Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:454/04.6BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:06/05/2019
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:MÉTODOS INDIRECTOS;
CRITÉRIO TÉCNICO;
ERRO NA QUANTIFICAÇÃO.
Sumário:I – Ainda que caiba à Administração Tributária eleger o critério conducente à determinação da matéria tributável, o mesmo tem de revelar-se adequado e racionalmente justificado, isto é, tem de revelar-se como um modo adequado de aproximação à realidade que visa tributar.
II – Em caso de litígio entre o contribuinte e a Administração Tributária quanto ao critério eleito e aos resultados deste, cabe ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação ao caso concreto, isto é, aferir se o “critério presuntivo eleito” se revelou nas circunstâncias concretas ajustado e adequado ao fim tido em vista e se essa adequação e justeza de mostra comprovada pelos factos apurados.
III – Estando provado nos autos que a utilização exclusiva daquele critério na determinação da matéria tributável conduziu em concreto a erro de quantificação, deve o acto ser anulado, independentemente de a prova de tais factos ter resultado de actuação da própria Administração Tributária, da interpretação de elementos por esta trazidos ao processo ou de actuação exclusiva do contribuinte, pois o que revela para efeitos de decisão (apurados os factos), não é a identidade da parte que efectuou a prova ou a identificação de quem tinha o ónus de a realizar, mas sim o que efectivamente se provou e em que medida é que os factos já apurados se mostram susceptíveis de preencher a conclusão de erro na quantificação.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I – Relatório

A Autoridade Tributária e Aduaneira, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra - que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por Supermercados E…, Lda., contra o acto de liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios, referentes ao exercício fiscal de 1992, no montante global de €281.500,93 - recorreu para este Tribunal Central Administrativo Sul.

Tendo alegado, formulou, a final, as conclusões que infra se reproduzem:

«A- No caso em apreço, mostraram-se reunidos os pressupostos legas de que depende a aplicação de métodos indirectos de tributação.

B- De facto, estribou a Douta Sentença a quo que “Perante tais anomalias, considera-se legitimado o recurso à aplicação dos métodos indirectos, em virtude da impossibilidade de apurar a verdadeira situação patrimonial da empresa, não restava outro caminho à ATA senão lançar mão de tais métodos indiciários, sob pena de beneficiar o infractor que não organiza a sua contabilidade de acordo com as regras legais previstas nos códigos tributários e comerciais, de molde a apurar e controlar o lucro tributável da sua actividade no exercício de 1992.”

C- A utilização de métodos indirectos de tributação traduz-se no recurso por banda da AT a elementos de facto conhecidos que, utilizados segundo as regras da experiência pautados por critérios de razoabilidade e normalidade conduzem à extrapolação de outros desconhecidos que seriem do suporte ao juízo valorativo extraído pela mesma.

D- Evidentemente o recurso aos métodos indiciados está legitimado por força do princípio da capacidade contribuída, o qual apenas ganha a sua máxima amplitude quando se mede directamente a matéria tributável, sendo, por isso, uma faculdade da AT, no exercício do seu poder/dever de liquidar imposto quando comprovadamente demonstre não poder alcançar, por via directa, o rendimento tributável.

E- Na senda ao acórdão do TCA Sul, de 03-02-2004, proc. 785/03, "Para que assim não suceda, imperioso se torna que aquele a quem possa ser oposto o método em causa faculte os elementos necessários e indispensáveis à decisão a tomar, de forma a que os resultados a que permitam chegar se mostrem reais, efectivos, concretos e credíveis, assim excluindo, necessariamente a possibilidade da utilização de tais métodos".

F- Assim, face às regras enunciadas e ao comportamento da Administração Fiscal, verificamos que foram carreados aos autos dados certos e objectivos, baseados no relatório de exame aos documentos contabilísticos efectuado no âmbito da acção de inspecção supra citada.

G - Sabemos que o nº2 do artigo 344º do Código Civil (CC| e o nº3 do artigo 74º da LGT estabelece uma repartição do ónus da prova, em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, competindo à Administração Fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação e ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação.

H- Sendo que este é um ónus que tem vindo a ser doutrinal e jurisprudencialmente entendido como possuindo uma natureza de ónus objectivo, por decorrência do princípio da oficialidade e não de ónus subjectivo tal como em sede de alegação, embora hoje este subjectivo de alegação se apresente mitigado por disposição expressa dos nºs 2 e 3 do artigo 264º do CPC (actual artigo 5º, na redacção introduzida pela Lei nº41/2013, de 25 do Junho), que introduziu o conhecimento oficioso do factos instrumentais e complementares, cfr. entre outros as acórdãos do TCA-Sul, de 04-05-2010, de 21-10-2008 e de 01-04-2003, proferidos no âmbito aos processos n°s 03903/10, 02018/07 e 02076/07, respectivamente.

I- Ora de acordo com os elementos constantes dos autos verifica-se que a Administração Fiscal cumpriu com o ónus que sobre si recaia e provou inequivocamente que se verificavam os pressupostos que legitimam o recurso a tais métodos indiciários.

J- Portanto, é manifesto que cabe aquele a quem a aplicação de métodos indirectos de tributação venha a ser oposto, a demonstração de que a realidade é diversa do resultado a que conduziu tais métodos, in casu é um ónus que pertence ao impugnante.

K- É que ”porque essa quantificação foi feita com recurso a métodos indiciários e ficando incólume a decisão de recorrer a esses métodos, é sobre o Contribuinte que recai o ónus de demonstrar o erro ou manifesto exagero desta quantificação (art. 100.º, n.º 3, do CPPT), não bastando que o mesmo crie dúvida sobre a quantificação do facto tributário. Dúvida sobre a quantificação existe sempre quando se recorre aos métodos indirectos.”, cfr. acórdão do TCA-Sul, de 04-05-2010, proc. nº03903/10.

L- Bem se compreende que o contribuinte fique nesta posição menos favorável, como se postulou no acórdão do TCA-Sul de 22-05-2001,proc. nº4016/000 “porque a quantificação por presunção só a si lhe é imputável, pelo que o contribuinte, se queria ser tributado pelo lucro real, deveria ter uma contabilidade sã, que permitisse o controlo dos dados nela constante".

M- E foi também esta a posição plasmada pelo EPGA, na sua promoção a fls.186, dos autos, no sentido da negação da pretensão do impugnante por "não lograr provar de forma clara e inequívoca que as extrapolações da F.P. se mostram erradas e, assim, errados os cálculos que servem de base à liquidação posta em causa».

N- Não se deve permitir que a “fundada dúvida" a qual alude o anterior artigo 121º do CPT e actual 100º do CPPT, seja assente na ausência ou na inércia probatória das partes, sobretudo do impugnante, vide, a este propósito, o acórdão do STA de 15-01-1997, recurso nº17914.

O- Na verdade, o impugnante não veio carrear qualquer dado concreto aos autos, donde se pudesse extrair extravasados os limites latentes da aplicação dos métodos indiciários de tributação, pelo que não logrou provar, como lhe competia à luz do nº3 do artigo 74º da LGT, que os dados apurados pela Administração Fiscal não correspondiam à realidade.

P- A Douta Sentença proferida pela Meritíssima Juiz a quo, fez uma incorrecta aplicação da lei e violou o artigo 344º, nº2 do CC e os artigos 74º, nº3, 87º, alínea b) e 88º, alínea b), todos da LGT.

Pelo exposto, somos da opinião que o douto Tribunal a quo, estribou a sua fundamentação na errónea apreciação dos factos relevantes para apreciação, a manter-se na ordem jurídica, a Douta Sentença ora recorrida revela uma inadequada interpretação e errada subsunção dos factos ao direito.

TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO RECURSO, DEVE A DECISÃO SER REVOGADA E SUBSTITUIDA POR OUTRA QUE DECLARE A IMPROCEDÊNCIA DA IMPUGNAÇÃO JUDICIAL.
PORÉM,V.EX.AS, DECIDINDO, FARÃO
A COSTUMADA JUSTIÇA!»

A Recorrida, notificada da admissão do recurso interposto, não contra-alegou.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal, emitiu douto parecer no sentido da procedência do recurso.

Colhidos os «Vistos» dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

II – Objecto do recurso

Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: artigo 639.°, n°1, do Código de Processo Civil) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso.

Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (artigo 635.°, n°2 do Código de Processo Civil) esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (n.°3 do mesmo artigo 635.°). Assim, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Atento o exposto, e tendo presentes as conclusões de recurso apresentadas, a única questão a apreciar e decidir neste recurso – uma vez que a impugnação na parte em que vinha posto em causa o recurso a métodos indirectos foi julgada improcedente no julgado – é se o Tribunal Tributário de Sintra errou na valoração dos factos e na aplicação do ónus probatório uma vez que, tendo julgado legitimo o recurso a métodos indirectos era sobre a Recorrida que se impunha a realização da prova do excesso de quantificação, a qual, não tendo sido realizada, devia ter determinado a improcedência da acção.

III - Fundamentação de facto

3.1. A sentença recorrida deu como assente a factualidade que infra se reproduz:

A) A Impugnante tem por objecto social a venda ao público de produtos de alimentação e utilidades domésticas, em regime de supermercado — CAE 052111.

B) A Impugnante encontra-se colectada em sede de IRC no regime normal.

C) Em cumprimento da ordem de Serviço n°1…, com despacho de 28.01.1997, foi efectuado um exame à escrita da Impugnante relativamente ao exercício de 1992.

D) Em resultado da acção de inspecção a que alude a al. C) do probatório, os Serviços de Prevenção e Inspecção Tributaria procederam a determinação do IRC do ano de 1992 por recursos a presunções, consignando no respectivo Relatório, alem do mais o seguinte:
«No teste efectuado ao apuramento diário e contabilização das I vendas de mercadorias verificámos que é elaborado um mapa (apuro diário) onde são inscritos os quantitativos globais relativamente á loja e ao talho. Este funciona na loja propriedade da empresa mas a sua exploração é feita por um empresário em nome individual que, para o efeito, paga aos Supermercados E… 8% das vendas efectuadas - Anexo V - Este valor é relevado contabilisticamente, em prestações de serviços - 4.084.727$00-Q. 12.L.3).
Este apuramento diário das vendas tem, como suporte das operações realizadas, daily Z's de numeração sequencial, ou seja, fitas das máquinas registadoras (talões recapitulativos que contêm o apuramento diário do volume de transacções) onde aparecem agrupadas as vendas por "famílias/ departamentos", incluindo o talho.
Nos testes efectuados - 30 dias do mês de Junho -Anexos VI - encontramos, saltos na numeração -faltas de Z's . Como se vê do termo de declarações - Anexo N - o gerente declara que "por vezes há funcionárias que pretendem ver que a sua caixa não tem qualquer venda registada para, assim, assumirem, responsavelmente, qualquer falta registada no final do seu período de trabalho. Então, o gerente da loja, faz sair um "Z" a zeros que, por negligência, não se encontra arquivado na contabilidade. Este procedimento de emissão de Z's a zeros não ocorre frequentemente pois só uma ou outra funcionária o exige".
Este comportamento do sujeito passivo, a emissão de Z's a zeros e o não arquivo dos mesmos, é como se emitisse facturas a zeros e depois não arquivasse todas as suas vias.
O que afirma pode ter ocorrido, mas a omissão de Z's. com valores de vendas –não a zeros - é evidente. Pois, nos dias em que há saltos nos "Z's" o quantitativo transferido para o talho não coincide.
A empresa declara transferir para o talho determinado valor mas nos "Z's" encontrados na contabilidade esse valor é sempre menor. O que não acontece nos dias 28 e 30, de Junho, onde esses valores coincidem - Anexos VI, VII e VIII.
Efectuou-se também um teste - para o mesmo mês aos pagamentos efectuados através do cartão de multibanco. Foi possível apurar o seguinte:
a) O sujeito passivo possui apenas um posto de pagamento por multibanco;
b)Do extracto mensal enviado pelo Multibanco, não constam todos os dias do mês, em virtude do sujeito passivo, não proceder diariamente ao fecho de operações. Este procedimento leva a que alguns dias acumulem com outros e que noutros existam mais do que um fecho de operações; - Anexo XIII
c) Os valores constantes do extracto já estão Influenciados pela % cobrada pela SIBS;
d) O somatório dos registos dos pagamentos com cartão multibanco, apurado nos talões das máquinas registadoras "Daily Z's", são inferiores aos que constam no extracto "Listagem das Operações de Fecho no Mês", enviado pelo Multibanco; Anexo XII
e)Devido à discrepância de valores encontrados - cerca de 2.167 contos, entre o valor apurados nos "daily Z's" e o registado no extracto Multibanco -foi solicitado ao sujeito passivo todos os talões de transferência do multibanco, bem como os talões de fecho de operações. Os mesmos nào foram apresentados porque não foi possível encontra-os -Anexo IV
J) Verificamos, também, nos testes efectuados - todos os dias do mês de Junho, que o contribuinte releva na contabilidade não os valores constantes dos Z’s das caixas registadoras mas os valores resultantes das contagens das mesmas caixas. As diferenças -para mais e para menos - encontradas não são significativas. (...)
4.5.1.2. Determinação do volume de vendas por métodos indirectos
Como já se referiu os Supermercados Europa cederam a exploração do talho a um empresário. As vendas deste são pagas pelos clientes juntamente com as (eventuais) compras de mercadorias feitas no supermercado, nas respectivas caixas registadoras. No apuramento diário do volume de transacções a empresa discrimina o que respeita ao talho.
Nas verificações efectuadas ás vendas de mercadorias do mês de Junho, foi possível recolher os elementos constantes do Anexo X e concluir o seguinte.
O contribuinte contabilizou na conta "2,6.8.1"- Talho as importâncias das colunas 'Transf. Talho mas nos daily Z's suporte desses lançamentos as importâncias agrupadas em "Talho" são menores quando há saldos na numeração desses Z's (todos os dias, excepto dois) e são rigorosamente iguais quando a sequência é exacta (os referidos dois dias). Essas comissões (diferença entre o valor das vendas do talho contabilizadas e o valor efectivamente transferido para o empresário que explora o talho) representam 13,5%, relativamente ás vendas do talho que constam nos Z’s.
Uma vez que o apuramento diário das vendas do supermercado é feito da mesma forma e no mesmo documento (vide, por exemplo, apuro diário de 21 de]unho de 1992-Anexo VII), presumimos que, também as comissões nas vendas de mercadorias são da ordem de grandeza-13,5%
Encontramos, assim, nos termos do art.°52° do CIR.C com base nestes elementos, o montante de vendas presumidas:
Vendas declaradas .... 570.609.091 $00
Coeficiente encontrado ... x1,135
Valor 647.641.318$00»

E) O Talho era explorado por um empresário sendo as vendas deste pagas pelos clientes do supermercado conjuntamente com as compras de mercadorias feitas no supermercado (Depoimento da 1ª e 2ª Testemunha).

F) Em 27.10.1992, a Impugnante reclamou para a Comissão de Revisão a que se refere o artigo 84° do CPT, não tendo os Peritos nomeados pelos intervenientes chegado a acordo (cfr. doc.. fls.171/179 do PAT).

G) O Perito indicado pela Fazenda Pública fez constar no respectivo Laudo o seguinte:
«1-Ressalta do relatório e foi confirmado pelo reclamante a comissão de informação contabilística (totais diários de caixa) que retiram credibilidade a contabilidade e consequentemente põem em causa a autenticidade dos lucros contabilísticos apresentados, suporte do apuramento do lucro tributável e consequentemente da matéria colectável nos termos dos art°s 17º e segs do CIRC.
Este facto consubstancia indícios objectivos para o recurso aos métodos indiciários previstos no art.51° e 52° do referido diploma.
2- A margem do lucro bruto (10%) reflectida na contabilidade é irrisória tendo presente O sector da actividade não obstante a concorrência existente;
3- As margens de lucro defendidas na reclamação e afloradas em sede de Comissão estão efectivamente, abaixo dos obtidos no relatório mas, não é objecto dos S.F. Tributária estimarem (...) com margens cujo universo desconhecemos. Ainda assim, as margens de lucro bruto resultantes do acréscimo de vendas são de 25,26% (margem de bruta (...) os custos de vendas) significativamente inferiores ao mesmo rácio obtido na análise interna dos S.Inspecção Tributária, cujo universo é apenas composto por empresas a dimensão e objecto social prosseguido pela reclamante.
Finalmente não transparece do relatório qualquer anomalias que possa ser invocadas para inviabilizar o seu conteúdo ou objectivo.» (Doc.fls. 183 do PAT)

H) Por decisão do Presidente da Comissão de 20.11.1997, concordando com a posição assumida pelo Perito da Fazenda Pública, manteve a fixação do rendimento por métodos indirectos nos termos seguintes:
«Dar o meu aval e aceitar a fundamentação constante do laudo do vogal da Fazenda Pública, nomeadamente o facto da quantificação apurada no relatório não enferma de nenhum vido grave que leve a que se possa a aceitar a propostas do vogal do s.p. no sentido de se arranjar outro método mais credível.
Compete pois verificar perante o relatório feito se a quantificação está ou não bem jeita. Não compete à Comissão verificar se há ou não métodos melhores (...) para apuramento do rendimento colectável ou lucro tributável.
Exercido de 1992 fixado em 80,220,545$00, seja mantido» (Doc. fls. 184 do PAT)

I) Em 04.12.2004, foi efectuada a liquidação adicional de IRC n°8310…, respeitante ao exercício de 1992, no montante de €305.546,18 61 (61.510$00) – cfr. doc. de fls. 22 dos autos.

J) No mês de Dezembro ocorrem muito mais vendas no talho devido a venda de cabrito (Depoimento da 1ª Testemunha).

M) Na charcutaria é vendido coelho (Depoimento da 1ªTestemunha).

N) Os valores vendidos na padaria do supermercado são inferiores a carne vendida no talho (Depoimento da 1ª Testemunha).

O) Por vezes registavam produtos da padaria no talho (Depoimento da 1ª Testemunha)

P) As vendas do talho variam de dia para dia (Depoimento da 2ª Testemunha).

Q) No dia 27.04.1998, deu entrada na Repartição de Finanças da Amadora a petição inicial que originou os presentes autos (cfr. fls. 2 dos autos).

R) No dia 22.10.2004, deu entrada nestes autos um oficio emitido pelo Serviço de Finanças de Amadora 1 informando, que: «(...) o imposto em causa se encontra a ser regularizado ao abrigo do DL. 124/96.» (Doc. fls. 120 dos autos)


3.2. Consta ainda da mesma sentença a título de “MOTIVAÇÃO DE FACTO” que a convicção do Tribunal assentou «na consideração dos factos provados no teor dos documentos bem como nos depoimentos prestados.
No que tange aos depoimentos prestados e que permitiram dar como assente a matéria levada às alíneas J) a P) do probatório.
A primeiro, pese embora sócia da Impugnante, revelou ser portadora de razões de ciência forte e conhecedora do funcionamento do supermercado, nomeadamente o funcionamento no que toca ao registos dos produtos vendidos.
A segunda, técnico oficial de contas da impugnante, igualmente revelou ser portador de razões de ciência forte, tendo conhecimento dos factos aos quais depôs.»

3.3. Mais ficou consignado, sob a epígrafe «FACTOS NÃO PROVADOS» que «Inexistem. As demais asserções da douta petição inicial constituem conclusões de facto e/ou direito ou são inócuas para a boa decisão da causa.»


3.4. Ao abrigo do preceituado no artigo 662.º n.º 1 do Código de Processo Civil acorda-se em alterar a redacção da al. I) do probatório.

Efectivamente, consta da referida alínea que “Em 04.12.2004, foi efectuada a liquidação adicional de IRC n°831002..., respeitante ao exercício de 1992, no montante de €305.546,18 61 (61.510$00) – cfr. doc. de fls. 22 dos autos.”.

Ora, como resulta da apreciação crítica do referido documento de fls. 22, a liquidação realizada foi-o pelo valor de Esc. 61. 256,510, a que corresponde, actualmente, o valor de € .

Assim, em substituição do então apurado, determina-se que seja a seguinte a redacção da al. I) do ponto III supra:

I. Em 04.12.2004, foi efectuada a liquidação adicional de IRC n.º 83100..., respeitante ao exercício de 1992, no montante de Esc. 61.256,510$00, a que hoje corresponde o valor de € 305.546,18 (cfr. doc. de fls. 22 dos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).”


3.5. Ao abrigo do preceituado no artigo 662.º do Código de Processo Civil por se revelar essencial para a decisão do recurso jurisdicional e se mostrar documentalmente comprovado, acorda-se em aditar ao probatório a seguinte factualidade:


S) Com a petição inicial a Impugnante juntou aos autos os quadros que constam de fls. 23, 24 e 25 dos autos, relativos aos meses de Janeiro, Julho e Dezembro de 1992, cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos.


T) Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor da “Acta n.º 593/97”, da Comissão de Revisão relativa ao pedido de revisão de matéria tributável formulado pela Recorrida em sede de IVA do ano de 1992, que consta de fls. 50 a 62 do processo administrativo apenso.


IV – Fundamentação de direito

A Recorrente, como resulta do que ficou sintetizado no ponto I deste acórdão, vem imputar à sentença recorrida erro de julgamento, partindo, no essencial da seguinte premissa: estando comprovado que se verificavam os pressupostos legitimadores de recurso a métodos indiciários a anulação da liquidação só podia fundar-se na prova inequívoca de que existiu erro ou excesso na quantificação, conforme resulta da conjugação dos artigos 342.º do Código Civil, 74.º da Lei Geral Tributária e 100.º n.º 1 e 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário [cfr. conclusões A) a N) das alegações de recurso].

Não tendo a Recorrida logrado provar aquele excesso ou erro na quantificação da matéria tributável, designadamente porque nem “veio carrear qualquer dado concreto aos autos donde se pudesse extrair extravasados os limites latentes da aplicação dos métodos indiciários de tributação” é forçoso que se conclua “que não logrou provar, como lhe competia á luz do n-º 3 do artigo 74.º da LGT, que os dados apurados pela Administração Fiscal não correspondiam à realidade(cfr. conclusão O) das alegações de recurso], impunha-se que o Tribunal tivesse mantido na ordem jurídica a liquidação impugnada.

Na sentença recorrida, a Meritíssima Juíza, após ter delimitado o objecto da acção [“Está em causa, nos presentes autos, uma liquidação adicional de IRC que tem subjacente a alteração à matéria colectável através de correcções técnicas e por aplicação de métodos indirectos levadas a cabo pela Administração Tributária e Aduaneira com referência ao exercício de 1992”] enfrentou as duas questões suscitadas na petição inicial, concluindo pela legalidade, in casu, do recurso à aplicação dos métodos indirectos e pela ilegalidade da liquidação por ser desadequado o critério utilizado na determinação da matéria tributável.
Não obstante a decisão, na parte em que julgou legítimo o recurso aos métodos indirectos não venha questionada, importa realçar em que termos é que a mesma ficou definida, isto é, em que elementos de facto e de direito se baseou, uma vez que, como vimos, é precisamente nesta decisão que se suporta todo o raciocínio que acompanha o presente recurso, transcrevendo-se, por isso, aqui o discurso fundamentador da sentença no segmento relevante:
«No caso vertente, a decisão tomada pelo presidente da Comissão de revisão, enquanto acto final de fixação da matéria colectável, apontou as seguintes anomalias à escrita da Impugnante:
“Do extracto mensal enviado pelo Multibanco, não constam todos os dias do mês, em virtude do sujeito passivo, não proceder diariamente ao fecho de operações. Este procedimento leva a que alguns dias acumulem com outros e que noutros existam mais do que um fecho de operações; - Anexo XIII.
Os valores constantes do extracto já estão Influenciados pela % cobrada pela SIBS;
O somatório dos registos dos pagamentos com cartão multibanco, apurado nos talões das máquinas registadoras “ Daily Z's", são inferiores aos que constam no extracto "Listagem das Operações de Fecho no Mês", Anexo XII
Devido à discrepância de valores encontrados - cerca de 2.167 contos, entre o valor apurados nos "dail y Z's" e o registado no extracto Multibanco -foi solicitado ao sujeito passivo todos os talões de transferência do multibanco, bem como os talões de fecho de operações. Os mesmos não foram apresentados porque não foi possível encontra-os -Anexo IV
Verificamos, também, nos testes efectuados - todos os dias do mês de Junho, que o contribuinte releva na contabilidade não os valores constantes dos Z's das caixas registadoras mas os valores resultantes das contagens das mesmas caixas. As diferenças -para mais e para menos - encontradas não são significativas. (...)»
Perante tais anomalias, considera-se legitimado o recurso à aplicação dos métodos indirectos, em virtude da impossibilidade de apurar a verdadeira situação patrimonial da empresa, não restava outro caminho à ATA senão lançar mão de tais métodos indiciários, sob pena de beneficiar o infractor que não organiza a sua contabilidade de acordo com as regras legais previstas nos códigos tributários e comerciais, de molde a apurar e controlar o lucro tributável da sua actividade no exercício de 1992».
Em resumo, para o Tribunal a quo a Administração Tributária logrou demonstrar que os erros ou inexactidões detectadas na contabilidade inviabilizavam a comprovação directa e exacta da matéria tributável e que o recurso aos métodos indiciários era a única forma de a determinar pelo que se mostrava legitimada a tributação com base nas operações que o contribuinte presumivelmente efectuou.
Diz a Recorrente que, sendo assim, não podia o Tribunal a quo ter concluído ter dúvidas quanto à quantificação alcançada e, com esse fundamento, anulado a liquidação.
Diga-se, desde já, que é verdade que a questão da “dúvida fundada”, estando em causa a determinação da matéria tributável por recurso a métodos indirectos, tem um campo de aplicação muitíssimo mais restrito do que ocorre nas demais situações de prova do facto tributário – mesmo que exista não deve ser considerada se o recurso à determinação por métodos indirectos resultar, como é o caso, da inexistência na contabilidade de elementos ou documentos necessários a um real apuramento da existência e quantificação do facto tributário (n.º 2 do artigo 100.º).
Esse restrito campo de aplicação, que o legislador acolheu no supra citado preceito conduziu a que a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores há muito venha firmando de forma unânime o entendimento de que «Recaindo sobre o sujeito passivo o ónus da prova do excesso na quantificação (artigo 74.º n.º 3 da LGT) e não tendo este logrado demonstrar erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada (artigo 100.º n.º 3 do CPPT), não pode a sentença recorrida fundar a anulação da liquidação na existência de “fundada dúvida” sobre a quantificação operada, ao abrigo do n.º 1 do artigo 100.º da LGT, pois que tal caminho lhe estava vedado na situação concreta dos autos, mercê do recurso a métodos indirectos (artigo 100.º n.º 2 do CPPT)».(1)
É, todavia, também pacífico que ao contribuinte não está vedado alegar e provar que houve erro ou excesso de quantificação, designadamente alegando e provando que o concreto método escolhido para fazer funcionar a presunção é inadequado para o acerto, ainda que possível (por aproximação) dessa quantificação.
Efectivamente, “Ainda que caiba à Administração Tributária eleger o critério conducente à determinação da matéria tributável, o mesmo tem de revelar-se adequado e racionalmente justificado, isto é, tem de revelar-se como um modo adequado de aproximação à realidade que visa tributar”, pelo que, “Em caso de litígio entre o contribuinte e a Administração Tributária quanto ao critério eleito e aos resultados deste, cabe ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação ao caso concreto, isto é, aferir se o “critério presuntivo eleito” se revelou nas circunstâncias concretas ajustado e adequado ao fim tido em vista e se essa adequação e justeza de mostra comprovada pelos factos apurados.».(2)
Foi precisamente o que sucedeu no caso concreto.
Efectivamente, e contrariamente ao que a Recorrente aduz nas suas conclusões de recurso (conclusão O) que supra curamos de transcrever por ser a síntese do fundamento do recurso), a Recorrida carreou para os autos dados concreto, que logrou provar, dos quais se pode concluir, sem que dúvidas subsistam, que o método escolhido não foi o adequado e que os resultados a que através dele se chegaram se afastam (para mais e sem justificação plausível ou que tenha sido adiantada) da realidade que visava tributar.
Ou seja, embora seja certo que a determinação da matéria colectável com o recurso a presunções ou estimativas não constitui um apuramento real da actividade do contribuinte, mas antes aproximado, verosímil, razoável, o resultado alcançado pode ser contrariado e infirmado perante prova que efectivamente demonstre que tal matéria tem menor dimensão do que a encontrada ou que se encontra errado o critério utilizado pela Administração Tributária nessa quantificação.
Foi o que ficou julgado em 1ª instância - ainda que com alguma falta de rigor nos conceitos, o que conduziu a que a Administração Tributária tivesse interpretado que era na fundada dúvida que o julgamento se tinha louvado -, onde se disse:
Questão idêntica á colocada nestes autos foi já apreciada no Acórdão do TCA Sul de 14.03.2006, in rec. 7531/02, em que a alegação da Impugnante e as conclusões da motivação do recurso são idênticas e que, por isso mesmo, vamos passar aqui a transcrever, procurando, por esta forma, obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito (cfr. artigo 8°, n°3 do CC).
Escreve-se, então, no referido acórdão que: «Ora, vindo provado que o talho era explorado por um particular que tinha contabilidade e vida empresarial distinta do estabelecimento explorado pela recorrente concede-se a razão a esta quando diz que, ainda que os produtos do talho fossem registados nas caixas do supermercado, conjuntamente com os produtos deste, não era possível estabelecer uma relação de proporção entre as vendas efectuadas do talho terem variações independentes das variações de vendas no supermercado o que é compreensível atento o leque mais alargado de produtos das vendas neste.»
E, ficou ainda consignado no referido acórdão: «Teria sido útil ao apuramento com exactidão da quantificação das vendas em falta no supermercado o cruzamento de informação entre a contabilidade do talho e a do supermercado o que não foi feito. ( ...)»
Ora, também no caso em presença, atento que ficou demonstrado, que os produtos do supermercado e do talho eram ambos registados na mesma caixa, as vendas do talho tem variações independentes de vendas do supermercado, nomeadamente no mês de Dezembro essas vendas são maiores, não poderemos deixar, de concluir, nos termos em que ficou ditado no acórdão citado: «(...) De tudo se conclui que a quantificação a que chegou a AT assentou numa margem de lucro ( contestada pela recorrente) que, também, nos suscita dúvidas ( no caso é a AF a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação foi posta em crise) quanto aos seu acerto atenta a falta de rigor do método utilizado que a recorrente contesta e que concedemos não foi o mais correcto pois no mínimo deveria ter tido em consideração outros meses do ano de 1993 e efectuado o cruzamento das contabilidades do talho e supermercado.»
E, assim, também nestes autos, impõe-se a anulação da liquidação quanto ao segmento que reflecte o apuramento da matéria tributável por aplicação de métodos indirectos.
Note-se que o método seguido, descrito no Relatório de Inspecção, consistiu exclusivamente em calcular as omissões de venda do supermercado a partir da percentagem de venda em falta encontradas para o talho.
Acontece porém que, como se salienta no acórdão em que a sentença recorrida se louvou (pelas razões aí indicadas) está também provado nos nossos autos que o talho era explorado por um particular que tinha contabilidade e vida empresarial distinta do estabelecimento explorado o que impõe que se deva conceder razão à Recorrente quando alega que, porque os produtos do talho eram registados nas caixas do supermercado, conjuntamente com os produtos deste, não é possível estabelecer uma relação de proporção entre as vendas efectuadas do talho, as quais têm, como se provou, variações independentes das variações de vendas no supermercado, o que é compreensível atento o leque mais alargado de produtos das vendas neste
Como se constata do Relatório de Inspecção, a Administração Tributária, ainda que ciente da independência económica jurídica referida, nem sequer curou de efectuar qualquer cruzamento entre a contabilidade da Recorrente a do Talho, como mencionado pela Recorrida, testando, assim, os pressupostos de que partiu na aplicação do método presuntivo de que partiu para a quantificação. Nem, tendo em vista o mesmo fim, nem sequer ponderou, mesmo, insista-se, ciente da falta de relação entre as vendas do supermercado e do talho, aferir dos resultados a que chegaria se ponderasse outro mês ou outros meses conjuntamente e que, como alega e comprovou a Recorrida, teriam conduzido a resultados manifestamente distintos em termos de quantificação, para menos [cfr. facto provado na alínea S)].
Acresce que, para além de se não ter logrado encontrar no Relatório de Inspecção nem na acta da Comissão de Revisão qualquer justificação para que não se tivesse atentado nos indicadores oficiais para o sector de actividade viabilizados pelo INE e pela então DSEPDGCI e para que se tivesse optado por indicadores cujo fundamento substancial igualmente não se mostra comprovado, resultou ainda provado que na sequência de liquidação em matéria de IVA - sublinhe-se, em procedimento de facto e de direito em tudo idêntico -, a Administração Tributária assumiu um comportamento completamente distinto do que assumiu em matéria de IRC.
Na verdade, conforme resulta do probatório por nós aditado, naqueloutro procedimento, já em sede de procedimento de revisão da matéria tributável, “ A comissão de revisão considerou por unanimidade que se justificava a aplicação de métodos indiciários ou presunções para apuramento do Imposto Sobre o Valor Acrescentado a pagar com respeito ao exercício de 1992. Considerou ainda, no entanto, que o método utilizado pelo Técnico de Fiscalização para determinar as omissões não era o mais consentâneo com o tipo e funcionamento da empresa. Extrapolar para o universo da empresa as omissões registadas exclusivamente com o talho, que aliás não era pertença do contribuinte, procedendo apenas este apenas ao registo das suas vendas, consiste numa técnica bastante falível e pouco abonatória, tanto mais que: 1) O universo de produtos numa empresa de “Supermercados” é muito mais variado e com margens bem distintas; 2) A empresa está implantada geograficamente numa área bastante comercial onde imperam 2 hipermercados; 3) A amostra foi pouco significativa e de fraca abrangência.”.
Mais aí ficou decidido que, por esses motivos, “a comissão de revisão decidiu aplicar para efeito de apuramento do imposto a pagar uma Margem Bruta sobre as vendas determinada pela média dos 3 valores propostos, sendo um pelo Instituto Nacional de Estatística (…) e dois pela própria Administração Fiscal”.

Recuperando aqui as conclusões deste recurso aduzidas pela Fazenda Pública, que subscrevemos, a utilização de métodos indirectos de tributação deve traduzir o “ recurso por banda da AT a elementos de facto conhecidos que, utilizados segundo as regras da experiência pautados por critérios de razoabilidade e normalidade conduzem à extrapolação de outros desconhecidos que seriem do suporte ao juízo valorativo extraído pela mesma”, de forma a “que haja uma verdadeira legitimação do recurso a tais métodos por força do princípio da capacidade contribuída”.

Ora, face a tudo quanto se provou e que vimos expondo, não temos dúvidas em afirmar que os elementos de facto conhecidos pela Administração Tributária, nos exactos termos em que se mostram apuados, impunham, na busca de uma aproximação à capacidade contributiva que persiste como elemento regulador, que tivesse sido outro, mais razoável e marcado por índice de normalidade, designadamente o por si reconhecido como adequado em sede de IVA, o método escolhido para a determinação do “facto desconhecido” que desse modo surgiria devidamente fundamentado.

Não o tendo feito e tendo a Recorrida logrado demonstrar, através da prova testemunhal e documental, que o critério utilizado pela Administração Tributária não é o mais adequado e que o por si proposto é mais credível e mais adequado à exacta e justa quantificação há, com estes fundamentos, que confirmar a sentença recorrida, atenta a verificação dos pressupostos previstos no artigo 100.º, n.º 3 da LGT.
Em conclusão: Estando provado nos autos que a utilização exclusiva daquele critério na determinação da matéria tributável conduziu em concreto a erro de quantificação, deve o acto ser anulado, independentemente de a prova de tais factos ter resultado de actuação da própria Administração Tributária ou da interpretação de elementos por esta trazidos ao processo, pois o que revela para efeitos de decisão (apurados os factos), não é a identidade da parte que efectuou a prova ou a identificação de quem tinha o ónus de a realizar, mas sim o que efectivamente se provou e em que medida é que os factos já apurados se mostram susceptíveis de preencher a conclusão de erro na quantificação.
Improcede, pois, com esta fundamentação, o recurso jurisdicional, o que, a final, se decidirá, sem, no entanto, haver condenação em custas uma vez que, tendo a presente impugnação judicial dado entrada em juízo antes de Janeiro de 2004 (1998), aplica-se-lhe, nesta matéria, o preceituado no Código das Custas Judiciais aprovado pelo DL n.º 224-A/96 de 26-11, na redacção anterior às alterações introduzidas pelo DL n.º 324/03, de 27-12, o qual dispunha, para o que ora releva, no artigo 2.º n.º 1 al. a), que o Estado, incluindo os seus serviços ou organismos, mesmo que personalizados, estão isentos de custas.


V- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, confirmando a sentença recorrida com os fundamentos exarados no ponto IV deste acórdão, em negar provimento ao recurso jurisdicional.

Sem custas.

Registe e notifique.

Lisboa, 5 de Junho de 2019

(Anabela Russo)

(Vital Lopes)

(Joaquim Condesso)

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(1) Vide, por todos, o recentíssimo acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17-10-2018, proferido no processo n.º 261/11.0BECBR, integralmente disponível em www.dgsi.pt
(2) Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 18 de Junho de 2015, proferido no processo n.º 7006/13, integralmente disponível em www.dgsi.pt, bem como os arestos do Supremo Tribunal Administrativo aí citados.