Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09145/12
Secção:CA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:07/24/2014
Relator:ANTÓNIO VASCONCELOS
Descritores:ERRO DE JULGAMENTO QUANTO À MATÈRIA DE FACTO.
PROVIDÊNCIA CAUTELAR CONSERVATÓRIA.
REQUISITOS.
Sumário:I - Não existindo prova legal que se imponha ao julgador, este julga a prova segundo as regras de experiência comum e a livre convicção
que sobre ela forma (nº 5 do art. 607º do actual CPC, correspondente ao nº 1 do art. 655º do anterior Código), nenhum reparo merecendo a decisão judicial, que, em face da divergência de dois depoimentos e da plausibilidade que cada um deles apresenta, dê o facto em apreço por não provado.

II - Os poderes do tribunal superior na reapreciação da prova testemunhal estão limitados por, através do registo magnético da prova, não ser captável um universo de elementos que a oralidade e a imediação conferem ao julgador da 1ª instância.

III - A ilegalidade subsumível na al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA é a que resulta de uma simples leitura do requerimento inicial e da oposição, que se impõe ao jurista médio, imediata, incontroversamente, com forte probabilidade de assegurar que a pretensão formulada ou a formular no processo principal será julgada procedente.

IV - Uma extensa e complexa argumentação que o Requerente da providência tem de desenvolver não só para fundamentar uma pretensa consolidação jurídica da sua situação como também para demonstrar a ilegalidade do acto suspendendo, revela, com absoluta segurança, que não é evidente a procedência da pretensão formulada no processo principal.

V - A verificação do “periculum in mora” exige, em primeiro lugar, que haja fundado receio (receio objectivo) da constituição de uma situação de facto consumada ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente da providência visa assegurar no processo principal.

VI - O receio de uma situação de efectivo risco “para a segurança das pessoas e bens” tem de se extrair da ponderação, segundo as regras da ciência, lógica e experiência comum, dos factos que foram dados por indiciariamente provados, não se bastando com o receio de um risco meramente hipotético, eventual ou conjectural.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em Conferência , na Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo , do Tribunal Central Administrativo Sul:



... IMOBILIÁRIA, S.A., com sinais nos autos, inconformada com a sentença do TAC de Lisboa, de 19 de Abril de 2012, que indeferiu os seus pedidos de suspensão de eficácia:

- Da deliberação da Câmara Municipal de Lisboa, de 4/03/2009, que aprovou o projecto de arquitectura da construção/ampliação do empreendimento turístico ... Hotel;
- do despacho do Vereador do Urbanismo e Planeamento, de 30/12/2009, que deferiu o respectivo pedido de licenciamento;
- do despacho da Sra. Arquitecta da mesma Câmara, de 5/05/2010, que procedeu à alteração do prazo da respectiva licença de 24 para 60 meses;

dela recorreu e, em sede de alegações, formulou as seguintes conclusões (sintetizadas):

« 1ª) (…) a sentença recorrida não fez correcta interpretação das disposições legais aplicáveis e consequente aplicação, assim como não pocedeu à correcta apreciação da pova produzida;
2ª) O que está em causa na presente providência é saber se a execução do projecto da Contra­Interessada, tal como aprovado pelas decisões camarárias suspendendas, põe ou não em causa a integridade da estrutura das fundações do Edifício da Recorrente, igualmente licenciadas por licença da mesma CML e construídas há mais de 40 anos, colocando, assim, em risco grave a segurança de pessoas e bens;
3ª) O objecto da presente providência cautelar é um pedido de suspensão de eficácia de um acto administrativo, que se encontra a produzir efeitos desde a sua emissão, nos termos em que foi emitido e independentemente de a Contra-Interessada estar ou não a executar a obra, ou de ter ou não suspendido a mesma;
4ª) Independentemente de a obra ter sido suspensa voluntariamente pela Contra-Interessada, esta poderá, obviamente, iniciá-la a qualquer momento, se e quando bem entender, assim como qualquer terceiro a quem o terreno, hoje da propriedade da Contra-Interessada venha, eventualmente, a ser transmitido;
5ª) Atendendo a que o risco resultante da execução do projecto da Contra-Interessada se centra ao nível da construção das fundações do respectivo edifício e que, por isso, o perigo decorrerá logo dos primeiros trabalhos de escavação, a ora Recorrente não podia senão ter recorrido a uma providência cautelar de suspensão da licença de molde a evitar ou impedir o início da obra;
6ª) Resulta claramente da Oposição do Requerido que a análise do documento nº1 junto com Oposição do Requerido e que é designado por "Definição de estrutura - implantação e perfis" (também junto pela Requerente como documento nº 12-A),

é suficiente para concluir que a solução adoptada para as fundações do prédio da Requerente, ora Recorrente, incluiu a existência de recalces àquelas monoliticamente ligados, que abrangem parte do subsolo, em cerca de 30 cm, do prédio que ora pertence à Contra-Interessada;
7ª) Da Oposição da Contra-Interessada resulta que esta admite que há, efectivamente, incompatibilidade entre o projecto aprovado pela CML e o projecto aprovado há mais de 40 anos atrás para o prédio da Requerente (cfr. artigos 63º e 65º a 70º da Oposição da Contra-Interessada);
8ª) Ao contrário do que resulta da sentença recorrida, são absolutamente irrelevantes, quer em sede da análise da validade quer em sede da análise dos efeitos dos actos suspendendos, alterações meramente hipotéticas aos actos em crise ou condições, igualmente hipotéticas, que aos mesmos venham eventualmente a ser apostas;
9ª) Estando sobejamente demonstrado e provado que o projecto da Recorrida, tal como aprovado pela CML, implica grave risco para a segurança estrutural do Edifício da Recorrente, (alíneas Y) e EEEE) da matéria de facto provada), não podia o tribunal recorrido ter concluído que "não se verifica risco para a segurança de pessoas e bens, pois não está demonstrado que se verifique fundado receio de a CI prosseguir as obras e dessa forma colocar em risco a segurança do Edifício da Requerente" (cfr. fls. 97 da sentença recorrida) - pelo que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento nos termos do art. 653º, nº 2 in fine do CPC, aplicável ex-vi do art. 1º do CPTA, devendo os factos constantes das referidas alíneas serem considerados povados nos termos do art. 712º, nº 2 do CPC;
10ª) Deveria também ter sido dado por provado que "Na reunião de Março de 2008 foi fornecida pelo Engº ... ao Engº ... cópia do "desenho dos perfis" que consubstancia o documento 12-A junto ao RI, o qual, só por si, permitia concluir que existiam fundações do ... invasivas do lote vizinho", devendo, assim, tal facto aditar-se à matéria de facto dada como provada, atento o depoimento do Engº ... ... , não tendo explicitado o tribunal recorrido as razões para não atender a tal depoimento – enfermando de igual modo de erro de julgamento nos termos já referidos na Conclusão 9ª;
11ª) Não podia ainda ter deixado de dar-se como provado que "A ocupação de parte do terreno da Contra-Interessada com os recalces das fundações do edifício da Requerente não poderia ter deixado de ser conhecida e aceite pelos então proprietários do imóvel à época”, devendo aditar-se a respectiva alínea, nesses mesmos termos, à matéria de facto provada, conforme resulta do depoimento das testemunhas ... e Engº ... (bem como as fotografias juntas aos autos em audiência de julgamento) – concretamente enfermando a sentença recorrida, também por esta razão, do vício nos temos referidos na Conclusão 9ª;
12ª) Ao não dar como provado o facto constante do ponto 6) da matéria dada como não provada, a sentença recorrida contradiz manifestamente os factos constantes das als. Y) e 000) da matéria de facto provada – e, também por essa via, enferma do vício referido na Conclusão 9ª, com as consequências daí decorrentes ;
13ª) Por congruência com a matéria dada como provada nas als. Y), 000) e EEEE), não pode deixar de considerar-se provado que "A eliminação dos recalces conduzirá, necessariamente, a um elevado risco de ruína do edifício do Requerente por falta de segurança de toda a estrutura da empena do edifício da Requerente", devendo aditar­se a respectiva alínea, nesses mesmos termos, à matéria de facto provada, nos termos do já citado art. 712º do CPC;
14ª) A sentença deveria ainda ter dado como provado, ainda que indiciariamente, que o espaço ocupado pela floreira integrada no Edifício da Recorrente, bem como o subsolo por baixo da mesma que a Contra-Interessada se propõe ocupar de acordo com a licença urbanística em causa nos autos, faz parte integrante do Edifício da Recorrente e é propriedade desta, conforme depoimentos das testemunhas da Recorrente, não contraditado por qualquer prova efectuada por parte da Contra-Interessada, neste ponto, enfermando igualmente de erro de julgamento (…);
15ª) Não podia a sentença recorrida ter deixado de considerar provado que "Até ao presente não foram ponderadas pela Contra-Interessada quaisquer alterações aos seus projectos", devendo aditar-se a respectiva alínea à matéria de facto provada, nesses precisos termos (cfr. fundamentação constante da Conclusão 9ª, aqui também aplicável);
16ª) No que concerne aos pressupostos de concessão da providência, incorreu também a sentença recorrida em erro de interpretação e aplicação dos requisitos vertidos no artigo 120º do CPTA, desde logo porque se verifica o requisito da alínea a) do preceito em causa (fumus boni iuris), o que dispensaria a análise do requisito do periculum in mora;
17ª) Desde logo devendo ter ficado provado que o projecto da Contra-interessada prevê a ocupação de uma parcela de terreno que está ocupada, à superfície, por uma floreira e cuja área no subsolo é pertença do Edifício da ora Recorente – como acima se refere – desde logo a licença suspendenda enferma do vício de violação de lei;
18ª) A licença suspendenda padece também manifestamente de erro quanto aos pressupostos de facto em que assentou por não ter sido devidamente representada, no projecto objecto de aprovação, a existência dos recalces no terreno onde irá ser executado o projecto pela Contra-interessada;
19ª) A licença de construção do Edifício da ora Recorrente previu expressamente a existência de uma estrutura monolítica de recalces por baixo das paredes do edifício ... , anteriormente existente no terreno da Contra-interessada e por esta demolido;
20ª) Tendo-se dado como provado na sentença recorrida que, para além de ter sido objecto de licenciamento pela CML, o Edifício da ora Recorrente foi, à época, objecto da necessária vistoria e de licença de utilização, não podia a sentença recorrida ter deixado de concluir que os recalces foram executados tal como previsto no projecto aprovado pela CML em 1969, em conformidade com o que dispõem o nº 2 do artigo 26º do Decreto-Lei nº 445/91, de 20 de Novembro, bem como o nº 2 do artigo 62.º do RJUE, tendo em conta igualmente o princípio da presunção de legalidade dos actos administrativos – ao não o fazer, violou a sentença recorrida estes normativos, enfermando, igualmente, de erro de julgamento como se referiu acima (cfr. Conclusão 9ª);
21ª) O acto administrativo de licenciamento de operações urbanísticas, apesar de eminentemente vinculado, inclui o exercício de poderes discricionários como bem resulta dos conceitos indeterminados constantes das alíneas a) a e) do n.º 2 do artigo 24.º do RJUE, não podendo, pois concluir-se que este acto não pode padecer de erro quanto aos pressupostos que o determinaram, contrariamente ao sustentado na decisão recorrida, que assim violou, por errada interpretação e aplicação, aqueles normativos;
22ª) Por isso a sentença recorrida deveria ter dado por verificado o requisito da alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, por ser evidente o erro quanto aos pressupostos de facto da licença suspendenda e o consequente vício de violação de lei, bem como pelo facto de a licença suspendenda ter autorizado a construção numa parcela de terreno que faz parte do Edifício da Recorrente e do prédio que é da propriedade desta;
23ª) Em qualquer caso, relativamente ao requisito do Fumus non malus previsto na 2ª parte da al. b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, o mesmo foi considerado provado pelo tribunal recorrido;
24º) Sobre tal requisito dir-se-á, no entanto, que é manifesto o erro de julgamento da sentença recorrida quanto à incompatibilidade entre o projecto aprovado pela licença suspendenda e a realidade de facto existente no terreno da Contra-interessada – e à consequente impossibilidade parcial de tal objecto – pois, como admitido por todos, a execução do primeio implica necessariamente a eliminação, ou


pelo menos a alteração da realidade existente naquele terreno, ou seja, a eliminação ou, pelo menos, alteração dos recalces;
25ª) A licença de construção ora impugnada (e a deliberação que aprovou o projecto de arquitectura) concedida à Contra-Interessada padece, consequentemente, de nulidade nos termos da al. c) do nº 2 do artigo 133º do CPA, tendo a sentença recorrida violado por errada interpretação e aplicação tal normativo;
26ª) Seria absolutamente desproporcional e ilegítimo pretender destruir, ou pôr em causa, os efeitos da licença concedida para a construção do ... , bem como a licença para a sua utilização, passados mais de 40 anos da sua construção, atentos os princípios gerais de certeza e segurança jurídicas;
27ª) Quer em sede cautelar quer em sede de acção principal, o tribunal tem que partir da presunção de legalidade da licença do Edifício da ora Recorrente,analisar a alegada impossibilidade jurídica com base nas licenças aprovadas e em vigor e não olhando a uma eventual nulidade da licença de construção do Edifício da ora Recorrente, alegada pela Contra-Interessada, e que não passa, mais uma vez de uma mera realidade virtual;
28ª) Acresce que, ainda que assim não se entendesse – no que não se concede e apenas em mera hipótese se pondera -, ao contrário do sustentado na sentença recorrida, verifica-se, inequivocamente, o requisito do periculum in mora, sendo manifesto que a sentença recorrida padece, nesta parte, de manifesto erro de interpretação e aplicação do nº 1 do artigo 120º do CPTA;
29ª) A Recorrente teme o início da obra pela Contra-interessada – ou por qualquer pessoa a quem esta venha eventualmente a transmitir a propriedade do imóvel – a qualquer momento porquanto a Contra-interessada é titular de uma licença de construção que lhe dá tal direito, podendo ser exercido em qualquer momento e quando entender;
30ª) Apesar de a Contra-interessada ter desviado a discussão, nos presentes autos, para a alegada existência de uma solução técnica para a remoção dos recalces,

tal é absolutamente irrelevante para a decisão do pedido cautelar formulado, pois (i) não foi apresentado nem submetido a aprovação da CML qualquer projecto para tal efeito pela Contra-interessada, (ii) nos presentes autos não é admissível condenar-se a Requerente da providência a qualquer acção ou omissão, nem tal foi, obviamente, pedido, (iii) nem teria de ser da Requerente, ora Recorrente, a responsabilidade pela execução e custos de uma tal obra;
31ª) O que releva nos presentes autos é que a licença suspendenda está sujeita a prazo de caducidade, nos termos do artigo 71º do decreto-Lei nº 555/99, e a própria Contra-interessada, ora Recorrida, vem alegando junto da Recorente a urgência na execução do seu projecto pelo prejuízo que tal atraso alegadamente lhe acarreta;
32ª) O que releva ainda o facto de, obviamente, não ser suficiente para acautelar os interesses da Requerente, ora recorrente, uma suposta suspensão voluntária da obra pela Contra-interessada, feita constar do livro de oba, que, a qualquer momento, pode ser levantada, sendo certo que, a Conta-interessada nunca se comprometeu por qualquer modo, através dos seus representantes legais ou através dos seus mandatários, a não executar a obra aprovada pela licença suspendenda, pelo que a sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do requisito do periculum in mora vertido na 1ª parte da al. b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA;
33ª) Finalmente, quanto ao requisito de ponderação de interesses (nº2 do artigo 120º do CPTA), da matéria provada nos autos resulta, sem qualquer margem para dúvidas, que os prejuízos que a Contra-interessada alega não decorrem da suspensão de efeitos da licença requerida nos autos mas sim do erro, censurável ou não, totalmente imputável à Contra-Interessada em que incorreu o seu projectista ao elaborar o projecto de ampliação do ... , sem ter em conta a estrutura das fundações do ... , pois não tivesse incorrido em tal erro de avaliação ou apreciação técnica quanto à existência dos recalces certamente o projecto da Contra-Interessada teria sido elaborado de forma diferente e, hoje, não estariam as partes envolvidas no litígio;
34ª) Sendo certo que, atento o tempo entretanto decorrido desde que o projectista se apercebeu da existência dos recalces, em 2009, os dois anos que decorrerem a Contra-interessada, através daquele, se dirigir à ora Recorrente, eram mais do que suficientes para tentar resolver o problema, evitando, assim, o atraso da obra e os custos que ora veio alegar;
35ª) Em qualquer caso, a existirem os alegados prejuízos da Contra­ Interessada, jamais estes poderiam ser considerados superiores aos interesses ou direitos que a Requerente, ora Recorrente, pretende acautelar com a presente providência, porquanto, obviamente a segurança das pessoas e bens que se encontram no ... são valores imateriais que se sobrepõem a qualquer lucro cessante que a Contra-Interessada possa querer invocar, pelo que se verifica o requisito (negativo) previsto no nº 2 do artigo 120º do CPTA;
36ª) Pelo que a questão que deveria a sentença recorrida ter decidido, e não o fez, é muito simples: ou se suspende os efeitos da licença de construção concedida à Contra-Interessada, assegurando assim que nenhum risco se corre quanto à segurança estrutural do ... enquanto se discute a validade da licença concedida à ... em sede de acção principal, ou não concede e a contra-Interessada permanecerá habilitada a iniciar, a qualquer momento, a execução de uma pretensão urbanística que, tal como foi aprovada pela licença suspendenda, determinará o corte das armaduras das fundações do Edifício da Requerente, ora Recorrente, as quais fazem parte integrante dos recalces pondo-se, assim, inevitavelmente em risco a segurança de pessoas e bens».

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A Recorrida Câmara Municipal de Lisboa (doravante CML) contra-alegou pugnando pela manutenção do decidido.

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A Contra-Interessada ... também apresentou contra-alegações, defendendo em síntese que:
- A Recorrente veio, em sede de recurso, “esgrimir quatro novos fundamentos, que até ao presente não invocou – e que, por essa razão, jamais poderiam ser apreciados ou mesmo equacionados pelo Tribunal a quo” (aquisição por usucapião do espaço ocupado pela floreira a favor da Requerente; presunção de legalidade das licenças de construção e de utilização, de que derivaria a prova de vários factos; discricionariedade técnica na apreciação da realidade existente no âmbito da apreciação do projecto de arquitectura da Contra-interessada; nova argumentação quanto ao suposto perigo eminente de execução do projecto);
- Todos os “vícios e erros de julgamento” assacados à sentença recorrida improcedem, in toto, devendo, consequentemente, manter-se a mesma nos exactos termos em que foi proferida
Para a hipótese de a providência requerida vir a ser julgada procedente, a Contra-Interessada, ao abrigo do art. 684º-A do CPC, aplicável por força do disposto nos arts 1º e 140º do CPTA, veio ampliar o objecto do recurso, invocando a nulidade da decisão judicial por omissão de pronúncia sobre a excepção dilatória de ineptidão do requerimento inicial (por contradição entre o pedido e a causa de pedir), formulando as conclusões seguintes:

“D. Subsidiariamente e sem conceder: ampliação do objecto do recuso


XVII. A Recorente sustentou que os actos suspendendo são nulos por impossibilidade do respectivo objecto e peticionou a suspensão da respectiva eficácia.
XXVIII. Se um acto não pode produzir efeitos, é óbvio que não há qualquer necessidade de requerer a respectiva suspensão de eficácia.
XIX. Pelo contrário, se se admite utilidade (antes de mais, processual) no requerimento de suspensão de eficácia de tais actos, então estar-se-á a reconhecer que os mesmos são aptos a produzir efeitos e que não poderão ser julgados nulos por impossibilidade legal do respectivo objecto.
XX. Verifica-se assim uma “contradição lógica” entre o pedido por contradição entre o pedido (suspensão de eficácia) e a causa de pedir (nulidade dos actos suspendendo por impossibilidade legal dos respectivos objectos).
XXI. Esta cicunstância conduz à ineptidão do requerimento inicial e à absolvição da instância, nos termos do disposto no artigo 493º, nº 2 do CC, aplicável ex vi do disposto no artigo 1º do CPTA.
XXII. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre a excepção invocada pela Contra-interessada, razão pela qual a decisão recorrida é, nesse aspecto, nula por omissão de pronúncia, devendo ser julgada procedente a referida excepção dilatória pelo douto tribunal ad quem, no âmbito dos seus poderes de cognição, enquanto instância de apelação e, consequentemente, dar-se por verificado o fumus malus iuris da pretensão cautelar em causa nos autos.
E. Subsidiariamente e sem conceder: da prestação de garantia bancária pela Recorrente
XXIII. Subsidiariamente, caso se entenda conceder provimento à pretensão cautelar em juízo, deverá este douto Tribunal ad quem, ao abrigo do citado artigo 120º, nº 4, do CPTA, impor à Recorente a prestação de garantia por uma das formas previstas na lei tributária, à ordem do Tribunal, e no valor de 6.940,110 (seis milhões novecentos e quarenta mil e cento e dez euros)”.


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A Exma. Magistrada do Ministério Público junto deste TCAS emitiu douto parecer, sustentando, em síntese, que:
- A sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que defira a providência requerida, por violar a al. b) do nº 1 do art. 120º do CPTA, por a execução do projecto de ampliação do ... colocar “fundados receios de risco de segurança do edifício da recorrente e para as pessoas e bens e, consequentemente, do fundado receio de uma situação de facto consumado e de produção de prejuízos de difícil ou mesmo impossível reparação”, sendo ainda que, na ponderação de interesses a que se reporta o nº 2 do mesmo art. 120º, a “segurança do edifício da recorrente e das pessoas e bens” se sobrepõe aos interesses meramente económicos da Contra-interessada;
- deve ser julgada improcedente a ampliação do recurso da Contra-interessada.

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Sem vistos foi o processo submetido à conferência para julgamento.

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A – DO ALEGADO ERRO DE JULGAMENTO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO
Neste contexto importa prima facie destacar a factualidade dada como assente na sentença recorrida, que passamos a transcrever :



«A)- O edifício situado na Av. Fontes Pereira de Melo, n.ºs 14 e 14-A e Largo de Andaluz, em Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.º 1492/19930318, com a área total de 697,96 m2, composto de 17 pisos está inscrito a favor da ... -Imobiliária, SA.- cfr. fls. 52-53 dos autos;
B)- O edifício referido em A), comummente designado como ... (anteriormente designado por Edifício Cimianto), confina com o lote de terreno a que se refere a licença de construção/ampliação do empreendimento turístico da ... , objecto do despacho suspendendo de 30.12.2009 – cfr. acordo das partes e fls. 52-53 e 395-396 dos autos;
C)- A construção do edifício referido em A) ficou terminada durante o ano de 1969;
D)- O edifício referido em A) tem vindo a ser utilizado para serviços/escritórios desde início da década de 70 – cfr. fls. 68-85 dos autos;
E)- A construção do edifício referido em A) foi objecto de licenciamento pela Entidade Requerida, que emitiu a Licença de Obras de Construção, n.º 410, com o prazo de 12 meses a findar em 12.11.1967 – cfr. fls. 54-55 dos autos;
F)- Em 19 de Setembro de 1991 foi lavrado o Auto de Vistoria para Utilização (Ocupação), que aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual consta, designadamente, que as obras ficaram concluídas em (…) Setembro de 1991 – cfr. fls. 56-59 dos autos;
G)- Com data de 28 de Setembro de 1992 foi emitida pela Câmara Municipal de Lisboa (CML) a licença de utilização n.º 246, que aqui se dá por integralmente reproduzida da qual consta designadamente, que o edifício possui 18 (dezoito pavimentos) – cfr. fls. 60-61 dos autos;
H)- O edifício da Requerente foi licenciado com base num projecto que previa recalces das fundações das construções limítrofes, designadamente, nos termos constantes da Memória Descritiva do edifício, Anexo 2, com o seguinte título: RECALCE DAS FUNDAÇÕES DAS CONSTRUÇÕES LIMÍTROFES DO TALHÃO DA CIMIANTO E CONSTRUÇÃO DUM MURO DE SUPORTE PARA CONTENÇÃO DOS TERRENOS DO LARGO DO ANDALUZ, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
¯ (…) Este imóvel terá 17 pisos sendo dois deles estabelecidos na cave abaixo do Largo do Andaluz, 7 desde aquele Largo até à Avenida Fontes Pereira de Melo e 8 acima desta Avenida.
(…) Ao longo da empena confinante com o prédio da ... foram previstos dois perfis-tipo de recalce; um destinado a recalçar e rebaixar as fundações do prédio, outro destinado a recalcar e rebaixar os muros de suporte dos jardins do mesmo prédio.
Qualquer deles funciona como muro-cortina de betão armado e foram dimensionados para suportar os impulsos dos aterros contidos sem qualquer efeito estabilizante das cargas recalcadas.
As sapatas dos muros de suporte e recalce ficam monoliticamente ligadas à rede de lintéis da fundação do edifício (…) – cfr. fls. 93-100 dos autos;
I)- Os recalces das fundações referidos na alínea antecedente encontram-se previstos nas peças desenhadas do projecto que constam de fls. 373 a 376 do processo n.º 3040/65 (PA) – cfr. fls. 101-104 dos autos e fls. 373 a 376 do PA);
J)- O projecto foi da responsabilidade da empresa ENARCO, prestigiada empresa de engenharia à época tendo como seu responsável o Senhor engenheiro Lobo Fialho – cfr. fls. 85 do processo administrativo n.º 30140/65 (PA);
K)- O edifício constituiu, à época, uma construção muito complexa, por implicar uma grande escavação para vencer o desnível entre a Av. Fontes Pereira de Melo e o Largo Andaluz, bem como pela altura correspondente a duas caves abaixo da cota deste largo, e com um total de 17 andares;
L)- A solução técnica preconizada foi a construção de uma estrutura de contenção e recalçamento ao longo das empenas confinantes entre o edifício então designado Cimianto e o edifício ... comum aos dois edifícios, com menores espessuras dedicadas ao edifício novo (Edifício Cimianto) do que as que ficaram ¯ associadas ao edifício existente (Edifício ... );

M)- O problema da exposição do terreno sob o edifício ... , que impunha a necessidade de realização de uma estrutura de contenção de terras; e a questão da descompressão do terreno sob as sapatas da empena do edifício ... , que impunha a necessidade de recalçar essa empena, podiam ter sido resolvidas separadamente com a construção de um recalce da empena da frente do edifício ... separado da estrutura de contenção e separado da estrutura portanto do próprio ... ;
N)- O prédio situado na Av. Fontes Pereira de Melo, n.ºs 12 a 14-A e Largo de Andaluz, n.ºs 5 a 11, em Lisboa, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo matricial n.º 667, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.º 742/19880609, com a área total de 813,74m2, está inscrito a favor de ... – Investimentos turísticos, SA - cfr. fls. 395-396 dos autos;
O)- Em 25 de Fevereiro de 2008 o Senhor Eng.º Eduardo Camacho ... entregou na CML um pedido de: - Consulta e reprodução simples de documentos referente a AVENIDA FONTES PEREIRA DE MELO 14-14C – cfr. fls. 400 dos autos;
P)- O objectivo prosseguido com o pedido referido em O) era apurar o nível de fundação do ... , para verificar se ficava abaixo ou acima do nível de escavação pretendido para o ... Lisboa, para estabelecer a necessidade de realizar ou não uma contenção no limite Norte do Sana Lisboa, no âmbito do projecto de escavação e contenção, então em elaboração;
Q)- Tal consulta não chegou a realizar-se, porque, de acordo com a informação então transmitida telefonicamente pelos serviços camarários, o processo estava requisitado ao arquivo da CML e indisponível para a dita consulta;
R)- Em 5 de Março de 2008, o Sr. Eng.º ... enviou um e-mail à Contra- interessada, dirigido ao Sr. Eng.º ... , dando nota da indisponibilidade do referido processo para consulta na CML e solicitando autorização para contactar directamente a SEMAPA para lhes pedir o projecto do ... – cfr. fls. 402 dos autos;

S)- A CI em 5 de Março de 2008 informou o Sr. Eng.º ... que poderá contactar a SEMAPA directamente – cfr. fls. 401 dos autos;
T)- No dia 7 de Março de 2008, o Sr. Eng.º ... procedeu a uma consulta do processo do ... nas instalações da Requerente, onde esteve presente o Sr. Eng.º ... ... , que teve como propósito procurar informação que permitisse, em fase inicial de projecto apurar o nível de fundação do ... , para verificar se ficava abaixo ou acima do nível de escavação pretendido para o ... Lisboa, para estabelecer a necessidade de realizar ou não uma contenção no limite Norte do ... Lisboa, no âmbito do projecto de escavação e contenção, então em elaboração;
U)- No decorrer da consulta referida em T) foi facultada ao Sr. Eng.º ... a consulta de diversos dossiers, contendo o projecto de arquitectura e diversos projectos de engenharia do edifício da Requerente;
V)- O Sr. Eng.º ... procedeu à consulta de peças desenhadas do projecto do edifício da Requerente, centrando-se na procura dos dados relevantes para a resposta à questão referida em P) e T), não procurando averiguar se as fundações do ... invadiam o prédio propriedade da Contra-Interessada, tirou algumas notas dos desenhos consultados, no que se referia aos aspectos mencionados em P) e T);
W)- O pedido de licenciamento para ampliação do ... para o lote de terreno onde se encontrava anteriormente implantado o edifício-... (processo n.º 718/EDI/2008), que a Contra-Interessada ... apresentou junto do Réu, assenta num projecto de arquitectura, que contém, entre outras, as peças desenhadas que constam de fls. 106-115 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidas;
X)- Nas peças desenhadas e nas memórias descritivas do processo de licenciamento da Contra-Interessada entregues na CML não estão representados os recalces referidos em H) e I);
Y)- A execução do projecto de ampliação do ... Lisboa, aprovado pelos actos suspendendos, implica a destruição e remoção de fundações do ... , existentes no lote propriedade da Contra-Interessada, com corte de percentagem não concretamente apurada

da espessura da parede de recalcamento existente, incluindo a remoção integral da armadura principal desse muro e da respectiva ligação à fundação;
Z)- Foi projectado um volume construído para o subsolo que se encontra parcialmente ocupado por estruturas invasivas pertencentes ao edifício vizinho, pressupondo o carácter desocupado do mesmo;
AA)- É possível demolir as fundações do ... existentes no lote propriedade da Contra-Interessada, proceder à respectiva remoção e garantir a integridade estrutural do ... , com a prévia execução de um reforço estrutural da parede, do ... , confinante com o prédio da Contra- interessada, a definir em projecto estrutural – cfr. fls. 398-399 dos autos;
BB)- Em Fevereiro de 2008, ... Gabinete de Projectos, Engenharia e Serviços elaborou o instrumento de fls. 478-481 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
- (…) Plano de Reconhecimento Geotécnico
Pretende-se a elaboração do reconhecimento geotécnico dum terreno situado entre a Av. Fontes Pereira de Melo e a Rua Actor Tasso/Largo de Andaluz, em Lisboa, com vista à ampliação para Nordeste do ... Park Hotel, de acordo com as condições abaixo indicadas.
A área em estudo tem boa acessibilidade para os equipamentos de prospecção mas existe um edifício no local e parte do logradouro está rebaixado em relação ao nível da rua, devendo o adjudicatário inteirar-se das condicionantes locais actuais.
1 PLANO DE TRABALHOS
Pretende-se caracterizar geotecnicamente a área em termos de aptidão para fundação de estruturas e avaliar as condições de escavação e contenção periférica dos terrenos.
Face às características dos solos a atravessar, prevê-se que a prospecção seja efectuada por furação à rotação em solo e eventualmente em rocha vulcânica na parte inferior.
O programa de reconhecimento geotécnico envolve a realização de 4 sondagens mecânicas com localização de acordo com o esquema anexo. A localização indicada poderá ser ajustada no caso de alguma sondagem coincidir com área construída, ou de difícil acessibilidade, ou ainda se interferir com eventuais infra-estruturas existentes.
Em todos os furos deverão ser realizados ensaios SPT a cada l,5m ou sempre que ocorra mudança acentuada de formação geotécnica.
Prevê-se a execução de 8 pisos em cave relativamente à Av. Fontes Pereira de Melo, a que corresponde 5 pisos abaixo da cota da Rua Actor Tasso/Largo de Andaluz, ficando o piso da oitava cave à cota 33,95. Nestas condições as sondagens deverão atingir no mínimo a cota 26,00, não devendo contudo ser interrompidas sem se atingir valores de SPT acima de 60 em pelo menos três medições sucessivas.
Deverá ser referenciado o nível de água encontrado em cada sondagem e ser feita a determinação do nível de água estabilizado nas quatro sondagens por meio de piézómetros.
Deverá ainda ser determinado, através de ensaios, o coeficiente de permeabilidade das formações ocorrentes.
Para cada sondagem deverá ser estabelecido o respectivo corte que referencie as sequências litológica e estratigráficas atravessadas, os resultados (N) dos ensaios SPT e a posição dos níveis de água (máximos e mínimos no caso de serem variáveis). Deverá ser indicada a cota da boca de cada sondagem.
Deverão ainda ser realizados 2 poços de prospecção, de acordo com a localização indicada no desenho, com vista a caracterizar as condições de fundação das construções adjacentes existentes, designadamente do edifício a Nordeste e do muro do lado da Av. Fontes Pereira de Melo, bem como uma sondagem junto à base desse muro com o objectivo de conhecer a sua constituição (material e espessura).
Com base na informação recolhida, deverá ser elaborado um relatório de reconhecimento geotécnico tendo em conta os aspectos relevantes para a realização de fundações de estruturas (edifício com 21 pisos dos quais 8 em cave) e para a realização de trabalhos de escavação para implantação de caves até à cota 33,95. Em particular deverão ser caracterizados os parâmetros geomecânicos das formações atravessadas, como sejam o peso volúmico, o ângulo de atrito interno, a coesão e o módulo de deformabilidade.


Deverão também ser feitas recomendações sobre o tipo de fundações e contenções a adoptar e quantificadas as tensões de contacto admissíveis nas diferentes camadas, bem como sobre a metodologia de desmonte.
Para além da apresentação individualizada dos resultados das sondagens no local, o relatório deverá apresentar perfis interpretativos das condições geológicas e geotécnicas do local. Deverão ser apresentados 4 perfis interligando os pontos de sondagem.
3 APRESENTAÇÃO DA PROPOSTA
A proposta deverá apresentar o preço global para a realização do reconhecimento geotécnico indicado acima, acompanhado da discriminação dos preços unitários considerados com vista a um eventual ajuste do plano antes da adjudicação.
A proposta deverá indicar o prazo de execução dos trabalhos. De modo a acelerar a transmissão da informação, deverão ser consideradas duas fases:
a) Transmissão da informação das sondagens de campo;
b) Preparação do relatório final. (…) – cfr. fls. 479-481 dos autos;
CC)- O pedido de licenciamento do projecto referido em W) foi apresentado pela CI à ER em 25 de Junho de 2008 – cfr. fls. 41 dos autos;
DD)- Em 5 de Agosto de 2008, o TURISMO DE PORTUGAL, I.P., emitiu parecer favorável à pretensão, nos termos da Informação n.º TP/DQO/DEA/2008.I.9061, datada de 30 de Julho de 2008 – cfr. fls. 410-414 dos autos;
EE)- A Contra-Interessada, com vista ao desenvolvimento do projecto de Escavação e Contenção Periférica e também de Fundações e Estrutura, mandou realizar quatro sondagens para caracterização geotécnica do terreno no lote de ampliação do ... Lisboa, tendo sido elaborado o respectivo Estudo Geológico Geotécnico, datado de Outubro de 2008 e a correspondente peça desenhada, datada de 20 de Outubro de 2008, que aqui se dão por integralmente reproduzidos – cfr. fls. 415-466 dos autos;
FF)- Em Novembro de 2008, o relatório referido na alínea antecedente foi complementado com uma Adenda, datada de Novembro de 2008 estando as respectivas peças
desenhadas datadas de 19 de Novembro de 2008, que aqui se dão por integralmente reproduzidas e que contém informação sobre os dois poços de inspecção de fundações realizados, tendo em vista a caracterização dos muros de suporte adjacentes ao terreno a construir e de que se extrai o seguinte:
- (…) Por decisão da ... , Investimentos Turísticos, S.A., foi a ... , ... E ... , SA, incumbida de efectuar dois poços de inspecção de fundação nos terrenos onde se pretende proceder à ampliação do ... Hotel, na Avenida Fontes Pereira de Melo, n.º 12.
Esta memória consubstancia com detalhe o conjunto de trabalhos realizados e a metodologia que presidiu à sua execução, apresentando de modo sistematizado os resultados obtidos.
Como apoio à realização deste trabalho foi generosamente facultada pelo cliente planta de localização, à escala 1/200, que serviu de base à implantação dos trabalhos no terreno.
2. TRABALHOS REALIZADOS
Tendo em vista a caracterização dos muros de suporte adjacentes ao terreno a construir, e conforme indicações do cliente, foram realizados dois poços de inspecção de fundações.
(…)
2.1 Poços de Inspecção de Fundações
Dadas as dificuldades de acessibilidade ao local de ampliação do ... , os dois poços de inspecção de fundações foram realizados com recurso a meios manuais.
O principal objectivo foi indagar acerca da profundidade, geometria e constituição das ... de um muro existente.
Foi possível determinar, até às profundidades investigadas, a sua constituição, que a nível de assento do muro fazem parte pedra calcária ¯ tosca, envolta em caliça, que teria como principal finalidade fazer a ligação entre os vários fragmentos de calcário. O muro é constituído ainda por pedra calcária, moldada, com extremos desencontrados para permitir o seu travamento e garantir assim a sua estabilidade. Conforme foi reconhecido nos trabalhos de prospecção geotécnica, toda aquela área foi aterrada, sendo a constituição dos aterros heterogénea (areias-silto-argilosas), por vezes com pequenos fragmentos pedregosos dispersos.

Em anexo podem-se consultar esquemas representativos dos dois poços de inspecção realizados, a saber, P1 e P2, assim como a sua localização dentro da área alvo de estudo. (…) – cfr. fls. 467- 477 dos autos;
GG)- Com data de 18 de Fevereiro de 2009 foi subscrita pelo Senhor vereador da Câmara Municipal de Lisboa, a Proposta n.º 171/2009, referente à Aprovação de obras de construção de um edifício situado na Avenida Fontes Pereira de Melo, n.º 8-12 para ampliação de uma unidade hoteleira, que aqui se dá por integralmente reproduzida e de que se extrai o seguinte:
- (…) ... - Investimentos Turísticos, S.A, na qualidade de promitente compradora, submeteu, em 25 de Junho de 2008, à apreciação da Câmara Municipal de Lisboa, um pedido de licenciamento de obras de alteração, para ampliação de uma unidade hoteleira existente, no edifício sito na Avenida Fontes Pereira de Melo, n.º 8-12, pertencente à freguesia do Coração de Jesus, que constituiu o Processo n.º 7I8/EDI/2008;
2. A proposta pretende ampliar um estabelecimento hoteleiro existente (... Hotel) através da ocupação do lote adjacente, onde actualmente existe um edifício com um piso para a Avenida Fontes Pereira de Melo e cinco pisos para o Largo do Andaluz;
3. Com a ampliação em causa, a superfície de pavimento total do hotel atingirá os 30941 m2 aumentando o número de unidades de alojamento, de lugares de estacionamento e a oferta de serviços;
4. O projecto propõe ligar o edifíco existente mantendo a mesma organização funcional, prolongando racionalmente o estabelecimento;
5. De acordo com a Planta de Classificação do Espaço Urbano do Plano Director Municipal de Lisboa (PDM), o local insere-se era Área Consolidada de Edifícios de Utilização Colectiva Terciária, e dado este enquadramento qualquer operação urbanística nesta zona terá de cumprir o aplicável nos artigos 62.º e 63.º do Regulamento do PDM (RPDM);
6. O Decreto-Lei n.º 316/2007, de 19 de Setembro que alterou Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro (Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial - RJIGT), veio introduzir uma alteração significativa das normas aplicáveis, nomeadamente o n.º 2 do art.º
85°, que dispõe o seguinte que caso tenha decorrido o prazo de cinco anos sobre a data da entrada em vigor do Plano Director Municipal, sem que tenha sido aprovado o plano de urbanização ou o plano de pormenor, e que estejam estabelecidos no PDM, os índices de referência para os usos e cérceas e ainda os indicadores relativos à definição da rede viária e do estacionamento, são aplicáveis às operações urbanísticas a realizar em zona urbana consolidada, os índices, parâmetros e indicadores de referência para elaboração de plano de urbanização ou plano de pormenor;
7. No presente caso, não existindo plano de pormenor ou de urbanização para a área, verificam-se estas condições, devendo aplicar-se o art.º 62.º do RPDM, que estabelece que o uso habitacional deverá corresponder a um mínimo de 20% e o uso terciário e industrial compatível deverá observar o máximo de 80%, que deverá ser cumprido o disposto no capítulo III referente a rede viária, estacionamento e garagens (artigos 105° a 117° do RPDM) e que a cércea máxima admitida é de 30m, salvo em edifícios pontuais cuja cércea deverá ser proposta e fundamentada no respectivo plano;
8. O projecto em apreciação cumpre os parâmetros definidos no RPDM, nomeadamente, em relação ao uso habitacional, uma vez que a actividade hoteleira é considerada nos termos do art. 7° de RPDM como uso habitacional, são observados os indicadores quanto à rede viária e estacionamento, tendo a pretensão merecido parecer favorável do Departamento de Segurança Rodoviária e Tráfego e que a cércea proposta para a ampliação, 35,5m, embora ultrapassando os 30m permitidos, deve ser enquadrada na excepção admitida no referido art. 62°, fundamentando-se na necessária transição volumétrica (…) edifícios adjacentes e na harmonização da frente edificada no quarteirão em que todos os edifícios têm cérceas superiores a 30 m;
9. No âmbito da apreciação do presente pedido foram consultadas várias entidades externas ao Município, entre as quais:
• O Turismo de Portugal, IP, que emitiu parecer favorável (fls. 432 a 437)
• O Departamento de Segurança Rodoviária e Tráfego, que emitiu parecer favorável (fls. 430);
• O Regimento de Sapadores Bombeiros (RSB), que emitiu parecer favorável, com os condicionamentos propostos na Ficha de Segurança (fls. 427);
10. Do teor e conteúdo das informações técnicas e respectivos despachos exarados sobre as mesmas, junto ao presente processo a fls. 438 a 440, resulta que o projecto de arquitectura reúne condições para ser aprovado, condicionado nos termos mencionados na respectiva folha de controlo, a fls. 441;
(…) propor ao Plenário da Câmara Municipal de Lisboa, o seguinte:
1. A aprovação do projecto de arquitectura, nos termos do disposto no artigo 20.º do RJUE;
2. A notificação à Requerente da Deliberação que sobre a presente proposta venha a recair, de acordo com o disposto no artigo 121.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação. (…) – cfr. fls. 41-43 dos autos;
HH)- O projecto de arquitectura das obras de construção para ampliação de um estabelecimento hoteleiro, no prédio sito na Avenida Fontes Pereira de Melo, n.º 8-12, freguesia de Coração de Jesus, que constitui o Proc.º n.º 718/EDI/2008, nos termos da proposta mencionada na alínea antecedente, foi aprovado por deliberação da Câmara de 4.03.2009 – cfr. fls. 39-40 dos autos;
II)- Com data de 11 de Março de 2009 a CML remeteu à CI o instrumento de fls. 46 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
¯ Assunto: Pedido de Ampliação - aprovação do projecto de arquitectura.
Processo n.º 718/EDI/2008
Local: Av Fontes Pereira de Melo, 8-12
Freguesia: Coração de Jesus
Informa-se V. EX. de que, nos termos do artigo 20.° do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, com a redacção dada pela Lei n.º 60/2007, de 4 de Setembro, foi o processo acima identificado APROVADO em Sessão de Câmara através da deliberação n.º 171/CM/2009, em 04-03-2009, de acordo com a informação de síntese e despachos, cujas fotocópias se anexam.


Conforme o disposto nos números 4 e 6 do mesmo artigo, deverá V. EX. solicitar a aprovação, em simultâneo, dos projectos da engenharia de especialidades identificados na informação acima citada, no prazo de 6 meses a contar do terceiro dia sobre a data de registo desta notificação, sob pena de suspensão do processo de Licenciamento pelo prazo máximo de 6 meses, findo o qual é declarada a caducidade do acto que aprovou o projecto de arquitectura, após audiência prévia do interessado.
Juntam-se em anexo os documentos do processo acima referido, constantes as fls 302, 427, 430, 432 a 441. (…) – cfr. fls. 46 e 483 dos autos;
JJ)- Em 17 de Abril de 2009, a Contra-Interessada apresentou, junto da CML, o Plano de Demolição solicitado pela DEPLE – cfr. fls. 484 dos autos;
KK)- O projecto de escavações/contenção/fundações foi subscrito e concluído em Maio de 2009, pela ... — Gabinete de Projectos, Engenharia e Serviços, SA, concretamente pelo senhor Eng. Cansado de Carvalho, prevendo-se a realização de ancoragens provisórias – cfr. fls. 116-123 dos autos;
LL)- A memória descritiva do projecto de escavação e contenção periférica do projecto de licenciamento da ampliação do ... Park Hotel que a ... - INVESTIMENTOS TURÍSTICOS, S.A., pretende construir no lote correspondente aos n.°s 5 a 11 do Largo de Andaluz e Av. Fontes Pereira de Melo n.ºs 8-12 em Lisboa, consta do instrumento de fls. 116-123 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
- (…) Refere-se a presente memória ao projecto de escavação e contenção periférica da ampliação do ... Park Hotel que ... - INVESTIMENTOS TURÍSTICOS, S.A., pretende construir no lote correspondente aos n.°s 5 a 11 do Largo de Andaluz e Av. Fontes Pereira de Melo n.ºs 12/12A em Lisboa.
O terreno do lote, actualmente ocupado por um edifício a demolir, abrange uma área de cerca de 830 m2 e é delimitado a Sul pelo hotel existente que irá ser ampliado, a Poente pela



Avenida Fontes Pereira de Melo, a Norte por um edifício vizinho e a Nascente pelo Largo de Andaluz.
O desnível de cerca de 15m, entre a Av. Fontes Pereira de Melo (≈63,5m) e o Largo de Andaluz (≈48,5m) é vencido actualmente por dois muros de suporte de terras, em socalco, o primeiro encostado à Av. Fontes Pereira de Melo, com uma altura aproximada de 7,5m e o segundo, com uma altura de cerca de 7,0m.
Dada a cota a atingir pela cave mais profunda, 36,80 no lado da Av F.P.Melo (Lado Poente) e 35,40 no lado do Largo de Andaluz (Lado Nascente), as alturas de escavação a realizar em relação à situação actual são de cerca de 19m e cerca de 13m, respectivamente.
No lado Sul, a última cave da ampliação, cujos pisos coincidem altimetricamente com os do hotel existente, situa-se um piso acima deste último, não sendo necessário proceder a qualquer obra de contenção. Neste caso, face às elevadas cargas da nova edificação, optou-se por uma solução de fundações por meio de estacas, o que permite evitar impulsos importantes sobre a contenção existente.
No lado Norte, a situação é inversa, situando-se a última cave do edifício existente (... ) cerca de 4,5m acima do fundo de escavação. Esta situação exige a adopção de uma solução de escavação/contenção que tenha em conta não só o desnível final como também o elevado valor das cargas transmitidas pelas fundações do edifício existente.
Refere-se finalmente a existência de uma galeria do Metropolitano de Lisboa, sob a Av. Fontes Pereira de Melo, estando o seu eixo situado a cerca de 15m da contenção do Lado Poente. (…)
2. SOLUÇÃO ESTRUTURAL
Dados os condicionamentos existentes no local, a contenção e as características geotécnicas dos terrenos, as soluções adoptadas para os três paramentos (o lado Sul não exige contenção), embora conceptualmente semelhantes, apresentam diferentes graus de complexidade na sua execução.
Descrevem-se de seguida as três soluções adoptadas:
(…)
c) Contenção com cortina de estacas de 0,60 m, afastadas de 1,20m, no lado Norte. Será aplicado um único nível de ancoragens, situado a uma cota inferior às sapatas do edifício existente. A profundidade a que se encontram as bases dessas sapatas deverá ser confirmada em obra. Num pequeno troço, será executada uma contenção do tipo Berlim definitivo, em virtude dos condicionamentos de espaço disponível no projecto de arquitectura.
(…)
Na frente Norte, apesar da altura relativamente reduzida da parede de contenção, após a execução da cortina de estacas e da sua solidarização pela betonagem da viga de coroamento, segue-se a escavação, por troços alternados, com a subsequente aplicação das ancoragens.
No pequeno troço em que se utilizará uma contenção do tipo Berlim serão introduzidos perfis metálicos HEB, em furos verticais previamente executados ao eixo da parede. Os perfis deverão atingir uma cota correspondente a 3,0 m abaixo do nível da face inferior da sapata da contenção, sendo selados com uma argamassa fluida. Apesar da execução da parede Berlim ser feita por painéis, a mesma terá continuidade em ambas as direcções, pois serão deixadas armaduras de espera nos vários painéis para a ligação aos laterais e aos inferiores.
Nas várias ancoragens previstas, optou-se por garantir uma segurança adicional à conferida pelo coeficiente de majoração utilizado (igual a 1,2), ao adoptar um valor de pré-esforço nas ancoragens inferior à capacidade de carga das mesmas. Assim, caso se verifiquem deslocamentos excessivos da parede, as ancoragens podem ser novamente tensionadas.
As soluções que se preconizam poderão, em fase de obra, ser ajustadas em função das condições realmente encontradas.
(…)
4. CARACTERISTICAS GEOMECÂNICAS DOS TERRENOS
O projecto foi elaborado, tendo em conta os resultados da campanha de prospecção geotécnica, efectuada pela firma ... em Outubro de 2008. Os trabalhos incluíram quatro furos de sondagem com cerca de 25,5m defuração e atingido as cotas aproximadas de 23m (alçado este) e 31m (alçado oeste). Estes resultados foram complementados por uma campanha de dois poços de inspecção de fundação, realizada pela mesma firma em Maio de

2009, um junto ao muro de contenção da Av. Fontes Pereira de Melo e outro junto ao edifício vizinho situado a Norte. Teve-se ainda acesso ao relatório de prospecção realizado pela TecnasolFGE quando do projecto do Hotel existente, o que permitiu uma melhor compreensão dos tipos de terreno em questão.
Foram detectados os seguintes complexos geológicos:
• Recente - aterros
• Miocénico - areias fortemente siltosas, argilitos, silte argilo-margoso
• Neocretácico - complexo vulcano-sedimentar de Lisboa, basaltos
Anexa-se à presente Memória o relatório da ... onde são apresentadas de forma detalhada as características das formações atravessadas. Os parâmetros geotécnicos dos estratos considerados na análise são os apresentados na Nota Técnica em anexo. (…)Refere-se ainda que deverão realizar-se visitas de inspecção ao edifício adjacente com vista a registar o estado de conservação e eventuais patologias existentes previamente à execução dos trabalhos. Destas visitas serão elaborados os respectivos autos.
Lisboa, Maio de 2009 (…) – cfr. fls. 116-123 dos autos;
MM)- A NOTA TÉCNICA do projecto de escavação e contenção periférica do projecto de licenciamento da ampliação do ... Park Hotel que a ... - INVESTIMENTOS TURÍSTICOS, S.A., pretende construir no lote correspondente aos n.°s 5 a 11 do Largo de Andaluz e Av. Fontes Pereira de Melo n.ºs 8-12 em Lisboa, consta de fls. 124-159 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
¯(…) 6 CONTENÇÃO NORTE
A contenção Norte, que confina com o edifício vizinho da Semapa, comporta duas soluções de contenção: cortina de estacas 00,60m tipicamente afastadas de 1,20m e muro tipo Berlim com espessura de 0,30m, numa extensão aproximada de 6m. O recurso a esta segunda solução prendeu-se com condicionantes arquitectónicas.
Foram estimadas as cargas correspondentes ao edifício confinante e aplicadas sob a forma de forças distribuídas (figura 30) com os seguintes valores: A - 340kN/m2 (numa largura de 2m)
B-100kN/m2 (numa largura de 6m)
Foram criados modelos para cada uma das tipologias, no entanto a solução de tipo Berlim é mais flexível e portanto mais sensível em termos de deslocamentos, pelo que aqui apenas se apresentam os resultados para esta solução.
Lisboa, Maio de 2009 (…) – cfr. fls. 124-159 dos autos;
NN)- Dão-se por integralmente reproduzidos os instrumentos de fls. 160-162 dos autos;
OO)- As ancoragens aplicadas durante a fase de escavação, em parte situadas no subsolo do ... , serão removidas na sequência da construção dos pisos do hotel, que passam a providenciar, em definitivo, a função de suporte horizontal da contenção que, provisoriamente, é assegurada pelas ancoragens – cfr. fls. 162 dos autos;
PP)- O projecto de escavação e contenção periférica foi sujeito à apreciação do Metropolitano de Lisboa, que se manifestou favoravelmente em 6 de Abril de 2009 – cfr. fls. 269 dos autos;
QQ)- Com data de 22 de Julho de 2009 a ... – Investimentos Turísticos, SA, enviou à ... - Imobiliária, S.A., por carta registada/AR, o instrumento de fls. 85 a) dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
¯ (…) Assunto: Obras a realizar no prédio sito na Avenida Fontes Pereira de Melo, 12, e Largo do Andaluz, n.°s 5 a 11, em Lisboa
N/Ref.ª: ADMS/AS/1443
Exmos. Senhores,
1. Na qualidade de proprietários do prédio mencionado em assunto, confinante com o imóvel sito na Avenida Fontes Pereira de Melo, n.º 14 e 14A Largo Andaluz, em Lisboa, do qual V. Exas. são proprietários, vimos, por este meio, informar que iremos proceder a obras, que

incluem a escavação e contenção periférica, prevendo-se nesta fase a realização de ancoragens provisórias.
2. As ancoragens serão efectuadas sob o vosso edifício, a uma profundidade que não colidirá, nem com as fundações existentes, nem com as redes enterradas existentes.
3. A presente carta destina-se ao cumprimento de uma exigência dos regulamentos camarários de licenciamento de obras. (…) – cfr. fls. 85a) dos autos;
RR)- A realização de ¯ ancoragens provisórias sob o edifício da Requerente a executar na obra de ampliação do ... Lisboa, a que se refere a alínea antecedente, não suscitou preocupação especial, à Requerente, por ser técnica de construção habitual;
SS)- A Contra-Interessada iniciou, no final de Julho de 2009, a elaboração do projecto de execução de escavação e contenção periférica;
TT)- Em 8 de Setembro de 2009, a Contra-Interessada apresentou, junto da CML, os projectos de especialidades, respeitante à ampliação do ... Lisboa, incluindo o projecto de escavação e contenção periférica e o projecto de estabilidade – cfr. fls. 489-490 dos autos;
UU)- Por despacho de 30 de Dezembro de 2009 do Senhor Vereador Manuel Salgado foi deferido o pedido de edificação referido em II, devendo as obras observar as condições expressas na folha de controlo respectiva – cfr. fls. 47 dos autos;
VV)- Em 24 de Julho de 2009 o SR. Eng.º ... solicitou na CML a consulta do projecto relativo ao ... – cfr. fls. 487 dos autos;
WW)- Com data de 21 de Agosto de 2009, a CML informou o Senhor Eng.º ... que foi deferido o pedido de consulta referido na alínea antecedente, nos termos da Notificação n.º 16823/NOT/DGIAT/ GESTURBE/2009 – cfr. fls. 488 dos autos;
XX)- Em 14 Setembro de 2009, o projectista do ... , Sr. Eng.º ... procedeu à consulta do projecto camarário do ... , tendo solicitado a reprodução de peças desenhadas do mesmo;


YY)- O ... procedeu à análise da informação contida nos desenhos referidos na alínea antecedente e apercebeu-se da existência de elementos solidários com a estrutura do ... , prolongando as respectivas fundações e invadindo o prédio da Contra-Interessada;
ZZ)- O ... solicitou à Contra-Interessada, em 19 de Abril de 2010, a realização de uma Campanha Complementar de Reconhecimento Geotécnico, com três poços de sondagem junto à empena Norte, com vista a apurar melhor no local a situação de eventual recalce do edifício ... , nos termos constantes do e-mail, de fls. 502, que aqui se dá por integralmente reproduzido;
AAA)- A especificação para a realização dos trabalhos referidos na alínea antecedente, elaborada pelo ... , consta do instrumento de fls. 503-505 dos autos denominado ¯ Plano Complementar de Reconhecimento Geotécnico, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
¯ (…) 1- INTRODUÇÃO
Pretende-se complementar o Reconhecimento Geotécnico realizado em Outubro de 2008 com a execução de poços de inspecção no alinhamento que delimita a separação do lote onde se irá construir a ampliação do ... Park Hotel e aquele em que está implantado o edifício da Semapa.
A consulta que fizemos nos arquivos da CML, ao projecto do edifício da Semapa, só possível já após ter sido entregue o projecto de licenciamento da ampliação do Hotel, mostra que terá sido feito o recalce do muro de suporte do jardim do lado Nordeste, bem como da empena do edifício, no mesmo alinhamento. Este recalce, que atinge o nível da fundação do edifício da Semapa terá sido executado em betão armado com a sobreespessura necessária para simultaneamente dar apoio à estrutura da sua empena.
2- PLANO DE TRABALHOS
Pretende-se determinar com a precisão possível:
1. A cota a que se encontra a base do muro de alvenaria do jardim, no lado Nordeste, e em que se inicia o seu recalce em betão;

2. A espessura da parede de recalce e a detecção de armaduras verticais por meio de roço horizontal;
3. A cota a que se encontra a fundação da empena do edifício que irá ser demolido, e onde se inicia o seu recalce em betão;
4. A espessura da parede de recalce e a detecção de armaduras verticais por meio de roço horizontal.
Em alternativa à execução de roços, admite-se que a detecção de armaduras possa ser efectuada por meios electromagnéticos.
Para alcançar os dois primeiros objectivos propõe-se o aprofundamento do poço existente P1 em cerca de 1,5m a 2m.
Para alcançar os dois outros objectivos, será necessário executar um novo poço (P3), encostado à face interior da empena do edifício a demolir, com uma profundidade de cerca de 2m.
Em função dos resultados obtidos, poderá ser necessário executar um terceiro poço de inspecção, no mesmo alinhamento, entre os poços P1 e P3.
3- RELATÓRIO
Com base na informação recolhida deverá ser elaborado um relatório, contendo a informação pedida e incluindo cortes verticais dos poços, com a indicação dos níveis da boca e de todas as singularidades detectadas.
4- APRESENTAÇÃO DA PROPOSTA
A proposta deverá apresentar o preço global para a realização do reconhecimento recorrendo ao aprofundamento do poço P1 e à realização do poço P3. Deverá ainda incluir o custo atribuído à realização do poço P4, caso este venha a ser considerado necessário. (…) - cfr. fls. 504-505 dos autos;
BBB)- Antes da demolição do edifício ... a ... procedeu aos trabalhos de prospecção geotécnica complementar mencionados na alínea antecedente, tendo a ... elaborado o Relatório de Prospecção Geotécnica, recebido pelo ... via e-mail, com o título - ... - Ampliação do Sana Lisboa. POÇOS DE INSPECÇÃO DE FUNDAÇÕES - PROSPECÇÃO COMPLEMENTAR, Proc.

29510, Julho de 2010, datado de Julho de 2010, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
¯ (…) Por decisão da ... , Investimentos Turísticos, SA., foi a ... , ... E ... , SA, incumbida de efectuar três poços de inspecção de fundação, complementares ao estudo realizado em Novembro de 2008, nos terrenos onde se pretende proceder à ampliação do ... Hotel, na Avenida Fontes Pereira de Melo, nº 12.
Esta memória consubstancia com detalhe o conjunto de trabalhos realizados e a metodologia que presidiu à sua execução, apresentando de modo sistematizado os resultados obtidos.
Como apoio à realização deste trabalho foi generosamente facultada pelo cliente planta de localização, à escala 1/200, que serviu de base à implantação dos trabalhos no terreno.
2. TRABALHOS REALIZADOS
Tendo em vista a caracterização das estruturas de suporte, assim como determinar a respectiva profundidade de assento, foram realizados dois poços de inspecção de fundações. O terceiro poço, que diz respeito ao poço P1 realizado na primeira campanha de prospecção, foi aprofundado ainda conforme solicitação do cliente.
(…)
2.1 Poços de Inspecção de Fundações
Dadas as dificuldades de acessibilidade ao local de ampliação do ... , os três poços de inspecção de fundações foram realizados com recurso a meios manuais.
O principal objectivo foi indagar acerca da profundidade, geometria e constituição das ... de um muro existente e do próprio edifício.
À semelhança da primeira fase, foi possível determinar, até às profundidades investigadas, a sua constituição, que a nível de assento fazem parte pedra calcária ¯tosca, envolta em caliça, que teria como principal finalidade fazer a ligação entre os vários fragmentos de calcário. O muro é constituído ainda por pedra calcária, moldada, com extremos desencontrados para permitir o seu travamento e garantir assim a sua estabilidade. Conforme foi reconhecido nos trabalhos de prospecção geotécnica, toda aquela área foi aterrada, sendo a constituição dos

aterros heterogénea (areias-siltoargilosas), por vezes com pequenos fragmentos pedregosos dispersos.
Em anexo podem-se consultar esquemas representativos dos três poços de inspecção realizados, a saber, P1, P3 e P4, assim como a sua localização dentro do perímetro investigado. (…) – cfr. fls. 524-530 dos autos;
CCC) - Em 27 de Abril de 2010 a CI apresentou à ER o instrumento de fls. 51 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
¯ (…) vem requerer a Vossa Excelência se digne conceder um prazo inicial de 5 (cinco) anos para a licença de construção (ampliação) do empreendimento turístico ... HOTEL uma vez que o prazo inicialmente solicitado, i.e., de 24 meses é manifestamente insuficiente para a conclusão das referidas obras. Em consequência solicita o recalculo das taxas em função do período ora solicitado, i.e., o período inicial de cinco anos.
Ademais, solicita ainda a Vossa Excelência a emissão duma única licença que incorpore a demolição e edificação nessa mesma licença aliás, actualmente, espelhadas nos processos 718/EDI/2008 e 537/EDI/2009. (…) – cfr. fls. 51 dos autos;
DDD)– Sobre o pedido referido na alínea antecedente foi elaborada na CML a Informação N.º 11947/INF/DEPLE/GESTURBE/2010, datada de 4 de Maio de 2010, que aqui se dá por integralmente reproduzida e de que se extrai o seguinte:
¯ (…) Através da presente exposição, o requerente solicita a alteração do prazo da licença referente ao processo de licenciamento de obras n.º 718/ED112008, solicitando o aumento do prazo para 5 anos em vez dos 2 inicialmente previstos.
Considero não existir inconveniente no solicitado, no entanto, terão de ser recalculadas as taxas relativas ao prazo da licença, pelo que, deverá ser corrigido este factor no processo 718/EDI/2008. (…) - cfr. fls. 49 dos autos;
EEE)- Sobre a Informação referida na alínea antecedente a Senhora Arquitecta Catarina Abranches, em 5 de Maio de 2010, proferiu o seguinte despacho: - Concordo, relativamente ao processo 718/EDI/2008, proceda-se conforme proposto, devendo ser recalculadas as taxas em função da alteração do período de duração da licença, para 5 anos. (…) – cfr. fls. 49 dos autos;
FFF)- Com data de 28 de Maio de 2010 a CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA, Direcção Municipal de Gestão Urbanística, Departamento de Projectos Estratégicos - Divisão de Equipamentos Públicos e Licenciamentos Especiais emitiu o ALVARÁ DE OBRAS DE DEMOLICÃO N.º 70/ED/2010, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
¯Nos termos do Art.º 74° do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 60/2007, de 4 de Setembro, é emitido o Alvará de licenciamento de obras de Demolição n.º 70/ED/2010 a que se refere o processo municipal nº 537/EDI/2009, em nome de ... -Investimentos Turísticos Lda, portador(a) do n.º de contribuinte 504173251, que titula a aprovação das obras de demolição que incidem sobre o prédio sito em Av Fontes Pereira de Melo 12; 12A, Lg de Andaluz 5; 5A; 6; 7; 8; 9; 10; 11, da freguesia de Coração de Jesus, descrito na 9.ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.º 742, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.º 667 da freguesia de São Sebastião da Pedreira.
1. O PRESENTE ALVARÁ DE OBRAS É EMITIDO COM OS SEGUINTES CONDICIONAMNETOS, QUE DEVERÃO SER SATISFEITOS DURANTE A EXECUÇÃO DA OBRA DE DEMOLIÇÃO.
1.1 CONDIÇÕES GERAIS DE LICENÇA
- Cumprir o disposto nas condições l.ª, 2.ª, 3.ª DA LICENÇA
1.2 CONDIÇÕES ESPECIAIS DE LICENÇA
- Cumprir Despacho nº 53/75
- Cumprir no aplicável o Despacho 149/P/86
- Dar satisfação ao Art.º 135.º do Regulamento Geral de Edificações Urbanas
1.3 OUTRAS CONDIÇÕES DE LICENÇA
- A presente licença de demolição refere-se à demolição total do edifício


- Qualquer dano provocado nas edificações confinantes, proveniente dos trabalhos de demolição, é da responsabilidade do titular da licença de obras, que terá de proceder à sua reparação.
2. NOTAS
- A metodologia adoptada para os trabalhos de demolição é da responsabilidade do respectivo autor
- O presente alvará é emitido em simultâneo, com os alvarás dos processos de:
- Construção/Alteração n.º 718/EDI/2008
- Demolição n.º 537/EDI/2009
- OVP n.º 6407/OTR/2009
3. PRAZO PARA A CONCLUSÃO DAS OBRAS: 6 Meses (…)- cfr. fls. 163 dos autos;
GGG)- Em 28 de Maio de 2010, foi emitido o Alvará de obras n.º 240/EO/2010, que titula a licença de obras de Ampliação (...) a que se refere o processo municipal n.º 718/EDI/2010, assim como, o alvará de obras de demolição do processo n.º 537/EDI/2009, com o prazo para conclusão das obras de 60 meses – cfr. fls. 506-509 dos autos;
HHH)- Em 28 de Maio de 2010 foi emitido o Alvará de ocupação da via pública n.º 419/OVP/2010, a que se refere o processo municipal n.º 6407/OTR/2009, nos termos do instrumento de fls. 510- 511, que aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 510-520 dos autos;
III)- Em 9 de Agosto de 2010, deram-se início aos trabalhos preliminares titulados pelos Alvarás mencionados em FFF) e GGG), procedendo-se à Montagem de estaleiro e vedação do perímetro da Obra e Consignação dos trabalhos- cfr. fls. 536-538 dos autos;
JJJ)- Em 1 de Setembro de 2010, deu-se início às operações de desmantelamento dos edifícios e transporte de resíduos- cfr. fls. 538 dos autos;
KKK)- Os trabalhos referidos na alínea antecedente terminaram em 16 de Setembro de 2010, e ocorreu o arranque das operações de demolição [do edifício ... ] com meios mecânicos e conforme o preconizado no projecto de demolição- cfr. fls. 538 dos autos;

LLL)- Em 24 de Setembro de 2010, concluíram-se os trabalhos de demolição do Edifício ... , tendo-se dado início aos trabalhos de transporte da fração inerte a destino final adequado- cfr. fls 538 dos autos;
MMM)- Em 29 de Setembro de 2010 terminaram os trabalhos de transporte e principiou-se os trabalhos de tratamento das empenas do ... em poliuretano, uma vez que as mesmas haviam ficado parcialmente descobertas pelos trabalhos de demolição, e havia que proceder à respectiva impermeabilização, trabalhos esses que foram concluídos em 2 de Outubro de 2010- cfr. fls 538 dos autos;
NNN)- Em 4 de Outubro de 2010, procedeu-se a uma sondagem junto ao ... , no sentido de identificar se o betão encontrado seria da demolição ou pertencente à fundação do ... tendo-se constatado que fazem parte da fundação do ... - cfr. fls 538 dos autos;
OOO)- A Contra-Interessada, em 9 de Outubro de 2010, tomou a decisão, em nome da segurança de pessoas e bens de ordenar a imediata e total suspensão dos trabalhos, até ao completo esclarecimento da questão;
PPP)- Em 9 de Outubro de 2010, ocorreu a Desmobilização dos meios afectos aos trabalhos propriamente ditos, tendo ficado a obra vedada e com contentores de apoio conforme o definido contratualmente- cfr. fls 539 dos autos;
QQQ)- No dia 10 de Outubro de 2010, registou-se no Livro de Obra: Os trabalhos estão suspensos, em virtude de se terem detectado elementos de betão, pertencentes ao edifício confinante, dentro do lote pertença da ... , estado em que a obra se encontra, desde então até à presente data - cfr. fls 540 dos autos;
RRR)- Com data de 21 de Abril de 2011 a ... – Investimentos Turísticos, SA, enviou à ... - Imobiliária, S.A., por carta registada/AR, o instrumento de fls 86 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:- (…) ASSUNTO: AMPLIAÇÃO DO ... HOTEL.



Existência de eventual Conflito entre as Fundações do Edifício sito na Av., Fontes Pereira de Melo, 14 e o lote de terreno afecto à ampliação do ... HOTEL, sito na Av.ª Fontes Pereira de Meio, 12-12A e Largo de Andaluz 5 a 11.
Ex.mos. Senhores,
1. Sendo Vossas Excelências proprietários do Edifício sito na Av.ª Fontes Pereira de Melo, n.º 14 (também denominado ... ) vimos, por este meio, informar Vossas Excelências que, no âmbito da execução da obra destinada à ampliação do nosso ... LISBOA HOTEL, os nossos técnicos constatam:
i) A existência de recalces de fundações (em betão armado com armaduras dispostas na face exterior) com penetração no lote de nossa propriedade e melhor identificado em epígrafe;
ii) A existência de penetração importante de elementos de betão armado, solidários com a estrutura do vosso edifício para dentro do nosso lote.
2. No entanto, para melhor elucidação técnica de Vossas Excelências sobre as questões supra referidas, incluímos, em anexo, parecer técnico subscrito, em 21 de Abril de 2011, pelo Senhor Engenheiro Civil Eduardo ... da ... - Gabinete de Projectos, Engenharia e Serviços, S.A..
3. Como é do vosso conhecimento (vide, neste sentido, a nossa carta datada de 22 de Julho de 2009 - Ref. ADMS/AS/1443) iniciámos a primeira fase das obras tendentes à edificação da referida ampliação do Hotel que, in casu, se traduziu nas demolições dos prédios existentes no nosso lote.
4. Acontece, porém, que, face à verificação das existências dos recalces de fundações e das penetrações de elementos de betão armado e armaduras pertencentes ao vosso edifício no nosso lote, estamos actualmente impedidos de continuar a execução das obras de edificação (conforme projectado e licenciado na edilidade camarária), comprometendo, nesta fase, seriamente os prazos de execução das empreitadas e os prazos de validade das licenças urbanísticas (nomeadamente de construção e de ocupação da via pública).
5. Ora, sendo da vossa responsabilidade exclusiva a penetração no nosso lote dos recalces de fundações, de betão armado e armaduras, solicitamos, na esteira duma boa relação de

vizinhança, que imediatamente Vossas Excelências envidem todos os esforços e meios suficientes para que, total e definitivamente, removam/eliminem do nosso lote tais elementos evasivos.
6. Por forma que este assunto seja imediatamente resolvido, estamos imediatamente disponíveis para termos uma reunião com Vossas Excelências no sentido de nos apresentarem a solução da resolução deste assunto que vos apraz apresentar, com vista a não comprometer a calendarização da execução das empreitadas atinentes à edificação da ampliação do Hotel e, não menos importante, não comprometer a nossa calendarização determinada para a abertura ao público do hotel objecto de ampliação.
7. Face à resolução urgente que este assunto merece, para a realização da reunião designamos, em nossa representação, o Senhor Dr. Carlos Silva Neves (Assessor do Conselho de Administração), com os seguintes contactos:
(…)
Estando ao dispor de Vossas Excelências para qualquer esclarecimento que entendam por conveniente (… )- cfr. fls 86-92 dos autos;
SSS)- Em anexo ao instrumento referido na alínea antecedente a CI remeteu à Requerente o instrumento de fls 88-92 dos autos, datado de 21 de Abril de 2011, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
- (…) Penetração das Fundações do ...
A presente Nota Técnica faz um ponto de situação quanto ao conflito que se julga existir entre as fundações do edifício confinante a Norte (... ) e o contorno do lote de terreno para a ampliação do ... Park Hotel.
De facto, a consulta do projecto camarário do ... (da autoria de ENARCO e datado de 1966) indica que, para a construção das suas caves, foi prevista a realização de um recalce das fundações da parede de empena Norte do edifício que se localizava aonde agora se localizará a ampliação do hotel.
No Anexo apresentam-se os elementos relevantes obtidos do processo camarário (planta e cortes das fundações e pormenores de armaduras dos recalces). De acordo com esses desenhos,

constata-se que o recalce é feito por meio de elementos que fazem parte integrante das fundações da empena Sul do ... (Perfis 1-1 e 2-2 na planta de fundações anexa).
Esses elementos de fundação penetram cerca de 0,75 m para o interior do lote do ... na zona baixa do terreno (com cerca de 19 m de extensão a contar do Largo do Andaluz e aproximadamente à cota 48,3) e cerca de 1,05 m na zona alta do terreno (plataforma com cerca de 9 m aproximadamente à cota 55,5 situada num nível intermédio entre o nível a Av. Fontes Pereira de Melo e o nível do Largo do Andaluz).
Para complementar esta informação, antes e após a demolição do edifício que existia no lote, fizeram-se algumas sondagens complementares com poços de sondagem e abertura de uma vala junto à empena do ... .
De toda a informação recolhida, apesar de persistir alguma incerteza quanto aos níveis do recalce, resulta, em nossa opinião, que abaixo do nível do terreno actual, deverá de facto haver uma penetração importante de elementos de betão armado, solidários com a estrutura do ... , para dentro do lote da ampliação do ... Park Hotel.
A existência destes elementos do edifício vizinho, penetrando no nosso lote, inviabiliza o projecto de escavação e contenção já aprovado pela CML para a construção da ampliação do SANA Lisboa, para além do próprio projecto de Arquitectura. (…)- cfr. fls 89-92 dos autos;
TTT)- Na sequência da recepção da carta referida em RRR), a Requerente procedeu à consulta do processo de licenciamento do edifício da Contra-Interessada, tendo solicitado ao Requerido a extracção de certidão de um conjunto de elementos referentes ao respectivo processo de licenciamento;
UUU- Na posse de elementos do processo de licenciamento da Contra-Interessada, a Requerente apercebeu-se que o projecto de arquitectura, os projectos de escavação e contenção periférica e o projecto de estruturas que a Requerente (1) havia apresentado para aprovação da CML, não tinham tido em consideração os recalces das fundações do edifício da Requerente e entravam em conflito com os mesmos, implicando a sua eliminação/destruição [(1) leia-se CI por se tratar de manifesto erro de escrita];

VVV)- Em 29 de Abril de 2011, a Requerente enviou uma carta à Contra-Interessada, por intermédio da qual acusou a recepção da comunicação de 21 de Abril e sugeriu a realização de uma reunião, no dia 3 de Maio às 15 horas – cfr. acordo das partes e fls 585 dos autos;
WWW)- Em 3 de Maio de 2011, pelas 15 horas, realizou-se, nas instalações da Requerente, uma reunião em que estiveram presentes, em representação da Contra-Interessada, o Dr. ... e o Eng.º ... e ... e, em representação da Requerente, os Eng.os ... e ... ... , na qual foi debatido o teor da carta de 21 de Abril de 2011, tendo os representantes da Requerente sido ainda informados da paralisação dos trabalhos de empreitada referente à ampliação do ... Lisboa- cfr. acordo das partes e fls 180-181 dos autos;
XXX)- Com data de 10 de Maio de 2011 a CI enviou à Requerente o instrumento de fls 180-181 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
- (…) ASSUNTO: AMPLIAÇÃO DO ... HOTEL.
Existência de eventual Conflito entre as Fundações do Edifício sito na Av. Fontes Pereira de Melo, 14 e o lote de terreno afecto à ampliação do ... HOTEL, sito na Av.ª Fontes Pereira de Melo, 12-12A e Largo de Andaluz 5 a 11.
Ex-mos. Senhores,
1. Na sequência da reunião realizada no passado dia 3 de Maio de 2011 nas vossas instalações (na qual estiveram presentes em representação da ... , para além de mim próprio, o Senhor Eng.º ... e Eng.º ... e em representação da ... o Senhor Eng.º ... e o Eng.º ... ... ) reunião que, desde já agradecemos, ficaram de Vossas Excelências de analisarem todo o processo com vista à resolução da situação supra identificada e comunicada na nossa carta (e respectivo anexo) datada de 21 de Abril de 2011, e pormenorizada pela nossa equipa técnica na referida reunião.

2. Ora, tendo em conta a urgência na resolução deste assunto (nomeadamente pelos motivos que aliás reforcei na reunião, i.e., a verificação actual da paralisação dos trabalhos de empreitada e, consequentemente, o retardamento na abertura ao público do Hotel ampliado), venho solicitar a Vossas Excelências a análise e a resolução deste assunto com a maior urgência.
3. Mais uma vez, manifestamos a nossa total disponibilidade para qualquer esclarecimento que Vossas Excelências entendam por conveniente. (…)- cfr. acordo das partes e fls 180-181 dos autos;
YYY)- Em 17 de Maio de 2011, a Requerente enviou à Contra-Interessada, o instrumento de fls 589-591 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, pelo qual responde à carta datada de 10 de Maio, e considerando ainda a (...) carta anterior de 21 de Abril (...) bem como a reunião havida no (...) dia 3 de Maio em que referiu que a obtenção [por parte da Contra-Interessada] de licença de construção para ampliação do (...) hotel sito na Av. Fontes Pereira de Melo cuja execução do respectivo projecto implicará a afectação dos recalces de fundações do nosso edifício [ou seja, do ... ], bem como, solicita à CI que assegure que as obras em causa permanecem suspensas - conforme comunicado na V. carta do passado dia 10.5.2011- até integral esclarecimento da situação. - cfr. acordo das partes e fls 589-592 dos autos;
ZZZ)- Com data de 4 de Julho de 2011 a Requerente enviou à CI o instrumento de fls 593-594 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
- (…) 2. Sem prejuízo dos direitos que entendemos caberem à ... , reafirmamos, alicerçados em princípios de boa vizinhança, que estamos disponíveis para avaliar a implementação pela ... das soluções que esta entenda apresentar-nos, tecnicamente viáveis, caso as mesmas passem por trabalhos sobre os recalces existentes e desde que salvaguardados os interesses e a segurança das pessoas e dos bens localizados no nosso edifício.
Neste quadro, entendemos ser de toda a conveniência, e também do V. interesse, a marcação de uma reunião entre os Presidentes dos Conselhos de Administração da ... e da ... com a presença sugerindo desde já, para o efeito os dias 13 e 14 do mês de Julho de 2011. (…)- cfr. acordo das partes e fls. 593-595 dos autos;
AAAA)- Com data de 19 de Julho de 2011 a Requerente enviou à CI o instrumento de fls. 170-171 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
- (…) Dirigimo-nos a V. Exas na sequência da reunião havida no passado dia 11 de Julho, nas nossas instalações a qual demonstrou ser inconclusiva pelo facto da ... pretender que a ... se responsabilize por sobrecustos (não identificados por V. Exas.) eventualmente decorrentes de alteração do V. projecto da obra acima referida, por força da necessidade de o adaptar à existência dos recalces das fundações do nosso edifício.
Não podendo a ... aceitar tal responsabilização, ficámos a aguardar um contacto dos V. técnicos ou gabinete de engenharia com vista também à verificação e esclarecimento de alguns pontos do V. actual projecto que, igualmente, implicariam uma alteração do mesmo.
Conforme transmitido nessa reunião, o V. projecto de ampliação acima referido assume a utilização de um espaço que pertence ao ... , concretamente o espaço da floreira existente no piso térreo, que é apropriado no V. projecto da primeira até à última cave.
Por outro lado, decorre também dos desenhos do V. projecto, em conjugação com a Memória Descritiva apresentada na Câmara Municipal de Lisboa com data de 27 de Abril de 2010, que será executada uma contenção tipo Berlim definitivo, que parece passar por baixo do prédio da nossa propriedade, não sendo clara a solução técnica preconizada.
(…)
Finalmente, vimos também informar V. Exa que, não obstante a V. recusa, continua a ... , num espírito de colaboração com o Conselho de Administração da ... , S.A, disponível para aceitar a implementação de soluções tecnicamente viáveis, caso as mesmas passem por trabalhos sobre os recalces existentes, e desde que salvaguardados os interesses e a segurança das pessoas e dos bens localizados no nosso edifício.
Neste sentido, reafirmamos a nossa total disponibilidade para eventuais reuniões de trabalho entre as nossas equipas técnicas, caso as possam entender como convenientes e relevantes para o

esclarecimento das questões pendentes e construção das soluções que protejam os interesses de ambas das partes. (…)- cfr. acordo das partes e fls 170-171 dos autos;
BBBB)- Com data de 29 de Julho de 2011 a CI enviou à Requerente o instrumento de fls 596-597 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
- (…) no sentido de esclarecer os vossos aparentes equívocos acerca da leitura do projecto de ampliação do ... Lisboa (projecto que facultámos como manifestação de total abertura e transparência), cremos que será vantajoso para ambas as partes promover um contacto entre peritos para uma primeira análise - conjunta e exclusivamente técnica - de factos e soluções, pelo que sugerimos desde já a marcação de uma reunião para esse efeito.
Por último, não podemos deixar de salientar que a presente tentativa de aproximação entre técnicos corresponde, da nossa parte, à reiteração de um esforço - que pretendemos manter - de não olhar de forma privilegiada para a solução que sempre seria mais consentânea com um desfecho eficaz e expedito das dificuldades que nos foram criadas: isto é, a pronta, total e definitiva desobstrução do nosso subsolo (recorde-se, ilegitimamente ocupado em proveito exclusivo do reforço estrutural do vosso edifício).
Assim sendo, e sem prejuízo de qualquer iniciativa vossa nesse sentido se tal vos for entretanto mais conveniente, solicitaremos aos nossos Projectistas o estabelecimento do contacto tendente à realização da reunião acima proposta. (…) - cfr. acordo das partes e fls 596-597 dos autos;
CCCC)- Com a execução dos 2 poços em Novembro de 2008, não se encontra a base da fundação do edifício ... - cfr. fls 475 dos autos;
DDDD)- As fundações do edifício ... estão identificadas no poço P3 que é o prolongamento do P1, não estando identificados os recalces – cfr. fls 523 e 528 dos autos;
EEEE)- A execução do projecto da CI aprovado pela CML, sem a adopção das medidas referidas em AA), poderá implicar grave risco das fundações do edifício da Requerente;
FFFF)- Com data de 7 de Setembro de 2011, foi emitido pelo Laboratório Nacional de Engenharia civil, subscrito por ... ... , respectivamente,

Investigador Coordenador, Director do Departamento de Estruturas do LNEC e Investigador Principal, Chefe do Núcleo de Comportamento de Estruturas do LNEC o instrumento de fls. 398-399, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
¯ (…) PARECER
QUESTÕES COLOCADAS PELA
Dr.ª ... , da ... & Associados,
RELATIVAS ÀS FUNDAÇÕES DO ...
1. INTRODUÇÃO
Por solicitação da Dra ... , da ... & Associados, e na sequência de diversos contactos e de uma visita ao local, vem o Departamento de Estruturas do LNEC responder às questões colocadas relativas às fundações do ... , sito na Av. Fontes Pereira de Melo, n.º 14, em Lisboa.
1.ª questão: “É tecnicamente viável demolir, na íntegra, os recalces do ... , invasivos do lote propriedade da ... , INVESTIMENTOS TURISTICOS, SA?”
Resposta: Sim, considera-se perfeitamente viável demolir, na integra, os recalces do ... - em rigor, os recalces a Sul ao ... (Edifício ... ), executados na ocasião e para efeitos da construção do ... , prolongando de forma solidária e invasiva as fundações deste - na parte em que são invasivos do lote propriedade da ... , INVESTIMENTOS TURÍSTICOS, SA.
2.ª QUESTÃO: “Em caso afirmativo, quais as soluções técnicas que seriam necessárias implementar para garantir a cabal segurança do ... , durante e depois da execução da mencionada demolição integral dos respectivos recalces, invasivos do lote propriedade da ... , INVESTIMENTOS TURÍSTICOS, SA.?”
Resposta: A demolição, referida na 1.ª questão, deverá ser objecto de um adequado projecto estrutural, o qual deverá ter em consideração, nomeadamente, o seguinte:



a) a prévia execução de um reforço estrutural, pela face interior da parede Sul do ... , que permita substituir a eventual função estrutural actualmente exercida pelas zonas invasivas a demolir posteriormente.
b) a remoção das zonas invasivas a demolir, pela execução de cortes executados, progressiva e escalonadamente, em trechos não contíguos e de largura limitada.
2. COMENTÁRIOS FINAIS
2,1 - Não se encontrou qualquer justificação de ordem técnica consistente com as boas práticas de construção em uso à época do projecto do ... (anos 60), para uma sistemática utilização de recalces invadindo propriedade alheia, como se constata pelo exame dos desenhos de projecto relativos às fundações do ... , disponibilizados pela Dra ... .
2.2 Finalmente, não pode o LNEC deixar de chamar a atenção para a conveniência em ser aproveitada esta oportunidade para se proceder também a uma adequada verificação da estrutura geral do ... , tendo em vista, nomeadamente, a verificação da segurança sísmica considerada na regulamentação em vigor. (…) - cfr. fls 398-399 dos autos;
GGGG)- O Grupo ... detém na cidade de Lisboa, sete unidades hoteleiras;
HHHH)- Actualmente encontram-se em fase de construção duas unidades hoteleiras de cinco estrelas, o ... e o MYRIAD BY ... S, sito na Torre Vasco da Gama;
IIII)- Actualmente encontra-se em fase de construção o EVOLUTION by ... S, sito na Praça Duque de Saldanha, no segmento de três estrelas;
JJJJ)- A estratégia de expansão do ... responde a uma tendência de crescimento da procura, na cidade de Lisboa, por produtos hoteleiros no segmento corporate (de turismo de negócios), com preços concorrenciais e instalações especificamente vocacionadas para eventos e serviços associados;
KKKK)- A decisão de ampliação do ... Lisboa insere-se na estratégia do GRUPO SANA, aumentando a capacidade da unidade hoteleira, nomeadamente na área

corporate, no âmbito da qual tem vindo a acolher diversos eventos e reuniões de empresas nacionais e internacionais, dotando-o de condições para responder à procura expectável nos próximos anos, a este nível;
LLLL)- Com a ampliação do ... Hotel, de 126 quartos, estes teriam um resultado líquido de exploração de 6.338 euros diários;
MMMM)- Com data de 18 de Novembro de 2011 a ER emitiu o instrumento de fls 863-865 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
- (…) Local: Av. Fontes Pereira de Melo, 14-14C
Freguesia: Coração de Jesus
Na sequência da informação n.º 36511/INF/DIVPE/GESTURBE/2011, de 09.11.2011, e após consulta dos processos requeridos ao Arquivo, é possível informar o seguinte:
Desde 2007 até à presente data deram entrada na CML os seguintes pedidos de consulta/reprodução de documentos relativamente ao local em epígrafe:
- Processo n.º 1888/DOC/2007 (6292/DMSC/07) - pedido de reprodução simples de fls 28 a 48 do Processo n.º 5674/OB/1989 (Obra 54953), requerido em 19.03.2007 por ... , Lda., deferido em 14.11.2007 e arquivado;
- Processo n.º 2495/DOC/2008 (11888/CML/08) - pedido de consulta da obra/processos existentes para a Av. Fontes Pereira de Melo n.º 14, requerido em 05.05.2008 por ... ... ... Estêvão. O requerente não deu resposta à notificação de comparência nos serviços camarários para efectuar a referida consulta, pelo que o processo foi arquivado por despacho proferido em 04.06.2009;
- Processo n.º 2127/DOC/2008 (6222/CML/08) - pedido de consulta da obra/processos existentes para a Av. Pontes Pereira de Melo 14 a 14-C e reprodução simples de documentos (não especificados), requerido em 16.04.2008 por Eduardo Camacho ... . O requerente não deu resposta à notificação para comparência nos serviços camarários para consulta do processo (e indicação dos documentos pretendidos), pelo que o mesmo foi arquivado por despacho proferido em 06.05.2009 e enviado para arquivo;
- Processo n.º 3068/DOC/2009 (19900/CML/09) - pedido de consulta e reprodução de documentos requerido em 24.07.2009 por ... . O requerente solicitou reprodução simples de fls 373 a 379 do processo n.º 30140/65 (vol. 2 da obra 54953) e de fls 5, 6 e 25 do processo n.º 5674/08/1989 (vol. 6 da obra 54953). O pedido foi deferido em 21.09.2009 e enviado para arquivo após fornecimento das cópias. (…) - cfr. fls 864-865 dos autos;
NNNN)- O projecto aprovado para a ampliação do empreendimento turístico da Contra-Interessada propõe-se utilizar espaço ocupado pelo edifício da Requerente, na frente - rés-do-chão, virado para a Av. Fontes Pereira de Melo - e no subsolo, onde se encontra implantada uma floreira – cfr. fls 106-115, 160-162 e acordo das partes.»

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Analisemos então o alegado erro de julgamento quanto à matéria de facto.

A impugnação da matéria de facto tem lugar nos casos enunciados no artigo 712º, nº 1 do CPC, sendo a dos presentes autos ao abrigo da 2ª parte da alínea a): “se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685º-B, a decisão com base neles proferida” (disposições do CPC na redacção vigente à data da interposição do recurso).
Acrescenta o nº 2 do primeiro artigo que, “No caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações do recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados”.

Na impugnação tem o recorrente de observar os ónus fixados no citado art. 685-B, especificando, “sob pena de rejeição:
- Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados [cf. nº 1, al. a)];
- Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida” [cf. nº 1, al. b)]
- e, quando os meios probatórios indicados como fundamento do erro na apreciação da prova sejam gravados e permitam a identificação precisa e separada dos depoimentos, a indicação exacta das passagens em que se funda (por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no nº 2 do artigo 522º-C”), sem prejuízo da faculdade do recorrente proceder à respectiva transcrição (cf. nº 2).
Como explica, entre outros, o ac. do STA de 14-04-2010, proc. nº 0751/07, in www.dgsi.pt, «(…) só com a satisfação daquele ónus, é que poderá ser dada à parte contrária a possibilidade de conhecer todos os motivos e fundamentalmente, os concretos depoimentos ou elementos de prova em que se funda a discordância do recorrente sobre o julgamento da matéria de facto. E daí a oportunidade ou possibilidade de a parte contrária exercer o direito previsto no nº 3 do mesmo preceito, ou seja a possibilidade de, na respectiva contra-alegação, proceder “à transcrição dos depoimentos gravados que infirmem as conclusões do recorrente”.
O mesmo é dizer que sob o recorrente recai, na respectiva alegação, o ónus de demonstrar cabalmente os motivos pelos quais, em seu entender, deve ser alterada a matéria de facto ou a razão de ser da sua discordância relativamente aos concretos pontos da matéria de facto que têm por indevidamente apreciados na 1ª instância. Demonstração essa, que terá de ser feita nomeadamente através da transcrição das passagens da gravação em que pretende alicerçar o seu ponto de vista.»


Vejamos, pois, o que se nos oferece dizer sobre a impugnação da matéria de facto feita pela Autora/Apelante, levada às Conclusões 10ª a 15ª das suas alegações de recurso, e em se que funda para assacar à sentença recorrida seis erros de julgamento por errada apreciação e valoração da prova sobre a factualidade dada por não indiciariamente provada, que se mostra vertida nos pontos 1, 2, 4, 6, 7 e 9 de fls 1127 da sentença.
Antes, porém, deixa-se expressamente consignado que a Conclusão 9ª não contém uma impugnação de matéria de facto, mas uma crítica à parte da sentença respeitante à apreciação de mérito, conforme resulta da referência que ali é feita a “cfr. fls. 97 da sentença” (fls 1161 dos autos), que corresponde já à parte da decisão judicial respeitante à apreciação dos requisitos da providência requerida, como se constata da epígrafe “B) Do periculum in mora” (fls 1154 dos autos e 90 a 98 da numeração própria da sentença), compreendida no desenvolvimento do ponto “3.2 – O Direito” (fls 1128 e segs dos autos e 64 e segs da numeração própria da sentença).
Fica, assim, explicada a delimitação feita no parágrafo anterior às conclusões das alegações de recurso respeitantes à impugnação da matéria de facto e, bem assim, a remissão que agora se faz da análise da Conclusão 9ª para momento ulterior.
Feitas estas considerações, passemos a apreciar os erros na apreciação e valoração da prova invocados pela Recorrente.
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Na Conclusão 10ª, a Recorrente assaca erro de julgamento à sentença recorrida por ter sido dado por indiciariamente não provado que "Na reunião de Março de 2008 foi fornecida pelo Engº ... ao Engº ... cópia do "desenho dos perfis" que consubstancia o documento 12-A junto ao RI, o

qual, só por si, permitia concluir que existiam fundações do ... invasivas do lote vizinho", sem explicar por que é que não se atendeu ao depoimento do Engº ... ... .
Segundo a Recorrente, sendo este e o Engº ... as únicas testemunhas que depuseram sobre aquela facticidade e sendo os seus depoimentos contraditórios, o tribunal deveria ter dado por indiciariamente provada aquela factualidade.
Vejamos se lhe assiste razão.
O tribunal deu por indiciariamente não provado sob os pontos 1 e 2 (fls 1127) que:
- "Na reunião de Março de 2008 os elementos fornecidos, só por si, permitiam concluir que existiam fundações do ... invasivas do lote vizinho"
- Na reunião referida em 1 tenham sido fornecidas cópias de algumas peças desenhadas desse projecto ao Engº Cansado de Carvalho"
Comecemos pelo último destes factos, em que está em causa a reapreciação de prova testemunhal em que se confrontam dois depoimentos opostos: do Engº ... que diz que, na reunião de Março de 2008, forneceu ao Engº ... uma fotocópia do “desenho do perfil” do projecto de estruturas do ... e o do Engº ... que diz que viu o referido desenho, que tomou, num papel, umas notas manuscritas com base nas quais transpôs para o seu projecto o desenho do referido perfil do projecto de estruturas do ... , com que não ficou com cópia.
Ora, relativamente à prova testemunhal, como é sobejamente sabido, não pode deixar de se dar a devida relevância à percepção de um universo de elementos que a oralidade e a imediação conferem ao julgador da 1ª instância e que, não sendo captáveis em toda a sua dimensão pelo tribunal “ad quem” através do registo magnético da prova, limita os poderes do tribunal superior na reapreciação da prova testemunhal.
Daí que, em princípio, o tribunal de recurso só deva alterar a decisão da 1ª instância, se após a sua reapreciação, for evidente que, em termos de razoabilidade, foi erradamente apreciada e valorada naquela instância.
A respeito das limitações do tribunal “ad quem” na reapreciação da matéria de facto e das suas razões, lê-se designadamente no ac. do STA de 19-10-05, proc. 394/05 (relator Conselheiro São Pedro), citando o ac. do TC de 13-10-2001, que «“A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte, nem pode subverter, o princípio da livre apreciação das provas e não se pode perder de vista que na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova e factores que não são racionalmente demonstráveis, de tal modo que a função do Tribunal da segunda instância deverá circunscrever-se a apurar a razoabilidade da convicção probatória do 1° grau dessa mesma jurisdição face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos».
Ora, no caso concreto, nem sequer é preciso ter em consideração as referidas limitações nos poderes de reapreciação que aludimos antes: é que perante dois depoimentos contraditórios na questão concreta do fornecimento da cópia do desenho do perfil - o do Engº ... , a dizer que forneceu uma cópia do "desenho dos perfis", e o do Engº ... a dizer que viu o desenho do perfil em questão, que tirou umas notas manuscritas, com base nas quais o transpôs para o seu projecto, e que não lhe foi entregue nenhuma cópia - não merece qualquer censura a decisão do tribunal “a quo” ao dar por não provado que o Engº ... , na reunião de Março de 2008, forneceu uma fotocópia do desenho do perfil ao Engº ... .

Na verdade, não existindo prova legal que se impusesse ao tribunal a quo, julgando este a prova segundo as regras de experiência comum e a livre convicção que sobre ela forma (nº 5 do art. 607º do actual CPC, correspondente ao nº 1 do art. 655º do anterior Código), nenhum reparo merece a decisão da 1ª instância ao dar por não provado o facto em apreço, em face da divergência dos dois depoimentos e da plausibilidade que cada um deles apresenta.
Contrariamente ao que parece entender a Recorrente, a circunstância de não ter ficado provado o fornecimento da referida fotocópia, não significa ter por provado o facto contrário – o seu não fornecimento - mas, e só, que o testemunho do Engº ... não foi suficiente para criar no tribunal “a quo” a convicção de que, na reunião de Março de 2008, o mesmo forneceu ao Engº ... cópia do "desenho dos perfis".
Isto para além de, produzida aquela prova destinada a demonstrar o fornecimento da cópia do desenho, a persistir a dúvida sobre se esse fornecimento se verificou, se impor ao tribunal “a quo” a decisão de dar o facto por não provado, em conformidade com o disposto no nº 1 do art. 342º do C.C..
Em suma, nenhuma censura merece o tribunal “a quo” ao dar por indiciariamente não provado que "Na reunião de Março de 2008 foi fornecida pelo Engº ... ao Engº ... cópia do "desenho dos perfis".
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Vejamos agora se se pode afirmar, como faz a Recorrente, que o tribunal “a quo” errou ao dar por não provado que esse desenho “só por si, permitia concluir que existiam fundações do ... invasivas do lote vizinho".

Quanto a este facto, a Recorrente defende que o tribunal julgou mal ao dá-lo por não provado, porquanto o depoimento do próprio Engº ... seria no sentido de que o desenho dos perfis permitia concluir que existiam fundações do ... invasivas do lote da Contra-interessada, resultando ainda - quer do depoimento do Engº ... (testemunha arrolada pela Recorrente), quer do depoimento do Engº ... (testemunha arrolada pelo Requerido) - que «a representação dos perfis constante do projecto elaborado pelo Engº ... (desenho nº 4 “escavação e Contenção periférica – projecto de licenciamento – Alçado Norte”)» apenas poderia ter sido feita na posse daquele desenho dos perfis do ... .
Como bem chama a atenção a Contra-interessada nas suas contra-alegações, há que distinguir aqui duas questões:
- A primeira, respeitante à representação do recalce do ... no projecto de estruturas da ampliação do ... Lisboa (“desenho nº 4 “escavação e Contenção periférica – projecto de licenciamento – Alçado Norte”), de que não existem dúvidas de que esse projecto o representa, tendo Engº ... afirmado, como já se deixou dito, que, na referida reunião de Março de 2008, viu o desenho do projecto do ... em que está esse recalce, que o anotou nas notas manuscritas que tirou e que foi com essa informação que elaborou o projecto de estruturas de ampliação do Hotel;
- a segunda, que é a que importa aqui reapreciar, respeita ao facto de saber se o referido desenho do recalce do projecto de estruturas do ... (desenho 1 do documento 12-A), “só por si, permitia concluir que existiam fundações do ... invasivas do lote vizinho”.

É líquido que, no desenho desse perfil, não se encontra qualquer indicação do limite da propriedade da Recorrente (ou do limite da propriedade da Contra-interessada), o que permite compreender que, na representação desse perfil constante do projecto elaborado pelo Engº ... (no “desenho nº 4 “escavação e Contenção periférica – projecto de licenciamento – Alçado Norte”), se registe um desfasamento de cerca de 70 cm relativamente ao local onde, de acordo com o projecto do ... , se supõe que se encontrarão as fundações deste edifício.
Ora, a ausência de qualquer indicação sobre o limite da propriedade da Recorrente (ou da Contra-interessada) e o total desconhecimento da solução adoptada nas fundações do edifício (estrutura monolítica, incomum, não pensável que existisse ali) são razões suficientes para criar no julgador uma dúvida séria sobre se a análise do desenho do perfil do projecto do ... - destinada a “apurar o nível de fundação do ... , para verificar se ficava abaixo ou acima do nível de escavação pretendido para o ... Lisboa para estabelecer a necessidade de realizar ou não uma contenção no limite Norte do Sana Lisboa, no âmbito do projecto de escavação e contenção, então em elaboração” (cf. alíneas P), T) e V) da matéria dada por indiciariamente provada) e efectuada nas condições apuradas na alínea U) - só por si, permitia extrair a conclusão de que a fundação do ... não se compreendia nos limites da propriedade da Recorrente, antes invadia terreno da Contra-interessada.
Eventualmente seria diferente a conclusão a extrair se a análise do desenho tivesse sido feita com prévio conhecimento do tipo de solução adoptada nas fundações do ... . Aí sim, conhecida que fora adoptada uma estrutura monolítica - para as fundações do Semapa e para a contenção do edifício vizinho - o desenho do perfil do recalço representado no projecto de estruturas do ... poderia

implicar a conclusão de que as fundações deste edifício invadiam terreno da Contra-interessada.
Serve isto para dizer que o depoimento da testemunha da Recorrente (Engº ... que teve intervenção na construção do ... e afirmou que “todos os desenhos do projecto”passaram pela sua mão”) - no sentido de que o desenho do perfil do projecto de estrutura do ... permitia concluir pela invasão do terreno vizinho - não é suficiente para demonstrar que do referido desenho resulta necessariamente a invasão do terreno “... ”, tanto mais que o depoimento do Engº ... não foi o de que esse desenho - que está transposto para o desenho do projecto de estrutura do ... – só autoriza a leitura de que a fundação do ... invade terreno da Contra-interessada. Na verdade, a testemunha nem sequer foi confrontada com a leitura que um projectista - que desconhecesse a solução monolítica adoptada para a estrutura do ... - faria do desenho do perfil em questão.
E o mesmo se diga das demais testemunhas ouvidas, directa ou indirectamente, sobre a necessária visibilidade, nesse desenho, da invasão do terreno da Contra-interessada pelas fundações do ... , porque todas depuseram com conhecimento da solução adoptada nas fundações deste edifício e a nenhuma delas foi perguntado se um projectista que desconhecesse a solução monolítica adoptada para a estrutura do ... concluía, necessariamente, só desse desenho, que as fundações do ... eram invasivas do lote vizinho.
Assim, não existindo prova legal que se impusesse ao julgador, isto é, julgando este a prova segundo as regras de experiência comum e a livre convicção que sobre ela forma, tem de se entender que, no concreto
contexto apurado, a opção do tribunal julgador em dar por não provado que o desenho do perfil em causa, “só por si, permitia concluir que existiam fundações do ... invasivas do lote vizinho” não enferma de qualquer desconformidade com aquelas regras, bem pelo contrário, revela-se a opção mais ajustada à análise da prova de que aquele tribunal dispunha, quer a testemunhal quer a documental (a análise proporcionada pelos dois desenhos – o desenho do projecto da Recorrente, destituído de qualquer indicação do limite do seu terreno, e a transposição desse desenho para o desenho do projecto de estruturas da ampliação do ... Lisboa, efectuada com um desfasamento de cerca de 70 cm relativamente ao local onde, de acordo com o projecto do ... , se supõe que se encontrarão as fundações deste edifício).
Por tudo o que acabou de se dizer, impõe-se julgar improcedente, “in toto”, a Conclusão 10ª das alegações da Recorrente.
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Na Conclusão 11ª, a Recorrente afirma que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento na apreciação da prova por ter dado por não provada a factualidade descrita no ponto 4, onde consta que “A ocupação de parte do terreno da Contra-interessada com os recalces das fundações do edifício da Requerente não poderia ter deixado de ser conhecida e aceite pelos então proprietários do imóvel à época”, sustentando que a prova deste facto resulta dos depoimentos das testemunhas Engº ... e Engº ... e, bem assim, das fotografias juntas aos autos na audiência de julgamento.
Para demonstrar este erro de julgamento, a Recorrente seleccionou duas passagens do depoimento da primeira testemunha em resposta à questão sobre se, “para efectuar aquelas caves e o tipo de estrutura monolítica que está ligada ao edifício ... (…), “aquilo poderia passar despercebido, podiam terceiros não saber, os próprios proprietários do edifício ... não saber o que se estava a passar debaixo do terreno deles … era possível que ignorassem?”.
A primeira parte da resposta da testemunha consubstancia uma mera opinião sem qualquer virtualidade probatória, como resulta com evidência da sua simples leitura.
Da segunda parte seleccionada, a testemunha disse o seguinte: “aquela escavação não era possível ser executada às escondidas” e para demonstrar esta afirmação invocou a existência, em arquivo, de um conjunto de fotografias em que se vê “perfeitamente, por exemplo”, que a escada de acesso ao buraco da escavação era feito através da propriedade do edifício ... ”.
Ora, a única coisa possível extrair deste depoimento é que os trabalhos de construção do ... , desde logo a escavação, dada a sua dimensão, não podiam passar despercebidos, como, aliás, a Mª Juiz “a quo” muito bem entendeu e precisou ao dizer à testemunha: “não passaram despercebidas ao proprietário, muito bem”, nada adiantando, mesmo indiciariamente, sobre o conhecimento e aceitação por parte do então proprietário do terreno ... da ocupação definitiva do subsolo deste terreno pelas “fundações do edifício da Requerente”, sendo que só essa ocupação definitiva estava em causa no facto em questão.
E o mesmo se diga do depoimento do Engº Hélder Gomes.
Com efeito, a Recorrente – ainda para demonstrar que o tribunal “a quo” apreciou mal a prova produzida sobre o facto dado por não provado no citado nº 4, seleccionou a seguinte passagem do depoimento da testemunha:

O que não há dúvida é que o prédio foi feito com o acordo da ... , inclusivamente para se fazer a obra até se trabalhou dentro do quintal da ... , portanto era impossível fazer ocupar um espaço daquele chamado jardim, aquele terraço, sem que a ... autorizasse”.
Do depoimento da testemunha, em parte que não foi transcrita pela Recorrente, regista-se que a mesma, ainda a instâncias sobre se houve algum acordo entre os proprietários dos dois terrenos, respondeu: “Acordo escrito, não sei”, “Não assisti a nenhuma conversação”.
E sendo-lhe perguntado se o proprietário do edifício ... sabia que “tecnicamente a solução era monolítica”, “se sabia esses pormenores técnicos”, respondeu que não sabia se havia lá algum engenheiro da ... , mas, com conhecimento ou não da ... (o que não sabia), ninguém da ... se opôs à obra.
Ou seja, dos depoimentos das referidas testemunhas colhe-se apenas que, aquando da execução dos trabalhos de construção do ... , uma parte do terreno ... foi temporariamente ocupada, mas nada se apura, nem indiciariamente, sobre o alegado conhecimento e aceitação por parte do então proprietário do terreno ... quanto à ocupação definitiva deste terreno com fundações do edifício da Requerente.
E o mesmo se diga quanto às fotografias juntas pela Requerente (em audiência de julgamento) que também mostram apenas que, durante a construção do ... , parte do terreno ... foi temporariamente ocupado.
Sendo assim, é de concluir que nenhuma prova foi produzida pela Recorrente sobre o alegado conhecimento e aceitação, pelos então proprietários do imóvel ... , da ocupação definitiva de parte do seu terreno com as fundações do ... , impondo-se julgar igualmente improcedente a Conclusão 11ª das alegações.
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Nas Conclusões 12ª e 13ª, a Recorrente sustenta que o tribunal não podia ter dado por não provada a factualidade constante do nº 6, por contradizer manifestamente os dados por provados nas alíneas Y) e OOO), impondo-se, por congruência com a matéria destas alíneas e, bem assim, com a da alínea EEEE), dar por provada a factualidade contida naquele número.
Vejamos:
No referido nº 6, o tribunal “a quo” deu por indiciariamente não provado que “A eliminação dos recalces conduzirá, necessariamente, a um elevado risco de ruína do edifício da requerente por falta de segurança de toda a estrutura da empena do edifício e da sua fundação”.
Nas alíneas Y), EEEE) e OOO), o tribunal deu por provado que:
- “Y)- A execução do projecto de ampliação do ... Lisboa, aprovado pelos actos suspendendos, implica a destruição e remoção de fundações do ... , existentes no lote propriedade da Contra-Interessada, com corte de percentagem não concretamente apurada da espessura da parede de recalçamento existente, incluindo a remoção integral da armadura principal desse muro e da respectiva ligação à fundação”;
- “EEEE)– A execução do projecto da CI aprovado pela CML, sem a adopção das medidas referidas em AA), poderá implicar grave risco das fundações do edifício da Requerente”, constando desta alínea AA) que “É possível demolir as fundações do ... existentes no lote propriedade da Contra-Interessada, proceder à respectiva remoção e

garantir a integridade estrutural do ... , com a prévia execução de um reforço estrutural da parede, do ... , confinante com o prédio da Contra- interessada, a definir em projecto estrutural – cfr. fls. 398-399 dos autos”;
- OOO)– A Contra-Interessada, em 9 de Outubro de 2010, tomou a decisão, em nome da segurança de pessoas e bens, de ordenar a imediata e total suspensão dos trabalhos, até ao completo esclarecimento da questão.
Atendendo a toda a factualidade dada por indiciariamente provada nas alíneas transcritas, é evidente que nenhuma razão de ordem lógica impunha dar por provado que “A eliminação dos recalces conduzirá, necessariamente, a um elevado risco de ruína do edifício da requerente por falta de segurança de toda a estrutura da empena do edifício e da sua fundação”, não se descortinando qualquer contradição entre não dar por provado que a eliminação dos recalces tem por consequência necessária a “ruína do edifício da requerente” e os factos indiciariamente apurados nas referidas alíneas Y), EEEE), AA) e OOO). Bem pelo contrário, em coerência com a factualidade provada nestas alíneas, impunha-se ao Tribunal julgador não dar por indiciariamente provado que a consequência necessária da eliminação dos recalces é a ruína do edifíco Semapa.
É certo que a Recorrente pretende que o risco que o tribunal teria de apreciar seria o decorrente do corte dos recalces feito sem qualquer consideração pela realidade monolítica das fundações Semapa, mas sem razão, porque esse risco já está vertido de forma completa na factualidade apurada na transcrita alínea EEEE).
Assim, improcedem também as Conclusões 12ª e 13ª.
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Na Conclusão 14ª, a Recorrente invoca mais uma vez erro de julgamento na apreciação da prova por ter sido dada por não provada a

factualidade descrita no ponto 7, onde consta que “O espaço já ocupado pelo edifício da Requerente, na frente – rés-do-chão, virado para a Av. Fontes Pereira de Melo – e no subsolo, onde se encontra implantada uma floreira, pertence ao ... , sustentando, na parte respeitante ao desenvolvimento dessa conclusão, que:
a)- Dar por não provado que o espaço ocupado pela floreira pertence à Recorrente é manifestamente contraditório com “a matéria factual plasmada na alínea NNNN), segundo a qual “O projecto aprovado para a ampliação do empreendimento turístico da Contra-Interessada propõe-se utilizar espaço ocupado pelo edifício da Requerente, na frente - rés-do-chão, virado para a Av. Fontes Pereira de Melo - e no subsolo, onde se encontra implantada uma floreira – cfr. fls. 106-115, 160-162 e acordo das partes”;
b)- o facto devia ter sido dado por indiciariamente provado por acordo das partes ou por conformidade com os “depoimentos das testemunhas da Recorrente, não contraditado por qualquer prova efectuada pela Contra-interessada”;
c)- Bastaria ao tribunal recorrido ter atendido ao facto do ... , incluindo a floreira e o espaço correspondente ao subsolo, estar implantado há mais de 40 anos, para, por si só, permitir concluir, pelo menos, a aquisição por usucapião, dando-se, assim, por indiciariamente provado o direito de propriedade da Recorrente sobre a parcela de terreno em questão.
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Vejamos cada uma destas razões invocadas pela Recorrente.
Quanto à primeira [(sintetizada sob a al. em a)], é óbvio que não há nenhuma contradição em dar por provada a factualidade vertida na alínea NNNN) - de que o projecto aprovado para a ampliação do empreendimento turístico da Contra-Interessada inclui um espaço ocupado pelo edifício da Requerente onde se encontra implantada uma floreira – e, simultaneamente, não dar por provado que esse espaço assim ocupado pertence à Requerente (ou seja, que está implantado em terreno do lote de que é proprietária).
Ocupação de terreno não implica, por si, propriedade desse terreno, pelo que não se verifica a invocada contradição.
Quanto às razões que incluímos na al. b), é prévio fazer um breve esclarecimento.
O facto que está em causa, que é o de que o espaço ocupado pela floreira pertence à Recorrente, não é, obviamente, um facto pessoal da Contra-interessada, e esta o que disse nos artigos 130º e 131º da oposição a propósito desse facto foi o seguinte: “… de acordo com os dados na posse da Contra-interessada e dos respectivos projectistas (designadamente o levantamento topográfico e as áreas constantes do registo predial – cf. p. a. e doc. nº 1), nunca foi perceptível que a dita floreira pertencesse ao ... , pois que se encontra fora do alinhamento da respectiva empena”; “…caso se confirme que a dita “floreira”, com efeito, se integra no prédio da Requerente, a Contra-interessada de imediato apresentará uma alteração ao seu próprio projecto, de modo a eliminar a área de implantação aí prevista”.
Ora, atento o disposto no art. 574º do actual CPC (correspondente ao art. 490º do anterior CPC), que estabelece no seu nº 3 que, “Se o Réu declarar que não sabe se determinado facto é real, a declaração equivale a confissão quando se trate de facto pessoal ou de que o Réu deva ter conhecimento e equivale a impugnação no caso contrário”, poderá eventualmente levantar-se a dúvida sobre se o referido facto deve considerar-se confessado ou impugnado.
Como já se deixou dito, o facto em questão não é um facto pessoal, próprio da Contra-interessada, mas também não é um facto que a mesma devesse conhecer (que seja objecto de percepção pessoal), como resulta desde logo da ponderação das duas circunstâncias enunciadas pela Contra-interessada:

a floreira não está implantada no alinhamento da empena do ... e a área de implantação do projecto da Contra-interessada, com inclusão da área de implantação da floreira, corresponde às áreas que constam da certidão do Registo Predial que ... juntou com a oposição.
Portanto, em conformidade com a disposição antes citada, os artigos 130º e 131º da oposição equivalem à impugnação do facto alegado pela Requerente de que o espaço ocupado pela floreira lhe pertence.
Debrucemo-nos, então, sobre a alegada conformidade com os “depoimentos das testemunhas da Recorrente, não contraditado por qualquer prova efectuada pela Contra-interessada” de que o espaço ocupado pela floreira lhe pertence.
A Recorrente indica como prova testemunhal que impõe decisão diversa da que foi acolhida na sentença, o depoimento Engº Hugo Pinto, testemunha por si arrolada, e o depoimento do Arqº ... , testemunha arrolada pela Contra-interessada.
Sobre o primeiro testemunho invoca que há dificuldades na audição da gravação, mas que o depoimento incide quase totalmente sobre a questão da floreira, tendo a testemunha referido que “Esse espaço faz parte do edifício” e, quando confrontada com o doc nº 21 junto com a oposição, afirmado que “Sim…os tapumes deixam de fora …Sim. Trata-se de uma floreira e do piso 7 para baixo esse espaço pertence ao ... , onde passam as tubagens”.
Nestas transcrições (mas também na parte não transcrita, de que ouvimos integralmente a gravação) apenas está vertida uma opinião incapaz de revelar que o espaço em questão está ou não localizado no lote que é propriedade da Recorrente.
Quanto ao depoimento do Arqº ... , autor do projecto de construção da ampliação do ... , em que confirma que o

projecto incluiu a área ocupada pela floreira e que essa inclusão se baseou nos elementos que lhe foram disponibilizados - um levantamento topográfico e a configuração da empena do ... , encontrando-se a floreira fora do alinhamento dessa empena, acrescentando ainda que até ao momento não tem nenhuma prova sobre a quem pertence o espaço, mas, a provar-se que pertence à ... , retirará imediatamente essa projecção e deixará o espaço vazio, o que não exige alteração do projecto, bastando fazer uma correcção a incluir nas telas finais.
Ora, a Recorrente transcreve a seguinte passagem do depoimento desta testemunha - “Se efectivamente o meu projecto estiver a criar um ónus sobre um terreno do meu vizinho, obviamente que tem ali um erro que tem de ser corrigido e com o qual eu, com o meu termo de responsabilidade, obrigo-me a corrigir” – para dizer que, com este testemunho, a Contra-interessada não podia “garantir que a parcela de terreno fosse propriedade” sua.
Evidentemente que a Contra-interessada não garantiu nem garante que o espaço ocupado pela floreira lhe pertence, mas não é esse o facto a provar. A provar é se esse espaço pertence à Recorrente.
Curiosamente, o sentido deste depoimento até é contrário à pretensão da Recorrente.
Por fim, resta dizer uma palavra sobre o último argumento esgrimido pela Recorrente e que deixámos já identificado antes sob a al. c).
Ao que parece a Recorrente veio invocar, só em sede do presente recurso, a aquisição da propriedade do espaço de terreno em que se encontra implantada a floreira por usucapião.
Porém, não tendo apresentado documento da sentença transitada em julgado a reconhecer-lhe essa invocada aquisição originária, nenhuma prova logrou fazer de que o terreno lhe pertence.


Portanto, de tudo o que ficou exposto, impõe-se concluir que bem andou a Srª Juiz ao dar por indiciariamente não provada a factualidade constante do nº 7 improcedendo também a Conclusão 14ª das alegações da Recorrente.
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Por fim, na Conclusão 15ª, a Recorrente insurge-se por a sentença recorrida ter dado por não provado o facto descrito sob o nº 9, onde consta que “Até ao presente não foram ponderadas pela Contra-Interessada quaisquer alterações aos seus projectos”, entendendo dever o mesmo ser aditado à matéria de facto dada por provada.
Sustenta que essa factualidade deve ser dada por provada, uma vez que não foi submetida à aprovação da Recorrida CML qualquer alteração aos projectos da Contra-interessada e que resulta da correspondência trocada entre a ... e a ... e, bem assim, dos depoimentos do Engº Hugo Pinto e Engº ... Lúcio (parcialmente transcritos) que a última sempre se mostrou indisponível para encontrar uma solução.
Também aqui não lhe assiste razão.
Da correspondência trocada entre a Recorrente e a Contra-interessada vertida nas alíneas ZZZ), AAAA) e BBBB) decorre: por um lado, que a Contra-interessada não pondera alterar o seu projecto para a área reduzida do espaço ocupado pela estrutura monolítica do Semapa e, por outro, que a ... não está disponível para uma solução que passe pela eliminação da parte da estrutura monolítica que invade o terreno da ... , pelo menos a expensas suas (conforme naquelas duas primeiras alíneas, resulta dos termos da disponibilidade da ... para aceitar a implementação de soluções pela ... só “caso as mesmas passem por trabalhos sobre os recalces existentes).


De qualquer maneira, o facto em questão sempre seria irrelevante para o que há a apreciar e decidir nestes autos.
Na verdade, a Recorrente defende que o facto de a Contra-interessada ter ou não ter ponderado alterações ao seu projecto relevaria na apreciação do pedido alternativo que formulou, uma vez que pediu “a suspensão de eficácia até à decisão final e, alternativamente, o decretamente de tal suspensão apenas até que a Contra-interessada submetesse a aprovação da Câmara Municipal Lisboa as alterações ao projecto necessárias a compatibilizá-lo com a realidade existente no local”.
Porém, como contrapõe a Contra-interessada, a Recorrente, verdadeiramente, não formula um pedido alternativo, pois «Em concreto, dizer que, em alternativa, as providências devem ser decretadas “até que a Contra-interessada obtenha a aprovação de alteração ao projecto que corrija as ilegalidades apontadas” é o mesmo que nada dizer, porquanto tal pedido é, no fundo, no sentido de as providências serem decretadas até que as alegadas ilegalidades desapareçam – o que sempre corresponderia, logicamente, à consequência normal de qualquer providência cautelar que deixe de ter fundamento».
Posto isto também é de concluir pela improcedência da Conclusão 15ª das alegações de recurso.
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Apenas uma breve nota a respeito das considerações tecidas pela Recorrente sobre a condução da audiência de julgamento pela Mma. Juiz a quo , vertidas sobretudo nesta parte das alegações mas que também se encontram em outros lugares da mesma peça processual.
São observações, considerações que, para além de violarem o dever de correcção estabelecido nos nºs 1 e 2 do art. 266º-B do CPC (correspondente ao actual art. 9º, nºs 1 e 2) a que a Recorrente está sujeita, são objectivamente infundadas (o que se alcança com audição da gravação da audiência) perante os

poderes de direcção da audiência conferidos pelo art. 650º, nºs 1 e 2, als a), b), c) e d) do diploma citado [(correspondente ao actual art. 602º, nº2, als a), b), c) e d)].
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B – DO ALEGADO ERRO DE JULGAMENTO QUANTO À MATÉRIA DE DIREITO

A Recorrente insurge-se contra a sentença recorrida por ter julgado improcedente a suspensão de eficácia:
- Da deliberação da Câmara Municipal de Lisboa, de 4/03/2009, que aprovou o projecto de arquitectura de construção/ampliação do empreendimento turístico ... Hotel, e do despacho do Vereador do Urbanismo e Planeamento, de 30/12/2009, que deferiu o pedido de licenciamento, a que a Recorrente imputara vícios de violação de lei por erro de direito por violação da al. c) do nº 2 do art. 133º do CPA, por violação do direito de propriedade consagrado no art. 62º da CRP e vícios de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto;
- do despacho da Sra. Arquitecta da mesma Câmara, de 5/05/2010, que procedeu à alteração do prazo da licença de 24 para 60 meses, a que imputara vícios de forma - por incompetência e por falta de fundamentação - e vícios de violação de lei.
Por razões de economia e de clareza quanto aos termos da reapreciação da decisão recorrida, deixa-se consignado um esclarecimento que segue.


Nesta parte reservada à apreciação do mérito do recurso, a Recorrente retoma frequentemente a impugnação da matéria de facto - repetindo argumentos anteriores ou introduzindo nova argumentação.
Porém, não tendo logrado obter provimento em qualquer dos erros de julgamento sobre a apreciação e valoração da prova que assacou à sentença recorrida, a factualidade a ponderar é exclusivamente a que foi dada por indiciariamente provada pelo tribunal a quo e que se mostra transcrita sob o ponto A), desconsiderando-se o inconformismo que a Recorrente mantém com a parte da decisão recorrida respeitante à matéria de facto.

1 - Sobre a parte da sentença que julgou não verificado o requisito da al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA

A Recorrente sustenta que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, por não ter considerado ser manifestamente evidente que:
- A deliberação camarária de 4/03/2009, que aprovou o projecto de arquitectura de construção/ampliação do empreendimento turístico ... Hotel, enferma de vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto, por ter aprovado um projecto que se propõe utilizar o espaço pertencente à Recorrente em que, à superfície, está implantada uma floreira (Conclusão 17ª);
- o despacho de licenciamento da respectiva construção de 30/12/2009, proferido pelo vereador do Urbanismo e Planeamento, enferma de vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto, por não estar “devidamente representada, no projecto objecto de aprovação, a existência dos recalces no terreno onde irá ser executado o projecto pela Contra-Interessada” (Conclusão 18ª).


Vejamos.
a)- Quanto ao erro sobre os pressupostos de facto imputado à deliberação camarária, a Recorrente reinsiste que a sentença devia ter dado por provado que o espaço em que está implantada a floreira do ... lhe pertence.
Na reapreciação da matéria de facto, deixámos dito que nenhum erro de julgamento podia ser assacado à sentença recorrida por ter dado por indiciariamente não provado que esse espaço pertence à ... .
No entanto, ainda aqui a Recorrente volta a insistir que “sempre terá ficado demonstrado que, pelo decurso do prazo (mais de 40 anos) sobre a construção do ... , tem que considerar-se indiciariamente verificada uma situação de usucapião”.
Esta forma de aquisição do terreno em que se encontra implantada a floreira vem suscitada pela primeira vez em sede do presente recurso, não tendo, consequentemente, sido apreciada pelo tribunal a quo. É, pois, uma questão nova (um fundamento de facto e direito relevante para a causa não suscitado nem apreciado pelo tribunal recorrido e não apenas um argumento ou raciocínio novo), que, não sendo matéria de conhecimento oficioso, não pode ser objecto do presente recurso.
Não obstante, para além do que já dissemos antes (de que não foi junto o respectivo documento probatório), a questão da aquisição originária da propriedade dessa parte de terreno é uma questão de direito privado (a dirimir nos tribunais comuns) para a qual a jurisdição administrativa é materialmente incompetente.
Por conseguinte, com relevância para uma apreciação sumária e perfunctória do referido vício (segundo a Recorrente, por aprovar um projecto que se propõe utilizar parte do terreno de que proprietária, onde está implantada a floreira), apenas há que ponderar a factualidade dada por indiciariamente provada na alínea NNNN).
Ora, tendo ficado apenas assente que o projecto aprovado se propõe utilizar espaço ocupado pelo ... , é óbvio que a factualidade indiciada é insuficiente para emitir um juízo de manifesta procedência da acção principal com fundamento na manifesta ilegalidade do acto camarário de aprovação do projecto.
Sendo assim, nenhum reparo merece a sentença recorrida ao considerar não verificado o requisito da al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA com o alegado fundamento de erro sobre os pressupostos de facto assacado à deliberação suspendenda de aprovação do projecto de ampliação do Hotel, improcedendo a Conclusão 17ª e a 2ª parte da Conclusão 22ª.
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b)- Quanto ao erro sobre os pressupostos de facto assacado ao despacho suspendendo de licenciamento, por ter sido proferido sem ter em consideração que parte do terreno a utilizar na ampliação do ... está ocupado pelas fundações do ... (por não terem sido devidamente representados, no projecto aprovado, os recalces existentes no terreno onde a ampliação irá ser executada), a Recorrente veio dizer expressamente o seguinte:
“(…) alegou, a título principal, no seu requerimento inicial, que o projecto licenciado pelos actos suspendendos padece de vício de violação de lei por erro quanto aos pressupostos de facto por do mesmo constar uma errada representação da realidade existente, concretamente uma errada representação dos recalces existentes no terreno da Contra-Interessada, monoliticamente ligados às fundações do edifício da ora Recorrente, e construídos ao abrigo de licença emitida pela CML nos anos 60”.
Supomos que a Recorrente pretendia dizer que o acto (e não o projecto) de licenciamento “padece de vício de violação de lei por erro quanto aos pressupostos de facto por do mesmo (projecto, objecto do acto administrativo de licenciamento) constar uma errada representação da realidade existente (…)”.
Feita esta breve observação, analisemos então as razões de discordância invocadas contra a sentença recorrida.
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A Recorrente não se conforma com a parte da sentença que considerou não estar “demonstrada qual a realidade existente no subsolo do prédio da CI e/ou que a realidade existente corresponda ao projecto aprovado pela CML relativamente ao edifício da Requerente”, não tendo esta logrado “(…) demonstrar – indiciariamente – que executou ipsis verbis o projecto e que o projecto executado foi aprovado”. Ou seja, não se conforma com a decisão de que o erro sobre os pressupostos de facto assacado ao acto de licenciamento não ficou demonstrado.
Argumenta que, atendendo a que ficou provado que “para além de ter sido objecto de licenciamento pela CML, o Edifício da ora Recorrente foi, à época, objecto da necessária vistoria e de licença de utilização”, a sentença não podia ter deixado de concluir - em conformidade com o que dispõem o nº 2 do art. 26º do Decreto-Lei nº 445/91, de 20/11, o nº 2 do art. 62.º do RJUE e o princípio da presunção de legalidade dos actos administrativos - que os recalces foram executados tal como foram previstos no projecto aprovado pela CML em 1969, pelo que, tendo concluído diferentemente, violou as citadas disposições e este princípio.
Vejamos.
Os preceitos invocados pela Recorrente dispõem respectivamente que “A licença de utilização destina-se a comprovar a conformidade da obra concluída com o projecto aprovado (…) e que “a autorização de utilização de edifícios (…) destina-se a verificar a conformidade da obra concluída com o projecto aprovado (…)”.

Não sendo aqui o lugar próprio para proceder a uma delimitação precisa do sentido e alcance das disposições citadas, sempre diremos que a factualidade indiciariamente apurada nas alíneas C) a E) revela que a vistoria efectuada ao ... e a licença de utilização não comprovam, no que respeita às fundações do ... , que os recalces foram executados tal como constam do projecto.
Na verdade, apesar da construção desse edifício de 17 pisos ter terminado em 1969, a vistoria para a sua utilização foi realizada mais de 20 anos depois, ficando até a constar do respectivo auto que as obras ficaram concluídas em Setembro de 1991, e a constar da subsequente licença de utilização – que apenas foi emitida em 28 de Setembro de 1992 – que o edifício possui 18 pavimentos.
É, pois, uma evidência que a vistoria realizada após a conclusão do edifício (no caso mais de vinte anos depois) não verifica a conformidade ou desconformidade da execução das fundações com o projecto de construção licenciado e, consequentemente, a licença de utilização que é emitida com base no resultado dessa vistoria também não pode servir para demonstrar que as fundações, e designadamente os seus recalces, foram executados tal como constam do projecto.
Quanto à presunção de legalidade dos actos administrativos invocada pela Recorrente, sempre se referirá, acompanhando a Contra-interessada, que para além de ser desde logo muito questionável a sua existência por não se encontrar expressamente prevista em qualquer disposição legal, actualmente deixou de ter razão o apelo à figura: por um lado, porque a relevância do acto administrativo anulável não precisa de se fundar numa presunção de validade por “corresponder a uma fattispecie autónoma” (cf. M. Aroso de Almeida, “Teoria Geral do Direito Administrativo”: temas nucleares, pág. 176); por outro, porque a evolução conseguida no âmbito do contencioso administrativo não se harmoniza já, no plano processual, com a inversão do ónus da prova fundada na referida presunção e que foi determinante de que fossem sempre os particulares a suportar as consequências das situações de incerteza sobre validade dos actos administrativos (cf. M. Aroso de Almeida, obra antes citada, pág. 181). Na jurisprudência vejam-se Acs do STA de 3-12-2002, proc nº 47574; de 24-1-2002, proc. nº 48154; de 26-1-2000, proc. nº. 37739; de 24-11-1999, proc. nº 32434; e de 5-5-1995, proc. nº 44837.
Serve isto apenas para dizer que a Recorrente também não tem razão quando pretende, em juízo, extrair da pretensa presunção de legalidade do acto de licenciamento do ... (e da emissão da licença de utilização), a consequência de que tem de considerar-se que os recalces foram executados tal como previstos no projecto aprovado pela CML em 1969.
Mas a Recorrente ainda volta a insistir no erro de julgamento da decisão do tribunal a quo sobre a matéria de facto dada por indiciariamente não provada no ponto 4, dizendo que, “tendo os recalces sido construídos ao abrigo de licença emitida pela CML (…) e não tendo havido qualquer oposição ao longo de 40 anos, a sentença não podia ter deixado de presumir que os recalces em causa foram devidamente autorizados, não tendo sido executados em violação dos direitos dos proprietários do terreno vizinho (…).
Esta questão foi reapreciada no ponto A), tendo-se aí decidido que a sentença recorrida não padece de erro de julgamento ao ter decidido dar por indiciariamente não provado que “A ocupação de parte do terreno com os recalces das fundações do ... não poderia ter deixado de ser conhecida e aceite pelos então proprietários do imóvel à época”.
*

A Recorrente também discorda da sentença recorrida na parte em que considerou que, uma vez que os actos suspendendos foram praticados no âmbito de uma competência vinculada, mesmo que tivesse ficado provado que a CML proferiu o despacho suspendendo de licenciamento com desconhecimento da “realidade existente” (e não ficou), não podia concluir-se que a Câmara pudesse “indeferir o pedido apresentado pela Contra-interessada de licenciamento com fundamento em que o mesmo colidia com as fundações invasivas do edifício propriedade da Requerente, antes de mais porque os motivos de indeferimento da licença de obras de construção estão taxativamente fixados na lei – cfr. artigo 24º do RJUE”.
Em síntese, objecta a Recorrente, de forma pouco clara, que o acto de aprovação do projecto de arquitectura, que antecede o acto de indeferimento do licenciamento, não é um acto vinculado uma vez é um acto “eminentemente discricionário, relevando dos mais puros poderes administrativos, isto é, dos poderes de apreciação técnica, consubstanciados em juízos eminentemente técnicos – a chamada discricionariedade técnica”.
Chamando à colação o disposto no art. 20º do DL 555/99, de 16/12 (RJUE), alega que a apreciação do projecto de arquitectura também incide sobre a sua conformidade com a inserção urbana e paisagística das edificações e que essa apreciação, não estando legalmente definida, se integra no âmbito da discricionariedade técnica, sendo “precisamente nesse âmbito que relevam os pressupostos de facto relativos às edificações envolventes e às condições existentes e, no caso, a existência de recalces monoliticamente ligados às fundações do edifício vizinho”. E acrescenta que o acto de indeferimento do licenciamento de operações urbanísticas, embora eminentemente vinculado, também inclui situações de indeferimento que decorrem do


uso de poderes discricionários, como resulta das alíneas a) a e) do nº 2 do art. 24º do RJUE.
Nesta parte afigura-se-nos que a Recorrente suscita uma questão nova, como parece ser de concluir do facto de não haver, no requerimento inicial, qualquer menção àquelas disposições legais, nem estar imputada a respectiva violação aos actos de aprovação do projecto de arquitectura e de licenciamento da construção/ampliação do Hotel.
Seja como for, a Recorrente não logrou provar que o acto de licenciamento foi proferido em erro sobre os pressupostos de facto consistente no desconhecimento pela CML da realidade existente nas fundações do ... .
Mas mesmo que indiciariamente o provasse e pudesse considerar-se que esse erro ocorre no âmbito do exercício de poderes de discricionariedade técnica, ainda assim não poderia concluir-se, sem mais, tratar-se de um erro determinante da procedência da acção principal.
Para tanto basta atentar em que o erro que a Recorrente assaca a esse acto é o de uma parte do terreno que não pertence à Recorrente estar ocupado com as fundações do seu edifício, não estando disponível para a execução do projecto da Contra-interessada que foi dimensionado para toda a área do lote de terreno de que a mesma é proprietária, desconsiderou aquela ocupação.
Ora, o que nesta parte do recurso está em questão é saber se é de ter por preenchido o requisito da al. a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA.
E como é consabido, a ilegalidade que preenche esta disposição legal é a que resulta de uma simples leitura do requerimento inicial e da oposição, que se impõe ao jurista médio, imediata e incontroversamente e se apresenta com forte probabilidade de assegurar que a pretensão formulada ou a formular no processo principal será julgada procedente.


Ora, a extensa e complexa argumentação que a Recorrente tem de desenvolver não só para fundamentar uma pretensa consolidação jurídica da sua situação de ocupação do terreno alheio como também para demonstrar a ilegalidade do acto suspendendo, revela, com absoluta segurança, que não é evidente a procedência da pretensão formulada no processo principal com fundamento no erro sobre os pressupostos respeitante aos recalces das fundações do ... .
Na verdade, a manifesta ilegalidade exigida pela citada disposição é uma situação de verificação excepcional, rara, apreensível imediatamente sem necessidade de averiguações ou de complexas ponderações, como é reconhecido pela generalidade da doutrina pela doutrina (exemplificativamente Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, na anotação 1 ao art. 120º do CPTA, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 1ª edição, Almedina, 2005, a págs. 601/603, e Ana Gouveia Martins, in Tutela Cautelar no Contencioso Administrativo, Coimbra Editora, 2005, a págs. 507/508) e é reiteradamente afirmado pelos tribunais administrativos, como exemplificativamente se vê, com alguma pertinência para o caso em apreço, nas breves passagens dos seguintes dois acórdãos do STA: de 24/09/2009, proc. 0821/09 - «Com efeito a ilegalidade do acto só é «evidente» se algum dos vícios arguidos contra o acto for manifesto, indubitável, claro num primeiro olhar. “Evidente” é o que se capta e constata “de visu”, sem a mediação necessária de um discurso argumentativo cuja disposição metódica permitirá o conhecimento, “in fine”, do que se desconhecia “in initio”. Porque as evidências não se demonstram, nunca é evidente a ilegalidade do acto fundada em vícios cuja apreciação implique demonstrações, ou seja, raciocínios complexos através dos quais se transite de um inicial estado de dúvida para a certeza de que o vício afinal existe»; e de 06.12.2012, proc. n.º 0913/12 «Quando é que se deve considerar que é evidente a procedência (ou improcedência) da pretensão a formular na acção? Qual é


a certeza que a lei exige para que, logo no processo cautelar, se deva considerar que o processo principal está, fatalmente, votado ao sucesso (ou ao fracasso)?
3.1. Uma coisa evidente é uma coisa que não necessita de demonstração ou, apropriando-nos duma expressão popular, é «uma coisa que entra pelos olhos dentro». E, porque assim, sempre que para se chegar a uma conclusão sejam necessários diversos e complexos raciocínios é porque a mesma não é evidente. Se o fosse, essa evidência seria imediatamente apreensível e tais raciocínios seriam dispensáveis».
No mesmo sentido e ainda exemplificativamente Acs do STA de 11.12.2007, proc. n.º 0210/07 (Pleno); de 09.12.2009, proc. n.º 0799/09; de 18.03.2010, proc. n.º 0105/10; de 25.08.2010, proc. n.º 0637/10; de 27.07.2011, proc. n.º 0520/11; de 25.09.2012, proc. n.º 0588/12; de 26.09.2012, proc. n.º 0720/12; de 06.11.2012, proc. n.º 0855/12; de 30.01.2013, proc. n.º 01253/12 - todos consultáveis em www.dgsi.pt.
De tudo o que ficou dito, é manifesta a falta de razão da Recorrente nos ataques feitos à sentença recorrida por não ter considerado verificado o requisito da da al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA com fundamento numa evidente procedência da acção principal sustentada no alegado erro sobre os pressupostos de facto assacado ao acto de licenciamento.
Assim, improcedem também as Conclusões 18ª a 21ª e a 1ª parte da Conclusão 22ª.

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c)- Embora já em sede da al. b) do nº 1 do art. 120º do CPTA, a Recorrente continuou a tecer críticas à sentença sobre a decisão respeitante à invocada “impossibilidade física e jurídica do objecto actos suspendendos”.


Com efeito, designadamente nas Conclusões 24ª e 25ª, veio alegar que é manifesto o erro de julgamento da sentença “quanto à incompatibilidade entre o projecto aprovado pela licença suspendenda e a realidade de facto existente no terreno da Contra-interessada – e à consequente impossibilidade parcial de tal objecto – pois (…) a execução do primeio implica necessariamente a eliminação (…) ou, pelo menos, alteração dos recalces”, pelo que “A licença de construção ora impugnada (e a deliberação que aprovou o projecto de arquitectura) (…) padece (…) de nulidade nos termos da al. c) do nº 2 do artigo 133º do CPA”.
Dado que se impunha ao tribunal a quo apreciar a questão do “objecto parcialmente física e juridicamente impossível” dos actos de aprovação do projecto e do licenciamento no âmbito da al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA, entendemos ser aqui o lugar próprio para apreciar o erro de julgamento invocado pela Recorrente.
Vejamos então.
A sentença, numa apreciação sumária própria dos processos cautelares”, entendeu não ser evidente que “os actos suspendendos têm objecto físico impossível” e “também não têm não objecto juridicamente impossível pois incidem sobre o prédio identificado em A), inscrito a favor da CI”.
O assim decidido não merece qualquer censura.
Com efeito, bastará atentar na passagem do douto ac. do STA de 24-02-2011, proc. 841/10 (relator - Conselheiro Rui Manuel P.F. Botelho) para ser evidente o acerto da decisão judicial em sede cautelar: «A impossibilidade de objecto de que fala a norma tem que ser uma impossibilidade absoluta, física e jurídica, agora e no futuro conhecido. “São de objecto impossível os actos cujo efeito ou medida seja jurídica ou fisicamente impossível e não quando se trata apenas de efeitos proibidos da ordem jurídica” (CPA, 2.ª edição, de Esteves de Oliveira e outro). No dizer do acórdão deste STA de 28.10.10, proferido no recurso 551/08, “A nulidade prevista no art. 133º, n.º 2, al. c) do CPA tem em vista uma impossibilidade total de objecto do acto, por falta de substrato pessoal,

material ou jurídico”. No caso em apreço, a impossibilidade física não se verifica pois o prédio para onde iria ser transferido o posto de venda de combustíveis existe e está lá. Impossibilidade jurídica também não, pois esse prédio, precisamente por existir, é um objecto viável de actos jurídicos não ocorrendo qualquer impossibilidade de sobre ele incidirem negócios que se reflictam na sua titularidade.»
Sem necessidade de outras considerações, improcedem também as Conclusões 24ª a 27ª das alegações da Recorrente.
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2 - Sobre o “fumus boni iuris” da al. b) do nº 1 do art. 120º do CPTA
Tendo a sentença recorrida julgado não ser evidente a procedência da acção principal por manifesta ilegalidade dos actos suspendendos, entendeu, no entanto, não ser manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada no processo principal, assim julgando preenchida a formulação negativa do “fumus boni iuris” (“fumus non malus iuris”), passando, assim, à apreciação do primeiro requisito cumulativo (“periculum in mora”) da concessão das providências consevatórias.
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3 - Sobre o requisito do “Periculum in mora”
Quanto a este requisito, o tribunal “a quo” entendeu que não se verificava o “risco para a segurança das pessoas e bens” invocado pela Recorrente por não ter ficado “demonstrado que se verifique fundado receio de a CI prosseguir as obras e dessa forma colocar em risco a segurança do edifício da Requerente”, concluindo que, com a improcedência do presente processo, não só “não há fundado receio da constituição

para a Requerente ou para a segurança de pessoas e bens de uma situação de facto consumado”, como também não há “produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que a Requerente visa assegurar com o processo principal”.
A Recorrente não se conforma com o assim decidido, sustentando que o requisito do “periculum in mora” se verifica inequivocamente e que, por isso, a sentença padece, nesta parte “de manifesto erro de interpretação e aplicação do nº 1 do artigo 120º do CPTA”.
É prévio fazer um ponto de ordem.
A Recorrente vem dizer que “Não pode nesta sede deixar de partir-se do pressuposto ou da presunção de que tais recalces foram executados em conformidade com o projecto aprovado pela CML, tendo em vista a emissão da correspondente licença de utilização para esta entidade, sendo certo que, como referido supra, tal foi confirmado de forma expressa pela testemunha Engº Hélder Gomes”.
Ou seja, reinsiste numa factualidade que não logrou provar, como se observou no ponto 3.1, pelo que, na apreciação que se seguirá, não se partirá do “pressuposto” pretendido pela Recorrente de que os recalces foram executados em conformidade com o projecto do ... aprovado pela CML.
Clarificado este aspecto, apreciemos as razões de discordância da Recorrente com a decisão judicial.
Antes, porém, umas breves considerações sobre o requisito agora em apreço.
A verificação do “periculum in mora” exige que haja fundado receio (receio objectivo) da constituição de uma situação de facto consumada ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.
Conforme se vê em Mário Aroso de Almeida (“Manual de Processo Administrativo”, 2010, págs 475 e 476) “... se não falharem os demais critérios de que depende a concessão da providência, ela deve ser, pois, concedida desde que os factos concretos

alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade. É este o único sentido a atribuir à expressão «facto consumado». Nestas situações, em que a providência é necessária para evitar o risco da infrutuosidade da sentença a proferir no processo principal, o critério (…) tem de ser o da viabilidade do restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar (…). Do ponto de vista do periculum in mora, a providência também deve ser, entretanto, concedida quando, mesmo que não seja de prever que a reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade se tornará impossível pela mora do processo, os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio da produção de «prejuízos de difícil reparação» no caso de a providência ser recusada, seja porque a reintegração no plano dos factos se perspetiva difícil, seja porque pode haver prejuízos que, em qualquer caso, se produzirão ao longo do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar ou, pelo menos, de reparar integralmente. Ainda neste último caso, justifica-se a adopção da providência para evitar o risco do retardamento da tutela que deverá ser assegurada pela sentença a proferir no processo principal (…)”. No mesmo sentido o mesmo autor e C.A. Fernandes Cadilha, in “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2ª ed., 2007 págs 704 e seg., nota 4.
Assim, no caso, impunha-se ao julgador saber, em primeiro lugar, se, de uma ponderação dos factos que foram dados por indiciariamente provados, se mostrava razoável extrair, segundo as regras da ciência, lógica e experiência comum, a existência de um receio de uma situação de efectivo “risco para a segurança das pessoas e bens”, ou se a alegação desse receio correspondia apenas a um receio de um risco meramente hipotético, eventual ou conjectural.
Conforme escreve Mário Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha, obra antes citada, pág. 703, “Tal como sucede para a atribuição de providências cautelares não especificadas em processo civil, com o artigo 381º nº 1 (e com o artigo 387º nº 1), do C. Proc. Civil, exige-se, antes de mais, um “fundado receio” quanto a ocorrência de determinadas

circunstâncias. Significa isto que o juízo sobre o risco dessa ocorrência deve ser sustentado numa apreciação das circunstâncias específicas de cada caso, baseada na análise de factos concretos, que permitam a um terceiro imparcial concluir que a situação de risco é efectiva, e não uma mera conjectura, de verificação apenas eventual”.
E também como refere Vieira de Andrade, in “A Justiça Administrativa”, (Lições), 4ª ed., pág. 298, “… o fundado receio há-de corresponder a uma prova, em princípio a cargo do requerente, de que tais consequências são suficientemente prováveis para que se possa compreensível ou justificada a cautela que é solicitada”.
Revertemos, então, ao caso “sub judice”.
Em nossa máxima síntese, a Recorrente sustenta que:
- O “periculum in mora” deve ser apreciado exclusivamente em relação à execução do projecto da Contra-interessada nos termos em que foi licenciado, sem considerar hipotéticas soluções alternativas;
- a execução que seja feita nesses termos do projecto aprovado implica a eliminação de parte das fundações do ... ;
- essa eliminação poderá implicar “grave risco das fundações desse edifício” (de ruína), com “risco para a segurança das pessoas e bens”;
- a titularidade do licenciamento constitui um permanente perigo eminente, por permitir, a todo o momento, executar o projecto tal como foi concebido (seja a sua execução pela CI, seja a sua execução por terceiro que um eventualmente adquira o terreno), sendo que o prazo para a execução da obra é limitado, o cronograma apertado e que a CI invocou ter urgência na abertura do hotel e ter elevados prejuízos por cada dia de atraso no início da obra;
- só este perigo de execução a todo o tempo pode ter sido considerado pelo tribunal “a quo”.
Ora, da sentença recorrida, expressa ou implícitamente, recolhe-se uma ponderação conscienciosa em ordem a apurar a verificação, ou não, do “periculum in mora” invocado:

- Por um lado, uma ponderação de que a Contra-interessada – apesar de ter um prazo limitado para a execução da obra, um cronograma apertado, ter urgência na abertura do hotel e elevados prejuízos por cada dia de atraso no início da obra - perante indícios de existência de fundações do ... no seu terreno, não hesitou, por sua exclusiva iniciativa e com fundamento em razões de segurança do ... , suspender a execução todos os trabalhos, com desmobilização de todos os meios humanos e materiais (com desmontagem do estaleiro), mantendo essa suspensão até ao presente;
- por outro, uma ponderação do alegado receio de “risco para a segurança das pessoas e bens” com fundamento apenas no facto de a Contra-interessada ser titular do licenciamento de ampliação do ... projectado para todo o terreno (solo e subsolo) de que é proprietária e, por isso, poder executar, a todo o momento, o projecto, com total desconsideração pelas consequências decorrentes de um corte simples e puro da parte das fundações do ... invasivas do lote de terreno da Contra-interessada.
Da ponderação conjunta de todos elementos em presença, a sentença concluiu, como já dissemos, não ter ficado “demonstrado que se verifique fundado receio de a CI prosseguir as obras e dessa forma colocar em risco a segurança do edifício da Requerente”, concluindo que, com a improcedência do presente processo, não só “não há fundado receio da constituição para a Requerente ou para a segurança de pessoas e bens de uma situação de facto consumado”, como também não há “produção de prejuízos de difícil reparação.
Entendemos que a sentença também não merece censura nesta parte.
O alegado receio de concretização do risco de segurança para pessoas e bens invocado pela Recorrente é meramente abstracto e conjectural, conforme se alcança da síntese que acima fizemos da argumentação vertida na sua alegação de recurso, das Conclusões transcritas em I (28ª a 32ª), da desconsideração pelo circunstancialismo fáctico apurado (algumas vezes ignorando-o ou substituindo-

o pelo seu entendimento do que deveria ter sido dado por provado) e da falta de uma análise objectiva e lógica dos factos.
Assim sendo, improcedem também as Conclusões 28ª a 32ª.
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4 – Nestes termos, tal como foi igualmente decidido na sentença recorrida, por não se encontrarem reunidos todos os requisitos contidos na al. b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, sendo os mesmos de verificação cumulativa, a falta de verificação do requisito periculum in mora torna desnecessária a apreciação do requisito ponderação de interesses previsto no nº 2 do artigo 120º do CPTA, pelo que necessariamente improcedem as demais conclusões da alegação da Recorrente ( 33ª a 36ª).
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5 - Ficam prejudicados, quer a apreciação do recurso interposto pela Contra-interessada ao abrigo do art. 684º-A do CPC (actual 636º do novo CPC), ex vi arts 1º e 140º do CPTA, quer o pedido pela mesma formulado de imposição à Recorrente de uma prestação de garantia no valor de seis milhões novecentos e quarenta mil e cento e dez euros.

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Acordam pois os juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo, deste TCAS em:
A) Negar provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmar a sentença recorrida;
B) Julgar prejudicados o recurso interposto pela Contra-interessada e o pedido pela mesma formulado de imposição à Recorrente de uma prestação de garantia.

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Custas pela Recorrente.

Lisboa, 24 de Julho de 2014