a factos/operações que terão tido lugar entre os anos de 2000 e 2001 (Novembro de 2000 a Julho de 2001).
As contra-ordenações imputadas aos recorrentes encontram-se previstas no art. 211.º do RGICSF, als. o), g) e r).
Atenta a moldura abstractamente aplicável a tais ilícitos contra-ordenacionais, o prazo de prescrição do procedimento contra-ordenacional é de 5 (cinco) anos (conforme o disposto no art. 27.º, al. a), do RGCO) e conta-se a partir da prática da infracção.
A suspensão do prazo prescricional ocorrida no processo por força da notificação do despacho que procedeu ao exame preliminar do recurso, não pode ser superior a 6 meses – art. 27.º-A, n.º1, al. c), e n.º 2, do RGCO.
Mesmo considerando os factos interruptivos e suspensivos da prescrição, esta ocorrerá sempre que, desde a data da prática do facto e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo de prescrição acrescido de metade, nos termos do art. 28.º, n.º3, do RGCO.
Vale isto por dizer que a prescrição em casos como o presente, ocorrerá sempre que sobre a data dos factos decorram 8 (oito) anos (prazo de prescrição de 5 anos + metade, 2 anos e 6 meses + prazo de suspensão, 6 meses);
- Já decorreram mais de 8 (oito) anos sobre os factos que constituem o objecto deste recurso de impugnação judicial.
A procedência desta questão prévia prejudica a apreciação das restantes questões suscitadas pelos recorrentes no(s) seu(s) requerimento(s) de recurso.
Estão, pois, prescritas as contra-ordenações objecto da decisão impugnada. (…)».
X. A..... exerceu funções como vogal do Conselho de Administração do Central –….., SA nos mandatos de 1996/1999 e 2000/2003; vogal do Conselho de Administração da Central ….– Sociedade Gestora de……, SA nos mandatos de 1994/1996 e 1997/1999; vogal do Conselho de Administração da Central Investimentos –….., SA, nos mandatos de 1996/1998, 1999/2001 e 2002/2004; vogal do Conselho de Administração da Central Investimentos – Sociedade….., SA [ex-…. & …– Sociedade ….(D….), SA] nos mandatos de 1998/1991, 1992/1994 e 1993/1995; e vogal do Conselho de Administração da N…. D… – Sociedade ……, SA, no mandato de 2002/2003 (cfr. certidão emitida pelo Banco de Portugal e junta aos autos em 23.04.2014, que se dá aqui por integralmente reproduzida).
Y. A....., contribuinte n.º 137.2….., enquanto director-geral do Central….., SA auferia, em 26.07.2004, o vencimento mensal de €8.515,00, à qual acrescia subsídio de refeição diário de €5,37 (cfr. documento junto aos autos em 09.11.2012 pelo Autor, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
Z. No ano de 2003, A..... auferiu o valor de €135.568,42, de rendimento de trabalho dependente, bruto, e o valor de €31.079,30, relativo a pensões (cfr. declaração de IRS junta aos autos com a contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
AA. No ano de 2004, A..... auferiu o valor bruto de €103.444.97, de rendimento de trabalho dependente, e o valor de €31.919.40, relativo a pensões (cfr. declaração de IRS junta aos autos com a contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
BB. No ano de 2005, A..... auferiu o valor bruto de €47.504,50, de rendimento de trabalho dependente, e o valor de €32.718,00, relativo a pensões (cfr. declaração de IRS junta aos autos com a contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
CC. No ano de 2006, A..... auferiu o valor bruto de €48.351,24, de rendimento de trabalho dependente, e o valor de €33.535,88, relativo a pensões (cfr. declaração de IRS junta aos autos com a contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
DD. No ano de 2007, A..... auferiu o valor bruto de €49.076,44, de rendimento de trabalho dependente, e o valor de €34.455,40, relativo a pensões (cfr. declaração de IRS junta aos autos com a contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
EE.No ano de 2008, A..... auferiu o valor bruto de €50.107,12, de rendimento de trabalho dependente, e o valor de €35.351,40, relativo a pensões (cfr. declaração de IRS junta aos autos com a contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
FF. No ano de 2009, A..... auferiu o valor bruto de €51.560,18, de rendimento de trabalho dependente, e o valor de €35.881,86, relativo a pensões (cfr. declaração de IRS junta aos autos com a contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
GG. No ano de 2010, A..... auferiu o valor bruto de €51.560,18, de rendimento de trabalho dependente, e o valor de €36.240,40, relativo a pensões (cfr. declaração de IRS junta aos autos com a contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzida).
*
A. Ao longo da sua vida profissional, A..... sempre foi considerado um profissional competente, rigoroso e cumpridor e era pessoa conhecida e estimada no sector bancário e financeiro, pelas suas capacidades profissionais (cfr. depoimento das testemunhas C…. e L….).
B. No ano de 2003, então com 59 anos de idade, A..... estava no auge das suas capacidades profissionais, sendo também docente há mais de 30 anos no Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa (ISCAL) (cfr. depoimento das testemunhas C…., L….. e R….).
C. Constituiu motivo de tristeza e abatimento para A..... o facto de, em virtude da prescrição do procedimento contra-ordenacional e de não poder obter uma judicial de absolvição, ter ficado impossibilitado de demonstrar a sua inocência e reabilitar o seu bom nome pessoal e profissional (cfr. depoimento das testemunhas R…..).
D. Em virtude da decisão do Banco de Portugal, o A..... ficou inibido do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência ou chefia em instituições de crédito, sociedades de corretagem e sociedades gestoras de fundos pelo período seis anos, o que se prolongou até 27.07.2010, data em que foi declarado extinto por prescrição o procedimento contra-ordenacional, uma vez que enquanto o processo esteve pendente, o Banco de Portugal, de acordo com a prática normal, não admitiria o registo como membro de órgão de administração, membro do Conselho Fiscal ou outro, e em sociedade que desenvolvesse actividade no sector bancário ou financeiro (cfr. depoimento das testemunhas A…..).
*

E. Em 08.11.2012, foi registada a entrada, via SITAF, de petição inicial que originou os presentes autos (cfr. fls. dos autos, que se dão aqui por integralmente reproduzidas).

II.2 - O DIREITO
As questões a decidir neste processo, tal como vêm delimitadas pelas alegações e contra-alegações de recurso e respectivas conclusões, são:
- aferir da nulidade da sentença e da violação dos art.ºs 5.º, 154.º, 607.º, n.ºs 3 e 4, 608.º, n.º 2, do CPC, 20.º, n.º 4 e 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP), por omissão de fundamentação naquela decisão relativamente aos factos que se considerou não provados;
- aferir da nulidade da sentença e da violação dos art.ºs 154.º, 205.º, n.º 1, 608.º, n.º 2, 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, por omissão de pronúncia, por a decisão recorrida ter omitido a fundamentação relativamente ao pressuposto do nexo de causalidade, quanto aos danos patrimoniais;
- aferir do erro decisório, por não terem sido dados por provados os factos alegados na PI nos art.ºs 21.º, 22.º, 29.º, 31.º, 38.º, 39.º, 47.º, 48.º, 49.º e 50.º ;
- aferir do erro decisório na fixação da indemnização por danos não patrimoniais por um valor inferior a €25.000,00 e do erro no julgamento da improcedência do pedido indemnizatório por danos patrimoniais, assim como, da violação dos direitos a uma decisão jurisdicional em prazo razoável e à tutela jurisdicional efectiva, porque com a impugnação judicial da decisão do Banco Portugal (BP), o A. e Recorrente passou a ter direito a que fosse proferida uma decisão favorável aos seus legítimos interesses e com a delonga do processo de contra-ordenação acabou por ficar privado de tal decisão e, consequentemente, ficou privado de ser ressarcido pelo BP, por uma actuação ilícita e culposa. Alega o Recorrente que a delonga na administração da justiça foi consequência directa da falta de cuidado por parte dos magistrados, judicial e do Ministério Público (MP), que deixaram passar os prazos legais e assim possibilitaram a declaração de prescrição do procedimento contra-ordenacional. Defende o Recorrente, que a declaração de prescrição o impediu de alcançar uma decisão quanto ao mérito do processo contra-ordenacional, que o condenasse ou absolvesse relativamente à sanção acessória que lhe foi aplicada pelo BP. Diz o Recorrente, que a inexistência da referida decisão de mérito implicou danos reais, indirectos e mediatos, por ter sido sujeito a uma sanção acessória de inibição do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência ou chefia em quaisquer instituições de crédito ou sociedades financeiras, por um período de 6 meses, que o impediu de exercer a sua actividade e o privou de auferir os respectivos rendimentos. Logo, alega o Recorrente, que por via do atraso na administração da justiça teve um dano de €728.093,22, correspondente à privação de rendimentos mensais de €8.515,00, acrescidos do subsidio de refeição no valor diário de €5,37, durante o tempo em que a proibição ilícita do BP vigorou. Alega ainda o A., que por via do atraso na administração da justiça, que culminou com a declaração de prescrição, não pôde demonstrar a ilegalidade da conduta do BP, recuperar a sua respeitabilidade profissional, reabilitar o seu bom nome pessoal e profissional e passou a ter danos decorrentes da mancha e desprestigio profissional que constituiu a decisão do BP, o que também lhe trouxe grande tristeza e abatimento.

Vem o Recorrente invocar a nulidade da sentença e a violação dos art.ºs 5.º, 154.º, 607.º, n.ºs 3 e 4, 608.º, n.º 2, do CPC, 20.º, n.º 4 e 205, n.º 1, da CRP, por omissão de fundamentação naquela decisão relativamente aos factos que se considerou não provados.
Por imposição do art.º 205.º, n.º 1, da CRP, as decisões judiciais têm de ser fundamentadas.
Visa-se com a fundamentação da decisão judicial exteriorizar o raciocínio decisório e as correspondentes razões - factuais e legais - que estão na base daquele raciocínio, para que as partes possam compreender a motivação da decisão proferida e sindicar a sua correcção, caso assim entendam. Visa a fundamentação, ainda, permitir o controlo decisório em caso de recurso.
Determina o art.º 668.º, n.º 1, do (antigo) CPC (aplicável à data), que “1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.
f) Seja omissa no que respeita à fixação da responsabilidade por custas, nos termos do n.º 4 do artigo 659.”
Nos termos dos art.ºs 94.º, n.ºs 2, 3, 95.º, n.º 1, do CPTA, 158.º, 659.º, n.ºs 1 a 3 e 660º, n.º 2, do (antigo) CPC, na sentença, o juiz deve pronunciar-se sobre todas as questões que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras. Deve o juiz apreciar as questões respeitantes ao pedido e à causa de pedir, e ainda, os argumentos, as razões ou os fundamentos invocados pelas partes para sustentarem a sua causa de pedir. O juiz terá, igualmente, que discriminar os factos que considera provados e em que faz assentar o seu raciocínio decisório e deve indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas que conduzem à decisão final.
Não obstante, não tem o juiz que rebater e esmiuçar todos os argumentos e alegações avançados pelas partes, bastando-lhe, para cumprimento do dever de fundamentação, pronunciar-se sobre as concretas questões em litígio, demonstrando que as ponderou. Da mesma forma, tem o juiz que especificar todos os factos alegados e que têm relevo para a decisão, mas não tem que discriminar ou considerar os restantes factos invocados pelas partes, que não tenham relevância na decisão a tomar.
Por seu turno, só o incumprimento absoluto do dever de fundamentação conduz à nulidade decisória. Nestes termos, determina o art.º 668.º, n.º 1, al. b), do (antigo) CPC, que é nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto e de Direito que justificam a decisão. Igualmente, o art.º 668.º, n.º 1, al. d), do (antigo) CPC, comina com a nulidade, a sentença que omita pronúncias que sejam devidas, ou para os casos em que o juiz conheça para além das questões de que podia tomar conhecimento.
Ou seja, só ocorre nulidade da decisão por falta de fundamentação se existir uma violação grave desse dever, quer porque na sentença se omita, de todo, o quadro factual em que era suposto assentar, ou este seja ininteligível; quer porque a sentença padeça, em absoluto, de falta de fundamentação de Direito, por não revelar qualquer enquadramento jurídico, ainda que implícito, de forma a deixar, no mínimo, decifráveis os fundamentos da decisão.
A decisão recorrida não se alongou na indicação e fundamentação dos factos que considerou não provados, referindo em ponto autónomo que estes inexistiam. Porém, aquela mesma decisão ostenta uma fundamentação bastante quanto à factualidade que considerou provada. Na referida decisão também se motiva com um mínimo de pormenor o julgamento de facto. Aí diz-se, ainda, que a factualidade provada foi a considerada relevante para a decisão a tomar.
Por conseguinte, apreciada a decisão recorrida é manifesto que a mesma ostenta uma fundamentação suficiente, porquanto se específica os fundamentos de facto e de Direito que estão na base da decisão recorrida e se decide em sua consonância.
Porque não se considerou de relevo para a decisão de Direito outros factos que tenham sido alegados pelas partes, apenas se indicou os factos que ficaram provados e julgou-se inexistirem factos com relevo por provar.
A decisão recorrida está, pois, plenamente fundamentada.
O Recorrente pode discordar da fundamentação adoptada na decisão recorrida quanto ao julgamento da matéria de facto, mas aquela fundamentação – ou a sua alegada falta - não é reconduzível a uma nulidade da decisão.
Falece, assim, a invocada nulidade decisória.

Vem o Recorrente invocar a nulidade da sentença e a violação dos art.ºs 154.º, 205.º, n.º 1, 608.º, n.º 2, 615.º, n.º 1, al. b) do CPC, por omissão de pronúncia, por a decisão recorrida ter omitido a fundamentação relativamente ao pressuposto do nexo de causalidade, quanto aos danos patrimoniais.
Também aqui é manifesta a falta de fundamento na alegação do Recorrente.
A decisão recorrida ostenta uma fundamentação de Direito bastante vasta, tendo-se pronunciado sobre todas as questões trazidas à lide.
Porque entendeu que os danos reclamados pelo A. e Recorrente não advinham do ilícito verificado – o atraso na administração da justiça – o Tribunal fez claudicar o seu pedido, nesta parte, por considerar inexistir nexo de causalidade entre o ilícito e os danos reclamados.
Explicou o Tribunal, na decisão recorrida, de forma escorreita e com uma fundamentação completa, o seu raciocínio. A simples leitura atenta da decisão permitiria ao Recorrente entender as razões aduzidas pelo Tribunal e compreender o correspondente raciocínio, com o qual podia, apenas, não concordar.
O Recorrente pode discordar da fundamentação adoptada na decisão recorrida, mas a mesma não é reconduzível a uma nulidade da decisão. Evidência de que não existe nulidade alguma na decisão recorrida, pelo que a sua invocação é manifestamente improcedente e impertinente, é o próprio Recorrente arguir a nulidade, e em simultâneo, pelas mesmas razões, o erro na decisão recorrida. Esta invocação simultânea é sinal claro de que o próprio Recorrente reconhece que a decisão não encerrava nulidade alguma, tendo-a arguido desprovido das razões que legalmente fundam a invocação da nulidade decisória.
Por conseguinte, falece manifestamente a invocada nulidade da decisão.

Vem o Recorrente invocar um erro decisório, por não terem sido dados por provados os factos alegados na PI nos art.ºs 21.º, 22.º, 29.º, 31.º, 38.º, 39.º, 47.º, 48.º, 49.º e 50.º.
Os art.ºs. 684º-A, n.º 2 e 685º-B do antigo CPC (tal como os actuais art.ºs 636º, n.º 2, 640º e 662º do novo CPC), impõem à parte recorrente, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, o ónus de especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
Por seu turno, os art.ºs 685.º-B e 712.º do CPC, ex vi art.º 1.º do CPTA (equivalentes aos art.ºs 640.º e 662.º do novo CPC), permitem a reapreciação e a modificabilidade da decisão de facto proferida pelo tribunal de 1.ª instância apenas nas situações em que o Tribunal recorrido apresente um julgamento errado, porque fixou factos de forma contrária às regras da prova, ou os fixou de forma inexacta, ou porque os valorou erroneamente.
Aqui vale o princípio da livre apreciação da prova, remetendo-se para uma íntima convicção do julgador, formada no confronto dos vários meios de prova, que uma vez exteriorizada através de uma fundamentação coerente, razoável, plausível, que obedeça às regras da lógica, da ciência e da experiência comum, torna-se uma convicção inatacável, salvo para os casos em que a prova deva ser feita através de certos meios de prova, que apresentem uma determinada força probatória.
Nestes termos, a impugnação da matéria de facto e a modificabilidade da mesma pelo Tribunal superior não visa alterar a decisão de facto fundada na prova documental ou testemunhal, apenas porque a mesma é susceptível de produzir convicções diferentes, podendo ser diversa a tomada no tribunal superior daquela que teve o tribunal da 1.ª instância. Diferentemente, este tribunal superior só pode alterar a matéria de facto porque as provas produzidas na 1.ª instância impunham, decisiva e forçosamente, outra decisão diversa da aí tomada (cf. art.º 662.º do CPC).
Portanto, para a modificação da matéria de facto é necessário que haja uma dada matéria de facto que foi identificada e apreciada pelo tribunal de 1.ª instância e que este tenha exteriorizado a sua convicção na fixação da matéria provada e não provada. Só depois, se face às provas produzidas e para as quais o Recorrente remete, se impuser forçosamente decisão diversa da tomada pela 1.ª instância, há que alterar aquela. Mas terá que se tratar de uma prova firme, indiscutível ou irrefutável, que necessariamente abala a convicção que o tribunal de 1.ª instância retirou da prova produzida.
Diz o Recorrente, que para além do que ficou provado no facto X, deveria ter ficado provado o alegado nos art.ºs. 21.º e 22.º da PI, designadamente que a carreira do A. se iniciou em 1958 no antigo Banco ….&…., onde o autor exerceu diversos cargos de Direcção. Diz o Recorrente, que este facto está provado através do documento junto a fls. 1472 a 1474 dos autos - declaração emitida pelo banco….., SA, datada de 23-02-2018, na qual se refere que o autor foi colaborador do ex-Banco ….& …., empresa do actual Grupo….., entre 01-08-1958 e 01-01-1989, tendo exercido os cargos de Subdirector e Director Adjunto dos Serviços Administrativos, Director Adjunto e Director da Direcção de Depto Organização e Director Coordenador da Direcção Administrativa (filial e nacional) e Direcção Financeira.
Como a seguir indicaremos, os factos que o ora Recorrente diz estarem em falta na decisão recorrida, não apresentam nenhum relevo têm para a apreciação da causa. Logo, não ocorre um erro decisório ao não se dar estes factos como provados.
Não obstante, acrescente-se, que os factos alegados pelo A. nos art.ºs 21.º e 22.º da PI não foram admitidos pelo R. no art.º 8.º da contestação, sendo que da prova invocada pelo Recorrente também não resulta indiscutível ou incontroverso o que se quer dar por assente.
Quanto ao doc. de fls. 1472 a 1424 dos autos SITAF, é uma mera cópia de um documento particular, designadamente de uma declaração do B…., pelo que tal documento não apresenta especial força probatória. Por seu turno, o testemunho invocado também não se mostra suficiente para que se deva dar por provado – por ser totalmente incontroverso face àquelas provas – que o A. e Recorrente foi colaborador do ex-Banco ….& …. entre 01-08-1958 e 01-01-1989 e que naquele período exerceu os cargos de Subdirector e Director Adjunto dos Serviços Administrativos, Director Adjunto e Director da Direcção de Depto Organização e Director Coordenador da Direcção Administrativa (filial e nacional) e Direcção Financeira.

O mesmo se diga com relação aos factos alegados nos art.ºs 29.º e 31.º da PI. Também estes factos irrelevam na decisão a tomar, pelo que a decisão recorrida não errou quando os não deu por provados.
Acresce, que o alegado nos art.ºs 29.º e 30.º da PI não foi admitido pelo R. no art.º 8.º da contestação.
Por seu turno, dos invocados depoimentos não resulta incontroverso e irrefutável que “o autor tinha condições pessoais e profissionais para durante vários anos exercer funções de Administração em instituições de crédito, sociedades financeiras de corretagem e sociedades gestoras de fundos de investimento, face aos conhecimentos técnicos e experiência adquirida ao longo da sua vida de trabalho” e que “ao ficar inibido pelo Banco de Portugal do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência ou chefia em instituições de crédito, sociedades de corretagem e sociedades gestoras de fundos de investimento pelo período de seis anos, o autor foi impedido de exercer a actividade profissional de administrador para a qual tinha vocação, interesse, preparação, aptidão e experiência.”
Mais se indique, que na decisão recorrida ficaram vertidos os factos A e B (na segunda repetição destas letras), que espelham os depoimentos ouvidos.

Quanto ao alegado facto 38.º, constante da PI, encerra em si mesmo uma conclusão ou um juízo de valor relativo à consequência do impedimento e à lesão patrimonial do A., conteúdo que nunca poderia ser levado à factualidade provada. Isto é, a afirmação da existência de uma lesão patrimonial – que é uma afirmação conclusiva e um conceito de Direito – e a conclusão dessa lesão como uma consequência – fáctica e jurídica – face ao impedimento determinado pelo BP, são afirmações que extravasam a pura factualidade ou a realidade existente. Logo, são afirmações que não poderiam figurar no elenco de factos provados.
Depurada a alegação conclusiva e de Direito do art.º 38.º da PI, constata-se, que o A. aí pretenderia afirmar um facto negativo, designadamente que após a inibição determinada pelo BP deixou de auferir de 01-08-2004 a 27-07-2010 um valor total de €728.093,22 euros, que de 01-08-2004 a 31-12-2009 deixou de auferir, durante 11 meses de cada ano, €8.633,14 e durante 3 meses de cada ano, €8.515,00, correspondentes a férias e subsídios de férias e Natal, num total anual de €120.509,54, que multiplicado por 5 anos e 5 meses daria a quantia total de €652.760,00 (120.509,54 x 5 + 120.509,54 x 5/12) e que de 01-01-2010 a 31-07-2010 deixou de auferir €8.633, durante 7 meses e €8.515,00 durante 3 meses, correspondente a 7/12 de férias e dos subsídios de férias e de Natal, num total de €75.333,22.
Ora, é manifesto que este facto negativo não resulta provado de forma indiscutível com base no testemunho invocado.
Quanto ao facto alegado na PI no art.º 39.º, também não resulta plenamente provado face ao depoimento indicado.
Acresce, que no que concerne aos rendimentos laborais auferidos pelo A. até então, foram dados por provados na decisão recorrida em Y a GG. Muito correctamente, a prova de tais factos assentou em prova documental, designadamente nas declarações de rendimentos entregues para efeitos fiscais.
No demais, com a seguir verificaremos, os factos que se dizem omissos irrelevam na decisão a tomar, pelo que também não ocorre erro algum na decisão recorrida por não ter dado tais factos por provados.

Vem o Recorrente invocar um erro decisório por não se terem dado por provados os factos alegados nos art.ºs 47.º, 48.º, 49.º e 50.º.
O alegado nos art.ºs. 47.º e 48.º da PI é, novamente, reconduzível a alegações conclusivas e a apreciações de Direito. Saber se a prescrição do procedimento contra-ordenacional foi a razão jurídica que obrigou ao arquivamento dos autos é uma apreciação que encerra juízos conclusivos e apreciações de Direito, não uma pura alegação fáctica. Concluir pela existência de uma condenação ou de uma absolvição – que são conceitos jurídicos – como consequência jurídica e fáctica de um arquivamento dos autos – que é um novo conceito jurídico – é uma alegação que encerra juízos de valor, conceitos de Direito e conclusões.
Igualmente, o alegado no art.º 50.º é uma conclusão e um juízo subjectivo do A. e não uma factualidade pura.
Assim, o alegado nos citados artigos da PI foi reconfigurado, e bem, em mera factualidade na alínea W) da decisão recorrida.
Igualmente, o alegado no art.º 50.º da PI é uma conclusão e não uma realidade puramente fáctica. A factualidade que cumpria ao A. arguir era a indicação precisa da tramitação ocorrida, do teor de cada acto e correspondente data.
Essa factualidade foi vertida na decisão recorrida de A a W., assim se depurando as alegações conclusivas e as apreciações de Direito feitas na alegação da PI.
Em suma, as alegações constantes dos art.ºs 47.º, 48.º, 49.º e 50.º da PI não são reconduzíveis a uma matéria puramente factual, mas configuram alegações de Direito, juízos de valor, conclusivos ou apreciações subjectivas que não cumpriam figurar no elenco dos factos provados.
Improcede, pois, o erro no julgamento da matéria de facto.

Vem o Recorrente invocar um erro decisório na fixação da indemnização por danos não patrimoniais por um valor inferior a €25.000,00 e do erro no julgamento da improcedência do pedido indemnizatório por danos patrimoniais, assim como, da violação dos direitos a uma decisão jurisdicional em prazo razoável e à tutela jurisdicional efectiva, porque com a impugnação judicial da decisão do Banco Portugal (BP), o A. e Recorrente passou a ter direito a que fosse proferida uma decisão favorável aos seus legítimos interesses e com a delonga do processo de contra-ordenação acabou por ficar privado de tal decisão e, consequentemente, ficou privado de ser ressarcido pelo BP, por uma actuação ilícita e culposa. Alega o Recorrente que a delonga na administração da justiça foi consequência directa da falta de cuidado por parte dos magistrados, judicial e do Ministério Público (MP), que deixaram passar os prazos legais e assim possibilitaram a declaração de prescrição do procedimento contra-ordenacional. Defende o Recorrente, que a declaração de prescrição o impediu de alcançar uma decisão quanto ao mérito do processo contra-ordenacional, que o condenasse ou absolvesse relativamente à sanção acessória que lhe foi aplicada pelo BP. Diz o Recorrente, que a inexistência da referida decisão de mérito implicou danos reais, indirectos e mediatos, por ter sido sujeito a uma sanção acessória de inibição do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência ou chefia em quaisquer instituições de crédito ou sociedades financeiras, por um período de 6 meses, que o impediu de exercer a sua actividade e o privou de auferir os respectivos rendimentos. Logo, alega o Recorrente, que por via do atraso na administração da justiça teve um dano de €728.093,22, correspondente à privação de rendimentos mensais de €8.515,00, acrescidos do subsidio de refeição no valor diário de €5,37, durante o tempo em que a proibição ilícita do BP vigorou. Alega ainda o A., que por via do atraso na administração da justiça, que culminou com a declaração de prescrição, não pôde demonstrar a ilegalidade da conduta do BP, recuperar a sua respeitabilidade profissional, reabilitar o seu bom nome pessoal e profissional e passou a ter danos decorrentes da mancha e desprestigio profissional que constituiu a decisão do BP, o que também lhe trouxe grande tristeza e abatimento.

De referir, antes de mais, que na decisão recorrida se explicitou, e bem, que na presente acção apenas cumpria averiguar da responsabilidade do EP por atraso na administração da justiça, não de algum erro judiciário.
Na verdade, frente à PI e às alegações de recurso, o A. e Recorrente parece confundir estes dois fundamentos da responsabilidade do EP, porquanto, para além da responsabilidade fundada no atraso na administração da justiça, vem advogar que a norma do art.º 227.º, n.º 2, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 292/92, de 31-12, é inconstitucional, por violar o art.ºs 2.º, 20.º, n.º4 e 47.º da CRP e permitir ao BP, que é uma entidade administrativa e não um Tribunal, a aplicação imediata de uma sanção acessória de inibição da actividade, assim lesando o direito ao processo sancionatório equitativo, à tutela jurisdicional efectiva, ou ao direito do lesado a ser indemnizado por uma decisão ilegal do BP. Aparentemente, o A. e Recorrente vem apontar ao juiz que proferiu a decisão no processo contra-ordenacional um erro decisório, por não ter apreciado daquela inconstitucionalidade.
Como se afirma na decisão recorrida, para a apreciação de um alegado erro judiciário os tribunais administrativos serão materialmente incompetentes, por estar excluída aquela apreciação do âmbito da jurisdição dos tribunais administrativos - cf. art.º. 212.º, n.º 3, da CRP, 1.º, 4.º, n.ºs 1, 2 e n.º 4, al. a), do ETAF.

Na decisão recorrida assinala-se, também, que frente à causa de pedir e ao pedido formulado na PI, se entende que nos presentes autos está em causa apenas um pedido de indemnização contra o EP por atraso na administração da justiça e não um pedido indemnizatório por um ilícito praticado pelo BP, desde logo porque o BP nem sequer é demandado na acção.
Corroboramos esta referência. Não obstante as alegações do Recorrente relativas ao erro decisório por o BP ter tido uma conduta ilegal, a verdade é que a conduta do BP não é o objecto desta acção. A presente acção não vem proposta contra o BP, nem é configurada como correspondendo a um pedido de indemnização por responsabilidade civil por facto ilícito praticado pelo BP. Aqui apenas se visa apreciar da responsabilidade civil do EP por ter ocorrido uma demora na administração da justiça.
Como a seguir indicamos, o claudicar do pressuposto nexo de causalidade prende-se directamente com esta confusão em que parece laborar o A. e Recorrente. Isto é, a conduta do BP, se ilícita, poderia dar lugar à responsabilidade civil desta entidade e ao dever de indemnizar pelos danos que daí tivessem resultado para o A. e Recorrente. Quanto ao apuramento de qualquer ilícito praticado pelo BP, poderia ser feito em sede da correspondente acção, que haveria ter sido interposta pelo A. e Recorrente. Já na presente acção, não há que apreciar da ilegalidade e da ilicitude da conduta do BP, mas há apenas que averiguar da ilicitude da actuação dos órgãos que administram a justiça, por terem demorado um tempo desrazoável para apreciarem o processo contra-ordenacional em que o A. e Recorrente foi arguido.

O direito a uma decisão judicial em prazo razoável foi consagrado no art.º 20.º, n.º 4, da CRP, na versão introduzida pela Lei Constitucional n.º 1/97, de 20-09.
Esse mesmo direito está também consagrado nos art.ºs. 6.ºe 13.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), de 04-11-1950 (aprovada para ratificação pela Lei n.º 65/78, de 13-10, com depósito em 09-11-1978 e desde essa data aplicável na ordem jurídica interna – cf. aviso no DR, 1.ª Série, n.º 1/79, de 21-01-1979) e tem igualmente protecção nos art.ºs 8.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10-12-1948 (publicada no DR de 09-03-1978) e 14.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (aprovado para ratificação pela Lei n.º 29/78, de 12-06, com depósito em 15-06-1978 e desde essa data aplicável na ordem jurídica interna – cf. aviso no DR, 1.ª Série, n.º 187/78, de 16-08-1978).
Por seu turno, o art.º 22.º da CRP consagrava desde a revisão de 1982 (Lei-Constitucional n.º 1/82, de 30-09-1982) um princípio geral da responsabilidade civil do Estado e demais pessoas colectivas públicas.
Naquela data inicial, estava em vigor o Decreto-Lei n.º 48051, de Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967, que não consagrava em termos expressos a responsabilidade do Estado pelo funcionamento defeituoso do serviço público de justiça e designadamente pela delonga anormal na administração da justiça.
Assim, a doutrina e a jurisprudência largamente maioritárias passaram a considerar que o artigo 22.º da CRP determinava um princípio geral de responsabilidade civil do Estado por danos causados no exercício das suas funções – política, legislativa, jurisdicional ou administrativa – e que era uma norma directa e imediatamente aplicável, servindo, por isso, de fundamento para a interposição de uma acção de responsabilidade civil extracontratual do Estado por facto ilícito e culposo (cf. neste sentido, o Ac. do STA, n.º 26535, de 07-03-1989, que deu o mote à alteração jurisprudencial nesta matéria, ou mais recentemente fazendo a referência à anterior jurisprudência o Ac. do STJ n.º 368/09.3YFLSB, de 08-09-2009. Vide também, entre outros, os Acs. do, do STA n.º 0533/09, de 19-11-2009 ou n.º 0122/10, de 05-05-2010 ou n.º 0144/13, de 27-11-2013. Na doutrina, vide, entre outros Jorge Miranda - Manual de Direito Constitucional. Tomo IV. 3.ª ed., Coimbra: Coimbra Editora, 2000, pp. 294-299; do mesmo autor, “A Constituição e a Responsabilidade Civil do Estado” - Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Rogério Soares, Coimbra, 2001, pp. 927-934; JJ Gomes Canotilho - Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4º ed. Coimbra: Livraria Almedina, 2000, p. 496; Gomes Canotilho e Vital Moreira - Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. l, 3ª ed., Coimbra; Coimbra Editora, 1993, pp. 168-169; Fausto Quadros - “Omissões legislativas sobre direitos fundamentais”. Nos Dez Anos da Constituição, Lisboa INCM, 1987, pp. 60- 61; Rui Medeiros - A Decisão de Inconstitucionalidade, Os Autores, o Conteúdo e os Efeitos da Decisão de Inconstitucionalidade da Lei. Lisboa: Universidade Católica Editora, 1999, pp. 576-620; Manuel Afonso Vaz - A Responsabilidade Civil do Estado, Considerações Breves sobre o seu Estatuto Constitucional. Porto: Edição UCP, 1995, pp. 7-13; Maria da Glória FP Dias Garcia - A Responsabilidade Civil do Estado e Demais Pessoas Colectivas Públicas. Lisboa: CES, 1997, pp. 40-46; Maria Rangel de Mesquita - “Responsabilidade do Estado e Demais Entidades Públicas: o Decreto-lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967 e o Artigo 22º da Constituição”. Perspectivas Constitucionais, Nos 20 anos da Constituição de 1976, vol. II, Coimbra: Coimbra Editora, 1997; Isabel Celeste M. Fonseca - “A responsabilidade do Estado pela violação do prazo razoável: quo vadis?”. Revista do Ministério Público, Ano 29, Jul-Set. 2008, nº 115, pp. 8-9).
Não estando regulamentado aquele princípio para todas as funções do Estado através Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967, do sendo o mesmo directamente invocado pelos particulares, caberia aos tribunais criar uma norma de decisão, aplicando o princípio à luz dos critérios gerais de indemnização e justa reparação de danos, que resultassem daquelas actuações do Estado em violação de direitos, liberdades e garantias ou dos interesses juridicamente protegidos dos particulares.
No entanto, parte desta doutrina questionava se tal responsabilidade podia abranger a derivada de facto lícito e pelo risco, ou se se limitava apenas à fundada em facto ilícito e culposo. Todavia, porque nestes autos vem pedida a responsabilidade do Estado por atraso na administração da justiça, que se reputa de ilícita e culposa, a discussão acerca da amplitude do artigo 22.º da CRP e da possibilidade de abranger a responsabilidade do Estado por factos lícitos e pelo risco, aqui não importa. Arreda-se, por isso, da matéria em discussão nestes autos, a possibilidade de o artigo 22.º da CRP fundar um pedido de responsabilidade por facto lícito ou pelo risco.
Alicerçando-nos no que vem defendido por tal doutrina maioritária, admite-se agora, portanto, que por aplicação do artigo 22.º da CRP, o Estado podia ser civilmente responsável pelos prejuízos causados ilicitamente aos cidadãos, pelo exercício da função administrativa, decorrente de um atraso na administração da justiça, que ferisse o seu direito a obter uma decisão judicial em prazo razoável, ainda que se estivesse na vigência do Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967.
Tal obrigação enquadrava-se, então, nas normas relativas à responsabilidade civil do Estado por actos ilícitos e culposos, designadamente pelos artigos 2.º, 6.º e 7.º do Decreto-Lei n.º 48051, de 21-12-1967 e 487º do Código Civil (CC).
Na vigência do Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967, era também jurisprudência pacífica e unânime do STA que os pressupostos da responsabilidade civil extracontracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos e agentes assentava na verificação cumulativa dos pressupostos de idêntica responsabilidade prevista na lei civil, com as especialidades resultantes das normas próprias relativas à responsabilidade dos entes públicos, e que são: o facto; a ilicitude; a culpa; o dano; e nexo de causalidade entre este e o facto (cf. art.ºs. 483.º a 510.º e 562.º a 572.º do CC).
Entretanto, foi publicada a Lei nº 67/2007, de 31-12, que no seu artigo 12.º vem prever em termos expressos que “é aplicável aos danos ilicitamente causados pela administração da justiça, designadamente por violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável, o regime da responsabilidade por factos ilícitos cometidos no exercício da função administrativa”.
A Lei nº 67/2007, de 31-12, mantém em termos idênticos os pressupostos para a efectivação da responsabilidade do Estado na administração da justiça.
Assim, também na Lei nº 67/2007, de 31-12, exige-se, para a efectivação desta responsabilidade a existência de um facto, entendido como um acto conteúdo positivo ou negativo, como uma conduta de um órgão ou do seu agente, no exercício das suas funções e por causa delas.
No caso, o facto corresponderá ao acto ou à omissão da administração (da justiça, vg. aos tribunais), de proceder à regular tramitação e decisão num processo.
Exige-se, ainda, a ocorrência de uma ilicitude, reconduzível à violação por aquele facto de normas legais e regulamentares ou princípios gerais aplicáveis, ou à prática de actos materiais que infrinjam tais normas e princípios, ou que infrinjam as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser consideradas (cf. art.ºs. 7.º e 12.º da Lei nº 67/2007, de 31-12).
Para aferir da ilicitude decorrente de um atraso na decisão judicial, a jurisprudência nacional, seguindo o entendimento que já vinha sendo tomado pelo TEDH, a propósito da aplicação do art.º 6.º, n.º 1, da CEDH, vem invocando que para a apreciação da violação do prazo razoável, há que considerar, primeiramente, de forma analítica o (in)cumprimento dos vários prazos legais para a prática dos vários actos e dos correspondentes prazos para a ocorrência das várias fases processuais.
Verificada a violação de um dado prazo, essa constatação não será, contudo, o bastante para se concluir pela violação do direito a uma decisão em prazo razoável. Diversamente, há então que atender também às circunstâncias do caso concreto: (i) à complexidade do caso - aqui relevando o número de partes ou de testemunhas ou o número de meios de prova a produzir; (ii) o comportamento processual das partes; (iii) a actuação das autoridades competentes no processo; (iv) e a importância do litígio para o interessado – vg., havendo que apreciar-se o concreto assunto que é discutido no processo e a importância que o mesmo reveste para o respectivo autor ou os próprios bens que se pretendem salvaguardar com o litígio.
Assim, verificando-se um atraso no cumprimento de prazos por razões ainda justificadas face aos termos do concreto litigio, ou derivadas de comportamentos provocados pelas próprias partes, há que afastar, nestas situações, o preenchimento do conceito de “prazo razoável”.
Posteriormente, há que encetar um segundo raciocínio, já não analítico, mas global, em que a aferição do pressuposto da ilicitude decorrente da excessiva demora do processo ou do atraso na decisão judicial se afere pela totalidade do período de tempo em que tal processo se desenvolveu. Para o cômputo desse prazo global releva não apenas a fase declarativa, desde o seu início, mas também a fase de execução judicial, importando apurar, no todo, o tempo em que decorreu até que uma dada pretensão formulada em juízo fosse efectivamente conhecida ou satisfeita.
Assim, como se defende no STA no Ac. n.º 0319/08, de 09-10-2008, “Deve em seguida passar a analisar-se na globalidade o tempo de duração da acção e o seu estado e, se a conclusão que se recolher deste conspecto for clara e seguramente no sentido de que foi ultrapassado o prazo razoável não deveremos perder-nos na floresta dos meandros processuais à procura de saber se foi ou não cumprido religiosamente cada um dos prazos dos actos daquele percurso. Uma situação deste tipo pressupõe evidentemente uma opinião praticamente unânime de um universo de apreciadores que o julgador pode prefigurar e portanto ocorre apenas quando a demora processual seja chocante, inaceitável, para os critérios do homem comum e das suas expectativas ponderadas sobre o andamento da máquina da administração da justiça.” (sobre a apreciação do pressuposto da ilicitude por quebra do direito à justiça em prazo razoável, para além do acórdão do STA, acima citado, vide, entre outros, os Acs. do STA n.ºs. 122/09, de 08-07-2009, 090/12, de 10-09-2010, 122/10, de 05-05-2010, 144/13, de 27-11-2013 ou 72/14, de 21-05-2015. Entre a jurisprudência do TEDH remete-se para os Acs. n.ºs. 53615/08, de 25-09-2012, Novo e Silva c. Portugal, 75529/01, de 08-06-.2006, Sürmeli c. Alemanha, 35382/97, de 06-04-.2000, Comingersoll SA c. Portugal, 33729/06, de 10-06-2008, Martins Castro e Alves Correio de Castro c. Portugal, 39297/98, de 08-03-2001, Pinto de Oliveira C. Portugal, 12986/87, de 24-08-1993, Scuderi c. Itália ou 12598/86, de 19-02-1992, Viezzer c. Itália).
Refiram-se, a este propósito, as palavras de Isabel Celeste da Fonseca, quando lembra que “o Tribunal de Estrasburgo já afirmou que a duração razoável corresponde em princípio à duração média de um processo, sendo certo que – em princípio, sublinhe-se – a duração em média em 1.ª instância deve corresponder a 3 anos, ou dois anos e sete meses, se atendermos às causas em matéria laboral ou relativas a pessoas. E a duração média de todo o processo deve corresponder, em princípio, sublinhe-se de novo, a um período que vai de 4 a 6 anos, salvo casos especiais, em que 2 anos pode significar duração excessiva, tendo em conta a particularidade de certas situações jurídicas litigiosas” (cf. da Autora, “Violação do prazo razoável e reparação do dano: quantas novidades, mamma mia! Anotação ao Ac. do STA de 09-10-2008, Proc. 319/08”, in CJA, Braga, Cejur, n.º 72, (Nov-Dez) 2008, pp. 45-46).
Quanto à culpa, é entendida enquanto um juízo subjectivo ou de censurabilidade, que liga o facto ao agente, por ter praticado a própria conduta ilícita ou por ter violado regras jurídicas ou de prudência que tinha obrigação de conhecer e adoptar.
Por aplicação dos art.ºs. 10.º, n.º 1, e 12.º da Lei n.º 67/2007, de 31-12, a culpa é apreciada pela diligência que é exigível, em abstracto, a um titular de órgão, funcionário ou agente zeloso e cumpridor em face do circunstancialismo próprio do caso concreto.
Estando em causa uma responsabilidade pelo ilícito, não se exige uma culpa subjectivada, a culpa personalizável no próprio autor do acto, aceitando-se como bastante uma culpa do serviço, globalmente considerado. Considera-se, pois, que da circunstância dos serviços de justiça não funcionarem de acordo com os standards de qualidade e eficiência que são expectáveis num Estado de Direito, decorre a indicada culpa, que aqui é apreciada enquanto uma culpa anónima ou de serviço (cf. art.º 7.º da Lei n.º 67/2007, de 31-12).
Por aplicação do art.º 10.º, n.º 2, da Lei n.º 67/2007, de 31-12, há aqui uma inversão da regra geral do ónus da prova prevista no art.º 344.º, n.º 1, do CC, presumindo-se a culpa, salvo prova em contrário (cf. art.º 350.º, n.º 2, do CC).
No que concerne ao pressuposto dano, corresponderá à lesão ou ao prejuízo de ordem patrimonial ou não patrimonial produzido na esfera jurídica de terceiros, decorrente da demora na tramitação do processo, ou na decisão, ou na adopção tempestiva procedimentos cautelares e de medidas provisórias que tenha sido oportunamente requeridas para se acautelar direito.
Atendendo à concreta situação, que não se coaduna com um princípio de restauração natural, aqui afasta-se a regra do 562.º do CC, concretizando-se o direito à reparação pelo dano, sempre, através de uma prestação pecuniária.
Por via da jurisprudência do TEDH tem sido igualmente entendido que se deve presumir a existência de danos não patrimoniais como consequência da demora excessiva de um processo judicial, não sendo necessário ao A. alegar e provar esses mesmos danos. Será um dano comum, que se apura de acordo com as regras da vida, inerente a todas as pessoas (singulares) que são vítimas de um atraso na justiça. Logo, a alegação e prova só nestas acções só serão exigíveis nos casos em que os danos excedam os normalmente produzidos nestas situações (cf. neste sentido, entre outros, os Acs. do TEDH n.ºs 62361, de 29-03-2006, Riccardi Pizzati c. Itália ou 50262/99, de 22-06-2004, C. Bartl c. República Checa).
Seguindo a jurisprudência do TEDH será também possível atribuir às pessoas colectivas uma indemnização por danos não patrimoniais, mas aqui e ficarem alegados e provados nos autos, vg. porque se verifique que da demora resultaram dificuldades de gestão, organização ou planeamento da empresa, danos para a sua imagem ou dificuldades financeiras.
Tal presunção da existência de danos não patrimoniais é, no entanto, ilidível, aceitando-se que haja casos em que a duração excessiva do processo provoca apenas um dano moral mínimo ou, até nenhum dano moral (cf. art.ºs 346.º e 351.º do CC).
Quanto ao montante do dano não patrimonial, também tem sido exigido pelo TEDH que a indemnização que seja atribuída pelo juiz nacional seja razoável e em montante idêntico aos atribuídos por aquele TEDH para casos semelhantes.
Ainda aqui, há igualmente que atender à jurisprudência do TEDH, que tem exigido que a indemnização a atribuir pelo juiz nacional seja razoável e em montante idêntico aos atribuídos por aquele TEDH para casos semelhantes. Para aferir os casos semelhantes o TEDH compara os números de anos, o número de jurisdições em que os casos correram, a importância dos interesses em jogo, o comportamento das partes e considera as situações para um mesmo país (c. neste sentido, entre outros, os Acs. do TEDH n.º 36813/97, de 29-03-2006, Scordino c. Itália, 64699/01, de 29-03-2006, Musci c. Itália ou 64890/01, de 10-11-2004, Apicella c. Itália).
Ou seja, para aferir do quantum da indemnização a arbitrar nos processos de indemnização decorrentes de atraso na decisão de processo judicial deve considerar-se os padrões fixados, quer na jurisprudência nacional, quer do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
Sobre o assunto, indicando os vários montantes para os casos “semelhantes”, pronunciou-se detalhadamente o STA no Ac. n.º 01004/16, de 11-05-2017, para o qual ora se remete.
Mais se refira, que atendendo à jurisprudência do TEDH, vão sendo apontados a título meramente indicativo os valores que oscilam entre 1000,00€ e 1500,00€ por cada ano de demora do processo – cf. neste sentido os Acs do TEDH n.ºs 65102/01, de 29-03-2006, Mostacciuolo v. Italy (n.º 2), 65075/01, de 29-03-2006, Giuseppina and Orestina Procaccini c. Italy, 64886/01, de 29-03-2006, Cocchiarella c. Italy, 64699/01, de 29-03-2006, Musci c. Itália ou 64890/01, de 10-11-2004, Apicella c. Itália. Assim apontando Fonseca, Isabel Celeste - “Violação do prazo razoável e reparação do dano: quantas novidades, mamma mia! Anotação ao Ac. do STA de 09-10-2008, Proc. 319/08”, in CJA, Braga, Cejur, n.º 72, (Nov-Dez) 2008, pp. 45-46; Ac. do STA n.º 07472/11, de 12-05-2011.
Para aferir os casos semelhantes o TEDH compara os números de anos, o número de jurisdições em que os casos correram, a importância dos interesses em jogo, o comportamento das partes e considera as situações para um mesmo país (c. neste sentido, entre outros, os Acs. do TEDH n.º 36813/97, de 29-03-2006, Scordino c. Itália, 64699/01, de 29-03-2006, Musci c. Itália ou 64890/01, de 10-11-2004, Apicella c. Itália).
Para a efectivação da responsabilidade exige-se, ainda, a verificação do pressuposto do nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Aplica-se aqui, tal como para os demais casos da responsabilidade do Estado pelo ilícito, a teoria da causalidade adequada, na sua formulação negativa, tal como vem formulada no art.º 563.º do CC, preceito segundo o qual a “obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”. Ou seja, só ocorre este nexo quando os danos, em abstracto, são consequência apropriada do facto. Igualmente, se para a produção do dano a condição é de todo indiferente ou só se tornou condição em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, essa condição não será causa adequada do dano que se alega.
De referir, ainda, que a mais recente jurisprudência do STA em matéria de responsabilidade civil do Estado Português decorrente de atraso na administração da justiça, na esteira do Ac. do TEDH n.º 73798/13, de 29-10-2015, Valada Matos c. Portugal, vem entendendo uniformemente que por força de um princípio da subsidiariedade, e por aplicação dos art.ºs 6.º, 113.º, 34.º, 35.º e 41.º da CEDH, compete, em primeira linha, ao juiz nacional reparar de forma razoável as violações dos direitos e liberdades que vem consagrados naquela Convenção, intervindo o TEDH apenas numa segunda linha, se esgotados os mecanismos nacionais e quando não tenha havido uma resposta reparatória que possa considerar-se satisfatória – cf. neste sentido os Ac. do STA n.º 488/16, de 30-03-2017 e Ac. do STA n.º 01004/16, de 11-05-2017.
Nesta mesma lógica, se se entender que a resposta nacional não é satisfatória, é possível o recurso àquele TEDH para efectivar correspondente o direito indemnizatório, como que duplicando-se as apreciações judiciais sobre o mesmo assunto.
Como se explica no Ac. do STA n.º 01004/16, de 11-05-2017 “a possibilidade “de “duplicação” de meios essa que será tão mais frequente quanto menor for a efetividade dos meios indemnizatórios internos em matéria de duração excessiva dos processos judiciais, efetividade a ser aferida à luz dos critérios definidos pelo próprio «TEDH» [e que são os seguintes: i) a ação de indemnização deve ser decidida em prazo razoável; ii) a indemnização deve ser prontamente paga, em princípio, no mais tardar seis meses após a data em que a decisão que concede a indemnização se tornou exequível; iii) as regras processuais que regem a ação de indemnização devem ser conformes aos princípios de equidade garantidos pelo art. 06.º da «CEDH»; iv) as regras sobre custas judiciais não devem representar um encargo excessivo para os litigantes cuja ação é fundada; v) o montante das indemnizações não deve ser insuficiente em comparação com os montantes concedidos pelo Tribunal em casos semelhantes] [cfr., entre outros, os Acs. do «TEDH» de 10.04.2008 (c. «Wasserman v. Rússia/n.º 2», §§ 49 e 51), de 15.01.2009 (c. «Bourdov v. Rússia/n.º 2», § 99), e de 29.10.2015 (c. «Valada Matos das Neves v. Portugal», §§ 72/73)], e inerentes decorrências relativamente ao grau de certeza jurídica e de efetividade quanto ao uso do meio contencioso interno para que este possa e deva ser utilizado para os efeitos do art. 35.º, § 1 daquela Convenção [necessidade de esgotamento de «todas as vias de recurso internas»], o qual, no caso português, foi considerado existir, a partir de 27.05.2014, impondo-se, assim e para efeitos do contencioso junto daquele Tribunal, a necessidade do uso/esgotamento dos meios internos após tal data [cfr. o citado Ac. do «TEDH» de 29.10.2015 (c. «Valada Matos das Neves v. Portugal», §§ 102/106) em contraposição com o que o mesmo Tribunal havia concluído, anteriormente, no Ac. de 10.06.2008 (c. «Martins Castro e Alves Correia de Castro v. Portugal», § 56)].
XIV. De notar, ainda, que no quadro do processo deduzido junto do «TEDH» e da possibilidade da sua apresentação quando foi usado também o meio contencioso interno aquele Tribunal, ao abrigo do disposto no art. 34.º da «CEDH», afere e controla tal uso pela exigência do dever de preenchimento por parte do requerente, mormente, da condição relativa ao ter de deter e de manter a qualidade de “vítima” em todos os estádios do processo [cfr., entre outros, os Acs. do «TEDH» de 07.05.2002 (c. «Bourdov v. Rússia», § 30), de 29.03.2006 (Pleno/Grande Câmara - doravante «GC») (c. «Scordino v. Itália/n.º 1», §§ 179/182) e de 07.06.2012 (c. «Centro Europa 7 S.R.L. e Di Stefano v. Itália», §§ 80/82)].
XV. E que uma decisão ou uma medida favorável ao requerente só é suficiente para lhe retirar a qualidade de “vítima”, para os efeitos do referido preceito, se as autoridades nacionais reconheceram explicitamente ou em substância, e se repararem a violação da Convenção [cfr. nomeadamente, para além do citado Ac. do «TEDH» de 29.03.2006 (GC) (c. «Scordino v. Itália/n.º 1», § 180); ainda os Acs. do mesmo Tribunal de 26.07.2005 (c. «Siliadin v. França», §§ 61/63), de 01.06.2010 (GC) (c. «Gäfgen v. Alemanha», § 115), e de 12.09.2012 (GC) (c. «Nada v. Suíça», § 128)], sendo que apenas quando estas condições estejam preenchidas a natureza subsidiária do mecanismo de proteção da Convenção se oporá ou impedirá um exame da queixa [cfr., entre outros, Acs. do «TEDH» de 20.03.2003 (c. «Jensen e Rasmussen v. Dinamarca (dec.)», I), e de 31.01.2008 (c. «Albayrak v. Turquia», § 32)], na certeza de que a questão de saber se o requerente continua a ser vítima pode também depender do montante da indemnização concedida pelas jurisdições internas e da efetividade (incluindo a prontidão) do “recurso indemnizatório” [vide, entre outros, Acs. do «TEDH» de 20.12.2001 (c. «Normann v. Dinamarca - dec.», §§ 7/9), e de 29.03.2006 (GC) (c. «Scordino v. Itália/n.º 1», § 202)].”

Feito o anterior enquadramento, apreciemos, em concreto, o caso dos autos, considerando o que antes ficou dito.
Diz a Recorrente que o atraso na administração da justiça ocorreu porque o processo n.º 9/04.5TFLSB demorou em demasia e culminou com um despacho de arquivamento, ocorrido em 27-07-2010. Alega o A. que aquele processo teve início em 19-02-2003, com a instauração do processo de contra-ordenação n.º 8/02/CO pelo BP.
Dos autos resulta que o indicado processo deu entrada e foi distribuído no Tribunal da Pequena Instância Criminal (TPIC) em 27-01-2004 (cf. facto E)
Assim, a ilicitude da conduta do Estado está fundada numa acção contra-ordenacional, que deu entrada no TPIC em 27-01-2004 e que terminou com um despacho de extinção do procedimento prolatado em 27-07-2010.
Por conseguinte, não obstante a presente acção já ter sido apresentada na vigência da Lei n.º 67/2007, de 31-12, os factos que estão na base do presente pedido de responsabilidade ocorreram, na sua maioria, na vigência do Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967 e não da Lei n.º 67/2007, de 31-12 (diploma que só entrou em vigor em 30-01-2008).
A Lei n.º 67/2007, de 31-12, não contém disposições transitórias que regulem a aplicação da lei no tempo. Logo, um caso como o dos autos, há, pois, que recorrer à norma geral do art.º 12.º do CC.
O art.º 12.º, n.º 1, do CC, estipula-se: “1. A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
2. Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.”
Para efeitos do apuramento da responsabilidade civil do Estado por deficiente administração da justiça, como resulta de toda a anterior exposição, a lei não se abstrai dos factos que dão origem a tal responsabilidade. Logo, a Lei n.º 67/2007, de 31-12, não poderá abranger (toda) a relação já constituída, mas dever-se-á entender que só abrange factos futuros, isto é, a factos que se produziram após a sua entrada em vigor.
Não obstante esta constatação, como acima assinalamos, o actual regime da Lei n.º 67/2007, de 31-12, no que se refere à responsabilidade do Estado por deficiente administração da justiça não se aparta em termos de pressupostos do que já vinha preconizado pelo Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967, havendo, também, aqui que se aplicar as normas da CEDH e que seguir a jurisprudência do TEDH.
Por conseguinte, porque ambos os regimes conduzirão a um resultado idêntico, que está assente nos mesmos pressupostos, vamos apreciar a presente causa verificando do preenchimento dos pressupostos para a efectivação da responsabilidade do Estado sem discernir entre o regime previsto no Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967 e o da Lei n.º 67/2007, de 31-12.
Sem embargo, para decidir da presente acção ter-se-á que entender que se lhe aplicam quer o regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei nº 48051, de 21-11-1967, quer a disciplina da Lei nº 67/2007, de 31/12.
Na decisão recorrida entendeu-se que ocorreu um atraso na administração da justiça porque numa apreciação analítica do processo n.º 9/04.5TFLSB verificou-se terem sido ultrapassados os prazos para o início da audiência do julgamento, bem como para ser proferido o despacho a declarar extinto o procedimento contra-ordenacional. Mais se entendeu, que considerando a complexidade do processo e o comportamento das partes, os indicados autos, na sua globalidade, tinham também decorrido por um tempo excessivo. Nessa conformidade, atribuiu-se ao A. uma indemnização por danos não patrimoniais de €6.000.00.
A decisão recorrida, na parte que importa, teve o seguinte discurso decisório: “considerando que o objecto dos presentes autos, é apenas a actuação do Estado (e não do Banco de Portugal, que nem é Parte nos presentes autos), será de proceder à análise da tramitação processual, a partir do envio do processo a Tribunal pelo Banco de Portugal, o que, como dissemos, ocorreu por ofício de 06.01.2004, e que deu início, em 27.01.2004, ao processo judicial para a apreciação da impugnação judicial da decisão de aplicação de contra-ordenação.
Nessa sequência, em 02.02.2004, foi proferido despacho a admitir os recursos apresentados e a designar as datas para a realização de julgamento, entre 20.09.2004 e 19.10.2004.
Porém, em 10.09.2004, o Autor requereu a suspensão do processo n.º 9/04.5TFLSB, e que fossem desmarcadas as datas do julgamento, levantando a questão do concurso de responsabilidade criminal e contra-ordenacional pelos mesmos factos atinentes aos ditos autos. Nesse seguimento, em 17.09.2004, foi proferido despacho ordenando que fosse oficiado o DIAP para informar sobre a existência de inquérito criminal e, em caso afirmativo, se brevemente iria ser proferido despacho final, sendo ainda dado sem efeito as datas designadas para o julgamento.
Efectivamente, em 18.01.2015, a procuradora-adjunta do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa informou o juiz titular do processo n.º 9/04.5TFLSB, de que o objecto do inquérito n.º 14.342/03.0TDLSB “tem por base a mesma factualidade” e, nessa medida, em 10.05.2005, no processo n.º 9/04.5TFLSB, foi proferido despacho, tendo sido determinado que os autos aguardassem a prolação de despacho final no âmbito do processo n.º 14.342/03.0TDLSB, o que veio a suceder em 20.07.2006 com a prolação de despacho de arquivamento; do que o juiz titular do processo n.º 9/04.5TFLSB foi informado pelo DIAP, em 23.08.2006.
Subsequentemente, em 04.10.2006, foi proferido despacho a declarar a cessação da causa impeditiva do desenvolvimento dos termos do processo n.º 9/04.5TFLSB e procedeu-se ao agendamento de várias sessões de julgamento, para as seguintes datas: 17.09.2007, 18.09.2007, 19.09.2007, 24.09.2007, 25.09.2007, 26.09.2007, 01.10.2007, 02.10.2007, 03.10.2007, 15.10.2007, 16.10.2007, 17.10.2007 e 18.10.2007.
Apurando-se, assim, para o que releva à decisão a proferir nos presentes autos, que o processo judicial n.º 9/04.5TFLSB esteve “suspenso”, por facto não imputável ao Tribunal, desde 10.05.2005 a 04.10.2006, e que a primeira sessão da audiência de julgamento apenas seria agendada para 17.09.2007, ou seja, aproximadamente 11 meses após o despacho de 04.10.2006, a ordenar a sua realização.
Por fim, as alegações finais foram prestadas em 02.07.2008, e a sentença proferida em 31.07.2008; tendo sido interposto recurso da aludida decisão e de determinados despachos interlocutórios; recurso que veio a ser decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 19.02.2009, revogando o despacho proferido no decurso da sessão de 16.10.2007 da audiência de julgamento que indeferiu a requerida junção de reportes do C…. ao Banco de Portugal, e ordenando que o mesmo fosse substituído por outro que admitisse a requerida junção aos autos dos reportes do Banco arguido e, em consequência, anulado o acórdão final proferido, e determinado o reenvio do processo para novo julgamento.
Após tomar conhecimento, em 03.04.2009, do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, o juiz de direito proferiu despacho e declarou-se impedido, tendo ordenado a remessa dos autos à distribuição, o que se veio a verificar em 14.04.2009.
No seguimento do pedido formulado em 09.06.2010, pelo arguido J....., solicitando a declaração da prescrição do processo de contra-ordenação e o arquivamento dos autos, foi proferida decisão, em 27.07.2010, declarando extinto o procedimento contra-ordenacional, reportado aos “factos/operações que terão tido lugar entre os anos de 2000 e 2001 (Novembro de 2000 a Julho 2001)”.
Constatando-se, portanto, o decurso do prazo de, aproximadamente, 15 meses entre a data da redistribuição do processo na primeira instância (em 14.04.2009) e da prolação do despacho a declarar extinto o procedimento contra- ordenacional (em 27.07.2010).
(…)
Verificando-se, porém, que ao longo da tramitação do processo contra- ordenacional ocorreram duas situações de delonga processual, a primeira de aproximadamente 11 meses, entre a data do despacho (em 04.10.2006) a agendar as sessões do julgamento e a data da primeira sessão do julgamento (17.09.2007); e a segunda, de cerca de 15 meses, entre a data da redistribuição do processo em 14.04.2009, e a data do despacho a declarar extinto o procedimento contra- ordenacional, em 27.07.2010.
(…)
De todo o modo, desde já se diga que, no caso dos autos, entendemos apurada a ilicitude para efeito da procedência do pedido indemnizatório por responsabilidade civil extra-contratual, como prevista no artigo 12.º da Lei n.º 67/2007, de 31/12, constatando- se um atraso na decisão do processo judicial, violador do direito a uma decisão em prazo razoável.
Como vimos, a apreciação da razoabilidade da duração do processo, na sua globalidade, ou relativamente a determinados actos desse mesmo processo, é feita em concreto, atendendo a diversos factores, como a complexidade do processo, o n.º de intervenientes e a conduta das partes, entre outros. Entendendo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que a duração média e razoável de um processo judicial é de cerca de 3 anos na 1.ª instância, e de 4 a 6 anos, incluindo as fases de recurso.
No caso em apreço, o recurso de contra-ordenação teve uma duração de cerca de 7 anos, o que consubstancia uma ligeira ultrapassagem do prazo razoável de duração média do processo, ainda que para tal tenha contribuído o lapso temporal em que o processo esteve suspenso até que fosse decidido o processo-crime.
Apesar disso, uma duração de aproximadamente 7 anos, afigura-se algo excessivo, face às legítimas expectativas das pessoas que recorrem a tribunal.
Ademais, como se disse e se reitera, foram detectadas duas situações de delonga processual, a primeira de aproximadamente 11 meses, entre a data do despacho (em 04.10.2006) a agendar as sessões do julgamento e a data da primeira sessão do julgamento (17.09.2007); e a segunda, de cerca de 15 meses, entre a data da redistribuição do processo em 14.04.2009, e a data do despacho a declarar extinto o procedimento contra-ordenacional, em 27.07.2010. E, como tal, se impõe concluir que foram ultrapassados os prazos para o início da audiência de julgamento e, bem assim, para que fosse proferido despacho a declarar extinto o procedimento contra-ordenacional.
Nessa medida, e mesmo que se atenda às circunstâncias concretas do caso, à sua complexidade e ao comportamento das partes, impõe-se concluir que o processo judicial de impugnação da decisão de aplicação de contra-ordenação, não fora decidido num prazo razoável ou inaceitável para os critérios e expectativas do homem comum. Alcançando-se igual conclusão, mesmo que considerando o prazo de “suspensão” do processo judicial por facto não imputável ao Tribunal, à conduta do Autor e das Partes no processo, a não ter sido requerido à aceleração processual do processo, à conduta do Banco de Portugal e à delonga do envio do processo para Tribunal.
O raciocínio decisório acima referido está certo, pelo que se acompanha o mesmo.
Conforme factualidade apurada, após a entrada e distribuição dos autos no TPIC, em 27-01-2004, até à prolação do despacho de extinção do procedimento, que ocorreu em 27-07-2010, decorreram cerca de 6 anos e 6 meses.
Verifica-se, também, que o processo contra-ordenacional teve diversas paragens de relevo, decorrentes do concurso da responsabilidade criminal e contra-ordenacional e da suspensão do mesmo, por essa razão, ficando os autos a aguardar o desfecho do processo-crime.
Depois, verifica-se uma nova paragem com a marcação do julgamento, porquanto em 04-10-2006 agenda-se o julgamento para datas após a de 17-09-2007, isto é, agenda-se o julgamento com cerca de 1 ano de dilação.
Esta dilação de cerca de 1 ano para a marcação do julgamento, não vem justificada nos autos.
Ocorrido o julgamento, que sofreu diversas vicissitudes processuais, com pedidos de escusas de testemunhas e diversos recursos, a decisão veio a ser prolatada em 31-07-2008, sendo no sentido da improcedência do recurso de impugnação interposto pelo A., ora Recorrente.
A dilação do julgamento encontra justificação nas vicissitudes ocorridas.
Interpostos diversos recursos da decisão, são os mesmos admitidos em 11-11-2008 e em 19-02-2009 é proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação e Lisboa (TRL), que determina a baixa dos autos para novo julgamento.
Redistribuído o processo em 14-04-2009, só em 27-07-2010 é proferido o despacho de extinção do procedimento contra-ordenacional, por prescrição.
A dilação de mais de 1 ano nesta fase do processo também não encontra uma justificação na factualidade provada.
Por conseguinte, apreciado o processo em termos analíticos, terá ocorrido uma demora injustificada em cerca de 1 ano no momento em que se agendou o julgamento e depois em mais de 1 ano, entre a data da redistribuição do processo e o despacho de 27-07-2010.
O processo em questão era de alguma complexidade e esteve suspenso face à ocorrência de um concurso de responsabilidades.
O processo passou também por 2 instâncias.
Quanto ao comportamento das partes no processo, dos dados apurados não resulta que estas tenham litigado com imperícia, ou de forma prejudicial à lide mais célere.
No que concerne à importância do litígio para o interessado, estava em apreciação um processo contra-ordenacional que envolvia a sua pessoa, enquanto trabalhador, pelo que que seguramente teve relevo para o ora Recorrente.
No mais, nada ficou provado nestes autos.
Neste seguimento, atendendo às circunstâncias do caso – e considerando a jurisprudência nacional e do TEDH, acima indicadas - teremos que admitir que terá ocorrido uma pequena demora no processo por se ter alongado por cerca de 6 anos e 6 meses.
Como acima se indicou, o TEDH e no seu seguimento a doutrina e jurisprudência nacionais, vêm assinalando como um tempo razoável para a tramitação de um processo, numa só instância, o período de 3 anos. Havendo duas instâncias, admite-se a demora por mais tempo, entre 4 e 6 anos.
Assim, frente ao caso concreto – e atendendo à jurisprudência do TEDH, que se tem de seguir - há aqui aceitar como correcto o julgamento que foi feito em 1.ª instância quando concluiu pela ocorrência de uma demora desrazoável, por o indicado processo ter decorrido num tempo total de 6 anos e 6 meses.
Está, pois, verificado o requisito da ilicitude que dá lugar à obrigação de indemnizar.
No que concerne à culpa, existirá uma culpa de serviço, uma culpa globalmente considerada. Ou seja, a administração da justiça não funcionou de acordo com os standards de qualidade e eficiência que são expectáveis num Estado de Direito, desde logo porque não conseguiu efectivar num tempo mais curto e portanto mais razoável o terminus do processo contra-ordenacional (cf. art.º 7.º da Lei n.º 67/2007, de 31-12).
Atendendo aos factos provados, não se antevê uma culpa subjectivada e personalizável no autor de algum acto processual.
Quanto a este pressuposto, indique-se, que o TEDH vem advogando que uma carga excessiva de trabalho ou a falta de meios disponíveis nos Tribunais não é fundamento legal para isentar ou obstar à efectivação da responsabilidade por atrasos na administração da justiça. Nestas situações, o Estado responderá civilmente pela desorganização do aparelho judicial, assim como pela deficiente definição dos quadros e meios dos Tribunais.
Aqui chegados, importa analisar os danos invocados pelo A. e ora Recorrente para se concluir quer pela existência desses danos, quer pela verificação ou não verificação do pressuposto do nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Na decisão recorrida entendeu-se verificado o dano não patrimonial e pelo atraso na decisão jurisdicional atribuiu-se ao A. e ora Recorrente, a esse título, uma indemnização de €6.000,00.
Como acima se indicou, a jurisprudência perfilhada pelo TEDH vem presumindo os danos não patrimoniais como consequência da demora excessiva de um processo judicial. Entende aquele Tribunal que os danos não patrimoniais são danos comuns, que decorrem das regras da vida. Quanto à alegação e prova destes danos, o TEDH só as requer quando estes danos excedam os normalmente produzidos nestas situações.
Dos factos provados não resultam danos não patrimoniais, superiores aos comuns, para o A. e Recorrente.
Do facto C. (na segunda repetição desta letra) resultam provados danos morais comuns, que correspondem à tristeza e abatimento do A. por ter visto o seu processo demorar e culminar com uma decisão que declarou a prescrição do procedimento contra-ordenacional.
Como se indicou, o TEDH vem atribuindo por cada ano de atraso valores que oscilam entre 1.000,00€ e 1.500,00€.
Na decisão recorrida arbitrou-se uma indemnização de €6.000,00 para os danos morais.
Frente aos padrões indemnizatórios do TEDH, este valor equivalerá a uma indemnização adequada para um atraso de um processo em cerca de 4 anos. Ter-se-á entendido na decisão recorrida que o processo contra-ordenacional deveria ter demorado apenas 2 anos e 6 meses e não os 6 anos e 6 meses que efectivamente demorou.
O Recorrente advoga que tal indemnização é errada, por lhe ser devida uma indemnização por danos não patrimoniais não inferior a €25.000,00.
Face ao que ficou dito é evidente que esta alegação do Recorrente não pode proceder.
A indemnização que lhe foi atribuída é perfeitamente adequada a indemnizar os danos não patrimoniais que sofreu, pela demora no processo contra-ordenacional.
Consequentemente, claudica esta alegação de recurso.

O Recorrente vem igualmente invocar a existência de um erro decisório por se ter entendido que inexistia o nexo de causalidade entre os danos patrimoniais que se alegavam e o ilícito. Considera o Recorrente que a perda dos rendimentos de trabalho nos anos subsequentes à decisão do BP e até à data da prolação da decisão que declarou a prescrição do procedimento contra-ordenacional foi uma consequência do atraso na administração da justiça. Igualmente, considera o Recorrente que aquela perda foi uma consequência da demora, porque foi a demora que determinou a prescrição do procedimento contra-ordenacional e daí derivou a impossibilidade de ver declarada a ilegalidade da conduta do BP, deixando de poder ser ressarcido pelo BP por uma actuação ilícita e culposa.
Como já se referiu, para a aferição do nexo de causalidade há que aplicar a teoria da causalidade adequada, na sua formulação negativa, tal como vem formulada no art.º 563.º do CC.
Portanto, só há dever de indemnizar quando os danos, em abstracto, são consequência apropriada do facto ilícito. Ou seja, o facto ilícito não só tem de constituir, em concreto, uma condição sine qua non do dano, como, em abstracto, aquele mesmo facto tem de ser capaz (tem de ser idóneo), em condições normais, para produzir o tipo de dano que se invoca. Igualmente, se para a produção do dano a condição é de todo indiferente ou só se tornou condição em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, essa condição não será causa adequada do dano que se alega.
Feita esta observação, é fácil de compreender que os danos decorrentes do não recebimento dos rendimentos de trabalho não são imputáveis ao atraso na administração da justiça no processo contra-ordenacional, mas, antes, têm a sua génese no facto de o A., aqui Recorrente, ter sido condenado pelo BP. Assim, a eventual perda daqueles valores não foi causada pelo atraso no processo contra-ordenacional, mas só pode ser imputável à conduta do BP.
Mais se indique, na sequência do que antes referimos, que o facto de se ter declarado a prescrição do processo contra-ordenacional em nada obstava a que o A. e Recorrente, se assim quisesse, viesse a intentar a competente acção contra o BP para efectivação da sua responsabilidade por facto ilícito e culposo. Também seria essa a acção adequada para se discutir da eventual ilicitude da conduta do BP.
Refira-se, igualmente, que constitui entendimento da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo que se a ilicitude é tendencialmente coincidente com a ilegalidade do acto, tal não significa que essa coincidência ocorra em todas as situações (cf. entre outros, os Acs. do STA de 26-2-2002, P. n.º 47753, de 13-02-2001, P. n.º 44445, ou de 09-11-2000, P. n.º 46441). A ilicitude, para efeitos de integração dos pressupostos de responsabilidade civil não significa a mera violação de uma disposição legal, exigindo a lei que se traduza na violação de uma disposição legal destinada a proteger interesses alheios, designadamente exige-se que resultem violados direitos ou interesses juridicamente protegidos dos administrados ou disposições legais destinadas a assegurar posições jurídico-subjectivas dos cidadãos.
Portanto, ainda que tivesse sido proferida uma decisão de mérito no processo contra-ordenacional, que absolvesse o A. e Recorrente da sanção que lhe foi aplicada pelo BP, essa mesma decisão, por si mesma, também não serviria necessariamente para fundar o ilícito que se exigiria para efeitos de integração dos pressupostos de responsabilidade civil. Ou seja, o A. e Recorrente ainda que obtivesse uma prévia decisão absolutória no âmbito do processo contra-ordenacional, por ocorrer alguma ilegalidade na conduta do BP, para efectivar a responsabilidade do BP por facto ilícito e culposo teria sempre que discutir e provar a existência dessa ilegalidade como correspondendo a um facto ilícito, discussão a efectuar na competente acção declarativa.
Assim, todo o raciocínio do Recorrente baseia-se numa falácia, porquanto considera que a declaração da ilegalidade da conduta do BP, que lhe daria direito a uma indemnização, seria a proferida no termo do processo contra-ordenacional, quando, nos termos legais, tal julgamento sobre a ilegalidade da conduta do BP, como correspondendo ao facto ilícito que se exigiria como pressuposto para a responsabilidade do BP, teria de decorrer no âmbito de uma acção declarativa que visasse efectivar aquela mesma responsabilidade.
A tudo acresce, que a invocada decisão de mérito a tomar no termo do processo contra-ordenacional tanto poderia ser de absolvição do A. e Recorrente, como de condenação, não cumprindo nos presentes autos aferir da ilegalidade ou da ilicitude da conduta do BP, por tal apreciação não caber no âmbito deste litígio.
Portanto, o atraso no processo contra-ordenacional não é a razão directa do dano relativo à perda de quaisquer rendimentos de trabalho.
Da mesma forma, os invocados danos na respeitabilidade profissional do A. e Recorrente, ou no seu bom nome, não decorrem do atraso na administração da justiça, mas são, antes, uma consequência da decisão condenatória do BP.
Inexiste, pois, para estes danos, o pressuposto do nexo de causalidade, porque o atraso na administração da justiça decorrente do processo contra-ordenacional não é causa sine qua non de uma mancha na carreira profissional do A. e Recorrente, ou no seu bom nome e prestígio profissional. Quaisquer danos desse tipo terão decorrido da decisão condenatória do BP e não da maior delonga que possa ter existido no processo contra-ordenacional que se seguiu.
Em suma, a decisão recorrida está inteiramente certa quando julgou pela inexistência do pressuposto nexo de causalidade facto ilícito e os danos patrimoniais que o A. invoca nesta acção.

No art.º 6.º, n.º 7, do RCJ estipulou-se que ”Nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.”
Por seu turno, nos termos do art.º 530.º, n.º 7, al. b), do CPC, consideram-se de especial complexidade as acções “que digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso”.
Assim, nos termos dos citados preceitos a dispensa do remanescente da taxa de justiça é uma situação excepcional, que tem de ser devidamente justificada pelo juiz e que apenas deve ocorrer quando a causa tenha uma complexidade inferior à média (cf. a este propósito os Ac. do TRL n.º 7973-08.3TCLRS-A.L1-6, de 14-01-2016 ou TRL n.º 3258/05.5TVLSB.L1-7, de 22-11-2016).
O presente recurso refere-se a uma acção de indemnização por atraso na administração da justiça, qualificado como um processo prioritário, que regista 1634 páginas (no SITAF). Quanto ao correspondente recurso vem apresentado através um articulado de 94 páginas e que reúne 30 conclusões. No recurso apela-se a questões de alguma complexidade em termos de matéria fáctica e jurídica. A causa tem para o Recorrente e para as restantes partes um interesse económico avultado.
O recurso apresentado deu lugar a contra-alegações da Entidade Pública.
Apreciadas as alegações de recurso, as mesmas vêm apresentadas de forma um tanto complicada e prolixa. Já as contra-alegações são apresentadas de forma mais comedida e adaptada à complexidade do caso.
Sem embargo, há que considerar que qualquer das partes apresenta uma conduta processual adequada ao litígio, que não extravasa o exercício normal dos seus direitos e que se enquadra nos princípios da boa fé, da cooperação, da economia, brevidade e simplificação processual.
Portanto, atendendo aos termos dos articulados apresentados, à correspondente conduta das partes, aos interesses em jogo nestes autos e à importância económica do litigio, não obstante a presente causa vir indicada como tendo o valor de 753.093,22€ e se referir a questões que se devem ter, na sua globalidade, como relativamente complexas, considera-se que a especificidade da situação justifica a dispensa de uma parte significativa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, sob pena de se estar a pagar uma taxa manifestamente desproporcional ao serviço prestado.
Por estas razões julga-se dispensado o pagamento de 75% do remanescente da taxa de justiça.

III- DISPOSITIVO
Pelo exposto, acordam em:
- negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida;
- custas pelo Recorrente, com dispensa de 75% do remanescente da taxa de justiça (cf. art.ºs. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2, do RCP e 189.º, n.º 2, do CPTA).

Lisboa, 4 de Abril de 2019.

(Sofia David)
(Helena Telo Afonso)
(Pedro Nuno Figueiredo)