Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:341/18.0BEFUN
Secção:CT
Data do Acordão:09/15/2022
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:IMPOSTO SOBRE O ÁLCOOL E AS BEBIDAS ALCOÓLICAS
VÍCIO PROCEDIMENTAL
ÓNUS PROBATÓRIO
EXISTÊNCIAS
PRODUTOS MACERADOS
ANÁLISE LABORATORIAL
Sumário:I-No âmbito de um procedimento de inspeção externo, a regra é da materialização dos atos de inspeção nas instalações ou dependências ou do contribuinte, podendo, naturalmente, solicitar-se um ou outro documento aos sujeitos passivos, aliás, tal é o que dimana do plasmado nos artigos 34.º, nº1, e 56.º, ambos do RCPIT quanto ao procedimento de recolha de elementos, os quais visam o cumprimento dos imperativos de presencialidade e de imediação física.
II-Invertendo-se e preterindo-se a aludida regra, e demonstrando-se que essa preterição granjeou reflexos em sede probatória materializada nas correções técnicas impugnadas, há lugar a um vício procedimental invalidante do ato de liquidação.
III-Se a quantificação atualizada das existências foi apresentada, e se encontra devidamente suportada, a realidade fática em contenda não pode subsumir-se no artigo 22.º, nº3, alínea b) do CIEC, tendo, de resto, sido cumprido o consignado no artigo 16.º, nº2, alínea c) da Diretiva 2008/118/CE do Conselho.
IV-A ATA não pode limitar-se a, genericamente, evidenciar a existência de algumas irregularidades, mas sem a devida concretização fática, utilizando, maioritariamente, uma técnica ilustrativa e exemplificativa, sem qualquer expressão espácio temporal e numérica, como legalmente se impunha. A dificuldade acrescida e a complexidade não podem redundar em pressupostos que legitimam a reconstituição das contas correntes e as correções efetuadas.
VI-A Direção de Serviços Técnicos, Análises e Laboratório, é dotada de laboratório, o qual consegue aferir o teor alcoólico de produtos em maceração através de análise química. Logo, a ATA pode/deve recorrer a esta diligência, particularmente em caso de dúvidas quanto aos produtos macerados e ao abrigo do inquisitório.
VII-A fundada dúvida no domínio dos produtos macerados tem de ser valorada contra a ATA, ao abrigo do artigo 100.º do CPPT.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I-RELATÓRIO

O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (doravante DRFP ou Recorrente) veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida, pelo Tribunal Tributário Administrativo e Fiscal do Funchal, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por “E... LDA”, (Recorrida) contra o ato de liquidação de Imposto sobre o Álcool e as Bebidas Alcoólicas (IABA) a que corresponde o registo de liquidação n.º 9000333, respetivos juros compensatórios e valor do impresso, no montante global de €489.974,26.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem:

A) Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial e, em consequência, anulou “a liquidação de IABA impugnada, e os correspetivos juros compensatórios, com todas as consequências legais” e condenou em custas a FP.

B) Com o assim decidido, não pode a FP, conformar-se, padecendo a douta sentença de erro de julgamento de facto [por ter errado na seleção e valoração da prova] e de direito [por não ter feito uma correta interpretação e aplicação das normas estabelecidas no n.º 1 do art.º 13.º, 29.º e 34.º e 56.º do RCPITA e al. b) do n.º 3 do art.º 22.º do CIEC].

C) O Tribunal a quo não se pronunciou sobre a possibilidade de dispensa de remanescente prevista na 2.ª parte do n.º 7 do art.º 6 do RCP, requerendo a FP a reforma quanto a custas.

D) Entende a Fazenda Pública que o Douto Tribunal não levou ao Probatório, como lhe competia, todos os elementos relevantes para a boa decisão da causa e a descoberta da verdade material, como não poderiam ter sido dados como provados alguns factos da forma como constam do Probatório.

E) Pelo que, de molde a subsumir a situação real respigada dos autos à boa decisão da causa, o Probatório deverá ser corrigido de acordo com a verdade factual, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 662.º do CPC.

F) Devem ser aditados os seguintes factos:

64. A Alfandega do Funchal foi incumbida de acompanhar a Impugnante após a inspeção, tendo verificado que as deficiências detetadas na mesma foram ultrapassadas.

65. A Alfândega do Funchal, apesar de manter controlo sobre a Impugnante, em nenhum momento pôs em causa as conclusões do relatório de que houve introdução irregular no consumo.

G) Deverá ser aditado como facto não provado:

a) As deficiências detetadas não impediam de apurar corretamente a mercadoria que era introduzida no consumo.

H) Os pontos 10 e 19 deverão ter o seguinte teor

10. Por outro lado, a Alfandega do Funchal, enquanto estância aduaneira de controlo, mantém controlos permanente sobre a Impugnante, atenta a sua qualidade de depositário autorizado com entrepostos de produção, tendo sido verificado irregularidades ao longo do tempo, nomeadamente falta de produto num varejo em 2003.

19. Os serviços laboratoriais da Direção de Serviços técnicos, Análises e Laboratório conseguem aferir o teor alcoólico de produtos em maceração através de análise química, não sendo, no entanto, nada comum fazer essa análise pois a informação do operador é suficiente, não estando a Alfândega do Funchal dotada dessa capacidade.

I) porque a sentença de que se recorre, considerou, por erro de julgamento de facto conforme supra se expôs, tal decisão padece também de erro de julgamento de direito por não ter feito uma correta interpretação das normas ínsitas no n.º 1 do art.º 13.º, 29.º e 34.º e 56.º do RCPITA e al. b) do n.º 3 do art.º 22.º do CIEC].

J) Da leitura da al. a) e b) do art.º 13.º do RCPITA resulta que, a lei não obriga a que os atos de inspeção sejam todos praticados nas instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, mesmo no caso do procedimento externo.

K) O que sucedeu neste caso, optando-se por realizar alguns atos nas instalações do sujeito passivo e outros atos fora daquelas instalações, nomeadamente a inventariação dos produtos que se encontravam armazenados ao abrigo do regime de suspensão de IEC e a recolha dos elementos necessários à inspeção, tais como a contabilidade de existências do EF, a qual se verificou no local que não estava atualizada, violando desta forma o art.º 22.º, n.º 3, alínea b) do CIEC.

L) Assim, os elementos foram solicitados presencialmente tendo sido feito um reforço do pedido via e-mail uns dias depois da primeira visita às instalações da Impugnante.

M) As notificações para solicitação da documentação só foram realizadas visto que a Impugnante não disponibilizava os elementos necessários à realização da inspeção, não resultando da lei que as mesmas tenham que ser presencialmente, nos termos dos artigos 28.º, 29.º e 42.º do RCPITA.

N) Não havendo qualquer violação dos n.º 1 do art.º 13.º, 29.º e 34.º e 56.º do RCPITA.

O) Resulta do relatório de inspeção que não foram entregues à equipa inspetiva todos os documentos solicitados necessários à realização da inspeção, nomeadamente as fichas de produção.

P) A inspeção teve como objetivo controlar a regularidade das operações efetuadas nos EF de que o operador é titular no que concerne ao IEC que recai sobre o álcool e as bebidas alcoólicas produzidas e recebidas naqueles Entrepostos Fiscais.

Q) Para apurar as quantidades de produto efetivamente fabricado, é necessário verificar as fichas de produção do EF.

R) O facto de as fórmulas de fabrico terem sido entregues na Alfândega do Funchal não é suficiente para a determinação das quantidades de produto efetivamente fabricado pela Impugnante.

S) No que respeita ao controlo dos produtos macerados, sem as respetivas fichas de produção, não é possível quantificar as incorporações de rum, álcool etílico e vinho da Madeira naqueles produtos.

T) Com efeito, não era possível determinar, nem com análise laboratorial, a data de fabrico dos mesmos, pelo que não seria correto presumir que os mesmos teriam sido feitos numa ou noutra data.

U) Recorrer às taxas de rendimento dos macerados para aferir as quantidades eventualmente incorporadas de rum, álcool etílico e vinho da Madeira naqueles produtos também não seria rigoroso, pois tal implicaria a presunção da utilização de produtos sem que tal tivesse apoio em evidências e essa presunção constituiria mera especulação por parte da inspeção, sem qualquer base em factos.

V) A análise laboratorial ao teor alcoólico dos macerados também não seria possível aferir as quantidades de rum, álcool etílico, vinho da Madeira e outros ingredientes que eventualmente foram colocadas naqueles produtos.

W) Daí não ser de todo, uma prática comum [vide facto 19 do probatório rectificado], sendo antes uma obrigação do operador, neste caso, da Impugnante.

X) Desta argumentação se mostra que não foram apresentados factos que comprovassem que o rum, o álcool etílico e o vinho da Madeira estariam no EF sob a forma de macerados, como pretende a Impugnante e que tal conclusão só poderia ser retirada com recurso a presunções e suposições, metodologia que nunca poderia ser seguida pela inspeção, que apenas se limita às evidências e aos factos recolhidos.

Y) A própria testemunha da Impugnante M... [técnico da Autoridade Tributária], que claramente hesita em afirmar que as deficiências detetadas não impediam de apurar corretamente a mercadoria que era introduzida no consumo.

Z) Pelo que, deverá concluir-se que a AT logrou por efetivamente em causa a veracidade da contabilidade da Impugnante.

AA) Para a reconstituição dos stocks foi necessário recorrer aos inventários de final de ano elaborados pela Impugnante.

BB) Face à explicação dada pela Impugnante, para a reconstituição de stocks apenas foram consideradas as existências que constavam contabilizadas no armazém “A2” e no armazém “AEX” e que, portanto, apenas incluíam os produtos em suspensão de IEC.

CC) Ou seja, os inventários de final de exercício foram fornecidos pela impugnante e retirados do seu sistema contabilístico.

DD) Importa também esclarecer que nos seus apuramentos, quando é detetada mais mercadoria do que a apurada, então considera-se que, estando em EF, apenas deverá IEC quando for introduzida no consumo.

EE) Por outro lado, quando é detetada menos mercadoria do que a apurada, então considera-se que saiu de EF em situação irregular e constitui-se dívida em sede de IEC.

FF) Quanto à alteração dos inventários, é preciso dizer-se que esses inventários de final de ano têm subjacente o cumprimento de uma obrigação de natureza tributária fiscal, com reflexos no apuramento dos resultados líquidos do exercício e no IRC incidente sobre os mesmos e não uma obrigação de natureza tributária aduaneira, em cuja esfera se incluem os IEC.

GG) Por outro lado, a AT, ao aceitar declarações de substituição, fá-lo no pressuposto de que o contribuinte detetou um lapso nos elementos que declarou anteriormente e tem a iniciativa de alterar as suas declarações anteriores com boa-fé, a bem da verdade material.

HH) Afigura-se improvável que à distância de mais de 5, 4, 3 e 2 anos, em 2018, conseguisse a Impugnante quantificar, com exatidão, os seus inventários em 31/12/2013, 31/12/2014, 31/12/2015 e 31/12/2016, respetivamente, quando já não está na presença da mercadoria nem da realidade que constava nos seus armazéns naquelas datas.

II) Nestes termos, e em face de tudo o exposto, incorre a douta sentença em erro de julgamento de direito, por violação da al. b) do n.º 3 do art.º 22.º do CIEC].

JJ) Termos em que, e pelo muito que V. as Ex.as doutamente suprirão, se requer seja dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida.

KK) Não houve pronúncia a possibilidade de dispensa de remanescente prevista na 2.ª parte do n.º 7 do art.º 6 do RCP, devendo a sentença ser objeto de reforma quanto a custas ao abrigo do n.º 1 do art.º 616.º do CPC.

LL) Ou, subsidiariamente, deverá o valor da taxa de justiça ser ajustado para um montante considerado justo e equilibrado, adotando-se uma solução que não choque com o comum sentimento de justiça.

Nestes termos e nos demais de Direito, deve ser dado provimento ao presente recurso por erro de julgamento de facto e de direito, revogando-se a douta sentença recorrida.

A Fazenda Pública requer, muito respeitosamente a V. Exas., ponderada a verificação dos seus pressupostos, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça prevista no n.º 7 do art.º 6º do RCP.


***

A Recorrida devidamente notificada contra-alegou, tendo concluído da seguinte forma:

“1ª - A douta sentença recorrida fez correcta identificação e selecção da matéria de facto pertinente para a boa decisão da causa e fundamentou bem de facto e de direito a decisão tomada, devendo assim ser integralmente mantida a sentença recorrida.

2ª- O aditamento à matéria de facto provada de dois factos novos a que atribui os nºs 64º e 65º é manifestamente inadmissível e violadora das mais elementares regras processuais.

3ª- Os referidos factos 64º e 65º cujo aditamento é pretendido pela Fazenda Pública jamais foram alegados por esta quer no âmbito do procedimento de inspecção quer na fundamentação da liquidação impugnada nos presentes autos.

4ª. - Também não foram alegados na contestação à impugnação nem, tão pouco, como eventuais factos supervenientes antes do fim da produção da prova no Tribunal recorrido.

5.ª - São, pois, factos alegados pela primeira vez em sede de recurso.

6.ª- Além disso são posteriores à conclusão do procedimento inspectivo e à liquidação decorrente do mesmo e nele fundamentada, pelo que em nada interferiram ou podiam interferir com a liquidação impugnada e respectivos fundamentos ou com o procedimento administrativo que a precedeu.

7ª. São ainda factos estranhos ao objecto do processo, intempestivos e impertinentes, sem qualquer interesse para a boa decisão da causa. Mesmo que por mera hipótese de raciocínio fossem admitidos, em nada poderiam alterar a sentença recorrida.

8.ª- A pretensão da Fazenda Pública não tem suporte factual no depoimento da testemunha, como se comprova nos trechos do depoimento da testemunha M..., de minuto 25:32 a minuto 26:57 e de minuto 31:10 a minuto 34:34 para os pretendidos factos 64 e 65.

9.ª – Acresce que incumpriu assim o ónus legal que sobre si recaía de «indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso» cfr. artigo 640º nº2 alínea a) do C.P.C..

10.ª- O pretendido aditamento de facto não provado (conforme artigos 15º e 16º das alegações da Recorrente e conclusão G) das mesmas) é também ele inadmissível

11.ª - Não se trata de um facto, mas sim de uma mera conclusão, que mais não pretende que contrariar a fundamentação da douta sentença recorrida.

12.ª- A Recorrente alega que a testemunha terá afirmado o contrário do pretenso facto que pretende seja aditado como não provado.

13.ª- Do depoimento da testemunha em causa, trecho de minuto 33:00 a minuto 34:35, resulta que a pretensão de aditar o referido facto, como não provado, carece de fundamento.

14ª -Alega ainda a Recorrente nos nºs 17 a 20 das suas alegações e na conclusão H), que os factos 10 e 19 da matéria de facto dada como provada deverão ter nova redacção.

15.ª -Estamos perante mais uma tentativa ilegal e inadmissível de introduzir na matéria de facto, factos não alegados, nem no procedimento de inspecção, nomeadamente no relatório final, nem na contestação, nem ainda na fase de produção de prova em tribunal.

16.ª-Depois, trata-se de alegação de carácter genérico sem qualquer concretização e sem nenhum interesse para a boa decisão da causa, já que não tem (nem sequer é alegada) qualquer relação com a matéria dos autos.

17.ª- O trecho que a Recorrente pretende que seja acrescentado ao nº10 da matéria de facto constitui uma falsidade e está em contradição com o facto nº1 da matéria de facto dada como provada, no qual, e bem, está provado que a Recorrida foi constituída em 2006!!!

18.ª- Está também em contradição com o facto nº11 da matéria de facto provada.

19.ª- É mais uma vez notório o incumprimento pela Recorrente do ónus, que sobre si recai, previsto no artigo 640.º nº2 alínea a) do C.P.C. de «indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso».

20.ª- A alteração pretendida ao nº 19 da matéria de facto não constitui matéria de facto. Isto porque é, no essencial, matéria opinativa e conclusiva.

21.ª- Além disso, e mais uma vez, a Recorrente deturpa o depoimento da testemunha como se pode verificar do trecho do seu depoimento de minuto 24:30 a minuto 25:30.

22.ª- No que concerne ao local da prática dos actos inspectivos, a sentença recorrida debruça-se aprofundadamente sobre a questão no ponto i. i) de fls.40 a fls.45.

23.ª- Além das disposições legais pertinentes em que se apoia, cita doutrina consagrada sobre a matéria, lembrando que a limitação constante do nº1 do artigo 34.º do RCIPTA «constitui – e bem – uma importante garantia do contribuinte» que, além de legalmente consagrada, «o bom senso implicaria».

24.ª- «… a equipa de inspeção esteve presente duas vezes nas instalações da Impugnante – na data do varejo (a 23 de março de 2017) e em 03 de abril de 2017 (cfr. pontos 24. e 32. dos factos provados)-, passando depois a solicitar à distância a entrega de milhares de documentos através de mensagens de correio electrónico e por via postal (cfr. pontos 26.a 31., 33. A 42. e 44. a 48. da matéria assente) em detrimento das regras acabadas de citar relativas ao local da prática dos atos inspetivos, imediação e presencialidade.»

25.ª- «Tal prática não se pode ter por justificada, sem mais, com as prerrogativas da inspeção, mostrando-se, na ausência de qualquer outra elucidação, como desproporcionada e ilegal, por preterição de formalidade essencial do procedimento inspetivo, invalidante dos termos procedimentais posteriores, designadamente liquidação que neles se suporta».

26.ª -Quanto à ilegalidade substancial das correcções tratada no ponto iii) da sentença, fls 50 a 54, nada há também a apontar à sentença recorrida. Trata-se de uma fundamentação clara, aprofundada e correcta.

27.ª- «… parte da mercadoria alegadamente introduzida de forma irregular no consumo, e que originou a liquidação impugnada, encontrava-se no entreposto sob a forma de produto macerado, tendo sido indevidamente desconsiderada com base no falso argumento de que não era suscetível de controlo.»

28.ª- «Além da aduzida desconsideração da mercadoria existente em entreposto fiscal, os serviços inspetivos socorreram-se dos inventários fiscais apresentados com as declarações de IES, considerando a totalidade de cada produto (a que já estava introduzida no consumo e a que se encontrava em entreposto fiscal).

29.ª- «E sempre que nos seus apuramentos havia no final de um ano mais mercadoria do que a apurada, a mesma não era tida em conta na abertura dos movimentos dos anos seguintes, mas quando no ano a seguir faltava essa mesma mercadoria, então concluíam que tinha sido introduzida no consumo.»

30.ª- «A apontada metodologia padece de um problema de base, materializado no facto de a Impugnante, em 29 de maio de 2018, ter apresentado declarações de IES de substituição para os exercícios de 2013 a 2016, com inventários fiscais corrigidos para 2013, 2014, 2015 e 2016 (cfr. pontos 61. e 62. da matéria apurada), as quais foram aceites pela Autoridade Tributária (circunstância que não vem colocada em crise).»

31.ª- «A premissa utilizada pelos serviços inspetivos para a reconstituição das contas correntes – as existências finais/iniciais constantes nos inventários fiscais dos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016 -, desapareceu da ordem jurídica.»

32.ª- As alegações da Recorrente, relativamente ao alegado erro de julgamento, assentam numa narrativa criada pela Autoridade Tributária, falaciosa, que desconsidera a matéria de facto dada como provada nos autos, estribando-se em factos alternativos não provados.

33.ª- Os mapas da Contabilidade de Existências em Excel entregues pela Recorrida à equipa inspectiva aquando do varejo e, posteriormente, por e-mail de 28.08.2017, contêm todos os elementos, que agora, em sede de recurso, a Recorrente diz que eram necessários à fiscalização.

34.ª- Nomeadamente as diversas mercadorias e quantidades entradas em entreposto e as respectivas datas; as quantidades de matéria prima utilizadas no fabrico dos produtos acabados; a quantidade de produtos finais produzidos, as datas de produção, sua composição e data de saída de entreposto e introdução no consumo.

35.ª- Como aqueles mapas de Excel se referem a cada produto existente no entreposto sob qualquer forma, incluindo os macerados, nos mesmos consta a quantidade, localização, composição e destino dos macerados existentes em qualquer data no período abrangido pela fiscalização.

36.ª- A equipa inspectiva tinha, pois, toda a informação que solicitou. Não quis foi utilizar os elementos que lhe foram apresentados, optando por, discricionariamente, criar registos e movimentos alternativos, que suportassem os objectivos que pretendia atingir. E, agora, a Recorrente continua no seu recurso a alegar falsamente que não tinha esses elementos…

37.ª- O laboratório aduaneiro, actualmente designado “Laboratório da Direcção de Serviços Técnicos e Laboratório da A.T.” tem capacidade para determinar, com rigor, não só o grau alcoólico de qualquer produto, como a totalidade de todos os produtos que o compõem e respectivas quantidades.

38.ª- A apresentação dos inventários em Maio de 2018, em substituição dos anteriormente apresentados, referentes aos anos 2013 a 2016, foi devidamente alegado na p.i.. Tal como foram alegados os factos que tornaram necessária essa substituição. Bem como as consequências e efeitos dessa substituição.

39.ª- Sobre esses factos a Recorrente nada disse na contestação, ou depois, aceitando-os, pelo que não pode vir agora, em sede de recurso, questionar o que antes aceitou.

40.ª- Improcedem pois, nos termos expostos, todas as conclusões das alegações da Recorrente.

Nestes termos e nos mais de direito deve o recurso interposto pela Fazenda Pública ser julgado totalmente improcedente e mantida a sentença recorrida nos seus precisos termos.

Subsidiariamente e por mero dever de patrocínio, caso seja julgado procedente o recurso, requer-se que seja dado cumprimento ao estabelecido no n.º 1 do artigo 636.º do CPC.”


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A Digna Magistrada do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

“1. A Impugnante “E... Lda.”, é uma sociedade por quotas constituída em 2006, cujo objeto social principal consiste na fabricação e comercialização de produtos obtidos a partir da cana-de-açúcar produzida na Região Autónoma da Madeira – cfr. certidão permanente do registo comercial acessível pelo código 8126-8014-2658.

2. A sociedade Impugnante tem sede no Parque Empresarial d…, concelho da Calheta – cfr. relatório final constante de fls. 356 a 415 do Processo Administrativo (PA) denominado “Processo papel”.

3. A Impugnante possui o estatuto de depositário e destinatário registado e é detentora dos entrepostos fiscais de produção n.ºs PT51126642101 e PT51126642102 (no lote 53) e PT51126642103 (no lote 30) – cfr. relatório final constante de fls. 356 a 415 do PA denominado “Processo papel”.

4. Os entrepostos fiscais de produção referidos no ponto antecedente encontram-se autorizados para os seguintes produtos:


5. A Impugnante possui um engenho onde recebe cana-de-açúcar de cerca de 250 agricultores da Região Autónoma da Madeira – cfr. relatório final constante de fls. 356 a 415 do PA denominado “Processo papel” e depoimentos das testemunhas M… e C….

6. No engenho mencionado no ponto anterior transforma a cana-de-açúcar recebida em melaço, o qual posteriormente destila para obtenção de rum de cana-de-açúcar (rum da Madeira) – cfr. relatório final constante de fls. 356 a 415 do PA denominado “Processo papel” e depoimentos das testemunhas M…e C….

7. A produção e transformação da cana-de-açúcar são, na Região Autónoma da Madeira, apoiadas por subsídios comunitários no âmbito do POSEI – cfr. depoimento da testemunha C….

8. Para efeitos de atribuição e verificação da legalidade dos subsídios atribuídos, o Instituto de Financiamento da Agricultura e das Pescas, IP (IFAP) controla a produção, comercialização e transformação de cana-de-açúcar pela Impugnante em produtos derivados (rum e mel) e a utilização e expedição destes – cfr. depoimentos das testemunhas C… e C….

9. Também o Instituto do Vinho, do Bordado e do Artesanato da Madeira, IP-RAM (IVBAM) faz um controlo quantitativo e qualitativo da cana-de-açúcar adquirida e transformada pela Impugnante, bem como dos produtos derivados da sua transformação, do armazenamento, envelhecimento, utilização e expedição destes – cfr. depoimentos das testemunhas M…, C… e C….

10. Por outro lado, a Alfândega do Funchal, enquanto estância aduaneira de controlo, mantém controlos permanentes sobre a Impugnante, atenta a sua qualidade de depositário autorizado com entrepostos de produção – cfr. depoimentos das testemunhas M..., C e C.....

11. Nesse contexto, a Impugnante foi objeto de um varejo em 2013 por parte da Alfândega do Funchal – cfr. depoimentos das testemunhas M... e C...

12. No âmbito da sua atividade, a Impugnante produz licores a partir de rum da cana-de-açúcar (que fabrica), álcool e vinho madeira (que adquire em suspensão de imposto de outros produtores) – cfr. depoimentos das testemunhas M...,C... e J....

13. Para o efeito, são utilizadas frutas e plantas que, depois de lavadas, cortadas e despolpadas, são adicionadas a produto alcoólico (álcool, rum e vinho da madeira, consoante os casos) para maceração em tanques de polietileno – cfr. memória descritiva de produção de licores constante do doc. n.º 10 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e depoimentos das testemunhasC... e J....

14. A maceração alcoólica decorre durante um período mínimo de quinze dias – cfr. memória descritiva de produção de licores constante do doc. n.º 10 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e depoimentos das testemunhasC... e J....

15. Findo o período de maceração, o produto é filtrado e adicionado açúcar – cfr. memória descritiva de produção de licores constante do doc. n.º 10 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e depoimentos das testemunhasC... e J....

16. Após novo período de decantação e nova filtração são ajustados as concentrações de açúcar e o grau alcoólico pretendido para o licor, seguindo o produto para engarrafamento – cfr. memória descritiva de produção de licores constante do doc. n.º 10 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e depoimentos das testemunhasC... e J....

17. As fichas de existências e as taxas de rendimento referentes a licores produzidos pela Impugnante foram comunicadas à Alfândega do Funchal – cfr. doc. n.º 10 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e depoimentos das testemunhas M...,C... e J....

18. Os serviços centrais da Autoridade Tributária e Aduaneira, designadamente a Direção de Serviços Técnicos, Análises e Laboratório, são dotados de laboratório – cfr. depoimento da testemunha M....

19. Os serviços laboratoriais da Direção de Serviços Técnicos, Análises e Laboratório conseguem aferir o teor alcoólico de produtos em maceração através de análise química – cfr. depoimento da testemunha M....

20. A Impugnante tem em funcionamento programa de contabilidade de existências denominado “Primavera” – cfr. relatório final constante de fls. 356 a 415 do PA denominado “Processo papel”.

21. Para além do aludido programa, a contabilidade de existências da Impugnante é elaborada em folhas “Excel” – cfr. relatório final constante de fls. 356 a 415 do PA denominado “Processo papel”.

Mais se provou que:

22. No dia 24 de janeiro de 2017, foi emitida pelo Chefe de Divisão Operacional do Sul (em regime de substituição) da Direção de Serviços Antifraude Aduaneira da Autoridade Tributária e Aduaneira, a ordem de serviço n.º 7/2017, processo n.º OI201700045, pela qual foram “credenciados os funcionários a seguir designados:


«Imagem no original»


Extensão: 2014; 2015; 2016; 2017” – cfr. fls. 605 dos autos (suporte digital), cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

23. Em 23 de março de 2017, o representante legal da Impugnante declarou, apondo a sua assinatura, que recebeu cópia da ordem de serviço mencionada no ponto antecedente – cfr. fls. 605 dos autos (suporte digital), cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

24. No mesmo dia, 23 de março de 2017, foi efetuado varejo aos entrepostos fiscais de produção da Impugnante com os n.ºs PT51126642101, PT51126642102 e PT51126642103, com quantificação das respetivas existências, pelos funcionários credenciados da Autoridade Tributária e Aduaneira A…, Reverificadora, e L…, Técnica Verificadora de 1.ª Classe, na presença do representante do operador, C… (Diretor Geral da Impugnante) – cfr. fls. 05 a 29 do PA denominado “Processo papel”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

25. Na sequência da diligência mencionada no ponto antecedente, foram lavrados autos de varejo por entreposto fiscal, assinados por todos os intervenientes, a que foram anexos mapas de contagem das respetivas existências – cfr. fls. 05 a 29 do PA denominado “Processo papel”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

26. Em 28 de março de 2017, pelas 9h40m, foi remetida ao Diretor Geral da Impugnante (C…, pela Inspetora A…., mensagem de correio eletrónico, com o seguinte teor:

“[…]
Na sequência da nossa visita da passada semana, solicito que seja preparada a seguinte informação, preferencialmente em suporte informático:
• Organograma da empresa;
• Ficheiro SAF-T de Setembro de 2014 a Março de 2017;
• Balancete Analítico e Demonstração de Resultados dos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017;
• Contas correntes (anos 2014, 2015, 2016 e 2017) dos seguintes fornecedores:
D…, LDA
G…, SA
L… LDA
M…LDA
R….
• Contas correntes (anos 2014, 2015, 2016 e 2017) dos seguintes clientes:
A…. (UK) LIMITED
B… LDA
FÁBRICA … LDA
G… SA
H… LIMITED
IC….A
J… LDA
L…. SA
M…LDA
Q… SA
T… LDA
V….
• Registos da contabilidade de existências actualizados dos 3 entrepostos fiscais entre 09/2014 e 03/2017;
• Listagem dos depósitos dos 3 entrepostos fiscais;
• Fluxograma dos processos produtivos;
• Mapas de produção dos licores, vodka e rum;
• Listagem dos produtos comercializados (rum, vodka e licores), com indicação do código interno de produto, do grau alcoólico, do código da Nomenclatura Combinada (NC) e se o produto beneficia das taxas de imposto previstas no art.º 78.º, n.º 4 do CIEC (produzidos e declarados para consumo na RAM, com a denominação geográfica «Rum da Madeira», licores produzidos a partir de frutos ou plantas regionais);
• Registo de controlo de utilização de estampilhas especiais (caso exista).
[…]
Voltaremos para recolher esta informação a partir de dia 03/04/2017 bem como para solicitar outros esclarecimentos relativos aos vossos procedimentos.
Como já foi acima indicado, esta informação deve ser disponibilizada, se possível, em suporte informático, com preferência para dados em formato Excel.
[…]” – cfr. suporte de 3126 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

27. No mesmo dia, 28 de março de 2017, o Diretor Geral da Impugnante respondeu à solicitação descrita no ponto anterior, por mensagem de correio eletrónico remetida às 18h:05m, nos seguintes termos:

“[…]

Em anexo envio informação relativa à informação Financeira. Junto envio organograma da empresa. Agradeço confirmação da receção dos mesmos, e informação se ficou a faltar alguma informação relativa à informação Financeira da empresa.
Abaixo notas explicativas de alguns elementos solicitados,
Contas correntes (anos 2014, 2015, 2016 e 2017) dos seguintes fornecedores:
L….LDA
Não temos conta corrente de fornecedor com esta entidade, a matéria prima foi adquirida a um intermediário – P… - Junto enviamos extrato deste Fornecedor.
Contas correntes (anos 2014, 2015, 2016 e 2017) dos seguintes clientes:
H… LIMITED
Entreposto logístico em Inglaterra que recebeu a mercadoria do nosso cliente – R…- Extracto em anexo.
MI… LDA
Não temos conta corrente de cliente com esta entidade. Existe um movimento da nossa parte devido a uma devolução de uma mercadoria não conforme.
T…. LDA
Não temos conta corrente de cliente com esta entidade. A empresa T… é um operador logístico com um entreposto fiscal de armazenamento.
VI….
Não temos conta corrente de cliente com esta entidade. A mercadoria (amostras) neste movimento foi enviado em Guia de Transporte (no regime de Depositário temporário), para uma presença numa feira no Algarve.
Vamos tratar de recolher a restante informação solicitada.
[…]” – cfr. suporte de 3126 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
28. Ainda naquele dia 28 de março de 2017, por mensagem de correio eletrónico remetida ao Diretor Geral da Impugnante pelas 23h:51m, a Inspetora A... confirmou “a recepção de 52 ficheiros zipados que incluem organograma, balencetes analíticos, contas correntes de fornecedores e clientes, demonstrações de resultados e ficheiros SAFT relativos ao período solicitado. Apenas ficou em falta o balancete analítico de 2017 […]” – cfr. suporte de 1732 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

29. No dia seguinte, 29 de março de 2017, o Diretor Geral da Impugnante remeteu à Inspetora A..., por mensagem de correio eletrónico o “balancete analítico de Fevereiro” – cfr. suporte de 1732 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

30. Já em 31 de março de 2017, a Inspetora A... remeteu ao Diretor Geral da Impugnante nova mensagem de correio eletrónico a agendar nova visita às instalações da Impugnante no dia 03 de abril de 2017 “a fim de completar a informação solicitada por e-mail” – cfr. suporte de 1732 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

31. Em resposta à mensagem referida no ponto anterior, o Diretor Geral da Impugnante, por mensagem de correio eletrónico remetida naquele dia 31 de março de 2017, demonstrou disponibilidade para a visita proposta, mais tendo informado que “devido ao fluxo de trabalho desta semana […] não conseguimos preparar em tempo útil toda a documentação solicitada […] até Segunda-Feira” – cfr. suporte de 1732 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

32. A 03 de abril de 2017, as funcionárias credenciadas A... e L..., deslocaram-se às instalações da Impugnante – cfr. relatório final constante de fls. 356 a 415 do PA denominado “Processo papel” e suporte de 1732 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”.

33. Em 18 de abril de 2017, a Inspetora A... remeteu mensagem de correio eletrónico ao Diretor Geral da Impugnante, com o seguinte teor:

“[…]
No decurso da nossa última visita à vossa empresa, ficaram pedidos alguns elementos que ainda não recebi.
Assim, solicito alguma brevidade no envio dos extractos dos artigos sujeitos a IEC que constam do vosso sistema informático PRIMAVERA, no que concerne aos armazéns “A2” e “AEX”, com movimentos (e saldo, se possível) desde 01/01/2014.
Solicito ainda brevidade no envio da listagem dos produtos comercializados (rum, vodka e licores), com indicação do código interno de produto, do grau alcoólico, do código da Nomenclatura Combinada (NC) e se o produto beneficia das taxas de imposto previstas no art.º 78.º, n.º 4 do CIEC (produzidos e declarados para consumo na RAM, com a denominação geográfica «Rum da Madeira», licores produzidos a partir de frutos ou plantas regionais) – elemento solicitado no nosso e-mail de 28/04/2017.
Posteriormente, ficariam em falta as contas-correntes dos entrepostos, as quais estavam desactualizadas à data do varejo e, que supomos, estão a ser actualizadas.
Assim, fico a aguardar que me envie brevemente os extractos do PRIMAVERA e a listagem mencionada, já anteriormente solicitados” – cfr. suporte de 1732 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

34. Em resposta à solicitação descrita no ponto antecedente, o Diretor Geral da Impugnante enviou, no dia 19 de abril de 2017, mensagem de correio eletrónico à Inspetora A... a remeter os seguintes ficheiros:

“Ficheiro IEC – Ficheiro com a informação do IEC associado aos artigos, com indicação interna do código do produto, grau alcoólico, código nomenclatura combinada (NC) e código adicional com respetiva informação se beneficia de taxa reduzida de imposto.
Ficheiros Gin, Licores, Rum, Vodka – Informação das famílias e artigos comercializados pelo Engenho Novo.
Ficheiro Relação DIC Artigo VGT_VGR – Ficheiro retirado do Sistema informático do lançamento no modulo das compras do IEC dos artigos. Neste ficheiro conseguimos importar o Nº do documento, que tem relação directa com o Nº da DIC que deu origem ao lançamento.
Ficheiro - Vendas Suspensão de imposto – Relação das facturas que foram efetuadas em regime de suspensão de imposto. Infelizmente não conseguimos importar a Nº da e Da que esta no esta descritivo da factura. No entanto, caso seja necessário podemos introduzir manualmente esta informação na tabela consultando as facturas correspondentes.
23 ficheiros com o extractos dos artigos e tabela resumo. Nestes ficheiros, temos o extrato do artigo e do artigo IEC associado ao mesmo.
Estamos a trabalhar para finalizar o envio dos restantes extractos solicitados de acordo com os modelos em anexo bem como a conta corrente completamente atualizada” – cfr. suporte de 1732 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

35. No dia seguinte, 20 de abril de 2017, a Inspetora A... confirmou ter recebido os elementos remetidos por via da mensagem de correio eletrónico referenciada no ponto anterior – cfr. suporte de 1732 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

36. Posteriormente, a 19 de junho de 2017, a Inspetora A... voltou a remeter mensagem de correio eletrónico ao Diretor Geral da Impugnante, com o seguinte teor:

“A fim de prosseguirmos com a inspecção iniciada em Março passado, venho relembrar que estão ainda em falta as contas-correntes actualizadas dos produtos sujeitos a IEC comercializados pela vossa empresa desde 2014, solicitadas no início do procedimento inspectivo.
Fico, então, a aguardar que me envie aqueles documentos com a maior brevidade possível” – cfr. suporte de 181 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

37. Por ofício n.º 843, rececionado a 02 de agosto de 2017 (data de assinatura do aviso de receção respeitante ao registo postal CTT … ), foi a Impugnante notificada para no prazo de quinze dias enviar à Divisão Operacional do Sul da Direção de Serviços Antifraude Aduaneira da Autoridade Tributária e Aduaneira, no âmbito da ação de inspeção realizada a coberto da OI201700045, “as contas-correntes actualizadas dos produtos sujeitos a IEC produzidos e armazenados nos Entrepostos Fiscais do ENM incluindo os movimentos desde 01/01/2014”, solicitando-se que “aquela informação seja remetida em formato electrónico, preferencialmente em Excel” – cfr. fls. 252 a 255 do PA denominado “Processo papel”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

38. No dia 04 de agosto de 2017, o Diretor Geral da Impugnante remeteu à Inspetora A... através da plataforma “Web transfer” 70 ficheiros referentes “aos extractos dos artigos e tabela resumo dos artigos em falta”, disponíveis até 28 de agosto de 2017 – cfr. suporte de 52 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-01”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

39. Em 28 de agosto de 2017, a Inspetora A... remeteu mensagem de correio eletrónico ao Diretor Geral da Impugnante a solicitar, “no âmbito da nossa inspecção a decorrer ao ENM”, os inventários de final de ano dos anos de 2013, 2014 e 2015, salientando que “o inventário de 31/12/2016 já nos tinha disponibilizado aquando da nossa visita às vossas instalações mas ficaram em falta estes inventários” – cfr. suporte de 7477 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-02”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

40. Em resposta à mensagem referida no ponto antecedente, o Diretor Geral da Impugnante enviou por correio eletrónico à Inspetora A..., naquele dia 28 de agosto de 2017, “contabilidade de Existências em Excel de todos os artigos, e os inventários solicitados” – cfr. suporte de 7477 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-02”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

41. A 30 de agosto de 2017, a Inspetora A... remeteu mensagem de correio eletrónico ao Diretor Geral da Impugnante, com o seguinte teor:

“[…]
Estive a analisar os mapas da produção que nos disponibilizou aquando da nossa visita, ou seja, os mapas que envia ao IVBAM com indicação dos produtos engarrafados e das produções a granel. Relativamente a estes mapas, colocaram-se duas situações:
- Não temos a produção n.º 13/2015 – solicito que me envie esta produção - Temos duas produções n.º 68/2014: uma refere-se a aguardente engarrafada e outra a licor de morango para constituir lote – peço esclarecimento desta situação, uma vez que temos todas as restantes produções de 2014” – cfr. suporte de 696 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-02”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

42. No mesmo dia, 30 de agosto de 2017, a Inspetora A... voltou a enviar mensagem de correio eletrónico ao Diretor Geral da Impugnante, a solicitar o seguinte esclarecimento:

“Nas contas-correntes dos produtos que enviou, estão produtos cujo código começa por “V04” e a descrição do produto começa sempre por “IEC”.
Que produtos são estes? Qual a diferença para os produtos com a mesma designação mas cuja descrição não tem “IEC” no início? (ex.: V040000018 - IEC Poncha de Maracujá 20º 1,5 Lts / V060000010 - Licor Poncha de Maracujá 20º 1,5 Lts; V040000067 - IEC Licor "Caipirinha" 16º 700ml / V060000035 - Licor "Caipirinha" 16º 700ml)” – cfr. suporte de 696 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-02”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

43. Por ofício n.º 0915, rececionado a 05 de setembro de 2017 (data de assinatura do aviso de receção respeitante ao registo postal CTT … 2 PT), foi a Impugnante notificada que “conforme despacho da Directora de Serviços de Antifraude Aduaneira de 2017-08-30, […], o procedimento de natureza inspectiva a essa empresa foi prorrogado por mais 3 meses, nos termos da alínea a) do n.º 3 do artigo 36.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira (RCPITA) […]” – cfr. fls. 256 a 258 do PA denominado “Processo papel”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

44. O Diretor Geral da Impugnante respondeu às solicitações de 30 de agosto de 2017, por mensagem de correio eletrónico remetida em 13 de setembro de 2017, na qual informou à Inspetora A... que:

“Os artigos V04 são referentes aos IEC que estão associados na venda até Julho de 2016 aos respectivos Artigos, […].
A partir de Julho de 2016, o IEC ficou associado a composição do artigo quando transferido para o Armazém da Comercial e o IEC calculado pelo Sistema na emissão da Factura.
[…]
Em ambas as situações o artigo IEC, é lançado (Como se fosse uma compra de MP) no Sistema com base na DIC.
Em relação ao email do dia 30 de Agosto, envio em anexo o quadro nº13/2015.
Em relação a duplicação da numeração dos quadros nº 68/2014, foi um lapso da nossa parte” – cfr. suporte de 696 KB constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-02”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

45. Por ofício n.º 0947, expedido por via postal registada a 14 de setembro de 2017 (registo CTT RH 0017 4522 1 PT), foi a Impugnante notificada pela Divisão Operacional do Sul da Direção de Serviços Antifraude Aduaneira da Autoridade Tributária e Aduaneira, no âmbito da ação de inspeção n.º OI201700045, para no prazo de dez dias enviar àquela Divisão os seguintes documentos:

“1. Fichas de Fabrico relativas às produções dos produtos sujeitos a IEC realizadas entre 01/01/2014 e 23/03/2017, com indicação das matérias-primas incorporadas, respectivas quantidades e teor alcoólico (quando aplicável) e quantidade de produto obtido, com indicação do respectivo grau alcoólico;
2. Fórmulas de fabrico dos produtos sujeitos a IEC, com indicação das quantidades de cada ingrediente utilizado, incluindo o respectivo teor alcoólico (quando aplicável), quantidade de produto final obtido e respectiva taxa de rendimento;
3. Cópia das facturas de aquisição de Álcool Etílico relativas aos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017” – cfr. fls. 259 e 260 do PA denominado “Processo papel”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

46. Em resposta ao ofício mencionado no ponto anterior, o Diretor Geral da Impugnante remeteu, a 23 de setembro de 2017, mensagem de correio eletrónico à Inspetora A..., disponibilizando em anexo as “Fórmulas de Fabrico dos produtos sujeitos a IEC e cópias das facturas da aquisição de Álcool Etílico relativas aos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017” e informando que “em relação às fichas de Fabrico relativas às produções, com indicação das matérias-primas incorporadas, respetivas quantidades (com indicação do teor) e quantidades produzidas, esta informação está nos ficheiros (Contabilidades de Existências) enviados no email do passado dia 28/08/2017” – cfr. suporte constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-03”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

47. Por mensagem de correio eletrónico remetida a 25 de setembro de 2017, a Inspetora A... solicitou ao Diretor Geral da Impugnante “toda a documentação que serviu de base aos registos nas contas correntes a fim de identificarmos as quantidades produzidas de cada produto e a respectiva quantidade de matéria-utilizada, nomeadamente a que está sujeita a IEC” – cfr. suporte constante da pasta “Documentação” do PA denominado “Processo Digital 02-03”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

48. O Diretor Geral da Impugnante respondeu à solicitação descrita no ponto anterior, por mensagens de correio eletrónico remetidas a 11 de outubro de 2017, por via das quais juntou setenta ficheiros “com as respetivas produções” – cfr. suportes constantes do PA denominado “Processo(s) Digital(ais)” 02-04 a 03-12, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

49. Por ofício n.º 121, datado de 13 de dezembro de 2017, expedido por via postal registada (registo CTT ilegível), foi a Impugnante notificada pela Divisão Operacional do Sul da Direção de Serviços Antifraude Aduaneira da Autoridade Tributária e Aduaneira, no âmbito da ação de inspeção n.º OI201700045, que naquela data “2017-12-13 se considera concluída a diligência realizada nessa empresa e iniciada em 2017-03-23” – cfr. fls. 261 e 262 do PA denominado “Processo papel”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

50. Por sua vez, em 22 de novembro de 2017, foi emitido “projeto de relatório de inspeção aduaneira”, por referência à ação de natureza inspetiva n.º OI201700045, no qual se imputaram “várias situações irregulares”, designadamente:

“No Álcool Etílico, verificou-se a saída irregular de EF de 26.852,26 litros de álcool puro (LAP) nos anos de 2015 e 2016, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 302.781,54€.
No Rum a Granel, verificou-se a saída irregular de EF de 42.379,24 LAP no ano de 2017 até ao início da presente ANI, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 140.553,01€.
No Rum Embalado, verificou-se a saída irregular do EF de 9.184,60 LAP nos anos de 2014 e 2016, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 27.208,47€.
Nos Licores, verificou-se a saída irregular de EF de 4.826,54 LAP nos anos de 2014 e 2015, pelo que constitui dívida em sede de IABA no valor de 14.298,15€.
No Gim, verificou-se a saída irregular de EF de 2,36 LAP nos anos de 2015 e 2016, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 27,99€.
Na Vodca, verificou-se a saída irregular de EF de 1.132,50 LAP nos anos de 2014 e 2015, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 13.419,47€.
No Vinho da Madeira, verificou-se a saída irregular de EF de 4.359,93 litros nos anos de 2014 e 2015, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 1.487,42€.
No Vermute, verificou-se a saída irregular de EF de 2.027,50 litros no ano de 2017, até ao início da presente ANI, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 1.490,82€.
[…]
Pelos controlos efectuados às Estampilhas Especiais requisitadas pelo depositário autorizado, detectou-se falta de 33.215 Estampilhas. Esta situação origina dívida em sede de IABA no valor de 545.125,74€ e configura a prática do crime aduaneiro de Introdução fraudulenta no consumo, previsto e punido nos termos do art.º 96.º, n.º 1, alínea a) do RGIT, em razão da prestação tributária em falta.
Em resumo, foi apurada uma dívida em sede de IABA no valor de 1.046.392,61€” – cfr. fls. 266 e 311 do PA denominado “Processo papel”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

51. Sobre o projeto de relatório mencionado no ponto antecedente recaiu despacho de concordância do Chefe de Divisão Operacional do Sul (em regime de substituição) da Direção de Serviços Antifraude Aduaneira da Autoridade Tributária e Aduaneira, datado de 29 de dezembro de 2017, no qual foi, de igual forma, determinado que se notificasse “o Operador inspecionado, convidando-o a exercer o seu direito de audição, concedendo-se 15 dias para o efeito - artº 60º do RCPITA” – cfr. fls. 266 do PA denominado “Processo papel”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

52. A Impugnante foi notificada do projeto de relatório de inspeção aduaneira para efeitos de audição prévia, por ofício n.º 1244, rececionado a 08 de janeiro de 2018 (data de assinatura do aviso de receção respeitante ao registo postal CTT RH 0017 4630 1 PT) – cfr. fls. 263 a 265 do PA denominado “Processo papel”.

53. Após prorrogação do prazo concedido para o efeito, no dia 01 de fevereiro de 2018, a Impugnante apresentou petição escrita de “direito de audição prévia”, no âmbito da qual foi consignado que:

“Perante os factos descritos, sem prejuízo de outras discrepâncias e irregularidades, que inquinam o relatório de inspecção, as conclusões notificadas, e os mapas constantes destas, não restou outra alternativa ao contribuinte senão elaborar a partir dos diversos registos existentes, novos mapas para contraditar os constantes das conclusões do relatório.
Estes mapas contêm observações, anotações e outras informações que justificam e fundamentam a sua veracidade, e os valores apresentados.
Porém, caso esse serviço tenha qualquer dúvida sobre a veracidade dos elementos ora apresentados, a maioria dos quais entregues às Sras. Inspectoras, durante o período de fiscalização, e por estas ignorados, requer-se desde já, que se sejam efetuadas novas diligências, e nomeadamente todas as que entenderem adequadas, nas instalações do contribuinte, de forma a poderem confirmar que todas as informações apresentadas, são verdadeiras, e concluir afinal pela inexistência de qualquer dívida” – cfr. relatório inspetivo constante de fls. 356 a 415 do PA denominado “Processo papel”, e transcrição constante do art. 104.º da petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

54. Com a petição escrita mencionada no ponto antecedente, a Impugnante requereu a audição como testemunha do “Eng.ºC..., já identificado no relatório, sobre todos os elementos constantes dos mapas agora apresentados” – cfr. relatório inspetivo constante de fls. 356 a 415 do PA denominado “Processo papel”, e transcrição constante do art. 104.º da petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

55. De igual forma, com a referida petição escrita, foram juntos os seguintes quadros:

- Quadro I – Álcool etílico a granel – mapa retificado;

- Quadro II – Rum a granel – mapa retificado;

- Quadro III – Rum embalado – mapa retificado;

- Quadro IV – Licores embalados – mapa retificado;

- Quadro VI – Vodka embalada – mapa retificado;

- Quadro VII – Vinho da Madeira a granel – mapa retificado;

- Quadro IX – Quadros dos macerados – mapa retificado;

- Quadro X – Quadro do varejo – mapa retificado – cfr. docs. n.ºs 02 a 09 juntos com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

56. A 14 de março de 2018, foi emitido “Relatório Final” da ação de natureza inspetiva n.º OI201700045, que apresenta a seguinte forma:

“CAPÍTULO I – Conclusões da Acção Inspectiva
[…]
Em resultado das verificações efectuadas, foram detectadas várias irregularidades.
No Álcool Etílico, verificou-se a saída irregular de EFP de 24.760,53 litros de álcool puro (LAP) nos anos de 2015 e 2016, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 293.397,48€.
No Rum da Madeira a Granel, verificou-se a saída irregular de EFP de 40.929,20 LAP no ano de 2017 até ao início da presente ANI, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 139.955,35€.
No Rum da Madeira Embalado, verificou-se a saída irregular do EFP de 2.099,57 LAP no ano de 2015, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 6.219,75€.
Nos Licores, verificou-se a saída irregular de EFP de 4.953,28 LAP nos anos de 2014 e 2015, pelo que constitui dívida em sede de IABA no valor de 14.673,58€.
Na Vodca, verificou-se a saída irregular de EFP de 1.131,45 LAP nos anos de 2014 e 2015, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 13.407,03€.
No Vinho da Madeira, verificou-se a saída irregular de EFP de 4.248,29 litros nos anos de 2014 e 2015, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 1.487,42€.
No Vermute, verificou-se a saída irregular de EFP de 1.986,44 litros no ano de 2017, até ao início da presente ANI, pelo que se constitui dívida em sede de IABA no valor de 1.490,82€.
[…]
Identificou-se, no varejo, um produto designado «Vermute» cuja origem é desconhecida […].
Foi detetada adição de Vinho Madeira ao Licor de Morango, cuja fórmula de fabrico declarada às autoridades aduaneiras não inclui aquele produto. […].
Em resumo, foi apurada uma dívida em sede de IABA no valor total de 470.631,44€.
Constatou-se que o depositário autorizado não cumpre a obrigação de manter actualizada uma contabilidade das existências em sistema de inventário permanente, […].
Verificou-se ainda que o depositário autorizado não cumpre a obrigação de dispor de caudalímetros […].
Constatou-se ainda que o operador não cumpre reiteradamente a obrigação de efectuar os registos na contabilidade dos EFP, nem cumpre a obrigação de manter um sistema de inventário permanente de modo a identificar os produtos existentes nos EFP a todo o momento, sendo que estas faltas tornam inviável o controlo dos EFP.
[…]
CAPÍTULO IV – Controlos Efectuados
A acção teve início na sede da empresa no dia 23/03/2017 com um varejo aos EFP de que o operador é titular, tendo sido lavrados os respectivos Autos de Varejo.
[…]
Para o início da execução dos varejos, foi solicitada a quantificação das existências nos EFP a qual não foi entregue à equipa inspectiva dado que o operador não tem disponível aquele tipo de registo.
A contabilidade de existências do operador é elaborada em folhas Excel. Consultadas as contas correntes dos EFP mantidas pelo depositário autorizado, verificou-se que há vários meses não eram efetuados os registos dos movimentos dos produtos em EFP pelo que os saldos apresentados não estavam actualizados.
O operador forneceu a listagem das existências dos produtos em suspensão de imposto retirado do programa informático Primavera, o qual não identifica o entreposto onde os mesmos se encontram. Também aqueles registos não estavam actualizados.
[…]
Analisadas as contas correntes remetidas, verificou-se que foram actualizados movimentos respeitantes aos anos de 2014 e 2015, sem que tenham sido remetidos quaisquer documentos de suporte aos registos apresentados. Com efeito, é fundamental que o EFP mantenha documentos que justifiquem os registos efectuados na contabilidade de existências, o que não acontece com a totalidade dos registos analisados.
Considerando a necessidade de confirmar os registos apresentados com as produções efectuadas, notificou-se o operador para apresentar as fichas de fabrico dos produtos sujeitos a IEC. Estas fichas de fabrico foram solicitadas no início da inspecção mas não haviam sido ainda entregues.
Em resposta a essa notificação, o operador entregou documentos denominados «Guia de Circulação», que indicam o produto acabado e, manualmente, a quantidade das matérias-primas utilizadas, a data de embalamento, o n.º QC, o lote e as estampilhas especiais apostas, ou seja, indicam o engarrafado e quantidades utilizadas de matéria-prima.
Verificou-se que, para alguns movimentos de produção registados nas contas correntes, não foram entregues os respectivos documentos de suporte aos registos como, por exemplo, para a produção de macerados.
Foram também detectados registos nas contas correntes actualizadas que não constavam das contas correntes no início do controlo e para os quais não foram apresentadas as respectivas ordens de produção. Além dos macerados, está nestas circunstâncias a produção de Vermute […].
Analisadas as contas correntes dos produtos mantidas pelo operador, constatou-se que são confusas e de difícil leitura. Com efeito, por exemplo, os embalamentos de produto e respectivas saídas de EFP são organizados por lote. Deste modo, torna-se complicado o apuramento de um saldo à vista para cada produto, dado que cada produto pode ter várias unidades referentes a vários lotes, não havendo um saldo único que compile todas as unidades armazenadas do mesmo produto.
Considerando todos os factos acima descritos, as contas correntes entregues posteriormente, por apresentarem lacunas na informação, não puderam ser confrontadas com a contagem das existências realizada no varejo pelo que não foi possível efectuar o apuramento do referido varejo.
Elaborou-se a reconstituição das contas correntes para os produtos produzidos e recebidos nos EFP. Considerando as dificuldades relativas à informação sobre as produções e sobre as existências nos EFP, optou-se por efectuar uma conta corrente por produto detido pelo depositário autorizado, visto que não foi possível determinar as existências no final de cada ano para cada um dos EFP.
Assim, foi efectuada uma conta corrente para cada um dos seguintes produtos: Ácool Etílico, Rum da Madeira a Granel, Rum da Madeira Embalado, Licores, Gim, Vodca e Vinho da Madeira. Foram ainda analisadas as operações relacionadas com o Vermute.
Dada a inexistência de contas correntes, os cálculos encontram-se efetuados numa base anual, tendo sido consideradas as existências finais/iniciais que constam dos inventários fiscais dos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016 e que foram declaradas pelo operador à Autoridade Tributária e Aduaneira.
Para os movimentos de entrada de produto, consideram-se os e-DA recebidos pelo operador e as produções efectuadas (nos casos dos produtos finais). Estas produções efectuadas são os fabricos que constam nas denominadas «Guias de Circulação» elaboradas pelo operador e entregues no decurso da ANI.
Os movimentos de saída do produto englobam as produções efectuadas pelo operador (nos casos das matérias-primas sujeitas a IEC) devidamente documentadas pelas denominadas «Guias de Circulação», e-DA emitidos e DIC apresentadas pelo operador.
[…]
O saldo final obtido foi confrontado com o saldo do inventário fiscal de final de ano, sendo apuradas as respectivas diferenças.
[…]
As existências finais correspondem às quantidades apuradas no varejo de 23/03/2017. Os apuramentos foram efectuados na unidade tributável (litros de álcool puro).
[…]
No apuramento efectuado não se verificaram diferenças entre a quantidade de Gim produzido e a quantidade existente no EFP, pelo que se conclui pela regularidade das operações.
As contas correntes reconstituídas dos restantes produtos encontram-se no Capítulo V.
[…]
Em resultado das verificações efectuadas, foram detectadas algumas discrepâncias que configuram irregularidades declarativas, sendo que algumas delas dão origem a prestação tributária em falta […].
CAPÍTULO V – Descrição das Irregularidades Constatadas
A. ÁLCOOL ETÍLICO
[…]
No apuramento efectuado, verifica-se que nos anos de 2015 e 2016 existem diferenças para menos, ou seja, a quantidade de álcool etílico existente no EFP é inferior à quantidade que, de acordo com os movimentos constatados, deveria existir. Assim, conclui-se que naqueles períodos ocorreram saídas irregulares de álcool etílico do EFP, pelo que constitui dívida em sede de IABA […].
B. RUM DA MADEIRA A GRANEL
[…]
No apuramento efectuado, verifica-se que em 2017 existe diferença para menos de rum da Madeira a granel, ou seja, a quantidade de rum da Madeira a granel existente no EFP é inferior à quantidade que, de acordo com os movimentos constatados, deveria existir. Assim, conclui-se que naquele período ocorreram saídas irregulares de rum da Madeira a granel do EFP, pelo que constitui dívida em sede de IABA […].
C. RUM DA MADEIRA EMBALADO
[…]
No apuramento efectuado, verifica-se que em 2015 existe diferença para menos, ou seja, a quantidade de rum da Madeira embalado existente no EFP é inferior à quantidade que, de acordo com os movimentos constatados deveria existir. Assim, conclui-se que, naquele período, houve saídas irregulares de rum da Madeira embalado no EFP, pelo que se constitui dívida em sede de IABA […].
D. LICORES EMBALADOS
[…]
No apuramento efectuado, verifica-se que nos anos de 2014 e 2015 existem diferenças para menos, ou seja, a quantidade de licor embalado existente no EFP é inferior à quantidade que, de acordo com os movimentos constatados deveria existir. Assim, conclui-se que, naquele período, houve saídas irregulares de licor embalado do EFP, pelo que se constitui dívida em sede de IABA […].
D. VODCA
[…]
No apuramento efectuado, verifica-se que nos anos de 2014 e 2015 existem diferenças para menos, ou seja, a quantidade de vodca existente no EFP é inferior à quantidade que, de acordo com os movimentos constatados deveria existir. Assim, conclui-se que, naqueles períodos, houve saídas irregulares de vodca do EFP, pelo que se constitui dívida em sede de IABA […].
F. VINHO DA MADEIRA
[…]
No apuramento efectuado, verifica-se que nos anos de 2014 e 2015 existem diferenças para menos, ou seja, a quantidade de Vinho Madeira existente no EFP é inferior à quantidade que, de acordo com os movimentos constatados deveria existir. Assim, conclui-se que, naqueles períodos, houve saídas irregulares de Vinho Madeira do EFP, pelo que se constitui dívida em sede de IABA […].
G. VERMUTE
[…]
Considerando que, no varejo efectuado em 23/03/2017, foram contados 710 litros de Vermute, constata-se a saída irregular de 1.986,44 litros […]. Esta situação constitui dívida em sede de IABA […].
H. OBRIGAÇÕES DO DEPOSITÁRIO AUTORIZADO
De acordo com o disposto no art.º 22, n.º 3, alínea b) do CIEC, constitui obrigação do depositário autorizado manter uma contabilidade de existências actualizadas para o entreposto fiscal, a qual deve respeitar o sistema de inventário permanente de forma que, a qualquer momento, seja possível identificar as quantidades de produto existentes no entreposto fiscal.
Como foi acima reiterado, no início do presente controlo verificou-se que a referida contabilidade não se encontrava actualizada nem o depositário autorizado apresentou o registo das quantidades que naquele momento se apresentavam em EFP, inviabilizando deste modo o apuramento do varejo.
Nestas circunstâncias, pode afirmar-se que existe uma prática reiterada de falta de registos na contabilidade do EFP, na medida em que o depositário autorizado não inscreveu várias vezes os movimentos de entrada e saída de produto na contabilidade do EFP.
Por outro lado, também não cumpre reiteradamente a obrigação de manter um sistema de inventário permanente de modo a identificar os produtos existentes em EFP a todo o momento.
A prática do não cumprimento das obrigações mencionadas inviabiliza o controlo dos EFP.
[…]
CAPÍTULO IX – Direito de Audição Prévia
Notificado do Projecto de Relatório (PR) em 08/01/2018, para se pronunciar, se assim entendesse, em sede de audição prévia (AP) no prazo de 15 dias, o operador requereu a prorrogação daquele prazo por mais 10 dias, solicitação que lhe foi concedida.
A resposta foi recebida via postal em 05/02/2018 bem como por e-mail, ao qual foram anexados ficheiros com detalhe dos dados utilizados pelo operador para sustentar a sua resposta.
[…]
No ponto 3., vem o operador indicar que repensou a sua organização e aceita que tenha algumas insuficiências, nomeadamente ao nível do momento em que efectua os registos contabilísticos, mas reitera que os mesmos são verdadeiros, rigorosos, fiáveis, todos documentalmente suportados e espelham com verdade a situação fiscal da mercadoria, não tendo feito introduções irregulares no consumo.
[…]
Os registos na contabilidade de existências não estavam «todos documentalmente suportados» como pretende o operador. A título de exemplo, não foi apresentada documentação de suporte relativamente aos registos de macerados, o que inviabilizou o controlo daqueles produtos.
[…]
No ponto 5., o operador afirma que não foram considerados, de forma arbitrária, os elementos entregues, com o argumento que eram de difícil leitura ou compreensão ou de que não estavam acompanhados do documento comprovativo, alguns dos quais oficiais e em poder da Alfândega de controlo […]. E conclui que não pode aceitar a rejeição dos registos entregues com o argumento falacioso de que não foram apresentados os documentos de suporte aos mesmos […].
[…]
Os elementos entregues pelo operador foram analisados e foi necessário confrontá-los com outros documentos, nomeadamente DIC e e-DA emitidos e recebidos. Além destes, também foi necessário confirmar as quantidades produzidas, mas neste ponto a informação foi insuficiente. Com efeito, os registos apresentados pelo operador careciam de documentação probatória pelo que não houve arbitrariedade na análise dos elementos disponibilizados mas antes falta de sustentação dos registos apresentados.
Alguns elementos apresentados não foram considerados na análise devido ao facto de não terem sido apresentadas evidências da sua ocorrência. Se alguns elementos não foram considerados na análise não foi por serem de difícil leitura ou compreensão […].
[…]
No ponto 6., o operador refere que os apuramentos efectuados pela inspecção estão todos errados, o que inquina as liquidações de dívida e as indicadas infracções. Refere ainda que, ao basear-se nos inventários relativos aos anos de 2013 e 2014, a equipa inspectiva apurou um resultado que não é real pois esses inventários contêm a totalidade de cada produto, o que está em EF e o que está no armazém comercial já introduzido no consumo. […].
Relativamente a este ponto, refira-se que a equipa inspectiva fundamenta em elementos concretos as suas conclusões e, ao contrário dos mapas de existências entregues posteriormente pelo operador, a reconstituição das existências indica claramente o documento que lhe serve de suporte.
O alegado pelo operador relativamente aos inventários de 2013 e 2014 ainda que poderia, em teoria, ser aceite como argumento para os produtos embalados. No entanto, o mesmo não acontece para os produtos sujeitos a IEC armazenados a granel. Com efeito, o operador apenas poderia ter armazenado álcool etílico e rum a granel em EF, dado que não introduziu no consumo aqueles produtos nem os adquiriu com IEC pago.
No entanto, analisados os elementos remetidos em sede de AP, constatou-se em vários produtos que o saldo mencionado no inventário fiscal é inferior ao saldo indicado de existências em EF, […]. Verificada a incoerência dos dados analisados, optou-se por seguir os inventários fiscais que, para todos os efeitos, foram declarados à Autoridade Tributária e Aduaneira no final de cada exercício.
[…]
No ponto 7., o operador elenca outras situações anómalas verificadas nas conclusões notificadas:
a) Omissão nas conclusões das quantidades de «macerados», com especial gravidade no que se refere a álcool, rum e vinho da Madeira […];
b) O álcool, o rum e o vinho da Madeira incorporados nos produtos macerados não foram abatidos na conta corrente do respectivo produto a granel. Também não foram consideradas as perdas reconhecidas nas autorizações de produção dos licores;
[…]
Relativamente à alínea a), não foram, efectivamente, incluídas as produções de macerados, visto que nunca foram apresentadas as respectivas fichas de produção, nem no decurso da inspecção nem em sede de AP, sem as quais não é possível quantificar as incorporações de rum, álcool etílico e Vinho da Madeira naqueles produtos.
A alínea b) é consequência da alínea a) pois não tendo sido identificadas as produções de macerados também não foram abatidas as matérias-primas neles incorporadas.
[…]
No ponto 8., o operador afirma que, perante os factos que descreveu, sem prejuízo de outras discrepâncias e irregularidades, que inquinam o relatório de inspecção, decidiu elaborar novos mapas que, na sua opinião, espelham a verdade e vêm contraditar os constantes das conclusões do relatório. […]. Mais requer o operador que sejam efectuadas novas diligências, nomeadamente as que considerem adequadas, nas instalações do operador, a fim de verificar que as informações apresentadas são todas verdadeiras e concluir pela inexistência de qualquer dívida. Mais requer a audição como testemunha do Eng.º Celso Olim, já identificado no relatório.
Quanto ao ponto 8., as alegações apresentadas pelo operador em sede de AP foram analisadas tendo por base os elementos entregues no decurso da inspecção, os quais foram julgados apropriados e suficientes para tal, não vindo o operador juntar nova documentação probatória em relação às conclusões exaradas no PR.
Nestas circunstâncias, não se afigura pertinente a realização de quaisquer outras diligências junto do operador e, da análise efectuada, foi ainda apurada dívida nos termos descritos nos capítulos anteriores.
Em sede de procedimento inspectivo, a legislação não prevê a audição de testemunhas pelo que não se pode atender à pretensão do operador. Mais se dirá que não se colocaram dúvidas no que concerne aos elementos apresentados pelo operador em sede de AP pelo que também não se considera necessária a solicitação de esclarecimentos.
[…]” – cfr. fls. 356 a 415 do PA denominado “Processo papel”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

57. Sobre o relatório final referido no ponto antecedente recaiu despacho de concordância do Chefe de Divisão Operacional do Sul (em regime de substituição) da Direção de Serviços Antifraude Aduaneira da Autoridade Tributária e Aduaneira, datado de 02 de abril de 2018 – cfr. fls. 356 e 357 do PA denominado “Processo papel”.

58. A Impugnante foi notificada do aduzido relatório final por ofício n.º 0275, datado de 02 de abril de 2018, expedido por via postal registada na mesma data (sob o registo postal CTT RH… PT) – cfr. fls. 355 e objeto postal anexo do PA denominado “Processo papel”.

59. No dia 09 de abril de 2018, foi registada no âmbito do “processo de cobrança a posteriori” n.º 04/2018 a liquidação n.º 9000333, apurada na sequência das correções efetuadas no âmbito da ação de natureza inspetiva n.º OI201700045, referente a IABA no valor de € 470.631,44, acrescidos de € 19.341,92 a título de juros compensatórios, e de € 1,80 de impresso de liquidação, o que perfaz o montante global de € 489.974,26 – cfr. doc. n.º 1 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

60. A Impugnante foi notificada da liquidação efetuada no processo de cobrança “a posteriori” n.º 04/2018, referida no ponto antecedente, por ofício n.º 0305, datado de 09 de abril de 2018, bem como para proceder ao respetivo pagamento no prazo de quinze dias – cfr. doc. n.º 1 junto com a petição inicial.

61. No dia 29 de maio de 2018, a Impugnante apresentou declarações de IES de substituição para os exercícios de 2013 a 2016 – cfr. docs. n.ºs 12 a 18 juntos com a petição inicial.

62. Com as declarações de IES mencionadas no ponto antecedente foram juntos inventários fiscais corrigidos emitidos por referência a 31 de dezembro de 2013, 2014, 2015 e 2016 – cfr. docs. n.ºs 12 a 18 juntos com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

63. A presente impugnação judicial foi apresentada em 03 de setembro de 2018 – cfr. fls. 01 e ss. dos autos (suporte digital).”


***

A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:

“Inexistem factos não provados, com interesse para a solução da causa.”


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A motivação da matéria de facto assentou no seguinte: “A decisão da matéria de facto efetuou-se com base nos documentos e informações oficiais constantes dos autos e do Processo Administrativo junto aos autos (“Processo Papel” e “Processo Digital”), referidos em cada um dos pontos do elenco da factualidade dada como provada, que não foram impugnados e que, pela sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do tribunal, em conjugação com a livre apreciação da prova.

O Tribunal alicerçou ainda a sua convicção relativamente à matéria de facto elencada nos pontos 5. a 19. do probatório nos depoimentos das testemunhas inquiridas - M...,C..., J... e C… -, valorados nos seguintes termos:

A testemunha M..., Inspetor Tributário e Aduaneiro a exercer funções na Alfândega do Funchal, demonstrou possuir um conhecimento direto da matéria em escrutínio, designadamente dos resultados da ação de natureza inspetiva, uma vez que, na qualidade de coordenador do núcleo de procedimentos fiscais, foi o responsável pela análise do relatório final para efeitos de controlo do operador e liquidação do tributo apurado; mais resultou assente que foi mantendo, ao longo dos anos, contactos profissionais com a Impugnante no âmbito da sua atividade de acompanhamento e controlo aduaneiro, o que o que lhe permitiu encontrar-se inteirado dos aspetos inerentes ao desenvolvimento da sua atividade.

Prestou um depoimento que se afigurou objetivo e descomprometido que, por essa via, logrou convencer o Tribunal sobre a caraterização da estrutura societária da Impugnante e da atividade concretamente prosseguida pela mesma (com especial enfoque no que toca à transformação de cana-de-açúcar e produção de produtos derivados), bem como do cumprimento das obrigações aduaneiras a que se encontrava adstrita e dos controlos a que estava sujeita por parte da Alfândega e do IVBAM. Precisou, no que em especial se refere aos macerados, que é do seu conhecimento funcional que os serviços centrais da Autoridade Tributária e Aduaneira têm ao seu dispor um laboratório apto a proceder a análises químicas de produtos em estado de maceração para aferir do respetivo grau de alcoolemia (o que, aliás, segundo afirma, é prática frequente). Mais aduziu que a Impugnante comunicou à Alfândega do Funchal as taxas de rendimento das mercadorias por si produzidas, esclarecendo que a partir das mesmas se mostra possível aferir dos respetivos componentes. Por fim, realça-se do seu testemunho a asseveração de que, em face dos controlos existentes e das particularidades geográficas da Região Autónoma da Madeira, não se mostra fácil para o operador económico introduzir no mercado milhares de litros de material fraudulento.

O seu depoimento foi, pois, valorado para a fixação da matéria elencada nos pontos 5., 6., 9., 10., 11., 12., 17., 18. e 19. dos factos provados.

Por sua vez, a testemunhaC..., revelou possuir um conhecimento direto da matéria em dissensão nos presentes autos, em razão do exercício das respetivas funções profissionais, porquanto é diretor geral da sociedade Impugnante (onde trabalha desde 2007), encontrando-se, por essa via, completamente inteirado da estrutura societária da empesa e dos condicionalismos inerentes à atividade prosseguida, designadamente à produção e comercialização de bebidas alcoólicas. Em face das suas funções, acompanhou também a ação de natureza inspetiva realizada (incluindo o varejo), tendo intermediado as comunicações estabelecidas com as inspetoras aduaneiras responsáveis, como resulta documentado nos autos.

O seu depoimento mostrou-se isento, espontâneo e objetivo, logrando convencer o Tribunal sobre os relatados aspetos relativos à estruturação da Impugnante, obrigações aduaneiras a que se encontra adstrita, controlos a que está sujeita (de três entidades: Alfândega, IVBAM e IFAP) e processos produtivos que utiliza. No que a este último ponto diz respeito, explicitou de forma detalhada o processo de produção de licores através de maceração. Debruçou-se, de igual forma, sobre o registo das produções para, posteriormente, narrar as contingências inerentes ao varejo realizado no âmbito da ação de natureza inspetiva e aos termos subsequentes do procedimento, como sejam as comunicações trocadas com as inspetoras responsáveis, os mapas retificados apresentados em sede de audição prévia e as conclusões firmadas no relatório final.

Neste sentido, o seu testemunho foi valorado positivamente para a fixação da matéria elencada nos pontos 5. a 17. dos factos provados.

De igual forma, a testemunha J..., evidenciou possuir um conhecimento direto dos factos em virtude das funções que exerce na Impugnante como diretor de produção (desde 2008), encontrando-se, como tal, plenamente inteirado de todo o processo produtivo da mercadoria inspecionada, tendo, de igual forma, acompanhado o varejo realizado no âmbito da ação de natureza inspetiva sob apreciação.

Prestou um depoimento livre, coerente e espontâneo que logrou convencer o Tribunal, nele precisando que acompanhou as contagens físicas realizadas no varejo, referindo, no que especificamente se refere aos macerados, que as inspetoras responsáveis registaram as respetivas quantidades e tanques onde se encontravam. Ainda no que se refere aos macerados, detalhou o respetivo processo produtivo, esclarecendo que a adição de álcool à fruta inviabiliza qualquer possível fermentação natural da mesma. Mais referiu que regista todos os movimentos diários de produção e que as fórmulas de fabrico dos licores foram comunicadas à Alfândega do Funchal. No restante, relatou a forma como foram preparados os mapas retificados apresentados na audição prévia com base nos seus registos de produção.

O seu depoimento foi, desta forma, positivamente valorado para a fixação da matéria vertida nos pontos 12. a 17. dos factos provados.

Por fim, a testemunha C…., revisor oficial de contas, demonstrou possuir um conhecimento direto da matéria inerente à estruturação da Impugnante, respetiva contabilidade e controlos a que se encontrava sujeita, em virtude de ser o órgão fiscal único da sociedade (desde 2015), responsável pela certificação das suas contas.

O seu depoimento afigurou-se isento, claro e seguro, que convenceu o Tribunal sobre os relatados aspetos concernentes com a estrutura da Impugnante e com os controlos a que estava sujeita por parte da Alfândega do Funchal, IFAP e IVBAM e por ele próprio enquanto órgão fiscal único. Quanto ao remanente, pronunciou-se sobre o teor das conclusões do relatório final, expondo as razões da sua discordância quanto à metodologia adotada, e debruçou-se sobre a organização da contabilidade da Impugnante.

Como tal, o seu depoimento foi valorado positivamente para a fixação da matéria constante dos pontos 8., 9. e 10. dos factos provados.”


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C) FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de IABA a que corresponde o registo de liquidação n.º 9000333, respetivos juros compensatórios e valor do impresso, no montante global de €489.974,26.

Ab initio, em termos de delimitação da lide recursiva, importa relevar que pese embora a Recorrida tenha requerido, subsidiariamente, a ampliação do objeto do recurso, ao abrigo do consignado no artigo 636.º, nº1, do CPC, fê-lo sem qualquer substanciação do erro de julgamento da decisão recorrida, o que obsta, naturalmente, ao seu conhecimento, (vide, designadamente, Acórdão do STJ, prolatado no processo nº 4622/09.6TTLSB.L1.S1, datado de 17 de novembro de 2016), encontrando-se, por isso, consolidadas na ordem jurídica as questões concatenadas com a falta de notificação prévia para o procedimento de inspeção e a preterição de formalidade essencial de audição prévia.

Mais importa ter presente que, em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, feito este introito, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se o Tribunal a quo incorreu:

¾ Em erro de julgamento de facto, competindo aferir da pertinência e legalidade dos requeridos aditamentos por complementação e por substituição, à luz do regime normativo contemplado no artigo 640.º do CPC.

¾ Em errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito por ter decidido que se verifica, por um lado, o vício do procedimento de inspeção atinente ao local da prática dos atos de inspeção e por outro lado, o vício de violação de lei por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, face à desconsideração por parte da AT de elementos e premissas base que não permitem legitimar o apuramento dos resultados e o ato de liquidação impugnado.

Comecemos, então, com o erro de julgamento de facto.

Para o efeito importa, desde já, convocar o teor do artigo 640.º do CPC, aplicável ex vi artigo 281.º do CPPT.

Preceitua o aludido normativo que:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de primeira Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Tem, por isso, de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida ou o aditamento de novos factos ao acervo probatório dos autos (1).

No concernente à observância dos requisitos constantes do citado normativo relativamente à prova testemunhal , após posições divergentes na Jurisprudência, mormente, na Jurisdição Comum o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a pronunciar-se no sentido de que “[e]nquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.” (2)

Note-se que, a indicação exata das passagens de gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo, naturalmente, do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, conforme decorre do artigo 662.º do CPC (3), aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT.

Dir-se-á, portanto, que o que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do artigo 640.º do CPC(4).

Salientando, ainda, neste particular, que a seleção da matéria de facto só pode integrar acontecimentos ou factos concretos, que não conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos, sendo que as asserções que revistam tal natureza devem ser excluídas do acervo factual relevante ou indeferido o seu aditamento.

“[q]uestão de facto é (..) tudo o que se reporta ao apuramento de ocorrências da vida real e de quaisquer mudanças ocorridas no mundo exterior, bem como à averiguação do estado, qualidade ou situação real das pessoas ou das coisas” e que “(..) além dos factos reais e dos factos externos, a doutrina também considera matéria de facto os factos internos, isto é, aqueles que respeitam à vida psíquica e sensorial do indivíduo, e os factos hipotéticos, ou seja, os que se referem a ocorrências virtuais”.(5)

“As afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão. Daí que sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, tal ponto da matéria de facto deve ser eliminado.”(6).

Feitos estes considerandos iniciais, verifica-se que, in casu, a Recorrente requer alterações ao probatório, as quais se consubstanciam em aditamentos por complementação e por substituição, por reporte ao meio probatório que descreve, importando, assim, aferir da sua pertinência para a decisão da causa.

Atentemos, então e per se, nas visadas alterações ao probatório.

A Recorrente começa por defender que devem ser aditados ao probatório os factos que infra se enumeram, consubstanciados no depoimento da testemunha M...:

- A Alfândega do Funchal foi incumbida de acompanhar a Impugnante após a inspeção, tendo verificado que as deficiências detetadas na mesma foram ultrapassadas.

- A Alfândega do Funchal, apesar de manter controlo sobre a Impugnante, em nenhum momento pôs em causa as conclusões do relatório de que houve introdução irregular no consumo.

Contudo, face ao âmbito e extensão da presente lide não se vislumbra qualquer utilidade no seu aditamento, nem, de resto, a Recorrente evidencia quais as razões subjacentes ao aludido.

In casu, não assume pertinência para a resolução do presente recurso o facto da Alfândega do Funchal ter sido ou não incumbida de acompanhar a Impugnante após a inspeção, e as constatações ulteriormente verificadas e não materializadas no Relatório Inspetivo, em nada relevando, natural e necessariamente, o facto da Alfândega do Funchal, não ter colocado em causa as conclusões do relatório.

Ademais, importa ter presente que tais aditamentos para além de revestirem natureza eminentemente conclusiva, carecendo de uma específica substanciação espácio-temporal, não resultam alegados pelas partes nos seus articulados, nem se vislumbram como factos instrumentais.

E por assim ser, em face de todo o exposto, indeferem-se os aludidos aditamentos.

Prosseguindo.

A Recorrente requer, outrossim, o aditamento do seguinte facto não provado, fundado, igualmente, no depoimento da testemunha M...:

a) As deficiências detetadas não impediam de apurar corretamente a mercadoria que era introduzida no consumo.

Ora, face às considerações anteriormente tecidas é por demais evidente que o aludido aditamento não pode lograr provimento, uma vez que a aludida asserção representa uma manifesta conclusão inviabilizando, assim, a sua materialização no probatório. Com efeito, o que tem de estar consignado no acervo fático dos factos são as ocorrências da vida real, devidamente substanciadas no espaço e no tempo, no caso quais as irregularidades e deficiências detetadas expressas, necessariamente, no Relatório Inspetivo, para que o Tribunal possa aquilatar da sua verificação, legitimação e concluir, in fine, se as mesmas impediam ou não o apuramento idóneo e correto da mercadoria.

Face ao exposto, indefere-se o requerido aditamento por complementação.

Subsiste, ora, por analisar a alteração aos artigos 10 e 19 do probatório, mais uma vez em ordem ao depoimento da testemunha M....

Neste particular, solicita a Recorrente que os pontos 10 e 19 passem a assumir o seguinte teor:

10. Por outro lado, a Alfandega do Funchal, enquanto estância aduaneira de controlo, mantém controlos permanente sobre a Impugnante, atenta a sua qualidade de depositário autorizado com entrepostos de produção, tendo sido verificado irregularidades ao longo do tempo, nomeadamente falta de produto num varejo em 2003.

19. Os serviços laboratoriais da Direção de Serviços técnicos, Análises e Laboratório conseguem aferir o teor alcoólico de produtos em maceração através de análise química, não sendo, no entanto, nada comum fazer essa análise pois a informação do operador é suficiente, não estando a Alfândega do Funchal dotada dessa capacidade.

Ora, compulsado o teor dos factos constantes nos pontos 10 e 19 do probatório resulta que a alteração visada consiste no aditamento quanto ao facto elencado em 10 da menção “tendo sido verificado irregularidades ao longo do tempo, nomeadamente falta de produto num varejo em 2003” e no concernente ao ponto 19 no aditamento da seguinte asserção “não sendo, no entanto, nada comum fazer essa análise pois a informação do operador é suficiente, não estando a Alfândega do Funchal dotada dessa capacidade”.

No entanto, mais uma vez, os aludidos aditamentos devem ser indeferidos na medida em que não consubstanciam, por um lado, factos, mas sim juízos opinativos, valorativos e conclusivos, e por outro lado, são manifestamente irrelevantes para a presente lide recursiva, porquanto não assume pertinência qualquer juízo de valoração quanto ao ano de 2003 -sendo ademais contraditório face à data da constituição da sociedade e contemplado em 1) do probatório- bem como a circunstância de um procedimento, legalmente previsto, ter caráter habitual ou pouco comum.

Assim, face a todo o exposto indeferem-se as visadas alterações ao probatório, mantendo-se, assim, inalterada a matéria de facto nos moldes em que foi fixada pelo Tribunal a quo.


***

Aqui chegados, estabilizada a matéria de facto importa, assim, analisar do aduzido erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito.

Vejamos, então.

A Recorrente começa por sustentar que o Tribunal a quo interpretou erroneamente a questão atinente ao local da prática dos atos de inspeção, na medida em que da leitura das alíneas a) e b) do artigo 13.º do RCPITA não resulta qualquer obrigação de que os atos de inspeção sejam todos praticados nas instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, mesmo no caso do procedimento externo.

Sendo que, in casu, apenas sucedeu uma opção de realização de determinados atos nas instalações do sujeito passivo e outros atos fora daquelas instalações, nomeadamente a inventariação dos produtos que se encontravam armazenados ao abrigo do regime de suspensão de IEC e a recolha dos elementos necessários à inspeção, tais como a contabilidade de existências do EF.

Ressalvando, adicionalmente, que as notificações a solicitar documentação só foram realizadas porque a Impugnante não disponibilizava os elementos necessários à realização da inspeção, quando, ademais, não resulta da lei que as mesmas tenham que ser concretizadas presencialmente, conforme plasmado nos artigos 28.º, 29.º e 42.º do RCPITA.

Mais sustenta que, inexiste o sentenciado erro sobre os pressupostos de facto e de direito, na medida em que não foram disponibilizados todos os documentos relevantes para apurar as quantidades de produto efetivamente fabricado, mormente, as fichas de produção do EF, sendo insuficiente para o efeito as fórmulas de fabrico já disponibilizadas na Alfândega do Funchal.

Acrescenta, ainda, que nem com a análise laboratorial, se poderiam obter os elementos em falta, até porque não seria possível aferir as quantidades de rum, álcool etílico, vinho da Madeira e outros ingredientes que eventualmente foram colocadas naqueles produtos, daí não ser, de todo, uma prática comum.

Conclui, assim, que não foram apresentados factos que comprovassem que o rum, o álcool etílico e o vinho da Madeira estariam no EF sob a forma de macerados, sendo que qualquer conclusão nesse pressuposto redundaria em presunções e suposições, metodologia que nunca poderia ser seguida pela inspeção, que apenas se limita às evidências e aos factos recolhidos.

Donde, contrariamente ao alegado pela Recorrente a AT logrou pôr efetivamente em causa a veracidade da contabilidade da Impugnante, inexistindo os apontados erros nos pressupostos de facto e de direito, incorre, nessa medida, a visada decisão em erro de julgamento de direito, por violação da alínea b) do n.º 3 do artigo 22.º do CIEC.

Dissente a Recorrida, propugnando pela manutenção da decisão, na medida em que a mesma não padece dos arguidos erros de julgamento, tendo ajuizado adequada e corretamente a questão inerente ao vício do procedimento de inspeção concatenado com os atos de inspeção e bem assim o vício de violação de lei concatenado com a ilegalidade substancial das correções.

Mais advoga que, as alegações da Recorrente, relativamente ao alegado erro de julgamento, assentam numa narrativa desconforme com a matéria de facto dada como provada nos autos, estribando-se em factos alternativos não provados, sendo certo que os mapas da contabilidade de existências entregues pela Recorrida à equipa inspetiva aquando do varejo e, posteriormente, por e-mail datado de 28 de agosto de 2017, contêm todos os elementos, que agora, em sede de recurso, a Recorrente diz que eram necessários à fiscalização.

Refutando, ainda, que o laboratório aduaneiro, não tenha capacidade para determinar, com rigor, o grau alcoólico de qualquer produto, bem como a totalidade de todos os produtos que o compõem e respetivas quantidades.

Vejamos, então.

Começando pela preterição de formalidade essencial no âmbito da ação inspetiva e inerente ao local da prática dos atos de inspeção.

Atentemos, desde já, na fundamentação jurídica que esteou a procedência deste vício procedimental.

O Tribunal a quo chamando à colação o disposto no artigo 34.º, nº1 do RCPIT, evidenciou, desde logo, que “[s]empre que a atividade inspetiva envolver a análise de elementos de contabilidade do inspecionado e relacionados com a atividade a inspecionar que se encontrem, ou devam legalmente se encontrar, em instalações ou dependências específicas, os atos de inspeção serão levados a cabo nessas instalações ou dependências.”

Mais densificando que o supra expendido representa, necessariamente, uma garantia do contribuinte, e que face ao consignado no artigo 56.º do mesmo diploma legal se terá de atender ao princípio da imediação, “[n]o sentido de se exigir que as fotocópias ou extratos de livros ou documentos devam ser efetuados nas instalações ou dependências onde se encontrarem.”

Ressalvando, naturalmente, que tal não obsta que “[n]ão possa ser solicitado um ou outro documento ou esclarecimento ao contribuinte e este se desloque aos serviços da Administração Tributária e Aduaneira, desde que se mostre adequado e proporcional. Mas a regra é, e deve ser sempre, a da prática dos atos de inspeção (como o exame e consulta dos livros e registos contabilísticos) nas instalações do contribuinte.”

Concluindo, assim, mediante transposição para a realidade fática dos autos, que “[a] equipa de inspeção esteve presente duas vezes nas instalações da Impugnante - na data do varejo (a 23 de março de 2017) e em 03 de abril de 2017 [cfr. pontos 24. e 32. dos factos provados] -, passando depois a solicitar à distância a entrega de milhares de documentos através de mensagens de correio eletrónico e por via postal [cfr. pontos 26. a 31., 33. a 42. e 44. a 48. da matéria assente], em detrimento das regras acabadas de citar relativas ao local da prática dos atos inspetivos, imediação e presencialidade. Tal prática não se pode ter por justificada, sem mais, com as prerrogativas da inspeção, mostrando-se, na ausência de qualquer outra elucidação, como desproporcionada e ilegal, por preterição de formalidade essencial do procedimento inspetivo, invalidante dos termos procedimentais posteriores, designadamente da subsequente liquidação que neles se suporta.”

E, de facto, não ajuizamos que exista o aludido erro de julgamento apontado pela Recorrente, e isto, desde logo, porque o Tribunal a quo, contrariamente ao por si evidenciado, não referenciou que num procedimento de inspeção externa todos os atos tenham de ser praticados externamente, mas sim que não poderia inverter-se a regra e transformá-la na exceção, coartando direitos às partes. Ainda para mais, como veremos, quando essa preterição granjeou reflexos em sede probatória -concatenada com a dificuldade de interpretação dos documentos carreados- materializada nas correções técnicas impugnadas.

De facto, da letra do artigo 13.º, alínea b), do RCPIT retira-se que um procedimento é passível de qualificação como externo, desde que os atos de inspeção se realizem total ou parcialmente nas instalações dos visados, no entanto, e na senda do expendido na decisão recorrida, essas prerrogativas da inspeção tributária e as “garantias de eficácia” a que é feita alusão têm sempre de ter concatenadas e ter como norteador basilar o princípio da proporcionalidade.

Aliás, todas as prerrogativas da inspeção tributária devem ser norteadas pela necessidade e pela proporcionalidade, quando, ademais, podem entroncar -como sucede in casu e densificaremos em sede própria- em deficit probatório e inerente erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

Com efeito, como doutrinam Joaquim Freitas da Rocha e João Damião Caldeira(7), “quanto ao conteúdo, “facultar as condições necessárias” significa, por exemplo, e consoante os casos, permitir o livre acesso às instalações e dependências, disponibilizar o exame, requisição e reprodução de documentos, e prestar informações. Naturalmente que a prossecução deste dever de colaboração há-de ser efectuada tendo em conta a sua harmonização ou compatibilização com outras dimensões constitucionais relevantes, como sejam o normal e adequado exercício das respectivas profissão ou funções, não podendo em caso algum a imposição da inspeção tributária constituir um entrave ou obstáculo desproporcionado ou abusivo.”

Aliás, na senda do expendido pelo Tribunal a quo, decorre, expressamente, do teor do artigo 34.º, nº1, do RCPIT que: “Quando o procedimento de inspecção envolver a verificação da contabilidade, livros de escrituração ou outros documentos relacionados com a actividade da entidade a inspecionar, os actos de inspecção realizam-se nas instalações ou dependências onde estejam ou devam legalmente estar localizados os elementos.”

Ora, dimana do citado normativo, o qual se reporta à dimensão espacial da atividade inspetiva que a regra é a atividade inspetiva, sempre que envolva a verificação da contabilidade, livros de escrituração ou quaisquer outros documentos relacionados com a atividade da entidade a inspecionar, realizar-se nas instalações ou dependências ou estejam ou devam estar localizados os elementos, ressalvadas as situações em que o próprio sujeito passivo -e desde que invocando motivo, devidamente, justificado e atendível e não comprometa o normal desenrolar do procedimento inspetivo- solicite a realização em local diverso.

Neste particular, convoque-se, novamente o entendimento dos citados autores, os quais esclarecem que “esta limitação constitui uma importante garantia do contribuinte, pois impede que «o procedimento de inspecção possa ser interno, devendo necessariamente revestir a natureza do procedimento de inspecção externo. E ao fazê-lo, acautela e previne que um funcionário da inspecção tributária possa exigir ao contribuinte que se desloque aos serviços da administração fiscal com a finalidade de ali apresentar a sua contabilidade, os seus livros de escrituração ou outros documentos relacionados com a sua actividade (8).”

Ora, o que o Tribunal a quo propugnou, e bem, é que a regra é e deve ser sempre, no âmbito de um procedimento externo, da materialização dos atos de inspeção nas instalações ou dependências ou do contribuinte, podendo, naturalmente, solicitar-se um ou outro documento aos sujeitos passivos.

Aliás, tal é o que dimana, outrossim, do plasmado no artigo 56.º do RCPIT quanto ao procedimento de recolha de elementos, os quais visam o cumprimento dos imperativos de presencialidade e de imediação física.

E a verdade, é que, in casu, e como resulta claramente do probatório a exceção tornou-se a regra, porquanto a entidade fiscalizadora deslocou-se apenas à entidade inspecionada na data do varejo, a saber, a 23 de março de 2017 e em 03 de abril de 2017, tudo o mais foi realizado nas instalações da AT, solicitando, reiterada e sucessivamente, milhares de documentos por suporte eletrónico, conforme dimana inequívoco do probatório, mormente, dos pontos 26) a 31), 33) a 42) e 44) a 48).

Logo, como é bom de ver, não foram apenas “alguns” elementos que foram solicitados ao sujeito passivo, como se infere do expendido em K), mas sim a quase totalidade dos documentos, sendo certo que não corresponde à realidade dos factos as asserções expendidas em L) e M), no sentido de que resultam de incumprimentos declarativos iniciais, porquanto, como resulta expresso do probatório encontramo-nos, maioritariamente, perante atos requeridos ab initio, sem que se retire, imediata ou mediatamente, qualquer reiteração decorrente de uma falta de colaboração. Aliás, como decorre da factualidade assente a Recorrida respondeu sempre, atempadamente, regra geral no dia subsequente, às solicitações da entidade fiscalizadora.

Anuindo-se, assim, com o expendido pelo Tribunal a quo, o qual secundamos, de que o procedimento inspetivo foi materializado “[e]m detrimento das regras acabadas de citar relativas ao local da prática dos atos inspetivos, imediação e presencialidade. Tal prática não se pode ter por justificada, sem mais, com as prerrogativas da inspeção, mostrando-se, na ausência de qualquer outra elucidação, como desproporcionada e ilegal, por preterição de formalidade essencial do procedimento inspetivo, invalidante dos termos procedimentais posteriores, designadamente da subsequente liquidação que neles se suporta.”

Ademais, e conforme veremos, em sede própria, se a AT tivesse adotado os procedimentos constantes na lei e supra expendidos, seguramente que a aduzida complexidade e dificuldade na interpretação dos elementos requeridos poderia ser suprida mediante esclarecimentos adicionais obtidos na sede da Recorrida, e obtenção de cruzamentos que poderiam/deveriam ser materializados com a preceituada imediação física.

De relevar, in fine, que não procede o expendido em 41.º quanto à cominação inerente ao vício em questão, porquanto existindo um vício procedimental no âmbito da ação inspetiva o mesmo refletir-se-á, necessariamente, nos atos subsequentes, particularmente o ato impugnado.

E por assim ser, não se vislumbra o aduzido erro de julgamento assacado neste concreto particular.

Mas, igual entendimento se perfilha no concernente ao vício de violação de lei atinente à ilegalidade das correções, na medida em que validamos o entendimento do Tribunal a quo no sentido de que as visadas correções assentam em premissas erradas, estando, assim, inquinadas de erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

Mas, explicitemos, então, porque assim o entendemos.

Começando por atentar no discurso fundamentador da decisão recorrida.

O Tribunal a quo evidencia, desde logo, que competindo à AT demonstrar os pressupostos que legitimam a sua atuação corretiva, a mesma não cumpriu esse ónus probatório na medida em que a fundamentação constante no Relatório Inspetivo para além de assentar em juízos, eminentemente, conclusivos, padece de erros base sobre os pressupostos de facto e de direito.

Densifica, para o efeito, que a AT “[p]ara legitimar tal atuação, foi considerado em sede inspetiva que a Impugnante, após ter sido instada para o efeito, apresentou contas correntes com movimentos atualizados “respeitantes aos anos de 2014 e 2015, sem que tenham sido remetidos quaisquer documentos de suporte aos registos apresentados”, reiterando-se que “é fundamental que o EFP mantenha documentos que justifiquem os registos efectuados na contabilidade de existências, o que não acontece para a totalidade dos registos analisados”.

Reiterando, para o efeito, que “[a]contece que tais imputações são de caráter genérico, não tendo os serviços inspetivos especificado, como se lhes impunha, que movimentos foram atualizados por referência a 2014 e 2015 e em relação aos quais não foram entregues quaisquer documentos de suporte, ou quais foram os registos concretamente analisados que não possuíam os correspetivos documentos justificativos.

Sublinhando, nesse particular, que “[a]penas foi efetuada uma referência, a título meramente exemplificativo, à produção de macerados, constando do relatório final que não foram entregues os documentos de suporte aos respetivos registos de produção, “o que inviabilizou o controlo daqueles produtos” (impossibilidade que, na verdade, não se verifica, conforme se verá). Por outro lado, a inspeção sustentou que as contas correntes dos produtos mantidas pelo operador “são confusas e de difícil leitura”, recorrendo, mais uma vez, a uma técnica ilustrativa, dando como exemplo “os embalamentos de produto e respectivas saídas de EFP” que são organizadas por lote. “

Aduzindo, adicionalmente, quanto aos pressupostos legitimadores da atuação corretiva, que os serviços de inspeção não podem desconsiderar a mercadoria contida em macerados, com fundamento em que “nunca foram apresentadas as respectivas fichas de produção, nem no decurso da inspecção nem em sede de AP, sem as quais não é possível quantificar as incorporações de rum, álcool etílico e Vinho da Madeira naqueles produtos”.

Não só porque os produtos em estado de maceração foram vistos e contabilizados em sede de varejo, como as alegadas fichas de existências e as taxas de rendimento referentes a licores produzidos pela Impugnante com recurso a processo de maceração foram comunicados à Alfândega do Funchal. Sublinhando, in fine, que, em caso de dúvida, sempre poderiam ter determinado a análise laboratorial daqueles produtos macerados, de forma a aferirem o respetivo teor alcoólico, em ordem ao inquisitório.

Concluindo, assim, que “[p]arte da mercadoria alegadamente introduzida de forma irregular no consumo, e que originou a liquidação impugnada, encontrava-se no entreposto sob a forma de produto macerado, tendo sido indevidamente desconsiderada com base no falso argumento de que não era suscetível de controlo” padecendo, adicionalmente, de erros de quantum base concatenados com premissas desfasadas da realidade e contraditórias, que inquinam o ato de liquidação impugnado de ilegalidade.

E, de facto, mais uma vez, não vislumbramos que o juízo de entendimento do Tribunal a quo, padeça dos erros que lhe são assacados na medida em que interpretou corretamente o regime jurídico aplicável aos autos com a devida transposição para a realidade fática em contenda.

Comecemos, então, por atentar na fundamentação jurídica constante no Relatório Inspetivo que fundou a, alegada, introdução irregular no consumo, e consequentemente as correções visadas.

Compulsado o teor do Relatório Inspetivo extraímos-perfilhando e validando o aduzido na decisão recorrida- que as razões externadas pela AT se coadunam com um juízo conclusivo e genérico.

Senão vejamos.

A ação inspetiva teve início com um varejo aos EFP, tendo sido solicitada a quantificação atualizada das existências nos EFP, a qual, à data, não estava disponível, tendo, contudo, sido ulteriormente apresentada uma listagem das existências dos produtos em suspensão.

Esclarecendo, nesse âmbito, que após atualização e entrega das contas correntes, “verificou-se que foram actualizados movimentos respeitantes aos anos de 2014 e 2015, sem que tenham sido apresentados quaisquer documentos de suporte”, razão pela qual foi solicitada a apresentação das fichas de fabrico dos produtos, e nessa decorrência apresentados documentados intitulados de “Guia de Circulação”, que indicam o produto acabado, a quantidade das matérias primas utilizadas a data de embalamento, o nº QC, o lote e as estampilhas especiais apostas.

Concluindo, para o efeito, que “para alguns movimentos de produção registados nas contas correntes, não foram entregues os respectivos documentos de suporte aos registos como, por exemplo, para as produções de macerados” e bem assim que “foram detectados registos nas contas correntes actualizadas que não constavam das contas correntes entregues no início do controlo.”

Mais evidenciando que “[a]nalisadas as contas correntes dos produtos mantidas pelo operador, constatou-se que são confusas e de difícil leitura”, para depois, novamente, concluir que “[t]orna-se complicado o apuramento de um saldo à vista para cada produto, dado que cada produto pode ter várias unidades referentes a vários lotes (…)”.

Desfechando, in fine, que “[c]onsiderando todos os factos acima descritos, as contas correntes entregues posteriormente, por apresentarem lacunas na informação, não puderam ser confrontadas com a contagem das existências realizada no varejo”, daí que tenha sido adotada enquanto metodologia “[a] reconstituição das contas correntes para os produtos produzidos e recebidos nos EFP (…)” optando-se por “[e]fectuar uma conta corrente por produto detido pelo depositário autorizado”, face à “[i]inexistência de contas correntes”.

Ora, atentando no supra exposto, contrariamente ao aduzido pela Recorrente e na senda do ajuizado pelo Tribunal a quo, ter-se-á de concluir que o Relatório Inspetivo assenta, efetivamente, em juízos conclusivos sem a devida substanciação dos pressupostos que levaram à desconsideração dos resultados e elementos apresentados pela parte, sendo que, como é consabido, vigora o princípio da verdade declarativa.

De relevar, neste particular, que tal como é reconhecido no Relatório Inspetivo a quantificação atualizada das existências foi, ulteriormente, apresentada, sendo que a contabilização das existências está devidamente suportada, conforme resulta dos pontos 20) e 21) do probatório, não impugnado, logo a realidade fática em contenda não pode subsumir-se no artigo 22.º, nº3, alínea b) do CIEC, tendo, de resto, sido cumprido o consignado no artigo 16.º, nº2, alínea c) da Diretiva 2008/118/CE do Conselho.

Note-se, inclusive e inversamente ao aduzido em O) que, a AT limita-se a, genericamente, evidenciar a existência de algumas irregularidades, mas sem a devida concretização fática, utilizando, maioritariamente, uma técnica ilustrativa e exemplificativa, sem qualquer expressão espácio temporal e numérica, como legalmente se impunha.

Acresce, outrossim, que o juízo em que assentam as correções visadas e ulteriormente a esteira de valoração constante nas alegações recursivas não traduz a realidade dos factos tal qual a mesma se encontra densificada no recorte fático dos factos, sendo inclusive contraditória, porquanto evidencia que as contas correntes apresentadas são de difícil leitura e depois procede à reconstituição das mesmas face à alegada inexistência das mesmas.

Ora, como é bom de ver, são realidades díspares a inexistência tout court dos elementos documentais, e a existência dos mesmos e a sua desconsideração face a uma difícil leitura. Não se percecionando, tão-pouco, quais as lacunas na informação, na medida em que, como visto, não se encontram devidamente corporizadas.

Ademais, a entidade fiscalizadora não pode, sem mais, desconsiderar a globalidade dos elementos documentais fornecidos pela parte, por os mesmos serem complexos e a sua leitura revelar alguma complexidade, até porque, tendo dúvidas sobre os mesmos a AT podia/devia ter solicitado esclarecimentos adicionais neste concreto particular, não podendo a dificuldade acrescida e a complexidade redundarem em pressupostos que legitimam a reconstituição das contas correntes.

Como doutrinado em Aresto deste Tribunal prolatado no âmbito do processo nº 431/04.7BESNT, de 28 de janeiro de 2021, “[n]ão pode ser aceite enquanto justificação legitimadora de uma correção a morosidade e a dificuldade na elaboração do trabalho.”

De resto, e adensar o vício que analisámos anteriormente, e conforme já demos nota, se a AT tivesse adotado os procedimentos constantes na lei para o efeito, seguramente que a complexidade e dificuldade na interpretação poderia ser suprida mediante esclarecimentos adicionais obtidos na sede da Recorrida, e obtenção de cruzamentos que poderiam/deveriam ser materializados com a imediação física prevista na lei.

Até porque, atentando no recorte fáctico dos autos, a Recorrente nunca se eximiu à colaboração, sempre respondendo às solicitações, explicitando as justificações que reputou pertinentes para o efeito, sendo, outrossim, de relevar que a alegada falta das fichas de fabrico não inviabilizava, per se e como veremos, a validação das realidades em contenda em ordem à realidade declarativa apresentada.

Com efeito, compulsados os pontos 26) a 48) do probatório dimana inequívoco que aquando da solicitação de elementos-como visto da vastíssima requisição de elementos por suporte eletrónico-a Recorrida nunca se eximiu à apresentação de qualquer documento requerido, sendo que existindo qualquer necessidade de protelamento temporal o mesmo era, expressamente, apontado não se vislumbrando qualquer subterfúgio ou manobra evasiva.

De resto, como dimana da factualidade assente, mormente, pontos 27), 34), 38), 44), 46), as respostas foram acompanhadas de notas explicativas.

Acresce, outrossim, que quanto às fichas de fabrico e de produção não se retira a realidade aludida pela Recorrente, não se legitimando, assim, as correções realizadas.

Senão vejamos.

Da interpretação conjugada dos pontos 45) a 48), dimana que a 14 de setembro de 2017, a entidade fiscalizadora requereu a apresentação dos seguintes elementos:
1.Fichas de Fabrico relativas às produções dos produtos sujeitos a IEC realizadas entre 01/01/2014 e 23/03/2017, com indicação das matérias-primas incorporadas, respectivas quantidades e teor alcoólico (quando aplicável) e quantidade de produto obtido, com indicação do respectivo grau alcoólico;
2. Fórmulas de fabrico dos produtos sujeitos a IEC, com indicação das quantidades de cada ingrediente utilizado, incluindo o respectivo teor alcoólico (quando aplicável), quantidade de produto final obtido e respectiva taxa de rendimento;
3. Cópia das facturas de aquisição de Álcool Etílico relativas aos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017.

Apresentando, nessa sequência, a Recorrida a seguinte documentação: fórmulas de fabrico dos produtos sujeitos a IEC e cópias das faturas da aquisição de Álcool Etílico relativas aos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017. Informando, adicionalmente, que “em relação às fichas de Fabrico relativas às produções, com indicação das matérias-primas incorporadas, respetivas quantidades (com indicação do teor) e quantidades produzidas, esta informação está nos ficheiros (Contabilidades de Existências) enviados no email do passado dia 28/08/2017”.

Ulteriormente, a 25 de setembro de 2017, foi requisitada “toda a documentação que serviu de base aos registos nas contas correntes a fim de identificarmos as quantidades produzidas de cada produto e a respectiva quantidade de matéria-utilizada, nomeadamente a que está sujeita a IEC”, cuja resposta foi satisfeita mediante a apresentação de setenta ficheiros.

E a verdade é que, após a prestação dos aludidos elementos a Recorrente nada mais requereu, não tendo envidado qualquer diligência complementar tendente a sanar ou suprir qualquer dúvida, limitando-se, tão-só, a comunicar mediante ofício datado de 13 de dezembro de 2017 que se considera concluída a diligência inspetiva.

Não podendo, nessa medida, validar-se o aduzido em 44), e 47) [O) e K], carecendo, naturalmente, de relevância as considerações 48) a 53), desde logo, porque não são contemporâneas do Relatório Inspetivo, sendo que qualquer fundamentação justificativa teria de estar devidamente substanciada não podendo ser relevada a aduzida a posteriori.

Ademais, tem, naturalmente, de ser relevado o facto de tais realidades terem sido comunicadas à Alfândega do Funchal, conforme resulta assente e não impugnado, não podendo, sem mais, validar-se a metodologia de reconstituição de stocks porquanto carece de demonstração da premissa base cujo ónus, como vimos, se circunscreve na esfera jurídica da AT.

Prosseguindo, ora, no atinente aos produtos macerados.

Também neste particular não assiste razão à Recorrente, desde logo, porque as alegações recursivas não apresentam respaldo na factualidade provada, sendo que, como já evidenciado anteriormente, em nada releva a circunstância da análise laboratorial não ser, alegadamente, uma prática comum.

Com efeito, dimana da factualidade provada que a Impugnante, no exercício da sua atividade possui um engenho onde recebe cana-de-açúcar de cerca de 250 agricultores da Região Autónoma da Madeira, mediante o qual transforma a cana-de-açúcar recebida em melaço, que posteriormente destila para obtenção de rum de cana-de-açúcar.

Mais dimanando, igualmente, provado que a produção e transformação da cana-de-açúcar são, na Região Autónoma da Madeira, apoiadas por subsídios comunitários no âmbito do POSEI, os quais apenas são atribuídos mediante controlo da legalidade pelo Instituto de Financiamento da Agricultura e das Pescas, IP (IFAP), o qual controla a produção, comercialização e transformação de cana-de-açúcar pela Impugnante em produtos derivados (rum e mel) e a utilização e expedição destes.

De ressalvar, igualmente, que o Instituto do Vinho, do Bordado e do Artesanato da Madeira, IP-RAM (IVBAM) faz, outrossim, um controlo quantitativo e qualitativo da cana-de-açúcar adquirida e transformada pela Impugnante, bem como dos produtos derivados da sua transformação, do armazenamento, envelhecimento, utilização e expedição destes.

Resultando ainda provado que, a Alfândega do Funchal, enquanto estância aduaneira de controlo, mantém controlos permanentes sobre a Impugnante, atenta a sua qualidade de depositário autorizado com entrepostos de produção, tendo nesse contexto a Impugnante, ora, Recorrida sido objeto de um varejo ocorrido em 2013 por parte da Alfândega do Funchal.

Sendo que no âmbito da sua atividade, e no atinente aos visados produtos, a Impugnante, ora Recorrida, produz licores a partir de rum da cana-de-açúcar (que fabrica), álcool e vinho madeira (que adquire em suspensão de imposto de outros produtores), utilizando, para o efeito, frutas e plantas que, depois de lavadas, cortadas e despolpadas, são adicionadas a produto alcoólico (álcool, rum e vinho da madeira, consoante os casos) para maceração em tanques de polietileno, a qual decorre durante um período mínimo de quinze dias, após o qual é filtrado e adicionado açúcar, com ulterior período de decantação e nova filtração ajustando-se as concentrações de açúcar e o grau alcoólico pretendido para o licor, com consequente seguimento do produto para engarrafamento.

Promanando, in fine, provado que as fichas de existências e as taxas de rendimento referentes a licores produzidos pela Impugnante foram comunicadas à Alfândega do Funchal.

E bem assim que, os serviços centrais da ATA, designadamente a Direção de Serviços Técnicos, Análises e Laboratório, são dotados de laboratório, os quais conseguem aferir o teor alcoólico de produtos em maceração através de análise química.

Ora, atenta a factualidade provada nenhuma censura merece o juízo de entendimento prolatado na decisão recorrida, não resultando provado o aduzido em V) e W), bem pelo contrário.

Note-se, neste concreto particular, que pese embora a Recorrente invoque a falta de apresentação das fichas de produção e que a mesma inviabiliza o apuramento dos resultados, a verdade é que não materializa, de que forma e quais os motivos atinentes a essa inviabilização, quando, ademais, foram juntos, desde logo, documentos apelidados de “Guia de Circulação”, com a densificação dos elementos reputados em falta.

Acresce que o laboratório aduaneiro(9) é entendido e mesmo epilogado como o “braço científico das alfândegas”, transformando-se num dispositivo central da Alfândega, conforme enunciado por Manuela Costa, Chefe de Serviços de Laboratório (10), ressalvando-se em termos de ratio que “os técnicos aduaneiros precisavam de desocultar as simulações distinguindo os produtos que, sob formas diversas, procuravam apresentar-se nos enquadramentos pautais de taxas mais baixas, ou aqueles que contornavam proibições.O laboratório tornou-se a palavra mágica que com o desenvolvimento da química, permitia destrinçar as matérias e detectar falsificações. Para o especialista, a múltipla utensilagem para captação e análise das amostras era um todo que se articulava através de operações protocoladas. Para o leigo, o laboratório é um acumulado de artefactos, frascos, estufas, tubos de ensaio, pipetas e seus suportes, provetas, balões, bicos, almofarizes, manómetros, barómetros, colorímetros, densímetros, balanças de precisão, etc completando-se com equipamentos de alta tecnologia e precisão.” (destaques e sublinhados nossos).

Mais doutrinando (11), neste particular, e no que para os autos releva que:

“Os métodos de análise comunitários utilizados pelo Laboratório requerem equipamento de base que utiliza as novas tecnologias. Compreende, entre outros, cromatógrafos gasosos e de gás liquido, espectrofotómetros, sacarímetro digital, extractores automáticos de proteínas e matérias gordas, densitómetros digitais, destiladores de óleos minerais e de álcool e bebidas alcoólicas, que permitem identificar, separar e quantificar as diversas substâncias e componentes de uma dada mercadoria. Contudo, o Laboratório ainda utiliza alguns métodos simples e antigos que resistiram ao tempo e provaram ser imprescíndiveis durante mais de um século.

Tradicionalmente uma das tarefas básicas do laboratório aduaneiro consiste no apoio laboratorial no controlo aduaneiro da fronteira externa e na regulação das trocas tendo em vista a correcta classificação pautal das mercadorias, a aplicação das medidas resultantes da política agrícola comum (ajudas Poseima e das restituições à exportação em que os montantes destes dependem de critérios de composição dos produtos que só a análise química pode determinar) e o controlo do regime de aperfeiçoamento activo em que se torna necessário analisar as matérias de base importadas e posteriormente exportadas após terem sido transformadas. Apoio laboratorial na gestão dos Impostos Especiais sobre o Consumo: Cada vez mais o laboratório é interrogado sobre a natureza e a composição das bebidas alcoólicas e sobre a existência e concentração dos desnaturantes e corantes em álcoois total e parcialmente desnaturados a fim de se constatar se as operações de desnaturação foram efectuadas de acordo com a legislação.

É também o laboratório da Alfândega o laboratório competente para analisar o “euromarcador” em petróleos e gasóleos isentos ou de taxa reduzida, análises estas solicitadas não só pelas alfândegas mas também pela GNR e entidades particulares. Apoio laboratorial na acção anti-fraude: A verificação das características dos óleos minerais, como a curva de destilação, densidade, ponto de inflamação e outras, permitem constatar se estes produtos estão de acordo com as especificações aduaneiras e legislativas ou se se trata de misturas abusivamente utilizadas como combustíveis ou carburantes. É ainda o laboratório que prepara os “Kits de estrada” para controlos móveis de utilização do gasóleo colorido e marcado e do álcool para fins sanitários e terapêuticos, para fornecer aos serviços aduaneiros e GNR.” (destaques e sublinhados nossos).

Pelo que, em sentido contrário ao propugnado pela Recorrente, mormente, em T) a W) não só a ATA poderia ter recorrido a esta diligência -existindo dúvidas quanto aos produtos macerados-como deveria ao abrigo do inquisitório ter-se socorrido das aludidas análises laboratoriais, em nada podendo relevar, naturalmente, a circunstância de ser uma prática pouco usual.

Secundando-se, nessa medida, a conclusão alvitrada na decisão recorrida no sentido de “[p]arte da mercadoria alegadamente introduzida de forma irregular no consumo, e que originou a liquidação impugnada, encontrava-se no entreposto sob a forma de produto macerado, tendo sido indevidamente desconsiderada com base no falso argumento de que não era suscetível de controlo.”

Carecendo, naturalmente, de relevância o aduzido em AA) a CC), das suas conclusões na medida em que a questão remonta a montante e aos pressupostos base que nortearam a descredibilização dos elementos apresentados, não logrando provimento o evidenciado em Z), porquanto não se encontra legitimada a atuação da ATA, mormente, a reconstituição dos stocks.

Ademais, não se perceciona o alcance do evidenciado em U), sendo certo que não corresponde à verdade a insusceptibilidade de recurso a presunções, desde logo, face à possibilidade de determinação da matéria coletável mediante avaliação indireta. Acresce que, em bom rigor, é avançada uma falta de veracidade do declarado e, no entanto, recorre-se a essa mesma realidade reconstituindo-se stocks, extrapolando-se dados, e assumindo-se, mediante inferências indiretas e presuntivas, realidades desconformes com as declaradas.

Relevando-se, igualmente, que o alegado em DD) e EE) não resulta minimamente demonstrado, não tendo a Recorrente redarguido com a inerente substanciação fática o ajuizado pelo Tribunal a quo no atinente ao erro de quantum, sendo certo que tal não é o que resulta do Relatório Inspetivo.

Sem embargo do exposto e como avançado pelo Tribunal a quo, “[s]empre que nos seus apuramentos havia no final de um ano mais mercadoria do que a apurada, a mesma não era tida em conta na abertura dos movimentos dos anos seguintes, mas quando no ano a seguir faltava essa mesma mercadoria, então concluíam que tinha sido introduzida no consumo. Obviamente que as contas correntes reconstituídas com base nesta metodologia não espelham a imagem fidedigna das existências em entreposto.”

Ainda neste âmbito importa, igualmente, relevar que não assiste razão quanto ao aduzido em GG), na medida em que tendo sido apresentadas e validadas as competentes declarações de substituição as mesmas careciam da devida análise e densificação, não podendo proceder, neste e para este efeito, as considerações evidenciadas em HH), porquanto a improbabilidade de precisão não pode justificar uma inércia de atuação da ATA.

Acresce, outrossim, que face à factualidade provada constante no probatório a existirem quaisquer dúvidas no domínio dos produtos macerados as mesmas tinham de ser valoradas contra a ATA.

Como doutrinado em recente Aresto do STA, prolatado no âmbito do processo nº 0695/07.4BEPRT 0450/18, de 12 de janeiro de 2022, “[s]e da prova produzida resultar dúvida fundada sobre a saída dos produtos do regime de suspensão, deve o ato tributário ser anulado.”

Esclarecendo, na fundamentação jurídica que perfilhamos, que “[n]os casos em que há dúvidas fundadas sobre o facto tributário que persistam após a instrução (non liquet) a lei manda anular o ato.

Isso, resulta, para o processo judicial, do artigo 100.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, mas deve entender-se que ali se consagra um princípio geral de repartição do ónus de prova objetivo aplicáveis às relações tributárias, tendo por base a ideia que que a aplicação de entendimento diverso (o de que caberia ao sujeito passivo a prova dos factos constitutivos da sua pretensão de anulação) implicaria o reconhecimento da presunção da legalidade do ato administrativo de que a Administração não beneficia (ver, por todos, o Acórdão da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo de 3/12/2002, no recurso 47 574, publicado no apêndice do Diário da República, 2.ª série, de 26/02/2004, página 7314).

Assim, mesmo que a Fazenda Pública tivesse razão em afirmar que a prova de que a mercadoria chegou ao destino era inconclusiva, o resultado não poderia ser diverso.” [no mesmo sentido vide Acórdão do TCAN, proferido no processo nº 01915/04.2BEPRT, de 30 de setembro de 2015]

Logo, no limite, a dúvida fundada e o aduzido princípio consignado no artigo 100.º do CPPT sempre acarretariam a anulação do ato impugnado.

Destarte, tudo visto e ponderado, improcede o arguido erro de julgamento, mantendo-se, nessa medida, a decisão recorrida, donde, o juízo anulatório com todas as legais consequências.


***

Subsiste por analisar a dispensa do remanescente da taxa de justiça.

De acordo com o disposto no citado artigo 6.°, nº7, do RCP que:

“(…) 7 - Nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.”

Em termos de densificação dos critérios da dispensa do pagamento do remanescente, veja-se, designadamente, o Acórdão proferido pelo STA, no âmbito do processo nº 0627/16, de 20 de setembro de 2017, e demais jurisprudência nele citada, que se transcreve na parte que releva para os autos:

“[a] dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem natureza excepcional, pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação processual e pela conduta das partes. A jurisprudência tem vindo também a admitir essa dispensa quando o montante da taxa de justiça devida se afigurar manifestamente desproporcionado em face do concreto serviço prestado, pondo em causa a relação sinalagmática que a taxa pressupõe, configurando uma violação dos princípios constitucionais do acesso ao direito e da tutela jurisdicional efectiva, da proporcionalidade e da necessidade (A título de exemplo, vide o seguinte acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 1 de Fevereiro de 2017, proferido no processo n.º 891/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/bc712805391451a8802580c00036138a.”

Ora, considera-se que o valor de taxa de justiça devido, calculado nos termos do tabela I.B., do RCP, é excessivo. Assim, não obstante, se entender que, face à pluralidade e complexidade das questões envolvidas e à tramitação dos autos, não deve haver dispensa total do pagamento da taxa de justiça, na parte que exceda os 275.000,00 Eur., entende-se ser adequado e proporcional, face às caraterísticas concretas dos autos e à atuação das partes, dispensar o pagamento da taxa de justiça, na parte que exceda 375.000,00 Eur.

Face ao exposto, por fundada a pretensão da Recorrente em matéria de condenação em custas, deve ser decretada a dispensa do remanescente da taxa de justiça, mas apenas na parte em que excede os €375.000,00, o mesmo se decretando na presente instância.


***

IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

-NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.

Custas pela Recorrente, com dispensa do remanescente da taxa de justiça, na parte em que excede os €375.000,00, em ambas as instâncias.
Registe. Notifique.


Lisboa, 15 de setembro de 2022

(Patrícia Manuel Pires)

(Jorge Cortês)

(Luísa Soares)



(1) António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª edição, pp 165 e 166; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62;




(2) Ac. STJ de 01.10.2015, P. 824/11.3TTLRS.L1.S1; Ac. STJ de 14.01.2016, P. n.º 326/14.6TTCBR.C1.S1; Ac. STJ de 11.02.2016, P. n.º 157/12.8TUGMR.G1.S1; Ac. STJ, datado de 19/2/2015, P. nº 299/05; Ac. STJ de 22.09.2015, P. 29/12.6TBFAF.G1.S1, 6ª Secção; Ac. STJ, datado de 29/09/2015, P. nº 233/09; Acórdão de 31.5.2016, 1572/12; Acórdão de 11.4.2016, 449/410; Acórdão do STJ de 27.1.2015, 1060/07.


(3) Vide, designadamente, Acórdão do STJ datado de 19/02/2015, proferido no processo nº 299/05.06TBMGD.P2.S1.


(4) Conforme doutrina o Ac. STJ. de 03/03/2016, no processo nº 861/13.3TTVIS.C1.S.


(5) HENRIQUE ARAÚJO: “A matéria de facto no processo civil”, publicado no site do Tribunal da Relação do Porto, acessível em www.trp.pt


(6) AC. do Tribunal da Relação do Porto, de 11 de julho de 2018, proferido no processo nº 1193/16.1T8PRT.P1


(7) In RCPIT anotado e comentado, Coimbra Editora, maio de 2013, anotação ao artigo 29.º, página 144.


(8) In Ob, Cit, pág.179.


(9) Cfr. Decreto Lei nº 118/2011, de 15.12 que aprovou a estrutura orgânica da AT, conjugado com a Portaria nº 320-A/2011, de 30.12 (artigo 14.º), complementado com o Despacho da Diretora Geral da AT nº 8451/2022, de 01.07.


(10) In Revista Aduaneira, nº 67, artigo: O LABORATÓRIO ADUANEIRO O “Braço Científico” das Alfândegas, disponível em: https://infoaduaneiro.portaldasfinancas.gov.pt/pt/publicacoes_formularios/publicacoes_aduaneiras/revista/Documents/67_total_2.pdf


(11) In ob. Citada, páginas 8 e 10.