Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1002/17.3BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:03/10/2022
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:FATURAÇÃO FALSA
IRC
ÓNUS DA PROVA
INDÍCIOS
MATERIALIDADE
DECLARAÇÕES DE PARTE
Sumário:I-No domínio da faturação falsa, a AT não precisa de fazer prova da falsidade/simulação das faturas, mas apenas evidenciar a consistência do seu juízo, invocando factos que traduzam uma probabilidade séria de as operações constantes nas faturas serem simuladas. Cumprido esse ónus passa a competir à Impugnante, apresentar prova capaz de destruir esses indícios, demonstrando que as faturas têm subjacentes operações com materialidade.

II-A mera menção aos serviços a jusante realizados e à necessidade de recorrer à subcontratação não se afigura como suficiente para a demonstração da efetividade das operações tituladas pelas faturas postas em causa.

III-A prova que importa realizar, de forma cabal, segura e inequívoca relativamente a cada um dos serviços titulados pelas faturas, não se basta com um mero enquadramento genérico da existência de prestação de serviços e uma alegação não devidamente substanciada no espaço e no tempo da concreta relação negocial.

IV-A apresentação dos meios de pagamento reveste grau de importância elevada em termos de prova da efetividade das operações.

V-A prova a realizar tem, necessariamente, de assumir um grau de certeza, precisão e detalhe elevado, desde logo, face à falta de credibilidade e fragilidades dos meios de pagamento.

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I-RELATÓRIO


C…, LDA (doravante C… ou Recorrente), interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria, a qual julgou improcedente a impugnação deduzida contra o despacho de indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada contra os atos de liquidação de Imposto sobre Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e de Juros Compensatórios (JC), do exercício de 2011, no montante global de €69.994,68.

A Recorrente formulou as conclusões que infra se descrevem:

“A) – Salvo o devido respeito, a Recorrente discorda do julgamento da matéria de facto contido na douta sentença recorrida, ou seja, o Tribunal “a quo” efetuou um errado e incorreto julgamento da matéria de facto, dando como não provados factos em contradição com a prova testemunhal efetuada e com os demais documentos juntos aos autos.

B) – Ao dar como provados os factos dos pontos 6., 9., 10., 13. e 14., não poderá ser extraída a conclusão de que a “W…” não prestou os serviços que se encontram registados na contabilidade da ora Recorrente.

C) – Face à prova testemunhal produzida, resulta provado que o fornecedor “W…” prestou à Recorrente os serviços faturados, apenas havendo divergência apontada por esta quanto ao número de horas despendidas em cada um dos clientes onde foram prestados os serviços, a qual não se mostrou sanada, conforme, aliás resulta do facto provado no ponto 15.

D) – Prova testemunhal que resulta do depoimento da testemunha L… (aos minutos 00:05:10 e seg., minuto 00:08:30 e seg., minuto 00:16:00 e seg., minuto 00:16:29 e seg., minuto 00:19:15 e seg., minuto 00:22:30 e seg., minuto 00:28:30 e seg. e minuto 00:30:00 e seg.) e da testemunha S… (aos minutos 00:49:55 e seg., minuto 00:53:00 e seg. e minuto 01:21:00 e seg.).

E) – Ademais, embora tenha sido confirmado pelas testemunhas acima identificadas que havia algumas divergências quanto às horas faturadas pela “W…” alocadas a cada uma das ações desenvolvidas nos clientes, tal facto não é suficiente para afastar a materialidade e efetividade dos serviços prestados, apenas relevando para efeitos de quantificação dos serviços prestados.

F) – De facto, a materialidade dos serviços prestados resulta ainda do depoimento de I…, legal representante da sociedade “U…, Lda,” aos minutos 02:06:20 e seg. e minuto 02:08:47 e seg.

G) – Relativamente à motivação da matéria de facto, e em concreto nas declarações de parte prestadas por J…, não é feita qualquer menção de desconsideração das mesmas declarações por falta de isenção ou rigor ou por imparcialidade notória, logo, a douta sentença deveria ter tido em consideração tais declarações na sua íntegra, para efeitos de factos provados e não provados.

H) – Designadamente, deveriam ter sido valoradas as declarações de parte entre os minutos 02:23:50 e 02:28:29; entre os minutos 02:29:15 e 02:31:15; entre os minutos 02:38:00 e 02:42:00, e ainda aos minutos 02:43:00 a 02:45:30.

I) – Dos transcritos depoimentos, conjugados com os documentos juntos à p.i. (documentos 14 a 34, que documentam os serviços prestados em cada um dos clientes), aliados aos factos provados nos pontos 6., 9., 10., 13. e 14. do probatório, resulta, assim, que deveria ter sido considerado provado o seguinte facto: “A “W…” prestou os serviços cujos custos se encontram registados na contabilidade da Impugnante”.

J) – Quanto ao facto dado como não provado relativo ao fornecedor “V…, Lda.”, “VCL” ou “RIP 2000”, importaria uma decisão diversa na douta sentença recorrida, face às declarações de parte prestadas por J…, as quais, como supra se disse, não devem ser desconsideradas por não se lhe poder assacar indícios de inveracidade ou falta de rigor (minutos 02:4:30 a 02:50:00).

K) – As declarações prestadas, supra identificadas, conjugadas com os documentos 35 a 37 juntos com a p.i. (de cujo teor resulta a prova dos orçamentos e das subsequentes faturas e a prova dos meios de pagamento), impunham que fosse dado como provado o seguinte facto: “A sociedade “V…, Lda.”, “VCL” ou “RIP 2000” forneceu à Impugnante material publicitário, cujo custo se encontra registado na contabilidade da Impugnante.”

L) – Por último, entende-se também como desacertada a decisão recorrida ao dar como não provado os custos dos serviços fornecidos por C….

M) – Por um lado, a valoração deste facto como não provado está em contradição com o facto provado no ponto 21. do probatório.

N) – Por outro lado, foram desconsiderados os documentos 39 e 40 juntos à p.i., meios de prova estes aptos a confirmar este facto, sem ter sido apresentada motivação justificativa para esta omissão de aceitação/rejeição dos mesmos.

O) – Foram também desconsiderados o testemunho de V…, representante da sociedade “S…, Lda.” e as declarações de parte de J… e de C….

P) – Designadamente relevam para a correta apreciação dos factos as declarações credíveis e isentas de C…, atinentes a factos pessoais por si praticados enquanto fornecedora da Recorrente com a designação comercial de “R…”, aos minutos 03:02:50 e seg., minutos 03:03:40 e seg..

Q) – Das passagens dos minutos 03:08:03 a 03:09:00 resulta afastada a presunção errónea da AT de falta de estrutura empresarial, que serviu para fundamentar a correção fiscal, o que, claramente se conclui não ter suporte fáctico e, portanto, não corresponder à verdade.

R) – No depoimento prestado por V…, representante da sociedade “S…, Lda.”, foram confirmados em concreto quais os produtos de design adquiridos à Recorrente, e da autoria dos mesmos por “R…” (aos minutos 01:52:42 a 01:57:00).

S) – Acresce, também, considerar como meio de prova as declarações de parte de J… que asseveram os anteriores depoimentos (aos minutos 02:50:45 a 02:56:14).

T) – Em suma, a prova efetuada nos autos permite concluir, com certeza, que os serviços concretamente descritos nas faturas foram efetivamente efetuados pela fornecedora C…, que usa o nome comercial “R…”; que foram objeto de posterior apresentação e contratação por parte dos clientes da Recorrente, nomeadamente da S…; e que foram pagos, pelo menos parcialmente.

U) – Pelo que, na douta sentença recorrida deveria ter sido dado como facto provado que: “C… prestou os serviços cujos custos se encontram registados na contabilidade da Impugnante.”.

V) – Em suma, as provas apresentadas pela Recorrente, sejam documentais sejam testemunhais, permitem aferir, por um lado, a materialidade e efetividade dos serviços e bens adquiridos, cujos custos foram contabilizados e que concorreram para a formação da matéria tributável do período 2011.

W) – Donde, dando-se como provado que a “W…”, a “V…, Lda.”, “VCL” ou “RIP 2000” e C… prestaram os serviços e venderam os bens que se encontram registados na contabilidade da Recorrente, não poderia ser afastado o direito à dedução dos custos fiscais em sede de IRC, como erroneamente se concluiu na sentença recorrida, por força da errónea apreciação da prova e da errónea valoração de factos como não provados.

X) – O TJUE tem vindo a produzir jurisprudência, em sede de IVA, no sentido em que a administração fiscal, para recusar a dedução, tem de demonstrar uma situação de fraude e a ausência de boa-fé por parte da empresa que adquiriu os bens em causa, e que esse direito à dedução não pode ser negado pelo facto do adquirente não possuir uma certificação documental de que o fornecedor/prestador de serviços dispunha dos bens em causa e estava em condições de os fornecer e tinha cumprido as suas obrigações de declaração e pagamento do imposto sobre o valor acrescentado.

Y) – Ora, a interpretação efetuada nas normas fiscais do IVA é passível de se adequar aos custos, suportados em sede de IRC.

Z) – A douta sentença não entendeu que era exigível à AT a prova de que a adquirente dos serviços foi parte ativa do acordo simulatório do negócio ou de uma parte do negócio ou que atuou de forma negligente em relação à atuação que lhe é imposta pela lei e pelos costumes comerciais, contudo, tal posição, é contrária ao entendimento da jurisprudência comunitária no que toca ao direito à dedução do IVA, e por maioria de razão, à dedução dos custos suportados com a aquisição de bens e serviços essenciais à obtenção do rendimento.

AA) – Como ficou provado, a Recorrente adquiriu os serviços e bens dos identificados fornecedores e as faturas emitidas por estes titulam prestações de serviços e aquisição de bens efetivas, daí conclui-se ser ilegal a desconsideração dos custos suportados, o que significa que a douta decisão recorrida não poderá manter-se, devendo ser revogada e consequentemente anulada a liquidação de IRC e juros compensatórios, do ano de 2011.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, anulando-se a liquidação de IRC e juros compensatórios, relativas ao exercício de 2011.”


***

A Recorrida DRFP optou por não apresentar contra-alegações.

***

O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) teve vista nos termos do artigo 146.º do CPTA e emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

***

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

***

II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

“Com relevância para a decisão a proferir, resultam provados os seguintes factos:

1. A coberto da ordem de serviço n.º OI20…, os serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças de Leiria realizaram uma ação de inspeção à Impugnante, C…, Lda. que incidiu sobre o ano de 2011 – cf. fls. 1 e 2 e Relatório de Inspeção Tributária, adiante RIT, a fls. 48 a 79 do Volume I do processo administrativo apenso aos autos, em suporte físico, adiante PA.

2. A ação de inspeção decorreu inicialmente para controlo declarativo, em sede de IVA e posteriormente passou a ter âmbito geral - cf. fls. 1 e 2 e RIT, a fls. 48 a 79 do PA- Volume I.

3. A Impugnante dedica-se à atividade de prestação de serviços de consultoria, apoio à gestão, conceção e desenvolvimento de novos produtos e formação – por acordo.

4. No âmbito da sua atividade, a Impugnante celebrou com a sociedade “E…, Lda.” [adiante designada E…] um contrato de prestação de serviços de consultoria nas áreas da qualidade, segurança e saúde no trabalho e ambiente, a efetuar em entidades identificadas por esta última, a partir 01.01.2010 – cf. doc. n.º 2 junto à PI.

5. A Impugnante implementava projetos desenvolvidos pela E…, comparticipados por fundos comunitários, nomeadamente no âmbito do QREN e do projeto PRIME - cf. depoimento da testemunha L….

6. Para assegurar o cumprimento desse contrato, a Impugnante subcontratou outras entidades, nomeadamente nas áreas da programação de computadores e da desmaterialização de processos – cf. depoimento das testemunhas L… e S….

7. As referidas prestações de serviço eram faturadas pela Impugnante à empresa E…, Lda., de acordo com o preço acordado, conforme orçamento prévio – cf. doc. n.º 3 junto aos autos com a PI.

8. Nos descritivos das faturas emitidas pela Impugnante à E… consta o nome das entidades onde foram implementados os projetos, o tipo de serviço de consultoria, o respetivo valor e o mês da prestação do serviço – cf. doc. n.º 4 junto aos autos com a PI.

9. No ano de 2011, a Impugnante outorgou uma “proposta/contrato de colaboração em regime de consultoria e auditoria informática” que apresenta um cronograma que refere 8 projetos identificados por um número e pelas horas atribuídas aos mesmos e pelo valor de € 90,379/hora, acrescido de IVA, em 17.01.2011, referindo-se em adenda que “os projectos definidos na proposta abaixo mencionada, serão atualizados de acordo com o registado no relatório de execução (…)” – cf. docs. n.º 5 e 6 juntos aos autos com a PI, complementado com as declarações de parte de J…..

10. A “proposta/contrato” em causa mostra-se apresentada e outorgada por N… que se apresentou como dono e gerente da “W…” - cf. docs. n.º 5 e 6 juntos aos autos com a PI, complementado com as declarações de parte de J….

11. A referida “proposta/contrato” mostra-se apresentada à Impugnante em nome da “W…, Lda” - cf. docs. n.º 5 e 6 juntos aos autos com a PI, complementado com as declarações de parte de J….

12. Na mesma “proposta/contrato” a proponente também aparece designada como “W…, Lda”, com indicação do NIPC 509…….” (adiante, “W…”) - cf. docs. n.º 5 e 6 juntos aos autos com a PI, complementado com as declarações de parte de J….

13. Mensalmente, a “W…” emitia uma nota de honorários e era realizada uma reunião entre a Impugnante e a “W…” para avaliação da execução dos trabalhos efetuados por esta – cf. depoimento das testemunhas L… e S… e declarações de parte de J….

14. A impugnante apontou divergências quanto às horas imputadas pela W… a cada cliente e solicitou-lhe a retificação das horas faturadas em excesso – cf. depoimento das testemunhas L… e S… e declarações de parte de J….

15. Apesar das solicitações da impugnante, a W… nunca emitiu as notas de crédito relativas às horas faturadas em excesso – cf. declarações de parte de J….

16. A “W…” emitiu à Impugnante 3 faturas, com data de vencimento em 2011, nos montantes de €3.025,00, €65.497,50 e €42.644,10 (com IVA), constando no descritivo da primeira “prestação de serviços de consultadoria” e das segunda e terceira “prestação de serviços de consultadoria, e auditoria” – cf. doc. 10 junto aos autos com a PI.

17. No ano de 2011, a Impugnante efetuou pagamentos parciais das faturas emitidas pela “W…”, através de cheques que no verso apresentam um carimbo da W…, a assinatura de R… e outra assinatura ou carimbo – cf. docs. n.ºs 11 e 12 juntos aos autos com a PI.

18. Entre janeiro e junho de 2011 a “W…” emitiu 8 relatórios de execução de cada um dos projetos identificados por um número, com o número de horas despendidas em cada um, nenhum destes números coincidentes com o número atribuído aos 8 projetos a que se refere o ponto 9. Supra – cf. doc. 13 junto aos autos com a PI.

19. Em 24.03.2011, a “V…, Ld.ª” ou “RIP 2000” emitiu a fatura n.º 5…. à impugnante, no valor global de 22.140,00€, com IVA incluído, constando do descritivo da fatura “Criação/impressão cartazes, brochuras, pastas e agendas”, “Quant. - 1 - Preço - 18.000,000” – cf. doc. a fls. 483 do PA – Volume II.

20. A impugnante emitiu 2 cheques no valor global de 18.000,00€ à ordem de V…, Ld.ª, durante o ano de 2011 – cf. docs. a fls. 484, 485, 486 e 487 do PA – Volume II.

21. C… desenvolveu projetos na área da decoração para clientes da Impugnante, nomeadamente para a S… - cf. depoimento da testemunha V….

22. C… elaborou uma proposta de trabalho à impugnante que não contém assinatura, valor ou data ou indicação do efetivo destinatário do produto – cf. doc. a fls. 563 do PA – Volume II.

23. C… emitiu à Impugnante, no ano de 2011, as faturas n.ºs 179, 180, 181, 182 e 183, no valor total de € 104.458,37 com IVA incluído que integram o descritivo, respetivamente de Código 773……. - Conceção e Protótipo de Linha de Mobiliário; Código 773….. - Conceção e Protótipos de Linha de Mobiliário-Sala; Código 773…… - Conceção e Protótipos de Linha de Mobil. Quartos; Código 773…. - Conceção e Protótipos - Linha Mobil. Sala I e II; Código 773…. - Desenvolvimento de Linha de Mobiliário e Decoração Hotel Angola – cf. docs. a fls. 536v., 537, 537v., 538 e 538v. do PA – Volume II.

24. As faturas emitidas por C… à Impugnante não eram pagas na totalidade – cf. RIT, documentos a fls. 539 a 562 do PA – Volume II e declarações de parte de C….

25. No ano de 2011 foi feita uma correção de saldos com base num documento interno, apenas com a indicação de “correção de saldos” que se traduziu nos seguintes movimentos contabilísticos: “Débito: conta 221…. – C… - €80.052,60; conta 1…. - BPN - €186.661,24; conta 25….. – J…. - €18.227,81; Crédito: conta 2…… - BPN - 100.000,00; Outras contas de clientes (21) e funcionários (23) - 184.941,65” – cf. RIT e documentos anexos a fls. 507v. do PA – Volume II.

26. No ano de 2011, a impugnante contabilização na conta 62….. – Deslocações, diversos documentos relativos a deslocações, entre os quais gastos titulados unicamente com um “MAPA DE VIAGEM AO SERVIÇO DA EMPRESA” – cf. RIT a fls. 376v do PA – Volume III.

27. Os referidos Mapas, elaborados em Excel para os meses do ano de 2011, não se encontravam assinados nem preenchidos, não contendo indicação, nomeadamente quanto: ao motivo da deslocação, o funcionário que se deslocou, a viatura em causa - cf. fls. 35 a 44, do Anexo ao relatório ponto III.2-Outros III.2.1.- Deslocações, a pág. 765 do SITAF, cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos.

28. Em 10.02.2015, na sequência da ação de inspeção referida no ponto 1. supra, foi elaborado o Relatório de Inspeção Tributária [RIT] em nome da impugnante, do qual consta o seguinte: “(…)

“(…) III - Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria tributável

No decorrer da ação inspetiva constatou-se a contabilização de diversos documentos relativos a aquisições de serviços a terceiros de montantes elevados que nos suscitaram algumas dúvidas relativamente à efetiva realização dos trabalhos mencionados nesses documentos.

Por esse motivo procedemos a uma análise mais aprofundada dos referidos documentos, dos meios de pagamento utilizados e de outros elementos solicitados ao SP e aos emitentes desses documentos.

Acresce que relativamente a um desses emitentes, no decorrer da ação inspetiva, veio a Direção de Finanças do Porto remeter-nos o oficio n.º 37…., já mencionado, e no qual refere que a análise efetuada à empresa W… Services, Lda:

“… leva à conclusão inevitável que as faturas que emitiu não representam efectivas prestações de serviços, sendo a actividade desta empresa nula ou, na melhor das hipóteses, residual.”

A análise dos restantes elementos da contabilidade evidenciou-nos a contabilização de alguns documentos suscetíveis de virem a originar correções para efeitos de IRC e IVA.

III. 1- Factos e valores que indiciam a prática de crime fiscal

III.1.1. – W…

O nome “W…” respeita a duas entidades distintas:

- W… Lda – NIPC 509….

- W… Unipessoal Lda – NIPC 507….

Ambas as entidades têm a sua sede na Rua Dr. C…, 2… – … – Sala …. – Maia.

III.1.1.1. – W… Lda – NIPC 509…….

Consultados os elementos existentes no cadastro da AT (Autoridade Tributária e Aduaneira), apurou-se que a W…, Lda iniciou a sua atividade em 22/04/2010, tendo cessado para efeitos de IRC (cessação oficiosa) e IVA em 05/02/2014, nos termos previstos no n.º 6 do art.º 8º do CIRC e no n.º 2 do art.º 34º do CIVA, respetivamente.

(…)

III.1.1.1.1 - Informação enviada pela Direção de Finanças do Porto

Analisada a informação que nos foi enviada pela Direção do Finanças do Porto bem como a informação relativa à inspeção realizada à W…, Lda, constataram-se aí, além dos já referidos, os seguintes factos relevantes:

-1- “… esta empresa somente dispôs de 2 funcionários ao longo da sua existência, para além da sócia gerente, sendo que J… laborou somente entre Maio e Setembro de 2010 e P… entre Maio de 2010 e Maio de 2011.”

-2- “… a partir de Maio de 2011, somente a sócia gerente constava na folha de vencimentos da empresa, …”

-3- “… o que não impediu esta de, ainda sem qualquer funcionário com conhecimentos técnicos de telecomunicações, facturar €385.728,00 de diversos serviços: assistências técnicas, comissões de angariação de clientes, prestação de serviços de consultoria, etc…”

-4- “… mesmo quando … dispunha de um funcionário com, supostamente conhecimentos técnicos (P…) … entre Novembro de 2010 e Maio de 2011, a empresa facturou € 592.440,09…”

5- “… Em suma, … somente com a socia gerente e mais dois, um ou nenhum funcionário, facturou cerca de um milhão de euros relativamente aos mais variados serviços.”

-6- “…. Foram notificados os principais clientes da W… … Lda … ainda que tenham sido emitidas várias faturas com serviços de auditoria, consultoria, formação, nenhum deixou o mínimo rasto: não houve um único cliente que apresentasse um relatório, ponto de situação, manual, folha de presença, ou qualquer outra prestação que comprovasse a prestação dos serviços em causa;”

-7- “Um dos clientes apresentou cópia dos cheques utilizados para pagamento das facturas em causa onde se verifica claramente que foi o marido da sócia gerente do cliente em questão o destinatário do dinheiro, sendo que outro emitiu cheques à ordem do sócio gerente;”

-8- “Alguns clientes, ao receberem a notificação da Autoridade Tributária … e ainda sem qualquer acção inspectiva iniciada, de imediato regularizaram a sua situação tributária, entregando declarações periódicas de substituição de IVA e declarações de rendimentos de IRC de substituição, onde desconsideravam as faturas emitidas pela W …”

-9- “… nos computadores da W… … Lda, não constavam quaisquer emails recebidos ou enviados aos seus clientes relativos aos supostos serviços a estes prestados.”

-10- “Quanto aos pagamentos dos clientes, verifica-se os cheques destes são, na sua maioria, levantados ao balcão ou, quando depositados ou aqueles pagamentos efetuados por transferência bancária, são de imediato levantados da conta, perdendo-se o rasto do dinheiro.”

-11- “Em suma, estamos na presença de uma empresa que com dois, um ou, na maior parte do tempo … sem funcionários com conhecimentos técnicos de telecomunicações, alega ter prestado diversos serviços que, pela sua especificidade, necessitariam de muita mão-de-obra para a sua execução… a análise da Autoridade Tributária … leva à conclusão inevitável que as facturas que emitiu não representam efetivas prestações de serviços, sendo a actividade desta empresa nula ou, na melhor das hipóteses residual. De resto a conclusão que a quase totalidade destas facturas não titula qualquer prestação de serviços real é demonstrada pela prontidão com que alguns dos clientes circularizados regularizou a sua situação tributária.”

III.1.1.1.2. - Proposta/contrato realizada entre a W… , Lda e a C…, Lda.

Foi-nos ainda enviada fotocópia de uma proposta/contrato no verso da qual se encontra um mail do Sr. N…, que se identifica como “Director Geral da W…, Lda”, e através do qual este informa o Sr. J… da sua impossibilidade de se deslocar à Marinha Grande, indicando que em sua substituição deslocar-se-ia um colaborador de nome R…. Este mail tem data de 6 de Dezembro de 2010.

Releve-se que o Sr. N… (nif 198…….) foi identificado na informação efetuada pela Direção de Finanças do Porto como marido da D. R…. e gerente da W…, Lda e da W…, Unipessoal, Lda., além de outras empresas.

Relativamente ao Sr. R… desconhecemos quem seja e quais as suas funções.

Por consulta ao cadastro da AT não detetámos a comunicação do pagamento de qualquer valor a nenhum dos 2 quer a título de trabalho dependente (categoria A), quer a título de trabalho independente (categoria B), por parte da W….

(…)

Junto com esta proposta a DF do Porto enviou-nos ainda os seguintes elementos:

- Fotocópias das faturas n.º:

- 201…..: €65.497,50;

- 201…..: €42.744,10;

- 201…..: €3.025,00;

- Extratos de conta corrente da C…, Lda relativos ao fornecedor 22……50 – W…, Lda – nipc 509….;

- Extratos bancários da conta n.º 21….., onde são identificados alguns cheques emitidos nos quais foi manualmente escrito “cheque w….” e “pagamento w….”;

- Anexaram também fotocópias de vários cheques emitidos à ordem da W…, TODOS assinados no verso, facto que prova o levantamento imediato, em dinheiro, dos valores indicados nos cheques.

(…)

III.1.1.3.1. – Elementos recolhidos na C…, Lda.

No decorrer da acção inspetlva à C… constatou-se a contabilização das seguintes faturas emitidas pela W…, Lda:

«Imagem no original»

NOTAS:

No descritivo das faturas constam os seguintes e eventos:

a) Referencia 900000 - Prestação de serviços de consultoria:

b) Referencia 900000 - Prestação de serviços de consultoria e auditora:

c) Referencia 900000 - Prestação de serviços de consultoria e auditoria.

Apurou-se ainda a contabilização dos seguintes cheques:

«Imagem no original»

NOTAS:

1 - Em alguns casos temos em nosso poder fotocópias frente e verso dos cheques, nem sempre completamente legível. O SP já foi notificado para apresentar fotocópias frente e verso dos cheques não o tendo efetuado até à presente data;

2 - Estes cheques encontram-se contabilizados através de fotocópia simples dos mesmos. Não se encontrou na contabilidade qualquer nota de pagamento, de envio de cheques, correspondência ou qualquer outro documento que prove o efetivo envio dos cheques à W…;

3 - Encontrando-se também a decorrer ação inspetiva relativamente ao ano de 2012 procedeu-se à análise da conta corrente nesse ano, tendo-se apurado que relativamente à W…, II foram efetuados os pagamentos acima referidos não se tendo detetado a contabilização de qualquer fatura (da W…, II) neste ano;

4- Foram os seguintes os cheques emitidos:

a) Este lançamento, 04012, registado na contabilidade em Abril de 2011, tem anexo um cheque no valor de €4.140,00 que de acordo com a classificação contabilística teve como destino a W…, Lda.

Todavia o valor contabilizado na conta corrente não foram os €4.140,00, mas sim €4.032,50. Conforme já se referiu relativamente à W… Unipessoal, Lda. encontra-se também incluído neste lançamento o suposto pagamento do montante de €8.215,00 em vários cheques.

Adicionando estes 2 valores obtém-se o montante de €12.247,50, valor este exatamente igual ao IVA da fatura n.º 201……, datada de 21/02/2011, e que deveria ser entregue pela W…. nos cofres do estado até 10/04/2011.

Releve-se ainda que o cheque encontra-se carimbado e assinado no verso, situação que é indicadora de que o mesmo foi levantado ao balcão, facto que não nos permite identificar o destino efetivo do dinheiro;

b) Este cheque, datado de 03/08/2011, foi emitido à “W…” pelo valor de €7.974,00, que corresponde ao valor do IVA da fatura n.º 2010046 (€0,10 de diferença), datada de 07/06/2011, e que deveria ser entregue pela W… nos cofres do estado até 10/08/2011.

Releve-se ainda que neste caso, tal como no anterior, o Cheque se encontra assinado e carimbado no verso, facto que é indicador de que o mesmo foi levantado ao balcão, não nos sendo por isso possível identificar o destino efetivo do dinheiro;

c) Relativamente a este cheque temos em nosso poder fotocópia da frente, fotocópia frente e verso extrato bancário onde consta o levantamento do cheque ao balcão.

Na fotocópia deste cheque (n.º 845……….), apenas da frente, este tem aposta a data de 01/08/2008. Na fotocópia da frente e verso, identifica-se com alguma dificuldade, a data de 01/08/2011. Releve-se que o nº do cheque é perfeitamente identificável numa fotocópia e noutra.

O cheque foi emitido à “W… Unipessoal Lda” pelo valor de €9.600,00. Em anexo encontra-se um extrato bancário onde é possível constatar que em 03/08/2011 o valor em causa foi retirado do banco através do “Cheque Caixa N.º 53…….”, expressão que significará que o valor deste cheque foi levantado ao balcão da entidade bancária emitente, no caso o BPN - Banco Português de Negócios. Desconhecemos qual a fatura que se pretendia pagar.

d) Tal como no caso anterior, relativamente a este cheque temos em nosso poder fotocópia da frente, fotocópia frente e verso extra to bancário onde consta o levantamento do cheque ao balcão.

Na fotocópia deste cheque (n.º 865………), apenas da frente, este tem aposta a data de 03/08/2008. Na fotocópia da frente e verso, identifica-se com alguma dificuldade, a data de 03/08/2011. Releve-se que o n.º do cheque é perfeitamente identificável numa fotocópia e noutra.

O cheque foi emitido à “W… Unipessoal Lda.” pelo valor de €5.850,00. Em anexo encontra-se um extrato bancário onde é possível constatar que em 03/08/2011 o valor em causa foi retirado do banco através do “Cheque Caixa N.º 54……”, expressão que significará que o valor deste cheque foi levantado ao balcão da entidade bancária emitente. no caso o BPN - Banco Português de Negócios. Desconhecemos qual a fatura que se pretendia pagar.

e) Tal como nos casos anteriores, relativamente a este cheque temos em nosso poder fotocópia da frente, fotocópia frente e verso extrato bancário onde consta o levantamento do cheque ao balcão.

Este cheque, datado de 29/07/2011, foi emitido à “w…” pelo valor de €4.000,00. Em anexo encontra-se um extrato bancário onde é possível constatar que em 03/08/2011 o valor em causa foi retirado do banco através do “Cheque Caixa N.º 53……”, expressão que significará que o valor deste cheque foi levantado ao balcão da entidade bancária emitente, no caso o BPN - Banco Português de Negócios.

Desconhecemos qual a fatura que se pretendia pagar.

f) Relativamente a este lançamento 100001 este encontra-se documentado com uma fotocópia do cheque n.º 675……, datado de 20/12/2011, no valor de €12.837,50.

Todavia o lançamento efetuado na contabilidade, em 01/10/2011, é do montante de €12.873,51.

Tal como nos casos anteriores, relativamente a este cheque temos em nosso poder fotocópia da frente, fotocópia frente e verso extrato bancário onde consta o levantamento do cheque ao balcão.

Este cheque, datado de 20/12/2011, foi emitido à “W…” pelo valor de €12.837,50. Em anexo encontra-se um extrato bancário onde é possível constatar que em 06/01/2012 o valor em causa foi retirado do banco através do "Cheque Caixa N.º 54…..", expressão que significará que o valor deste cheque foi levantado ao balcão da entidade bancária emitente, no caso o BPN - Banco Português de Negócios.

Desconhecemos qual a fatura que se pretendia pagar.

g) Este lançamento 010016, efetuado já no ano de 2012, encontra-se o cheque mencionado na alínea anterior, constatando-se por isso que o mesmo foi contabilizado em duplicado;

h) Relativamente a este cheque, n.º 615……., datado de 03/01/2012, foi emitido à “W…” pelo valor de €10.000,00. Tal como nos casos anteriores, relativamente a este cheque temos em nosso poder fotocópia da frente e fotocópia frente e verso.

Releve-se ainda que neste caso, tal como em anteriores, o cheque se encontra assinado e carimbado no verso, facto que é indicador de que o mesmo foi levantado ao balcão, não nos sendo por Isso possível identificar o destino efetivo do dinheiro;

i) Tal como nos casos anteriores, relativamente a este cheque temos em nosso poder fotocópia da frente (rasurada na data), fotocópia frente e verso e extrato bancário onde consta o levantamento do cheque ao balcão.

Este cheque, datado de 05/12/2012, foi emitido à “W…” pelo valor de €12.837,00. Em anexo encontra-se um extrato bancário onde é possível constatar que em nessa mesma data o valor em causa foi retirado do banco através do "Cheque Caixa N.º 548….", expressão que significará que o valor deste cheque foi levantado ao balcão da entidade bancária emitente, no caso o BPN - Banco Português de Negócios. Desconhecemos qual a fatura que se pretendia pagar.

III.1.1.2. – W… Unipessoal Lda - NIPC 507…..

Consultados os elementos existentes no cadastro da AT (Autoridade Tributária e Aduaneira), apurou-se que a W… Unipessoal, Lda. iniciou a sua atividade em 19/12/2007.

O CAE principal é o 046410 - Comércio por grosso de têxteis.

Como CAE's secundários tem os seguintes:

- 046810 - Agentes especo o comércio por grosso de produtos;

- 070220 - Outras atividades de consultoria para os negócios e a gestão;

- 077390 - Aluguer de outras máquinas e equipamentos N.E.

Consultado o site público do Ministério da Justiça (https:/Ipublicacoes.mj.ptl) apurou-se ainda que a W… Unipessoal Lda. (inicialmente W…, Unipessoal Lda.) foi constituída em 14 de Dezembro de 2007 com um capital social inicial de (5.000,00 constituído por uma única quota pertencente R…. (NIF 261……). Foi também, na altura da constituição da sociedade, designada gerente a sócia R….

Em 03/10/2008 o capital social foi aumentado para (50.000,00, sendo que a diferença, (45.000,00 foi subscrita em dinheiro.

A sede foi nesta altura alterada para a Rua Dr. C…, … – …..º sala … - Maia.

Em 23/10/2008 foi alterada a designação social de W… para W…, Unipessoal, Lda.

III.1.1.2.1. - Informação enviada Dela Direção de Finanças do Porto

Analisada a informação que nos foi enviada pela Direção do Finanças do Porto, verifica-se que nela constam alguns factos relevantes relativos à W… unipessoal Lda. que passamos a referir:

(…)

III.1.1.2.2. - Inspeção realizada à W…. Unipessoal. Lda.

Da análise a esta informação apuraram-se ainda os seguintes factos além dos já referidos:

-1- “não declarante de IRC desde 2009 ... existindo ainda dividas de IVA ...”

-2- “… foi notificado a exibir a contabilidade ... findo o prazo ... não foi exibida ... para os três exercícios em análise (2008, 2009 e 2010) ...”

III.1.1.2.3. - Proposta/contrato realizada entre a W… Unipessoal. Lda e a C…, Lda.;

Ponto 2.1.

Foi-nos enviada pelo Sr. J… fotocópia de uma “2.1. - Proposta/contrato de colaboração em regime de consultaria e auditoria informática - prestação de serviços de consultoria (desmaterialização de processos e sistemas de gestão das empresas)”, entre a W… e a C….

Relevem-se as seguintes anomalias:

A primeira folha que serve de “capa” a esta proposta -se tem o seguinte descritivo:

“2 – W…, Unipessoal, Lda - nipc 507……..”;

a segunda folha tem o descritivo seguinte:

“2.1 - Proposta do fornecedor W…, Unipessoal Lda nipc 507…".

Relativamente à primeira folha da proposta esta tem o seguinte descritivo:

"W…”

e no fundo da página

“W… NIF-507…………. n…t...@w….pt”,

Estes últimos dados repetem-se em todas as páginas da “proposta”.

Constata-se pois que a C…, lda, que elaborou este "dossier" não conhece o nome correto de uma empresa a quem terá supostamente pago valores significativamente elevados.

(…)

Ponto 2.2.

De seguida, no ponto 2.2., são anexadas diversas “Notas de Honorários”, assinadas pelo Sr. N…, datadas de Janeiro de 2010 a Agosto de 2010 (releve-se uma vez mais que tal como na proposta estas notas de honorários são efetuadas em nome de “W…”, entidade que apenas tem inicio de atividade a 22 de abril de 2010).

Ponto 2.3.

No ponto 2.3. anexam-se documentos relativos a: “trabalhos realizados, com atas de reunião, processos elaborados e registos de presença de formação ministrada W… Unipessoal, Lda nipc 507….., onde são identificados os colaboradores N…, C… e M…”.

(…) identificam-se as seguintes empresas:

a) Construções T…

b) Ajo….

c) F…

d) N…

e) U….

f) C…

g) S…

(…)

III.1.2. – R…, Lda/V…, Lda - NIPC 505…...

Relativamente a esta empresa, identificada comercialmente nas faturas como “Rip 2000” e noutros documentos por “VCL”, mas cuja designação social é a acima referida, V…, Lda., constatou-se, relativamente ao ano de 2010, a contabilização de duas faturas, sendo que apenas uma foi registada na conta corrente do fornecedor e a outra foi registada diretamente em gastos por contrapartida da conta 1…. - Bancos sem qualquer registo em conta de terceiros.

Todavia, consultado o sistema informático da AT, constatou-se que este SP se encontrava cessado à data de 31/12/2005, nos termos previstos no artigo 34º, n.º 2 para efeitos de IVA e para efeitos de IRC nos termos previstos no artigo 80, n.º 6:

“Independentemente dos factos previstos no número anterior, pode ainda a administração fiscal declarar oficiosamente a cessação de atividade quando for manifesto que esta não está a ser exercida nem há a intenção de a continuar a exercer, ou sempre que o sujeito passivo tenha declarado o exercício de uma actividade sem que possua uma adequada estrutura empresarial suscetível de a exercer.”

III.1.2.1. - Análise dos elementos da “Rip2000” existentes na contabilidade da C… e pedido de elementos a esta última

Procedeu-se então à análise mais pormenorizada do extrato de conta deste fornecedor bem como das correspondentes faturas e meios de pagamento utilizados no ano de 2011, tendo-se apurado os seguintes factos:

«Imagem no original»

Notas:

a) Ver informação do ano de 2010;

b) Ver informação do ano de 2010;

c) No descritivo da fatura n.º 5…, que tal como a referida na alínea a), não se encontra assinada por ninguém, consta o seguinte:

- “Criação/impressão cartazes, brochuras, pastas e agendas”

- “Quant. - 1 - Preço - 18.000,000”;

A fatura foi lançada a débito de conta 62… - artigos para oferta (€18.000,00) e 243 - IVA dedutível (€4.140,00), e a crédito da conta 22111190 – R… Lda (€22.140,00);

Como meio de pagamento de parte do valor desta fatura constam da contabilidade 2 cheques dos seguintes valores:

- € 9.000,00 - Cheque n.º 94………

- emitido em nome de VCL;

- o cheque é datado de 11/07/2011 e foi lançado na contabilidade nessa data;

- 9.000,00 - Cheque n.º 06………

- emitido em nome de V… Lda.;

- o cheque é datado de 18/07/2011 e foi lançado na contabilidade nessa data;

Releve-se ainda que tal como no caso de alguns cheques emitidos em nome da W… se encontra junto ao mesmos um extrato da conta bancária onde, relativamente a cada um destes cheques, se identifica o descritivo "Cheque de caixa n.º 573…. e 583…..", expressão que, conforme já se referiu significará que o cheque foi levantado ao balcão do banco.

Perante os factos solicitou-se ainda ao SP que nos apresentasse adicionalmente os seguintes elementos:

a) Orçamentos, contratos ou outros documentos previamente formalizados entre a C., Lda. e os fornecedores indicados;

b) Correspondência trocada entre a C… Lda. e os fornecedores indicados;

c) Fotocópias autenticadas dos meios de pagamento utilizados [cheques (frente e verso), transferências

bancárias, notas de pagamento, etc.];

d) Identificação da(s) pessoa(s) contactadas em cada uma das empresas;

e) Outros elementos que considere relevantes que esclareçam e comprovem as operações realizadas entre a vossa empresa e aquelas entidades e que, em conformidade com a prova da realidade em relação às questões anteriores, seja também provada a imprescindibilidade dos referidos gastos, nos termos do artigo 23º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC).

Até à presente data não nos foram apresentados pelo SP outros elementos além dos recolhidos no decorrer da ação inspetiva.

III.1.2.2. Notificação dos sócios e gerentes da V…. Lda.

Na insuficiência de elementos e depois de se identificarem os sócios e gerentes da empresa através do cadastro da AT e dos dados existentes no Portal da Justiça (https://publicacoes.mj.pt/), procedeu-se à notificação dos responsáveis pela empresa, Srs. V… (sócio gerente), M… (sócia) e E… (sócia gerente).

A todos foram solicitados os seguintes elementos relativamente às faturas registadas na contabilidade da C…, Lda.:

“-1- Orçamento ou contrato efetuado previamente entre ambas as partes;

-2- Correspondência (cartas, mails ou outros), trocada entre ambos;

-3- Fotocópias autenticadas dos meios de pagamento [cheques (frente e verso), transferências bancárias, notas de pagamento, etc.];

-4- Explicar, comprovar e quantificar quais os trabalhos efetivamente realizados, nomeadamente:

- Elaboração e impressão de folhetos promocionais - € 9.000,00;

- Criação e impressão de material publicitário – €12.660,00;

- Criação/impressão cartazes, brochuras, pastas e agendas - €22.140,00

-5- Outros elementos que considere relevantes.”

Obtiveram-se as seguintes respostas:

V… e M… (cônjuges):

O Sr. V… respondeu-nos por mail a 22 de julho de 2014 através de uma carta assinada por ele e que nos foi enviada por um SP de nome E… e que se identificou como advogado.

Nessa carta foi referido o seguinte:

_ “…Não conhece a sociedade C…, “não tendo mantido” qualquer contacto com os legais representantes daquela sociedade ou com qualquer outro funcionário da mesma.”

_ “Desconhece se a referida sociedade executou qualquer trabalho para a sociedade sua representada, “desconhece a emissão das faturas n.º …5…...”

“... desde Agosto de 2005, data em que a sócia e também gerente E… entrou para a sociedade ... deixei de colaborar ou intervir ativamente ... esporadicamente deslocava-me às instalações da sociedade para assinar alguns módulos de cheque ...”

_ “... desde a data de Agosto de 2005, até à data em que foram entregues as chaves das instalações …, o que aconteceu no ano de 2011, foi sempre a sócia gerente E… ... que tomou todas as decisões relacionadas com a gestão e actividade da empresa ...”

_ “Aproveito a oportunidade para esclarecer que a sócia M… …, nunca trabalhou nem de alguma forma interveio ou agiu na actividade e na gestão da sociedade ... “

E…:

A D. E… respondeu-nos por mail a 9 de julho de 2014, depois de previamente nos ter contactado por telefone logo que recebeu a notificação.

Referiu o seguinte:

_ “... a empresa C… ... foi meu cliente na empresa V…, ... Lda., ... #

_ “Confirmo por isso que foram efetuados os trabalhos relativos às facturas em questão e que foram as mesmas pagas pela cliente ...”

_ “... não fazer prova dos pontos 1-2-3 e 4 pelos motivos que passo a descriminar:

_ comprei a quota da empresa em Agosto de 2005, fiz escritura e registo na Conservatória ..., _ em junho de 2011 vim a descobrir casualmente que a mesma tinha cessado a actividade ...

_ em setembro de 2011 voltei ás instalações para tentar resolver alguns assuntos, um deles com a Caixa Leasing, pois as instalações tinham sido compradas pela Empresa, dei com a mesma completamente vazia ... não possuo por isso qualquer documento ...”

Na sequência deste mail colocámos, também via mail, a seguinte questão à D. E…:

“Relativamente ao ponto 4, embora, como refere, não disponha de elementos comprovativos da realização dos trabalhos, seria possível identificar-me o nome dos funcionários da empresa que procederam à execução dos referidos trabalhos?”

A resposta obtida foi a seguinte:

“... quem me encomendava os trabalhos era o Eng. J…, não consigo lembrar-me do apelido”

Pretendia-se obviamente saber o nome dos funcionários da Rip200/VCL, pelo que voltámos a enviar novo mail à D. E… solicitando-lhe o seguinte:

“... o nome dos seus funcionários que procederam à execução dos trabalhos pedidos pela C….

Obteve-se então a seguinte resposta: “... o nosso colaborador na altura era o Sr. J… que fez uma parte do trabalho em parceria com a empresa A… que fez a outra parte.”

Na sequência da resposta da D. E… procedemos ao contacto dos responsáveis pela elaboração da contabilidade da empresa A…, Lda (NIPC 504……..), entretanto cessada para efeitos de IVA em 30/06/2013, solicitando-lhe o envio de extrato de conta corrente do ano de 2010 e seguintes.

Através de mail foram-nos remetidos extratos da conta 21……. – V…, Lda. dos anos de 2009, 2010 e 2011, constatando-se a existência dos seguintes registos na contabilidade:

- Ano de 2009:

- Pagamento do valor de €4.500,00 referente ao saldo do ano anterior:

- Débito da fatura n.º 4….. no valor de 004,00

Nota:. Como referimos a ordem de serviço é relativa ao ano de 2010. Entendemos, no entanto, incluir aqui este comentário relativamente ao ano de 2009 a fim de evidenciar que também neste ano não se encontrou na contabilidade o registo de qualquer movimento relevante com a C…, Lda.

- Ano de 2010:

- Sem movimento, mantendo-se o valor de €204,00 em divida;

- Ano de 2011:

- Sem movimento, mantendo-se o valor de €204,00 em divida;

Não foram solicitados mais elementos à D. E….

Releve-se que além dos esclarecimentos fornecidos por mail não nos foram efetivamente apresentados quaisquer elementos comprovativos da realização dos trabalhos mencionados nas faturas.

III.1.2.3. - Análise

Face aos factos apurados e tendo em consideração os elementos recolhidos da contabilidade do SP, bem como os restantes já referidos, constata-se que:

- Ao longo dos anos de 2010 e 2011 foram emitidas pela Rip2000, VCL-V…, Lda. faturas com IVA incluído no montante de €43.800,00;

No que se refere à tatura n.º 5… (relativa ao ano de 2011), no valor de €22.140,00, foram emitidos 2 cheques em nome da VCL, que pela análise aos extratos bancários nos permitem constatar terem sido levantados ao balcão do banco, desconhecendo-se por isso qual o destino efetivamente dado aos seus valores. Os cheques tinham o valor de €9.000,00 cada um, ficando o restante valor por pagar.

- Dos elementos adicionalmente pedidos ao SP não nos foram ainda entregues nenhuns dos elementos solicitados.

- Um dos sócios da empresa refere que desconhece a C… Lda.;

- A outra sócia, embora refira que os trabalhos foram realizados em colaboração a empresa “A…”, consultada essa empresa, nada consta na sua contabilidade nos anos em análise que indique a realização de qualquer trabalho para a VCL Lda. nos anos de 2010 e 2011.

Acresce que a sócia da VCL, Lda. não nos apresentou na nenhum dos elementos solicitados que prove a efetiva realização dos trabalhos mencionados nas faturas.

Não temos por isso qualquer prova da realização dos trabalhos mencionados nas faturas, nem do efetivo pagamento das mesmas.

Considerando todos os elementos apurados, atendendo aos movimentos efetuados na contabilidade da C…, Lda., bem como a sua falta de sustentação em termos contabilísticos, apenas podemos admitir que as faturas referidas, foram emitidas nos anos de 2010 e 2011 em nome de V…, Lda. para a C…, LDA, correspondem a meras operações fictícias, não consubstanciando a existência de qualquer transação efetiva, até porque a V…, Lda. não tinha quaisquer condições humanas, materiais e técnicas para realizar qualquer dos trabalhos mencionados nas faturas e já não exercia a sua atividade na data de emissão das faturas.

III.1.3. – C… - NIF 204……….

Consultado o sistema informático apuraram-se os seguintes factos relativamente ao SP C… - nif 204……………:

- É, conforme já se referiu sócia gerente da C…, Lda.;

- Foi, pelo menos até 31/12/2011, cônjuge do outro sócio gerente da C…, Lda., Sr. J…;

- Encontrava-se enquadrada (no caso até 25/06/2013 - data em que cessou) no CAE 047593 - Comércio a retalho de outros artigos para o lar, n.e., em estabelecimentos especializados, não tendo mais qualquer outro enquadramento e foi sempre este CAE que mencionou nas suas declarações fiscais nos anos de 2009, 2010 e seguintes.

III.1.3.1. - Análise dos elementos existentes na contabilidade da C…

Relativamente a este fornecedor constatou-se a contabilização das seguintes faturas:

«Imagem no original»

NOTAS: No descritivo das faturas constam os seguintes elementos:

a) ver informação do ano de 2010;

b) Código 773…… - Concepção e Protótipo de Linha de Mobiliário - 24.925,50;

c) Código 773…… - Concepção e Protótipos de Linha de Mobiliário-Sala - 10.850,00

d) Código 773…… - Concepção e Protótipos de Linha de Mobol -Quartos - 12.560,00;

e) Código 773…… - Concepção e Protótipos - Linha Mobil. Sala I e II - 16.590,00;

f) Código 773……. - Desenvolvimento de Linha de Mobiliário e Decoração Hotel Angola – 20.000,00.

A todos estes valores acresceu IVA.

Apurou-se ainda a contabilização dos seguintes valores a título de supostos pagamentos das faturas:

NOTAS:

a) Este valor, €62.740,00, foi registado fia contabilidade a título de pagamento à D. C…. O único documento que se encontra na contabilidade a justificar este lançamento é um extrato bancário da conta 21………, que de acordo com a contabilização efetuada, será uma conta do BPN - Banco Português de Negócios.

Manualmente encontra-se escrito: “62.540 € - À C… - Período 2010-01-01 - 2010-09-14.”

Releve-se ainda que o descritivo que consta deste movimento é “Transferência entre Dos”. Ficamos por isso na dúvida se se trata de uma transferência de uma conta da C…, Lda para a D. C…, ou simplesmente de uma transferência entre contas da C…, Lda.;

b) Transferência do valor de €100,00 da conta 212……… para a conta 191……., sem mais qualquer explicação;

c) Relativamente a este ponto constata-se que foi efetuado, com base numa nota de contabilidade/ “documento de diversos” e apenas com a Indicação de “correcção de saldos”, o seguinte movimento contabilístico (lançamento 12037):

- Débito: conta 22…… - C… - €82.188,06

- Crédito: Conta 1……. - BPN - €82.188,06

Não há mais qualquer documento que explique ou fundamente este movimento.

Na prática o que este movimento nos Informa é que saíram da conta de bancos, na contabilidade, €82.188,06, sem que exista qualquer documento bancário a fundamentar este movimento que nos prove que este lançamento corresponda a efetivos movimentos contabilísticos e financeiros, mas sim a movimentos fictícios, não existindo por isso, relativamente ao caso em análise, qualquer prova do pagamento efetivo do valor de €82.188,06;

d) Em todos os casos, situação Idêntica à já referida na alínea b);

e) Tal como no caso da alínea c), constata-se que foi efetuado, com base numa nota de contabilidade/"documento de diversos" e apenas com a Indicação de "correcção de saldos", o seguinte movimento contabilístico (lançamento 120038 - ano de 2011):

- Débito: conta 2…… - C………. - €80.052,60

conta 1……. - BPN - €186.661,24

conta 25……… - J…………. - €18.227,81

- Crédito: conta ……….. - BPN - €100.000,00

Outras contas de clientes (21) e funcionários (23) - 184.941,65

Através deste lançamento, sem qualquer documento externo que o fundamente, pretende-se informar que se terá supostamente procedido a pagamentos ao fornecedor C…, ao banco BPN e ao sócio J…. Para o efeito terão sido utilizados valores recebidos do cliente A… (€154.306,81), do sócio J… (€22.321,22), dos valores referentes a salários dos sócios e dos funcionários (€5.134,80 + €3.178,82) e ainda €100.000,00 do BPN.

Tudo isto sem qualquer documento externo que suporte os referidos movimentos nas diversas contas. Entendemos por isso que este lançamento não se refere a efetivos movimentos contabilísticos e financeiros, mas sim a movimentos fictícios, não existindo por consequência, relativamente ao caso em análise, qualquer prova do recebimento ou do pagamento efetivo dos valores mencionados neste documento;

f) Em todos os casos, situação idêntica à já referida nas alíneas b) e d).

III.1.3.2. - Elementos enviados pelo fornecedor/sócio C…

Face aos factos analisados e tendo em consideração os elementos recolhidos da contabilidade do SP, entendeu-se que deveríamos proceder à notificação da sócia da empresa e também fornecedora, D. C… para nos apresentar os seguintes elementos:

“-1- Orçamento ou contrato efectuado previamente entre ambas as partes;

-2- Correspondência (cartas, mails ou outros), trocada entre ambos;

-3- Fotocópias autenticadas dos meios de pagamento [cheques (frente e verso), transferências bancárias, notas de pagamento, etc.];

-4- Indicação do destinatário efetivo dos trabalhos realizados (a quem se destinavam estes trabalhos);

-5- Explicar, comprovar e quantificar quais os trabalhos efetivamente realizados, nomeadamente:

- Desenvolvimento de linhas de mobiliário - € 0,00; - Quarto de criança - €6.250,00;

- Quarto de casal - €6.250,00; - Concepção e protótipo de linha de mobiliário - €24.925,50;

- Concepção e protótipo de linha de mobiliário - Sala - €10.850,00; - Concepção e protótipo de linha de mobiliário - Quartos - €12.560,00;

- Concepção e protótipo de linha de mobiliário - Sala I e II - €16.590,00; - Concepção e protótipo de linha de mobiliário - Hotel Angola - € 20.000,00;

-6- Outros elementos que considere relevantes.”

Na sequência desta notificação, efetuada em 03/07/2014, a D. C… entregou na Direção de Finanças de Leiria, em 19 de Setembro de 2014, duas pastas com diversas fotocópias, que de acordo com carta que juntou se referem a:

- Faturas n.º 17…,17…,18…,18…,18… e 18…; - Fotocópias de: - Orçamentos; - Detalhamento dos trabalhos; - Elementos de criação; - Elementos de estudo; - Materiais utilizados para prototipagem e benchmarking; - Transferências bancárias.

Analisadas as duas pastas de documentos constatou-se que o seu conteúdo era o seguinte:

Extrato da conta 19………….. - de 08/06/2010 a 31/12/2012

Esta conta tem diversos movimentos a debito e crédito, encontrando-se alguns sublinhados e com um "visto". Presumimos que a D. C… pretende desta forma informar-nos que estes movimentos se referem a recebimentos da C…, Lda.

Procedemos por isso à sua identificação e somatório, tendo-se obtido os seguintes valores relativamente a cada um dos anos de 2010,2011 e 2012:

2010 (…) 2011

2012

(…)

NOTA:

Conforme se constata, apesar de existirem alguns valores coincidentes nos montantes e nas datas de pagamento, existem claras divergências entre os valores que a D. C… indica ter recebido e os valores que a C…, Lda diz ter pago, bem como entre a comparação destes valores e os faturados pela D. C… à C… nestes 3 anos.

ORCAMENTOS e documentos anexos

De seguida é apresentado um orçamento datado de 05/01/2010 (n.º 2…) no valor de €15.000,00 (com iva incluída) e com “prazo de entrega: final de Dezembro” e outro datado de 21/12/2010 (n.º 2…) no valor de €104.458,36 (com iva incluído) e com "prazo de entrega: Dezembro 2011”.

Relativamente ao orçamento n.º 2… é apresentada uma “proposta de trabalho” ao “cliente C…”, não assinada, não valorizada e não datada. A essa proposta são anexadas diversas fotocópias de desenhos de diversas peças de mobiliário, sempre tudo em termos genéricos, sem qualquer indicação do destinatário efetivo do produto (identificação do cliente da C…).

São também apresentadas fotos de diversos tipos de quartos, resultado, segundo é referido de visitas a feiras nacionais e internacionais, não se sabe quais, são feitas análises swot, questionários (sem respostas) e outras fotocópias diversas.

No que se refere ao orçamento n.º 2….. os elementos que o constituem são idênticos aos do orçamento n.º 2…., não se identificando, pela análise dos documentos apresentados de onde decorrem os montantes a faturar/faturados à C…, Lda.

III.1.3.3. - Elementos apresentados pela C…

No decorrer da ação inspetiva o sócio gerente da C…, Sr. J…, apresentou-nos duas pastas relativas aos supostos trabalhos desenvolvidos pela D. C….

Da análise dessas duas pastas constata-se que a maioria dos elementos apresentados são os mesmos que já haviam sido apresentados antes pela D. C…, não existindo de facto elementos novos de relevo.

(…).

III.1.3.4. - Análise

Da análise efetuada constata-se que foram emitidas, no ano de 2010, pela D. C… à C…, Lda., uma fatura no montante global de €15.000,00, além de outras no valor global de €119.458,37 relativas ao ano de 2011.

A análise destas faturas, dos valores supostamente pagos, bem como dos justificativos da realização dos trabalhos apresentados quer pela C…, Lda., quer pela D. C…, constata-se que os elementos apresentados não são suficientes para que fique provada a efetiva realização dos trabalhos (…).

De facto, as referidas faturas, no caso emitidas nos anos de 2010 e 2011 pela D. C…, correspondem a meras operações fictícias, não consubstanciando a existência de qualquer transação/prestação de serviços efetiva, até porque a D. C… não teria qualquer estrutura empresarial, nomeadamente a nível de recurso humanos, técnicos ou outros que lhe permitisse realizar os trabalhos mencionados nas faturas, pois da análise efetuada aos anos de 2010 e 2011 constatou-se que nestes 2 anos teve ao seu serviço uma única funcionária de origem Russa e de nome S… (nif 243…….), pelo que não teria, por isso, quaisquer condições para realizar trabalhos dos referidos montantes, alguns dos quais requerem análises cientificas efetuadas por pessoas ou entidades devidamente habilitadas, recurso que, na análise declarativa efetuada a estes anos, não se detetou ter ocorrido.

(…)

III.1.5. - Resumo das correcções relativas aos indícios de crime e respetivos fundamentos legais

Na sequência da análise efetuada nos pontos anteriores constata-se que são as seguintes as correções a efetuar para efeitos de IRC e IVA:

IRC Correções

«Imagem mo original»

Fundamentação

No que se refere ao IRC, o artigo 23.º, na redação em vigor à data, refere que apenas podem ser considerados gastos do exercício:

“1. a) ... os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora ...”

o que não é manifestamente O caso dos valores mencionados nestas faturas, pois não temos qualquer prova da sua imputação a terceiros, clientes ou outros, não contribuindo por isso para a realização de qualquer rendimento sujeito a imposto nos anos em análise.

Acresce ainda que nos termos previstos no n, o 2 do artigo 23º do CIRC se refere que:

“2. Não são aceites como gastos as despesas ilícitas, designadamente as que decorram de comportamentos que fundadamente indiciem a violação da legislação penal portuguesa ...”

o que é manifestamente o caso, pois, da análise efetuada, constata-se que nos encontramos perante a emissão e utilização de “faturação fictícia”. Não poderiam por isso, nos termos previstos no art.º 23.º do CIRC, estes valores, nos montantes de €193.345,50 (ano de 2011), (…), serem consideradas para efeitos fiscais.

(…)

III. 2 - Outros

No decorrer da ação inspetiva detetaram-se outras situações suscetíveis de correção nos anos de 2011 e 2012/ que passamos a identificar de seguida.

III.2.1. - Deslocações

Relativamente às deslocações efetuadas pelo SP constataram-se nos anos analisados

situações distintas:

(…)

- No ano de 2011 recorreu à contabilização de mapas de Kms, sem qualquer identificação de viaturas nem de destinatário dos valores, sendo o valor médio mensal destes documentos €1.275,00;

(…)

Ano de 2011 - Conta 62…… - Deslocações

Nesta conta encontram-se contabilizados diversos documentos relativos a deslocações efetuadas pelo SP, entre os quais gastos titulados unicamente com um “MAPA DE VIAGEM AO SERVIÇO DA EMPRESA”.

Este mapa, efetuado em excell tem, em todos os meses do ano de 2011, os campos relativos ao “NOME”, “VIATURA” e “FUNÇÃO” sempre por preencher.

No campo “DATA” é indicado o mês, não se especificando em nenhum dos meses o local da “DESLOCAÇÃO”, o “MOTIVO DA VIAGEM”, nem a quantidade de “KMS” percorrida em cada um dos dias.

No final do mapa é indicado o valor global de Kms, o valor por kms (€0,36) e o valor total do mês.

o campo relativo à “ASSINATURA” encontra-se também por preencher, desconhecendo-se por isso quem foi o destinatário do valor bem como o tipo de despesa efetivamente realizada.

Releve-se que, conforme já se referiu, a empresa tem no seu ativo tangível 2 viaturas ligeiras de passageiros das marcas Skoda e Jaguar, não sendo nesta altura os sócios da empresa, Sr. J… e D. C… possuidores, de acordo com os dados que constam do cadastro da AT, nesta altura de qualquer veículo pessoal.

São os seguintes os documentos identificados:

Perante os factos analisados estes valores não podem ser considerados para efeitos de IRC, pois não cumprem 05 requisitos previstos nos artigos 23° e 45° do CIRC:

Artigo 23.º “- 1 - Consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente:

d) De natureza administrativa, tais como remunerações, incluindo as atribuídas a título de participação nos lucros, ajudas de custo, material de consumo corrente, transportes e comunicações, rendas, contencioso, seguros, incluindo os de vida e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de poupança - reforma, contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares da segurança social, bem como gastos com benefícios de cessação de emprego e outros benefícios pós- emprego ou a longo prazo dos empregados;

2 ~ Não são aceites como gastos as despesas ilícitas, designadamente as que decorram de comportamentos que fundada mente indiciem a violação da legislação penal portuguesa, mesmo que ocorridos fora do alcance territorial da sua aplicação ..”

Artigo 45° “- Não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como gastos do período de tributação:

f) As ajudas de custo e os encargos com compensação pela deslocação em viatura própria do trabalhador, ao serviço da entidade patronal, não facturados a clientes, escriturados a qualquer título, sempre que a entidade patronal não possua, por cada pagamento efectuado, um mapa através do qual seja possível efectuar o controlo das deslocações a que se referem aqueles encargos, designadamente os respectivos locais, tempo de permanência, objectivo e, no caso de deslocação em viatura própria do trabalhador, identificação da viatura e do respectivo proprietário, bem como o número de Quilómetros percorridos, excepto na parte em que haja lugar a tributação em sede de IRS na esfera do respectivo beneficiário;

g) Os encargos não devidamente documentados; ... "

Acresce ainda o referido no artigo 88.º do CIRC

“1 - As despesas não documentadas são tributadas autonomamente, à taxa de 50%, sem prejuízo da sua não consideração como gastos nos termos do artigo 23.º ...

Assim, além da não consideração destes valores para efeitos de IRC, vamos ainda, nos termos previstos no artigo 88° do CIRC proceder ao cálculo do imposto devido pela tributação autónoma destas despesas não devidamente documentadas:

-1- Valor da despesa: €15.309,36

-2- Tributação autónoma (taxa): 50%

-3- Valor do imposto (1x2): €7.654,68

III.3 – Resumo global das correcções

IRC

2011

«Imagem no original»

Tributação autónoma de IRC

Ponto III.2.1. – Valor do imposto: €7.654,68

(…).” – cf. fls. 48 a 79 do PA – Volume I.

29. Em 04.03.2015, na sequência das conclusões do RIT referido na alínea antecedente, a Autoridade Tributária emitiu a liquidação de IRC n.º 2015 831………, no valor de €69.994,68 – cf. doc. n. º 42 junto com a PI.

30. Em 01.09.2015, foi apresentada reclamação graciosa da liquidação a que se refere o ponto antecedente – cf. fls. 31 do PA – Volume III.

31. Em 22.10.2015, foi proferido despacho pelo Chefe de Divisão a indeferir a reclamação graciosa, decisão comunicada à mandatária da impugnante em 26.10.2015 – cf. fls. 391 a 396 do PA – Volume III.

32. Em 19.11.2015, foi apresentado recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa das liquidações a que se refere o ponto antecedente – cf. fls. 2 e segs. do PA – III Volume.

33. Em 25.01.2017, foi proferido pela Diretora de Serviços despacho a indeferir o recurso hierárquico, com fundamento na informação n.º …../2016, da Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, decisão comunicada à mandatária da impugnante em 31.03.2017 – cf. fls. 17 a 29 do PA – III Volume.

34. Em 28.06.2017, foi apresentada a presente impugnação – cf. fls. 1 do SITAF.


***

A decisão recorrida consignou como Factos não provados os seguintes:

Nada mais se provou com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir, designadamente, não ficou provado o seguinte:

1. A “W…” prestou à Impugnante os serviços correspondentes às faturas a que se refere o ponto 16. supra, vencidas no ano de 2011;

2. A sociedade “V…, Lda.”, “VCL” ou “RIP 2000” criou imprimiu e forneceu à Impugnante material publicitário, designadamente cartazes, brochuras, pastas e agendas, correspondentes à fatura a que se refere o ponto 19. supra.

3. C… prestou, no ano de 2011, à Impugnante os serviços correspondentes às faturas a que se refere o ponto 23. supra.


***

A motivação da matéria de facto assentou no seguinte:

“Os factos assentes como provados e como não provados resultam da convicção alcançada mediante a análise crítica e conjugada do teor das peças processuais e da prova documental, junta com os articulados e integrada no processo administrativo e, ainda, da prova por declarações de parte e por depoimento testemunhal produzida no processo 1720/15.0BELRA, cujo aproveitamento para estes autos foi deferido, em função dos requerimentos para esse efeito apresentados pela Fazenda Pública e pela Impugnante.

Os meios probatórios que, no cômputo da prova produzida, apresentaram maior peso na formação da convicção alcançada quanto a cada um dos factos assentes, encontram-se expressamente indicados junto de cada um dos pontos supra.

No que respeita aos documentos, através da indicação do documento e das folhas do processo físico ou do PA em que o mesmo se encontra junto a cada alínea dos factos assentes.

A valoração dos documentos foi feita atendendo ao seu valor probatório, ao seu teor e aos factos que os mesmos comprovam, em si mesmos ou em conjugação com os demais.

Em relação a este aspeto, cumpre destacar que as informações oficiais, em que se integra o Relatório de Inspeção Tributária [RIT] e respetivos anexos, fazem fé, quando devidamente fundamentadas, como sucede in casu [artigos 76º, nº 1 da LGT e 115º, nº 2 do CPPT].

E que, os documentos apenas em sede de Impugnação apresentados em anexo à PI, designadamente os constantes de atas de reuniões e sumários de formações relativos ao ano de 2011, não enviados à Autoridade Tributária no âmbito das solicitações de documentos então efetuadas, para que esta pudesse recolher elementos junto das entidades e pessoas ali identificadas, estando sujeitos à livre apreciação do tribunal, em conjugação com toda a restante prova produzida, não chegam para com base neles se alcançar a formação da convicção da realidade das prestações de serviços a que se reportam as faturas indicadas nos pontos 16., 19. e 23. dos factos assentes.

No que respeita à prova por declarações de parte e por depoimento testemunhal, a mesma foi valorada na formação da convicção alcançada no que respeita aos pontos 5., 6., 9., 10., 11., 12., 13., 14., 15. e 24., como se indicou concretamente junto a cada alínea – depoimentos de L…, S…, V… e declarações de parte de J… e C….

A este respeito cumpre destacar que o depoimento das testemunhas L… e S…, ambas consultoras ao serviço da impugnante, relevou na formação da convicção alcançada no que respeita ao contexto de atuação da Impugnante e a sua relação comercial com a “E…”, designadamente, como atuava no âmbito da implementação dos sistemas de gestão e da formação nos vários clientes angariados pela Impugnante e a relação comercial da Impugnante com a “E…”. No entanto, tendo ambas afirmado conhecer a empresa “W…” por ser uma das empresas subcontratadas pela Impugnante, referindo saber que na execução dos trabalhos de programação informática efetuados por esta empresa houve situações que ficaram pendentes, não esclareceram concretamente quanto aos ajustamentos daí decorrentes. Afirmaram, concomitantemente, que a partir de certa altura a prestação de serviços foi suspensa e que não havia troca de documentação entre a Impugnante e a “W…”, sendo os contactos e as questões da faturação diretamente tratadas pelo Eng. J…. Disseram, ainda, que a Impugnante tinha como prática oferecer brindes aos clientes, não sabendo, qual era o fornecedor dos mesmos, uma vez que trabalhavam com várias empresas fornecedoras.

A testemunha V… de B…, sócio-gerente da “S…”, apenas afirmou que a Impugnante lhe prestou serviços na área da desmaterialização, sem reconhecer o nome do Sr. N…. No que respeita aos trabalhos na área da decoração, referiu que a Impugnante lhe forneceu desenhos técnicos para o desenvolvimento de protótipos e que desenvolveu uma linha de decoração para um hotel em Angola, sob a designação “Rosa Mosqueta”.

A testemunha I…, sócio-gerente da “U…”, Lda., disse ter relações comerciais com a Impugnante, desde 2008, afirmando conhecer vagamente a “W…” e o Sr. N…, por ter realizado algumas reuniões e ações de formação. Esclareceu, ainda, que a faturação era emitida pela “E…”.

Em declarações de parte, J…, gerente da Impugnante, referiu conhecer pessoalmente, em termos profissionais, o Sr. N…, cujo contacto lhe foi fornecido em 2009, pelo Eng.º L…, colaborador do Norte da “E…”. Contratou a “W…”, para começarem em janeiro de 2010, pois pareceu-lhe que, de conversas havidas e da análise dos curricula, quer o Sr. N…, quer dos outros dois colaboradores, evidenciavam ter experiência no desenvolvimento das bases de dados necessárias à conclusão dos projetos, tendo sido a empresa que apresentou a melhor proposta para colaboração em termos de qualidade/preço. Disse, igualmente, que até agosto de 2010, a colaboração processou-se de uma forma contínua, tendo-se esfriado a partir dessa altura, devido à quantidade de trabalhos em não conformidade existentes e que as notas de honorários apresentadas pela “W…” eram, em regra, objeto de acertos e que a Impugnante, via de regra, apresentava uma contraproposta. Sendo que, nesses casos, a Impugnante procedia ao adiantamento do valor correspondente ao IVA constante da fatura emitida pela “W…”. Esclareceu que, tendo dificuldades na troca de informações com o Sr. N…, avolumou-se o diferencial de horas que estavam faturadas e não foram pagas. Referiu ainda que a “W…” nunca chegou a emitir as notas de crédito, tendo feito acerto de saldos na expectativa que a “W…” enviasse as notas de crédito. Relativamente à “Rip 2000”, disse não conhecer a empresa, mas afirmou que os produtos publicitários foram faturados e pagos.

Ouvida C…, na qualidade de sócia gerente da Impugnante, a mesma afirmou que efetuou trabalhos de decoração para clientes da Impugnante e esclareceu que, em virtude de, à data, ser casada com o Eng. J…, havia uma grande flexibilidade nos pagamentos e que as faturas nunca eram pagas na totalidade, sendo a gestão e a parte contabilística assegurada pelo seu ex-marido. Afirmou também que a única funcionária referida no relatório de inspeção tributária, era costureira, pelo que a criação era da exclusiva responsabilidade da depoente, não necessitando de mais nenhum colaborador.

A testemunha arrolada pela Fazenda Pública, S…, Inspetora Tributária, afirmou que teve contacto, no âmbito de uma fiscalização cruzada, com o Sr. N…, mas que não lhe foi apresentada qualquer documentação.

A testemunha arrolada pela Fazenda Pública, C…, Inspetor Tributário, esclareceu os factos constantes do RIT, referindo nomeadamente, no que diz respeito à “W…”, que não lhe foram apresentados orçamentos, apenas uma proposta de contrato, não havia envio de documentação relativa aos meios de pagamento, os descritivos das faturas eram sempre genéricos e que, em regra, só era pago o valor correspondente ao IVA. Esclareceu ainda que a correção de saldos foi efetuada com base num documento interno, não lhe sendo exibido o comprovativo do cheque ou transferência, nem lhe foi apresentada qualquer justificação para a referida operação e que foi através do mesmo documento que foi feito o acerto de contas relativo a C…, saldando a conta “caixa”, não sendo possível aferir pela documentação, designadamente o extrato de conta, o destino dos valores. A respeito da “VCL” ou “RIP 2000”, sublinhou as incongruências dos depoimentos prestados e o facto de se tratar de uma empresa com cessação oficiosa de atividade reportada a 2005.

As testemunhas acima identificadas arroladas pela Impugnante, prestaram o respetivo depoimento de forma séria, lógica e coerente, relativamente aos factos sobre os quais foram inquiridas, apresentado razão de ciência justificada pelo desempenho de funções profissionais, nos termos supra enunciados quanto a cada uma, quanto a grande parte dos factos sobre que foram inquiridas, relativamente aos quais foram valorados, como resulta da indicação junto a cada um dos pontos dos factos assentes.

Não obstante, esses mesmos depoimentos foram valorados em concreto, apenas na parte em que contribuíram para a formação da convicção alcançada, ante a sua congruência contextual em conjugação com o que resulta do conspecto de toda a prova produzida nos autos, no que respeita a esses mesmos factos, sem que tenham permitido concluir pela concreta existência e contornos das aquisições de serviços que aqui se encontram em causa, tituladas pelas faturas emitidas no ano de 2011.

As testemunhas acima identificadas arroladas pela Fazenda Pública, prestaram o respetivo depoimento de forma séria, lógica e coerente, relativamente aos factos sobre os quais foram inquiridas, com razão de ciência justificada pelo desempenho de funções profissionais, todavia dado que apenas corroboram o que resulta inscrito no RIT, fazendo este fé quando devidamente fundamentado e assente em elementos objetivos, a convicção alcançada resulta desde logo destes e não do depoimento daquelas, de modo a justificar-se sobre os mesmos produzir quaisquer outras considerações.

No que concerne às declarações de parte, as mesmas foram livremente apreciadas, com a devida cautela, em conjugação com os demais elementos probatórios integrados nos autos, designadamente o RIT e elementos objetivos no mesmos especificados, sem perder de vista que, por natureza, este é um depoimento prestado pelo interessado em que a causa se decida num determinado sentido e não noutro. Sendo certo que a sua livre apreciação foi condicionada, como em relação à demais prova produzida, pela razão, pela experiência e pelo conjunto das circunstâncias que os autos revelam e em que estas declarações se contextualizam. Assim, as declarações de parte prestadas, pelas razões agora assinaladas em conjugação com as que acima foram referidas em relação à prova por depoimento testemunhal que também se verificam em relação às declarações de parte, apenas permitiram ao Tribunal fundar a sua convicção nos termos que se encontram refletidos nos acima referenciados pontos dos factos assentes.

No âmbito da apreciação conjugada da prova produzida destaca-se que a “proposta/contrato” e adenda à mesma a que se referem os pontos 9. a 12. dos factos assentes, se reporta a 8 projetos identificados por um número e pelas horas atribuídas aos mesmos e pelo valor de € 90,379/hora, acrescido de IVA, referindo-se em adenda que “os projectos definidos na proposta abaixo mencionada, serão atualizados de acordo com o registado no relatório de execução (…)”. Não obstante, nenhum dos outros documentos integrados nos autos faz menção aos projetos em causa identificados pelos n.ºs ali especificados e, designadamente, os 8 relatórios de execução a que se refere o ponto 18. dos factos assentes, reportam-se projetos identificados por um número, com o número de horas despendidas em cada um, verificando-se que nenhum destes números é coincidente com o número atribuído aos 8 projetos na “proposta/contrato” a que se refere o ponto 9. dos factos assentes e, por sua vez, essa correspondência também não resulta dos demais documentos juntos à PI pela Impugnante e dos constantes do PA.

Por seu turno, as testemunhas não concretizaram suficientemente os serviços prestados pela “W…”, no ano de 2011, à Impugnante, decorrendo dos depoimentos e das declarações de parte do sócio-gerente da Impugnante que tendo sido apontadas divergências quanto às horas imputadas pela “W…” a cada cliente, a partir de certa altura a prestação de serviços foi suspensa, e, ainda que não havia troca de documentação entre a Impugnante e a “W…”, sendo os contactos e as questões da faturação diretamente tratadas pelo sócio-gerente.

Relativamente à fatura n.º 5……, emitida no ano de 2011 por “V…, Ld.ª” ou “RIP 2000” à impugnante, no valor global de 22.140,00€, com IVA incluído, a que se refere o ponto 19. dos factos assentes, não foi carreada para os autos prova documental para além da constante do PA e, nos termos acima expostos, em sede de prova testemunhal e por declarações de parte foram prestados depoimentos genéricos.

No que respeita às faturas que C… emitiu à Impugnante, no ano de 2011, n.ºs 179, 180, 181, 182 e 183, no valor total de €104.458,37, com IVA incluído, a que se refere o ponto 23. dos factos assentes, considerando o conspecto da factualidade assente nos pontos 21. a 25. e resultando da prova produzida tão só realçada a expertise da fornecedora para a execução de tais serviços, a mesma não permite ir além da fundada dúvida quanto à existência efetiva das operações mencionadas nas faturas, não sendo aqui aplicável o regime que decorre do artigo 100.º do CPPT.

Em suma, pelas razões expostas, com base nos depoimentos testemunhais e documentos juntos aos autos pela Impugnante e integrados no PA e nas declarações de parte, em função da ausência de suficiente concretização e circunstanciação em relação às também concretas prestações de serviços tituladas pelas faturas a que se referem os pontos 16., 19. e 23., dos factos assentes, tudo em contraponto com o que resulta do relatório inspetivo e dos elementos objetivos em que este assenta, apenas se almejou formar a convicção necessária à fixação da factualidade provada acima dada como assente.

E, por outro lado, não se almejou formar convicção que permitisse concluir pela efetiva prestação dos serviços referidos nas faturas emitidas à Impugnante, a que se referem os pontos 16., 19. 23., relativas ao ano de 2011 – razão pela qual se assentaram como não provados os factos constantes dos pontos 1, 2 e 3 supra.


***

III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRC do exercício de 2011.

Ab initio, em termos de delimitação da lide recursiva, importa relevar que a Recorrente interpôs recurso apenas quanto às correções aritméticas no valor global de €193.345,50 por os custos incorridos com as empresas “W… Unipessoal, Ld.ª”, “V…, Ld.ª” e “C…”, não consubstanciarem operações reais, logo encontra-se consolidada na ordem jurídica a correção no valor de €16.784,36, respeitantes a deslocações e correspondente tributação autónoma.

Mais importa ter presente que, em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se o Tribunal a quo:

¾ Valorou erradamente a factualidade vertida no probatório, mormente no atinente à factualidade não provada, a qual da conjugação da prova testemunhal com a prova documental, deveria ter sido consignada como provada.

¾ Cometeu erro de julgamento de facto na medida em que extraiu valoração contraditória.

¾ Incorreu em erro de julgamento por errada apreciação dos pressupostos de facto e de direito, no atinente à manutenção das correções dos custos no valor de €193.345,50, concernentes a operações fictícias, competindo, nessa medida, aquilatar:

o Do âmbito e extensão do ónus probatório;

o Da existência de indícios suficientes para legitimar a atuação da AT, e cumprido esse ónus aferir da prova da materialidade das operações;

Vejamos, então.

Comecemos pelo erro de julgamento de facto.

Ora, se o que está em causa é o Tribunal a quo ter errado o seu julgamento de facto, cumpre ter em conta a tramitação processual atinente à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto.

Para o efeito, importa começar por aferir se a Recorrente cumpriu os requisitos consignados no artigo 640.º do CPC.

Preceitua o aludido normativo que:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida (1).

No concernente à observância dos requisitos constantes do citado normativo relativamente à prova testemunhal , após posições divergentes na Jurisprudência, mormente, na Jurisdição Comum o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a pronunciar-se no sentido de que “[e]nquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.” (2)

Note-se que, a indicação exata das passagens de gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo, naturalmente, do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, conforme decorre do artigo 662.º do CPC (3), aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT.

Dir-se-á, portanto, que o que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do artigo 640.º do CPC(4).

Mais importa ter presente que nem todos os factos alegados pelas partes, ainda que provados, carecem de integrar a decisão atinente à matéria de facto, porquanto apenas são de considerar os factos cuja prova (ou não prova) seja relevante face às várias soluções plausíveis de direito. Por outro lado, cumpre distinguir entre factos provados e meios de prova, sendo que uns não se confundem com os outros.

Feitos estes considerandos iniciais, verifica-se que, in casu, a Recorrente impugna a matéria de facto, requerendo um aditamento por substituição, convocando o inerente meio probatório e de acordo com os requisitos contemplados no citado normativo.

Vejamos, então, cada uma das realidades alegadas per se.

A Recorrente começa, desde logo, por sustentar que o Tribunal a quo ao dar como provados os factos elencados em 6), 9), 10), 13) e 14), não pode concluir e dar como não provado que a “W…” não prestou os serviços que se encontram registados na contabilidade da ora Recorrente, sendo uma contradição que terá de levar à sua eliminação e assunção como facto provado.

Porém, não lhe assiste razão porquanto da leitura conjugada dos aludidos pontos da factualidade assente com o facto consignado como não provado não resulta qualquer contradição, que justifique e funde a visada alteração ao probatório.

Com efeito, da conjugação da factualidade consignada nos pontos 6), 9), 10), 13) e 14), apenas se retira que a Recorrente no âmbito dos projetos desenvolvidos pela E… recorreu à subcontratação, particularmente no âmbito das áreas de programação de computadores e da desmaterialização de processos, tendo, outrossim, outorgado uma proposta/contrato de colaboração de consultoria e auditoria informática a qual foi apresentada por N… que se intitulou como gerente da W….

Dimanando, igualmente, desse acervo que mensalmente a W… emitia uma nota de honorários, e era realizada uma reunião de avaliação com a Recorrente tendente à avaliação da execução dos trabalhos efetuados, e bem assim que na sequência da constatação de divergências quanto às horas imputadas pela W…, foi requerida a competente retificação das horas faturadas em excesso.

Ora, face ao supra expendido a aludida factualidade em nada contende e contraria e factualidade assumida como não provada, nem permite, de todo, legitimar como facto provado que a W… prestou à Recorrente os serviços correspondentes às faturas a que se reporta o ponto 16, porquanto inexiste qualquer nexo que permita assumir a materialidade das visadas operações e nos moldes peticionados pela Recorrente.

Note-se, ademais, que a mera menção aos serviços a jusante realizados e à necessidade de recorrer à subcontratação não se afigura como suficiente para a demonstração da efetividade das operações tituladas pelas faturas postas em causa.

Prosseguindo.

Ainda neste âmbito, e quanto ao aludido facto não provado concernente à sociedade emitente W…, a Recorrente requer a sua eliminação e competente aditamento, em substituição, na factualidade provada, convocando, para o efeito, a prova documental, concretamente os documentos 14 a 34 dos autos, e a prova testemunhal, especificamente, os depoimentos das testemunhas L…, S…, I…, e bem assim as declarações de parte prestadas por J….

Analisemos, então.

Comecemos pelos depoimentos de L… e S…, os quais a Recorrente, mediante os excertos que transcreve nas suas alegações, defende que resulta, sem dúvidas, que o fornecedor W… lhe prestou efetivamente serviços, nos seus clientes devidamente identificados, concretizados em consultadoria e apoio à implementação de ferramentas de programação informática, e formação para a sua utilização, no âmbito das ações de certificação de qualidade desenvolvidas pela C….

Concluindo, assim, que foi apresentada prova que permite demonstrar, em concreto, quais os serviços prestados pelo referido fornecedor, sendo certo que é ainda adensado que pese embora tenham reconhecido a existência de algumas divergências quanto às horas faturadas pela W… alocadas a cada uma das ações desenvolvidas nos clientes, tal facto não é suficiente para afastar a materialidade e efetividade dos serviços prestados, apenas relevando para efeitos de quantificação dos serviços prestados.

Não entendemos, porém, que lhe assista razão, porquanto atendendo nos respetivos trechos áudio convocados pela Recorrente não é possível, retirar a assunção peticionada. De resto, o Tribunal ad quem procedeu à audição integral dos depoimentos e os mesmos são demasiados genéricos, conclusivos, pouco pormenorizados e sem a devida substanciação espácio-temporal.

Com efeito, o depoimento de L… apenas permite dar como assente que existia uma parceria com a E…, e a inerente necessidade e efetivação de subcontratação, relevando, genericamente, e sem qualquer pormenorização no domínio temporal e delimitação específica do serviço prestado, mormente, no atinente aos serviços elencados nas faturas em contenda.

No fundo, a abordagem coaduna-se com o tipo de trabalho requerido, mormente, controlo e desmaterialização, mas sem que possa fazer-se a competente prova e ligação com as operações contempladas nas faturas colocadas em causa, essa sim, a prova que devidamente substanciada, poderia demonstrar a efetividade dos custos e que conforme referido, não foi, de todo, demonstrado mediante a prestação desse depoimento.

Mais importa relevar que, atentando, inclusivamente, nos excertos transcritos pela Recorrente inexiste qualquer alusão, ainda que genérica, ao ano de 2011, mas, tão-só, ao ano de 2010. Acresce, ainda, que a mesma expressamente afirmou no atinente ao conhecimento dos projetos que “essas coisas não passavam exatamente por si” nada sabendo explicar quanto a acertos e a pagamentos, muito menos alocar qualquer realidade ao exercício em contenda.

O mesmo sucede com o depoimento de S…, o qual, não obstante evidenciar a participação da W…, corroborando, outrossim, a área de atuação, concretamente, da desmaterialização, e densificando no atinente à empresa F… e aos softwares de produção, verdade é que nada depôs no sentido que permita inferir pela concretização, efetiva, dos serviços descritos nas faturas emitidas pela aludida empresa.

Note-se que, atentando no aludido depoimento retira-se, à semelhança do anterior depoimento da testemunha L…, que o mesmo foi genérico e sem a devida particularização, bastando, para o efeito, ter presente que nunca fez qualquer precisão temporal -cuja exigibilidade se impunha para efeitos da prova que arrogava e se propunha realizar- e bem assim utilizou expressões que demonstram incerteza e dúvidas, designadamente, em termos de direção e vinculação na empresa W….

De salientar, outrossim, que quando foi interpelada quanto ao contexto de formação com a W…, afirmou, perentoriamente, que nunca esteve “em contexto de sala” com a mesma.

Pelo que, contrariamente ao expendido pela Recorrente os aludidos depoimentos não permitem demonstrar, em concreto, que os serviços elencados nas faturas consubstanciam transações reais, razão pela qual inexiste o apontado erro de julgamento de facto, neste concreto particular, com a consequente manutenção da factualidade não provada.

Mas continuemos.

Atentemos, ora, no depoimento de I…, o qual, segundo a esteira de entendimento da Recorrente permite confirmar a materialidade das operações, donde, fundar a visada alteração ao probatório.

Porém, mais uma vez, atentando no seu depoimento e particularmente nos trechos transcritos pela Recorrente, o mesmo não, é de todo, apto a fazer essa prova, desde logo, porque o seu depoimento carece de assertividade e do pormenor que se impõe, reconhecendo o mesmo, expressamente, que conhece “vagamente” a empresa W….

Sendo, igualmente, de sublinhar que quanto à prestação dos serviços evidenciados nas faturas em contenda nada foi, devidamente, demonstrado e substanciado, sendo este depoimento ainda mais genérico e conclusivo que os outros anteriores.

Com efeito, era imperioso demonstrar, de forma cabal e devidamente circunstanciada, a prestação efetiva de cada um dos serviços, mormente, com a indicação precisa dos dias da sua prestação, da sua duração efetiva, com a identificação dos prestadores no campo e as matérias constantes de cada ação de formação, para que se pudesse apurar da veracidade, não só da sua efetiva prestação, mas dos valores que alegadamente lhe são imputados e que constam das faturas.

Portanto, a prova a realizar tem, necessariamente, de assumir um grau de certeza, precisão e detalhe elevado, desde logo, face à falta de credibilidade e fragilidades dos meios de pagamento.

Dimana, assim, que os aludidos depoimentos face à forma como foram prestados, e devidamente densificada anteriormente, não são aptos a que se dê como provado a realização de cada um dos serviços que as faturas titulam, sendo certo que, como é consabido, é essa a prova que importa realizar, de forma cabal, segura e inequívoca relativamente a cada um dos serviços titulados pelas faturas, não bastando um mero enquadramento genérico da existência de prestação de serviços e uma alegação não devidamente substanciada no espaço e no tempo da concreta relação negocial.

Subsiste, ora, por atentar nas declarações de parte prestadas por J….

A Recorrente começa por defender que a decisão recorrida não faz qualquer menção de desconsideração das aludidas declarações, mormente, por falta de isenção ou rigor ou por imparcialidade notória, logo deveria ter tido em consideração tais declarações na sua íntegra, para efeitos de factos provados e não provados.

Mas, não só a aludida afirmação não traduz a verdade dos factos, como as declarações de parte não permitem suportar a realidade adensada pela Recorrente.

Mas expliquemos, então, porque assim o entendemos.

Atentando na decisão recorrida, verifica-se que o Tribunal a quo, ponderou as declarações de parte e explicitou quais as razões atinentes a essa mesma valoração.

Com efeito, na motivação da matéria de facto, consta, expressamente, o seguinte juízo de entendimento:

“No que concerne às declarações de parte, as mesmas foram livremente apreciadas, com a devida cautela, em conjugação com os demais elementos probatórios integrados nos autos, designadamente o RIT e elementos objetivos no mesmos especificados, sem perder de vista que, por natureza, este é um depoimento prestado pelo interessado em que a causa se decida num determinado sentido e não noutro. Sendo certo que a sua livre apreciação foi condicionada, como em relação à demais prova produzida, pela razão, pela experiência e pelo conjunto das circunstâncias que os autos revelam e em que estas declarações se contextualizam. Assim, as declarações de parte prestadas, pelas razões agora assinaladas em conjugação com as que acima foram referidas em relação à prova por depoimento testemunhal que também se verificam em relação às declarações de parte, apenas permitiram ao Tribunal fundar a sua convicção nos termos que se encontram refletidos nos acima referenciados pontos dos factos assentes.”

Logo, não só, como visto, é concretizada a competente valoração como não se aquiesce qualquer censura no aludido julgamento, até porque, não podemos perder de vista que ainda que as declarações sejam espontâneas, e prestadas sem hesitações, a verdade é que o Tribunal não pode descurar a circunstância de que o gerente é parte interessada nos presentes autos, ou seja, tem interesse no resultado da ação e, nessa medida, o seu depoimento tem de ser valorado com essa circunstância específica. Acresce, outrossim, que a declaração de parte se revela de superior interesse no que tange a factos de índole estritamente pessoal e demonstráveis por prova tendencialmente única, circunstancialismo que não sucede no caso vertente.

Note-se, ademais, que no caso de redundância entre provas de diferente tipo, v.g., declarações de parte versus prova testemunhal, «entra em jogo uma regra epistemológica distinta que nos indica que “a confirmação de uma hipótese não depende só da quantidade de dados favoráveis de que se dispõe, mas também da sua variedade: quanto maior for a variedade, maior será o apoio resultante” (Hempel, 1966:58). A razão que sustenta esta regra é bastante simples. Quanto maior for a variedade de testes a que se submete uma hipótese, maiores serão as possibilidades de que seja refutada em caso de ser falsa. E, por isso, outorga maior nível de corroboração em caso do resultado das distintas provas ser positivo para a hipótese.» (5)

De resto, de uma leitura atenta do probatório, verifica-se que o Tribunal a quo, valorou tais declarações de parte quando as mesmas se encontravam, designadamente, em conformidade e de harmonia com outro tipo de prova, mormente, documental e testemunhal, conforme resulta inequívoco dos factos constantes em 9, 10, 11, 12, 13 e 14.

Relevando, justamente, tal asserção na motivação da matéria de facto onde é consignado que: “No que respeita à prova por declarações de parte e por depoimento testemunhal, a mesma foi valorada na formação da convicção alcançada no que respeita aos pontos 5., 6., 9., 10., 11., 12., 13., 14., 15. e 24., como se indicou concretamente junto a cada alínea – depoimentos de L…, S…, V… e declarações de parte de J… e C….”

Mais importa sublinhar que, atentando no concreto conteúdo das declarações prestadas e cujas transcrições se encontram devidamente evidenciadas nas alegações as mesmas não permitem, de todo, materializar a visada alteração ao probatório, porquanto as mesmas não consentem, contrariamente ao defendido pela Recorrente, demonstrar a efetividade das operações sindicadas.

De relevar, in fine, que os convocados documentos 14 a 34 dos autos não permitem propugnar nesse sentido, ainda que conjugados com a aludida prova testemunhal, porquanto não permitem estabelecer o competente nexo entre o serviço faturado e os elencados nesses mesmos documentos.

Com efeito, por um lado, os aludidos documentos coadunam-se com o descritivo dos procedimentos de gestão de recursos humanos, de compras e gestão documental, avaliação da satisfação do cliente, os quais mais não representam que as diretrizes base e de âmbito geral, e por outro lado, as atas de reunião e inerentes folhas de sumários não permitem estabelecer qualquer conexão com os serviços elencados nas faturas, o que, como visto, era a realidade que competia fazer prova.

De enfatizar, ainda, a falta de correspondência entre a “proposta/contrato” a que é feita expressa alusão na motivação da matéria de facto no sentido de que “[n]enhum dos outros documentos integrados nos autos faz menção aos projetos em causa identificados pelos n.ºs ali especificados e, designadamente, os 8 relatórios de execução a que se refere o ponto 18. dos factos assentes, reportam-se projetos identificados por um número, com o número de horas despendidas em cada um, verificando-se que nenhum destes números é coincidente com o número atribuído aos 8 projetos na “proposta/contrato” a que se refere o ponto 9. dos factos assentes e, por sua vez, essa correspondência também não resulta dos demais documentos juntos à PI pela Impugnante e dos constantes do PA.”

Assim, face a todo o expendido anteriormente, improcede a requerida alteração ao probatório, mantendo-se, assim, o facto não provado número 1 com o seguinte teor: “A “W…” prestou à Impugnante os serviços correspondentes às faturas a que se refere o ponto 16. supra, vencidas no ano de 2011 “.

Atentemos, ora, no facto não provado elencado no ponto 2 e com o teor que infra se transcreve: “2. A sociedade “V…, Lda.”, “VCL” ou “RIP 2000” criou imprimiu e forneceu à Impugnante material publicitário, designadamente cartazes, brochuras, pastas e agendas, correspondentes à fatura a que se refere o ponto 19. supra.”, o qual segundo a Recorrente deve ser eliminado e passar a constar como facto assente, face ao teor das declarações de parte prestadas por José Morais, e aos documentos 35 a 37 dos autos.

No respeitante às declarações de parte damos por reproduzidas as considerações de direito já expendidas quanto à sua concreta valoração, sublinhando, ainda, neste concreto particular que os trechos convocados não permitem estabelecer a prova da materialidade que se impõe, na medida em que a explicitação realizada não tem a devida concretização espácio-temporal, nem permitindo, per se, concretizar o nexo que se impõe e fundamental para os efeitos almejados pela parte.

Quanto aos documentos visados, e ainda que exista um prévio orçamento, a verdade é que os respetivos meios de pagamento para além de não permitirem fazer prova do seu pagamento integral, a verdade é que, conforme aduzido no Relatório de Inspeção Tributária os aludidos cheques identificam o descritivo “Cheque de caixa”, o que significa que os mesmos foram levantados ao balcão.

Não podendo, inclusive, ser descurado, desde logo, que a aludida sociedade se encontrada cessada desde 31 de dezembro de 2005, e que o próprio sócio gerente dessa sociedade Sr. V…, afirma não conhecer a sociedade Recorrente, e que desconhece, desde logo, a emissão da visada fatura nº 51…, no valor global de €22.140,00.

Face ao supra expendido, não se vislumbra qualquer erro de julgamento de facto na fixação da aludida factualidade não provada, razão pela qual a mesma se mantém inalterada, indeferindo-se a visada alteração ao probatório.

Subsiste, ora, por analisar o erro de julgamento de facto atinente à emitente C….

A Recorrente sustenta, desde logo, que a valoração do facto não provado elencado no ponto 3), está em contradição com o facto provado no ponto 21) do probatório.

Mas, sem razão, porquanto da factualidade expendida em 21), apenas se retira que C… desenvolveu projetos na área da decoração para clientes da Impugnante, nomeadamente para a S…, em nada permitindo inferir a prova da materialidade das operações descritas nas faturas elencadas em 23 do probatório. Ademais, os factos elencados em 21) e 22) não contêm uma delimitação temporal concreta, inviabilizando, por conseguinte, a necessária alocação devidamente circunstanciada.

Por outro lado, sufraga que foram desconsiderados os documentos 39) e 40) juntos à p.i., os quais sublinha que são meios de prova aptos a confirmar a veracidade dos serviços adquiridos e a efetividade do custo incorrido, não tendo, de resto, sido apresentada concreta motivação atinente à sua desvalorização.

Porém, mais uma vez, não lhe assiste razão, não só porque o Tribunal a quo no âmbito da motivação da matéria de facto esclarece as razões subjacentes à competente fixação no probatório de tais asserções fáticas, quer enquanto factualidade não provada, assim como provada, sendo inclusive de sublinhar que no atinente a esta emitente é, claramente, esclarecido que resulta “[d]a prova produzida tão só realçada a expertise da fornecedora para a execução de tais serviços”.

Acresce, outrossim, que os documentos 39 e 40 mais não representam que uma proposta de trabalhos e orçamento, os quais têm, naturalmente, de ser analisados no contexto e em conjugação com a demais factualidade constante nos autos, tendo, designadamente, que ser computado, neste e para este efeito, a questão inerente aos meios de pagamento e contemplada em 24, e bem assim a efetivação da correção de saldos titulada por mero documento interno, conforme consignado em 25.

Prosseguindo, ora, quanto ao erro de julgamento de facto decorrente da errada valoração e desconsideração do depoimento de V… e das declarações de parte de J… e de C…, os quais, segundo entendimento da Recorrente, e por reporte ao respetivo trecho áudio permitiam dar como assente a factualidade, erroneamente, vertida como não provada.

No respeitante às declarações de parte de C… e sempre com a específica valoração atinente a este meio probatório e já devidamente delineado anteriormente, cumpre, desde logo, relevar que atentando nos excertos transcritos inexiste qualquer expressa referência ao ano de 2011, mas, tão-só, ao ano de 2010, sendo certo que, de todo o modo, o vertido nas suas declarações não tem a devida substanciação sendo demasiado genérico, não podendo, como visto, descurarem-se todas as realidades fáticas indiciadas no Relatório Inspetivo e constantes no probatório.

De adensar, para o efeito, que não se pode descurar que esta era sócia-gerente da Impugnante, ora Recorrente, admitindo a própria nas suas declarações que os valores nem sequer eram pagos na totalidade pela Impugnante porque esta era gerida pelo seu marido que acabava por gerir a própria empresa em nome individual da mulher, emitente da fatura, o que, aliás, foi corroborado nas declarações de parte prestadas por J….

Mais importa ter presente que do teor das aludidas declarações de parte e contrariamente ao expendido pela Recorrente não foi afastada a aduzida falta de estrutura empresarial, não bastando, para o efeito e como é bom de ver, uma afirmação interessada e parcial no sentido de que a própria tinha capacidade face à sua experiência e que a funcionária que tinha ao seu serviço era uma costureira, inexistindo qualquer suporte adicional e que permita, sem mais, corroborar tal realidade.

Analisemos, ora, o depoimento de V…, o qual segundo a Recorrente conseguiu confirmar, em concreto, quais os produtos de design adquiridos à Recorrente e a autoria dos mesmos, e que por essa mesma razão seriam suficientes para fundar a materialidade das operações respeitantes às visadas faturas.

Mas, a verdade é que analisando o depoimento prestado, e especificamente as transcrições constantes nas alegações, ajuíza-se que o mesmo não é, de todo, passível de materializar a prova da efetividade das transações, desde logo, porque, mais uma vez, inexiste uma concreta e específica delimitação temporal, como as afirmações são titubeantes, revelando incerteza, como se infere, designadamente, do uso das expressões “salvo erro”, “não sei precisar em concreto”, “penso que foram essas linhas, mas…”, sendo que quando expressamente indagado sobre se a decoradora trabalhava diretamente para a C… afirmou, sem certezas, que “Eu penso que trabalhava para a C…, penso.”

Pelo que, mais uma vez não assiste razão quando ao aduzido erro de julgamento de facto.

Remanesce, in fine, a concreta apreciação das declarações de parte de J…, evidenciando, desde já, que as aludidas declarações em nada permitem demonstrar a efetividade e a materialidade das operações, sendo certo que não se pode descurar que essa emitente era sua cônjuge, o que, per se, retira imparcialidade e acarreta fragilidade. Aliás, se atentarmos nas transcrições constantes no probatório resulta, desde logo, que as asserções, independentemente da bondade das mesmas e do seu caráter genérico e conclusivo, coadunam-se, mais uma vez, com o ano de 2010, inexistindo qualquer referência expressa ou mesmo implícita ao ano de 2011, impossibilitando, assim, o correspondente nexo e prova efetiva.

Acresce, outrossim, que é exposta, de forma expressiva, a debilidade dos meios de pagamento, que ainda que por referência a trabalhos de 2010, refere “não tenho a certeza se lhe foram pagos”, e bem assim uma assunção a uma correção de saldos que pode consubstanciar um “perdão dela”.

Pelo que, face a todo expendido anteriormente, improcede o arguido erro de julgamento assacado à decisão recorrida, mantendo-se, por conseguinte, o facto não provado nº3.

Destarte, tudo visto e ponderado e sem necessidade de outras considerações, improcede, na íntegra, o aduzido erro de julgamento de facto, e natural e necessariamente o reputado aditamento por substituição, com a consequente manutenção da factualidade não provada nos moldes e exatos termos fixados pelo Tribunal a quo.


***

Aqui chegados, uma vez estabilizada a matéria de facto, atentemos, então, se procede o erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito.

A Recorrente sustenta, desde logo, que para a desconsideração dos custos a AT tem de cumprir o ónus da prova de que a adquirente dos serviços foi parte ativa do acordo simulatório do negócio ou de uma parte do mesmo ou que atuou de forma negligente, logo não só enunciou como valorou, erradamente, o ónus probatório que sobre si impedia.

Ora, o aludido erro de julgamento está intrinsecamente ligado com a concreta enunciação e densificação do ónus probatório, impondo-se, por isso, começar por aferir como se processa o direito adjetivo fiscal em sede probatória e quais as consequências que dimanam da sua regulamentação.

Em sede de procedimento administrativo tributário incumbe à AT a prova dos factos constitutivos do ato administrativo, ou seja, compete à entidade fiscalizadora aquilatar e indagar sobre a verificação do facto tributável e demais elementos pertinentes à liquidação do imposto, porquanto, o procedimento só pode produzir uma liquidação em sentido estrito quando, face aos elementos apurados, estiver adquirida a plena convicção da existência e conteúdo do facto tributário.

De resto, tal conclusão resulta evidente em face do princípio da verdade material, ínsito nos artigos. 50.º, do CPPT e 58.º, n.º 1, da LGT.

Com efeito, o contribuinte goza da presunção de verdade da sua declaração, nos termos consignados no artigo 74.º, n.º 1 da LGT, logo compete à AT o ónus da prova dos pressupostos legais da sua atuação, in casu a demonstração de que os indícios por si recolhidos no decurso da ação inspetiva são sérios e suficientes para concluir pela inexistência ou simulação de uma relação económica que sustente as faturas em apreço.

De sublinhar, neste particular, que não é exigível que a AT efetue uma prova direta da simulação, pelo que cumprindo a mesma aquele ónus e ilidindo, desse modo, a presunção de veracidade da declaração do sujeito passivo consagrada no referido artigo 74.º, n.º 1 da LGT, passa a competir, por seu turno, a este último o ónus da prova da realidade subjacente à fatura, infirmando os indícios recolhidos pela entidade fiscalizadora.

Com efeito, no âmbito das chamadas “faturas falsas ou operações fictícias” “(…) vem-se entendendo de modo uniforme que, estando em causa a correção de liquidações de IRC por desconsideração dos custos documentados por faturas reputadas de falsas ou “de favor” pela administração tributárias, as regras de repartição do ónus da prova a ter em conta são as seguintes:

- Porque a liquidação de IRC tem por fundamento o não reconhecimento de custos declarados pelo sujeito passivo, compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, tendo o juízo da administração tributária assentado na consideração de que as operações e o valor mencionado na fatura em causa não corresponde à realidade, haverá de demonstrar a existência de indícios sérios de que a operação referida na fatura foi simulada;

- Feita essa prova, compete ao sujeito passivo o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a fazer refletir negativamente os custos declarados na determinação da respetiva matéria tributável nos termos que decorrem do artigo 23º do CIRC, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois neste caso o artigo 100.º do CPPT não tem aplicação; (…).”

No mesmo sentido, apontam os Arestos do STA, proferidos em Plenário no âmbito dos processos com os nºs 01424/05, 587/15 e 0591/15, datados de 27 de fevereiro de 2019, 16 de março de 2016 e 17 de fevereiro de 2016.

Conclui-se, assim, que basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar os custos sindicados, factualidade essa que tem de ser suscetível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte, passando ulteriormente a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito à dedutibilidade dos custos, provando, assim, que as operações se realizaram efetivamente e ocorrem os pressupostos de que depende a sua dedutibilidade fiscal.

Logo, face ao supra expendido e contrariamente ao propugnado pela Recorrente não se vislumbra que o Tribunal a quo tenha incorrido em qualquer erro na enunciação e interpretação da distribuição do ónus da prova, visto que, conforme supra expendido a prova dos indícios compete, efetivamente, à AT, não tendo esta de provar a existência de uma simulação, circunscrevendo-se, por seu turno, a prova da materialidade das operações na esfera da Impugnante, ora Recorrente.

O mesmo se diga quando ao ajuizado no atinente à existência de indícios que legitimam o ato tributário impugnado, porquanto se corrobora o ajuizado pelo Tribunal a quo no sentido de que a AT recolheu elementos necessários para legitimar a sua atuação, ou seja, valida-se o entendimento de que foram recolhidos indícios sérios e bastantes que permitam concluir pela simulação das operações constantes nas faturas.

Senão vejamos. Atentando no Relatório da AT retiramos os seguintes indícios:

Relativamente ao fornecedor W…:

Ø Dualidade de identificação empresarial, respeitando a entidades completamente diferenciadas.

Ø Falta de estrutura empresarial, na medida em que a empresa apenas dispunha de dois funcionários e a partir de maio de 2011, somente a sócia gerente constava na folha de vencimento da empresa;

Ø Na sequência de pedidos de esclarecimentos aos principais clientes da W… constatou-se:

o que nenhum cliente apresentou um relatório, ponto de situação, manual, folha de presença, ou qualquer outra prestação que comprovasse a prestação dos serviços em causa;

o em algumas situações, assistiu-se a uma imediata regularização da situação tributária, com a consequente entrega de declarações periódicas de substituição de IVA e declarações de rendimentos de IRC de substituição, onde se desconsideravam as faturas emitidas pela W…;

o pagamentos dos clientes, cujos cheques, na sua maioria, são levantados ao balcão;

Ø Apresentação, como justificativo das operações, de uma proposta de contrato elaborada em que subsistem dúvidas quanto à concreta designação comercial da outra empresa contratante (W…, N…, Lda.), empresa esta não declarante em sede de IVA e que iniciou a sua atividade em 22.04.2010;

Ø Inexistência na contabilidade de qualquer nota de pagamento, de envio de cheques, correspondência ou qualquer outro documento que prove o efetivo envio dos cheques à W…;

Ø Irregularidades, discrepâncias e pagamentos parciais das faturas e valores a que ascendem por referência ao IVA liquidado;

Ø Levantamentos dos cheques ao balcão, com a consequente perda do rasto do dinheiro;

Ø Descritivos das faturas com a mesma referência e pouco pormenorizados;

Ø Correção de saldos com base em documento interno.

Ø Contabilização de cheques em duplicado;

Ø Discrepância dos lançamentos registados na contabilidade e a conta corrente;

Ø Anomalias nas propostas;

Ø Falta de colaboração com a AT, em resposta ao pedido de elementos;

Ø Erros na identificação social das visadas sociedades por parte da Impugnante;

No respeitante ao fornecedor V…, Lda

Ø Sujeito passivo cessado oficiosamente em 31 de dezembro de 2005;

Ø Falta de identificação do meio de pagamento utilizado na totalidade dos valores;

Ø Levantamento dos cheques, indicados como meio de pagamento, ao balcão;

Ø Descritivo das faturas pouco detalhado;

Ø Falta de colaboração com a AT, em resposta ao pedido de elementos, mormente, no envio de orçamentos, contratos ou outros documentos e fotocópias autenticadas dos meios de pagamento;

Ø Sócio gerente V… afirmou, expressamente, não ter mantido qualquer contacto com os legais representantes da sociedade, e que desconhece a emissão da fatura nº 5….;

Ø A outra sócia alocou a realização dos serviços a uma empresa denominada A…, no entanto, na sequência de diligências da AT junto dessa entidade, constatou-se que a mesma nada contemplava na sua contabilidade.

Ø Nos extratos da conta 21…….-V……, inexiste qualquer registo de movimento com a Impugnante;

No concernente a C…:

Ø Inexistência de estrutura empresarial, mormente, em termos de recursos humanos e técnicos que permitisse a realização dos trabalhos descritos nas faturas;

Ø Ausência de congruência entre meios de pagamento e os valores faturados;

Ø Correção de saldos no ano de 2011 em elevado valor;

Ø Inexistência de outro documento de suporte desta operação na contabilidade que não um documento interno;

Ø Apresentação de orçamentos que não se encontram datados nem assinados, nem identificam o destinatário final do produto;

Ø Inexistência de apresentação de outros elementos de suporte das operações, ainda que instada para o efeito.

E a verdade é que, atentando nos aludidos indícios, e validando o juízo de improcedência do Tribunal a quo entende-se que os mesmos são de molde a justificar e desconsiderar a efetividade dos serviços contemplados nas faturas visadas, desde logo, face às fragilidades e falta de credibilidade inerentes aos respetivos meios de pagamento -os quais, como é consabido, revestem grau de importância elevada em termos de prova da efetividade das operações- logo a AT logrou demonstrar factos-índice de falta de veracidade das faturas de gastos declarados, cessando a presunção de veracidade das declarações do sujeito passivo, para efeitos do artigo 75.º, n.º 2, alínea a) da LGT.

Pelo que, não precisando, como visto e já devidamente densificado anteriormente, a AT de fazer prova da falsidade/simulação das faturas, mas apenas evidenciar a consistência do seu juízo, afigura-se que, in casu, invocou factos que traduzem uma probabilidade séria de as operações constantes nas faturas serem simuladas, ilidindo, assim, o ónus probatório que sobre si impendia.

Noutra formulação, dir-se-á que da análise do conjunto dos indícios recolhidos, verifica-se que a AT elencou elementos que revelam de forma séria a forte probabilidade de as operações em causa não serem operações reais, considerando quer as fragilidades documentais, quer a ausência de estrutura empresarial, quer as fragilidades dos meios de pagamento, e os circuitos de pagamentos insuscetíveis de demonstrar a identidade de quem movimentou o dinheiro.

De relevar, in casu, que a AT pautou toda a sua atuação pelo inquisitório, com pedidos de esclarecimentos e diligências devidamente evidenciadas no Relatório de Inspeção Tributária, com total colaboração, logo tendo a AT cumprido o ónus probatório que recaía na sua esfera jurídica, competia à Recorrente ter apresentado prova capaz de destruir esses indícios, demonstrando que os serviços elencados nas faturas em causa são reais, isto é, que as faturas emitidas pelos fornecedores W…, Lda e C… têm subjacentes operações com materialidade, o que, in casu, não logrou fazê-lo.

Com efeito, atentando na factualidade não provada, a qual se encontra estabilizada e cuja fundamentação inerente à mesma se encontra devidamente consubstanciada na análise à impugnação da matéria de facto, para a qual, ora, remetemos, é por demais evidente que não resulta que a Recorrente tenha feito prova positiva da aludida materialidade das aquisições.

Mais importa relevar que, in casu, é manifestamente irrelevante, neste e para este efeito, a assunção do seu concreto conhecimento pela Recorrente, o qual, de todo o modo, não resulta, de todo demonstrado, e que se circunscrevia na sua esfera jurídica da Recorrente e não da AT. Com efeito, nada resulta demonstrado quanto ao aduzido adquirente de boa­-fé, situação fática subjacente, designadamente, ao Acórdão PPUH Stehcemp, inexistindo, assim, qualquer violação da jurisprudência do TJUE convocada em X) a Z) das suas conclusões.

De ressalvar, in fine, que este foi também o entendimento propugnado por este Tribunal nos Acórdãos prolatados no âmbito dos processos nºs 1006/17.6BELRA, datado de 28 de janeiro de 2021, e 1720/15.0BELRA, de 07 de junho de 2018, os quais visavam a mesa Impugnante, e os mesmos fornecedores ainda que reportados a outros exercícios.

Assim, tudo visto e ponderado, conclui-se que a AT elencou indícios consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade das faturas emitidas pelos fornecedores visados e supra elencados não corresponderem a operações reais, os quais permitem suportar-atenta a falta de prova positiva por parte da Recorrente- objetivamente e à luz das regras da experiência comum, a conclusão a que chegou e que determinou as correções à matéria coletável de IRC, do exercício de 2011, relativamente às visadas faturas.

Destarte, improcede o recurso da Recorrente, mantendo-se a decisão recorrida por a mesma não enfermar de quaisquer dos vícios assacados.


***

IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, e confirmar a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

Registe. Notifique.


Lisboa, 10 de março de 2022

(Patrícia Manuel Pires)

(Vital Lopes)

(Luísa Soares)



________________________________

(1) António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª edição, pp 165 e 166; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; Vide, designadamente, Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº 6505/13, de 2 de julho de 2013.
(2) Ac. STJ de 01.10.2015, P. 824/11.3TTLRS.L1.S1; Ac. STJ de 14.01.2016, P. n.º 326/14.6TTCBR.C1.S1; Ac. STJ de 11.02.2016, P. n.º 157/12.8TUGMR.G1.S1; Ac. STJ, datado de 19/2/2015, P. nº 299/05; Ac. STJ de 22.09.2015, P. 29/12.6TBFAF.G1.S1, 6ª Secção; Ac. STJ, datado de 29/09/2015, P. nº 233/09; Acórdão de 31.5.2016, 1572/12; Acórdão de 11.4.2016, 449/410; Acórdão do STJ de 27.1.2015, 1060/07.
(3) Vide, designadamente, Acórdão do STJ datado de 19/02/2015, proferido no processo nº 299/05.06TBMGD.P2.S1.
(4) Conforme doutrina o Ac. STJ. de 03/03/2016, no processo nº 861/13.3TTVIS.C1.S.
(5) JORDI FERRER BELTRÁN, La Valoración Racional de la Prueba, Marcial Pons, 2007, p. 76.