Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:36/18.5BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:09/20/2018
Relator:SOFIA DAVID
Descritores:REPETIÇÃO DE PROVIDÊNCIA CAUTELAR
CAUSA DE PEDIR NUM PEDIDO DE SUSPENSÃO DE EFICÁCIA DE ACTO ADMINISTRATIVO
CONTRA-INTERESSADO
Sumário:I - A a causa de pedir numa acção cautelar, em que se requeira a suspensão de eficácia de um acto administrativo, não se recorta apenas - ou essencialmente - em função dos concretos vícios que sejam alegados, mas, diferentemente, afere-se com base na invocação da probabilidade do êxito da acção principal, frente ao direito que se invoca e considerando a correspondente e provável ilegalidade do acto suspendendo. Por seu turno, a ilegalidade do acto afere-se atendendo a uma concreta factualidade que também tenha sido invocada.
II - Ou seja, na providência cautelar de suspensão de eficácia a invocação de determinados vícios ou ilegalidades como determinantes da invalidade do acto suspendendo apenas importa na medida em que concorra para o preenchimento do pressuposto fumus boni iuris, ou para o juízo relativo à probabilidade do êxito da acção principal. Logo, o acrescento de tais invocações de Direito, com base numa mesma factualidade, não há-de configurar uma nova causa de pedir, substancialmente diversa de uma anterior, em que se alegassem menos ou diferentes vícios.
III- Assim, quando em relação a um mesmo processo principal, se intenta uma segunda providência cautelar de suspensão de eficácia de um acto administrativo, ainda que nessa segunda providência se venha a arguir vícios acrescidos face àqueles que se arguiram na providência anterior, sem a concomitante invocação de novos factos ou de factos de conhecimento superveniente, não há aqui que falar, em diferentes causas de pedir. As causas de pedir nestes dois pedidos de suspensão de eficácia são idênticas – invoca-se em ambos os casos a probabilidade do êxito da acção principal, por o acto suspendendo ser ilegal e inválido, à luz das mesmas circunstâncias fácticas, cujo conhecimento se detinha ab initio;
IV - A repetição de providências cautelares na dependência de uma mesma causa principal não deixa de ocorrer pela circunstância de se indicar nas mesmas diferentes Contra-interessados, sendo certo que estes não são partes na acção nos mesmos moldes das entidades públicas demandadas, mas um tertium genus, apenas verificável no processo administrativo impugnatório. Ou seja, a não indicação de determinados Contra-interessados numa dada acção cautelar não afasta a possibilidade de se considerar que existe uma situação de litispendência por se ter intentado duas acções cautelares contra as mesmas partes, porquanto as entidades públicas demandadas a título principal são as mesmas, quer em termos efectivos, quer do ponto de vista da sua qualidade jurídica.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

I - RELATÓRIO
L... A... interpôs recurso da sentença do TAF de Sintra, que julgou verificada a excepção de litispendência, rejeitando o requerimento cautelar.
Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões:”

(Texto no Original)

“.
O Recorrido Ministério da Saúde (MS), nas contra-alegações formulou as seguintes conclusões: “
(Texto no Original)

“.

O Recorrido SIC – Sociedade Independente de Comunicação, nas contra-alegações formulou as seguintes conclusões: “1. Não existem razões de facto ou de direito que justifiquem a demanda da ora Recorrida nos autos, nem a título principal, nem na qualidade de Contra-Interessada;
2.Quer as alegações do Recorrente, quer o requerimento inicial que apresentou com a interposição do presente procedimento cautelar, são ininteligíveis, sendo que, em momento algum se compreendem os fundamentos de facto e de direito que eventualmente poderiam levar às conclusões dos seus raciocínios, sempre na perspetiva de justificação da demanda da Recorrida;
3. Conforme decidiu, e bem, o TAF de Sintra, no seu douto despacho liminar, ora recorrido, verifica-se nos autos a exceção dilatória insuprível de litispendência;
4. O Recorrente intentou o presente procedimento cautelar com os mesmos fundamentos, causa de pedir e pedido que os procedimentos anteriores invocados na decisão recorrida;
5. O pedido formulado nos autos pelo Recorrente contra a Recorrida é nulo e inexistente, bem como inexiste qualquer fundamento de facto ou de direito passível de configurar causa de pedir invocável contra a Contra-Interessado Recorrida;
6. Deve ser negado provimento ao presente Recurso, assim se confirmando o Douto Despacho Liminar recorrido, o que se requer, com todas as consequências legais”.

O Recorrido Ministério da Administração Interna – MAI, nas contra-alegações formulou as seguintes conclusões: “1.Compulsados os autos, analisando-se da legalidade que estes comportam, é inequívoco que a sentença ora sob escrutínio respeita a lei e o direito;
II Não se encontram reunidos os requisitos legais estabelecidos nos n.ºs 1 e 2 do art.º 120.º do CPTA, para que a Providência Cautelar interposta pelo Requerente possa ser procedente, como se encontra claramente expresso e fundamentado na decisão de rejeição liminar do requerimento inicial apresentado pelo Requerente;
III. O Requerente já intentou Providência Cautelar contra o Ministério da Administração Interna, do despacho de 23 de março de 2015, proferido pela Senhora Ministra da Administração Interna, que o puniu com a pena disciplinar de Aposentação Compulsiva, tendo o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, através da sentença de 1O de agosto de 2015 (Proc.º n.º 2526/15.2BESNT), indeferido a providência cautelar requerida;
IV. Vem repetir agora o pedido de suspensão do citado despacho e de atos conexos, que são naturalmente decorrentes do ato punitivo praticado no âmbito do respetivo procedimento disciplinar, inexistindo qualquer novo pedido suscetível de apreciação;
V. Deste modo, não subsiste qualquer espécie de dúvida de que se verifica a exceção de litispendência;
VI. Para além do exposto, constata-se ainda a manifesta desnecessidade de tutela cautelar e a caducidade do direito do direito de ação, atendendo ao ato impugnado e à data da entrada em juízo dos presentes autos cautelares;
VII. É, pois, manifesta a extemporaneidade da presente ação cautelar, pelo que nos termos conjugados do artigo 123.º, n.0 1, alínea a), com os artigos 58.º e 59.0, todos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o prazo para a impugnação jurisdicional do ato encontra-se ultrapassado, determinando a preclusão do seu direito à apresentação da Ação, extinguindo-se, em consequência, o processo cautelar;
Sem prescindir;
VIII.O Ministério da Administração Interna reitera aqui toda a oposição oportunamente apresentada no âmbito da Providência Cautelar que correu os seus termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sob o Processo n.0 2526/15.2BESNT;
IX. O Requerente já intentou Providência Cautelar contra o Ministério da Administração Interna, do despacho de 23 de março de 2015, proferido pela Senhora Ministra da Administração Interna, que o puniu com a pena disciplinar de Aposentação Compulsiva, repetindo agora o pedido de suspensão do citado despacho e de atos conexos, que são naturalmente decorrentes do ato punitivo praticado no âmbito do respetivo procedimento disciplinar, inexistindo qualquer novo pedido suscetível de apreciação;
X. A interposição da presente ação cautelar é totalmente despropositada e inútil, não se entendendo porque é que o Requerente, de forma obscura, ininteligível, prolixa e de má-fé, insiste em questões colaterais e exógenas que nada têm a ver com os factos de natureza disciplinar que lhe são imputados, e sobre os quais foi promovido um procedimento disciplinar cuja tramitação não merece qualquer censura jurídica e no qual foram integralmente asseguradas as garantias de defesa do arguido, ora Requerente, resultando dos autos prova, quer documental, quer testemunhal, quer judicial, inequívoca da prática por este dos factos que lhe são imputados;
XI. Face ao descrito, é inequívoco que a sentença encontra-se devidamente estribada na lei e no direito aplicável, não padecendo de qualquer dos vícios invocados pelo ora Recorrente.”

A DMMP apresentou a pronúncia no sentido da improcedência do recurso.
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, vem o processo à conferência.

II – FUNDAMENTAÇÃO
II.1 – OS FACTOS
Em aplicação do art.º 663º, n.º 6, do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art.º 1.º e 140.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), por não ter sido impugnada, remete-se a matéria de facto para os termos em que foi decidida pela 1.ª instância.

II.2 - O DIREITO
As questões a decidir neste processo, tal como vêm delimitadas pelas alegações e contra-alegações de recurso e respectivas conclusões, são:
- aferir da nulidade decisória por a decisão recorrida ter omitido pronúncias relativas aos fundamentos de Facto e de Direito e não ter apreciado os prejuízos de difícil reparação para o requerente da providência;
- aferir do erro decisório porque, no caso, inexistia uma situação de litispendência, pois foram invocados mais vícios contra o acto suspendendo, acrescentados prejuízos, os 4.º, 5.º, 6.º e 7.º Contra-interessados não são partes no Proc. n.º 2526/15.2BESNT, porque não ocorreu a prolação de um despacho liminar e porque naquela acção não se conheceu dos actos conexos ao acto ora suspendendo, o despacho de 23-03-2015 da Ministra da Administração Interna, que aplicou ao ora Recorrente a pena disciplinar de aposentação compulsiva;
- aferir do erro decisório porque na decisão recorrida não foram apreciados os prejuízos de difícil reparação para o requerente da providência e porque o requerente da providência demonstrou que os pressupostos para o seu deferimento estavam preenchidos;

O juiz deve pronunciar-se sobre todas as questões que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras. Deve o juiz apreciar as questões respeitantes ao pedido e à causa de pedir, e ainda, os argumentos, as razões ou os fundamentos invocados pelas partes para sustentarem a sua causa de pedir. Na sentença, o juiz terá, igualmente, que discriminar os factos que considera provados e em que faz assentar o seu raciocínio decisório e deve indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas que conduzem à decisão final (cf. art.ºs 94.º, n.ºs 2, 3, 95.º, n.º 1, do CPTA, 607.º, n.ºs 2 a 4 e 608º, n.º 2, do CPC).
Não obstante, não tem o juiz que rebater e esmiuçar todos os argumentos e alegações avançados pelas partes, bastando-lhe, para cumprimento do dever de fundamentação, pronunciar-se sobre as concretas questões em litígio, demonstrando que as ponderou. Da mesma forma, tem o juiz que especificar todos os factos alegados e que têm relevo para a decisão, mas não tem que discriminar ou considerar os restantes factos invocados pelas partes, que não tenham relevância na decisão a tomar.
Por seu turno, só o incumprimento absoluto do dever de fundamentação conduz à nulidade decisória. Nestes termos, determina o art.º 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, que é nula a sentença que não especifique os fundamentos de Facto e de Direito que justificam a decisão. Igualmente, o art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, comina com a nulidade, a sentença que omita pronúncias que sejam devidas, ou para os casos em que o juiz conheça para além das questões de que podia tomar conhecimento.
Ou seja, só ocorre nulidade da decisão por falta de fundamentação se existir uma violação grave desse dever, quer porque na sentença se omita, de todo, o quadro factual em que era suposto assentar, ou este seja ininteligível; quer porque a sentença padeça, em absoluto, de falta de fundamentação de Direito, por não revelar qualquer enquadramento jurídico, ainda que implícito, de forma a deixar, no mínimo, decifráveis os fundamentos da decisão.
Ora, no caso em apreço o Tribunal ponderou as questões em litígio e decidiu-as. Explicou o Tribunal o seu raciocínio, alicerçando-o num elenco que Factos, que foram indicados na sentença, a que se seguiu uma apreciação de Direito, para, por fim, se decidir sobre a verificação da excepção de litispendência. Logo, com esta fundamentação não ocorre nenhuma nulidade por omissão de pronúncia. O Recorrente pode discordar daquela fundamentação, mas a mesma não é reconduzível a uma nulidade decisória.
Por conseguinte, falece a invocada nulidade da decisão.

Vem o Recorrente invocar um erro decisório alegando que, no caso, inexistia uma situação de litispendência, pois foram invocados mais vícios contra o acto suspendendo, acrescentados prejuízos, os 4.º, 5.º, 6.º e 7.º Contra-interessados não são partes no Proc. n.º 2526/15.2BESNT, porque não ocorreu a prolação de um despacho liminar e porque naquela acção não se conheceu dos actos conexos ao acto ora suspendendo;
Através desta acção o ora Recorrente pede a suspensão de eficácia do despacho de 23-03-2015, da Ministra da Administração Interna, que aplicou ao Recorrente a pena disciplinar de aposentação compulsiva e dos “actos administrativos conexos”.
Quanto a estes “actos administrativos conexos”, o A., ora Recorrente, não os identifica concreta e especificamente, nem nas suas alegações de recurso, nem no âmbito da PI entregue. Assim, tal como se indica na decisão recorrida, há apenas que considerar que através da presente providência se pretende a suspensão de eficácia do despacho de 23-03-2015, da Ministra da Administração Interna, com todos os efeitos que daí derivem. Quanto a outros actos que tenham sido proferidos, porque não vêm especificamente indicados pelo requerente com a indicação de quais são, quem os proferiu, em que data, ou qual o conteúdo que tiveram, não podem ser considerados como tendo sido alvo desta providência cautelar. Igualmente, quando o requerente da providência e ora Recorrente se refere a um pedido indemnizatório, estar-se-á a referir a algo que irá peticionar na acção principal e que não pode ser objecto desta providência cautelar. Logo, como se indica na decisão recorrida, ainda que o Recorrente venha a formular no processo principal pedidos em cumulação real, daí não resulta que através desta providência haja requerido algo diverso e para além do pedido de suspensão de eficácia do despacho de 23-03-2015, da Ministra da Administração Interna.
Quanto ao facto de não ter sido prolatado um despacho liminar prévio à decisão recorrida, que clarificasse ou identificasse estes actos conexos, tal não teria de ocorrer por não ter enquadramento legal. A decisão recorrida constitui o tal despacho e nela indica-se que os restantes pedidos do A. – para além do relativo à suspensão de eficácia – irrelevam, por não estarem correctamente formulados ou não poderem sê-lo no âmbito de uma providência cautelar.
Em suma, tal como decorre da causa de pedir e dos pedidos formulados na PI, há que concluir que através desta providência apenas se quis formular um pedido de suspensão de eficácia com relação ao indicado despacho de 23-03-2015, da Ministra da Administração Interna, não se visando com a presente acção cautelar quaisquer outros ou diferentes efeitos.
Por conseguinte, a presente providência visará acautelar a utilidade da sentença a proferir na acção principal, em que se formulará um pedido impugnatório contra o indicado acto, cumulado com outros pedidos, mormente o indemnizatório. Portanto, a causa de pedir nessa acção principal corresponderá à invocação da ilegalidade daquele acto, que se pretenderá irradicar da ordem jurídica, por sofrer de um desvalor jurídico.
Quanto à causa de pedir da presente acção cautelar, corresponde à invocação da existência de um periculum in mora, isto é, da existência de um dano ou perigo que se pretende acautelar, para assim evitar a infrutuosidade da sentença a proferir na acção principal, cumulado com a existência de fumus boni iuris, ou da probabilidade de o direito invocado na acção principal vir a vingar, sendo a mesma julgada procedente.
Num pedido de suspensão de eficácia de um acto administrativo, para confirmar a probabilidade do êxito da acção principal, o requerente do pedido cautelar haverá que invocar a ilegalidade daquele acto, assacando-lhe vícios, ilegalidades. É a existência de tais ilegalidades que conduzirá, depois, a um determinado juízo de desvalor jurídico, que se imputará ao acto ilegal.
Portanto, a causa de pedir numa acção cautelar, em que se requeira a suspensão de eficácia de um acto administrativo, não se recorta apenas - ou essencialmente - em função dos concretos vícios que sejam alegados, mas, diferentemente, afere-se com base na invocação da probabilidade do êxito da acção principal, frente ao direito que se invoca e considerando a correspondente e provável ilegalidade do acto suspendendo. Por seu turno, a ilegalidade do acto afere-se atendendo a uma concreta factualidade que também tenha sido invocada. Ou seja, na providência cautelar de suspensão de eficácia, a invocação de determinados vícios ou ilegalidades como determinantes da invalidade do acto suspendendo apenas importa na medida em que concorra para o preenchimento do pressuposto fumus boni iuri, ou para o juízo relativo à probabilidade do êxito da acção principal. Logo, o acrescento de tais invocações de Direito, com base numa mesma factualidade, não há-de configurar uma nova causa de pedir, substancialmente diversa de uma anterior, em que se alegassem menos ou diferentes vícios. A consequência da invocação das ilegalidades, num ou noutro caso, será sempre a mesma: a verificação de uma provável invalidade do acto suspendendo e o respectivo provável êxito da acção principal.
Assim, quando em relação a um mesmo processo principal, se intenta uma segunda providência cautelar de suspensão de eficácia de um acto administrativo, ainda que nessa segunda providência se venha a arguir outros fundamentos ou vícios face àqueles que se arguiram na providência anterior, sem a concomitante invocação de novos factos ou de factos de conhecimento superveniente, não há aqui que falar em diferentes causas de pedir. As causas de pedir nestes dois pedidos de suspensão de eficácia são idênticas – invoca-se em ambos os casos a probabilidade do êxito da acção principal, por o acto suspendendo ser ilegal e inválido, à luz das mesmas circunstâncias fácticas, cujo conhecimento se detinha ab initio. Num processo alega-se essa invalidade por determinados vícios, no outro, por vícios diferentes, ou acrescidas, mas a causa de pedir repete-se em termos substanciais e efectivos, porque nos dois processos o que se pretende é a apreciação da invalidade do acto suspendendo e a garantia de uma dada e única situação concreta, que se pretende salvaguardar até à decisão definitiva tomada no processo principal.
De referir, ainda, que considerando o preceituado no art.º 95.º, n.º 3, do CPTA, também não é hoje seguro que nos processos impugnatórios (principais) que correm termos nos tribunais administrativos a causa de pedir se delimite pelos vícios alegados pelas partes, ou por uma concreta causa de invalidade, parecendo, antes, que o legislador pretendeu que nesses processos tal causa de pedir englobe todas as ilegalidades que possam ser assacadas ao acto impugnado, atendendo à factualidade trazida a litigio (a espelhar as dificuldades e divergências jurisprudenciais sobre a matéria, vide, o Ac. do STA do Pleno do STA n.º 356/11, de 13-11-2014, que revogou o Ac. do STA (Secção) n.º 356/11, de 19-04-2012).
Sem embargo do que acima se refere, nota-se, igualmente, que apesar das alegações do A. e Recorrente relativas à alegação de diferentes vícios ou prejuízos em cada acção cautelar que intentou, dessas mesmas alegações e dos próprios autos não resulta essa ocorrência, mas o inverso. Ou seja, nesta acção cautelar a invocação das invalidades é semelhante às anteriores, assim como, são invocados os mesmos prejuízos.
Já no que concerne à alegada ampliação da instância relativamente à causa principal, irreleva para a apreciação da causa de pedir formulada na presente acção cautelar.
Conforme decorre da factualidade apurada, o A. e Recorrente intentou no TAF de Sintra o P. 2526/15.2BESNT, onde também requereu a suspensão de eficácia do despacho de 23-03-2015, da Ministra da Administração Interna, que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva. Nesse processo foi prolatada decisão no sentido da improcedência do pedido, decisão ainda não transitada, por estar pendente o respectivo recurso.
Posteriormente, o A. e Recorrente intentou uma nova acção cautelar com o n.º 475/17.9BESNT, em que requereu novamente a suspensão de eficácia daquele despacho, assim como dos “actos administrativos conexos”, acção onde foi prolatado um despacho de indeferimento liminar, que foi alvo de recurso para o TCAS, onde se encontra pendente.
Nas várias acções - nos P. 2526/15.2BESNT, n.º 475/17.9BESNT e agora neste processo – L... A... – impugnou o mesmo acto, pelas mesmas razões, mas indicou diferentes Contra-interessados.
Neste recurso, L... A... alega que aquela indicação diversa quanto aos Contra-interessados obsta ao julgamento feito na decisão recorrida, no sentido da ocorrência de uma situação de litispendência. Mas sem razão. Como acima se indica, com as referidas providências cautelares o A. visa surtir um único efeito com base numa única causa de pedir, em que as partes demandadas a título principal são as mesmas.
Por conseguinte, a repetição de providências cautelares na dependência de uma mesma causa principal não deixa de ocorrer pela circunstância de se indicar nas mesmas diferentes Contra-interessados, sendo certo que estes não são partes na acção nos mesmos moldes das entidades públicas demandadas, mas um tertium genus, apenas verificável no processo administrativo impugnatório. Ou seja, a não indicação de determinados Contra-interessados numa dada acção cautelar não afasta a possibilidade de se considerar que existe uma situação de litispendência por se ter intentado duas acções cautelares contra as mesmas partes, porquanto as entidades públicas demandadas a título principal são as mesmas, quer em termos efectivos, quer do ponto de vista da sua qualidade jurídica.
O Contra-interessado não é uma verdadeira parte principal, mas uma “quase” parte, é alguém que figura ao lado das entidades demandadas e que se identifica a partir da relação material em causa ou dos documentos contidos no processo administrativo e que deve ser demandado quando se constate a possibilidade de ficar directamente prejudicado com o eventual procedência dos pedidos impugnatórios ou quando se constate que tem um que tem um legítimo interesse na manutenção do acto impugnado - cf. art.º 57.º do CPTA.
Portanto, ocorre aqui uma situação de litispendência porque o A. e Recorrente apresentou uma acção cautelar idêntica à já apresentada no P. 2526/15.2BESNT, quer quanto aos sujeitos, quer quanto à causa de pedir ou aos pedidos (cf. art.º 581.º do CPC, ex vi art.º 1.º do CPTA).
Em conclusão, a decisão recorrida não errou quando entendeu verificada a excepção de litispendência.

Vem o Recorrente invocar um erro de julgamento, por na decisão recorrida não terem sido apreciados os prejuízos de difícil reparação para o requerente da providência e porque o requerente da providência demonstrou que os pressupostos para o seu deferimento estavam preenchidos.
Porque foi julgada verificada a excepção de litispendência, não havia de conhecer-se do mérito da acção cautelar, ficando prejudicada a apreciação dos invocados prejuízos ou do preenchimento dos critérios do art.º 120.º do CPTA.
Logo, não errou a decisão recorrida quando não apreciou esta matéria julgando-a prejudicada.
A decisão recorrida não padece, portanto, de nenhum erro de julgamento quando não apreciou daquele mérito cautelar.

III- DISPOSITIVO

Pelo exposto, acordam:
- em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a decisão recorrida;
- custas pelo Recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário de que goze (cf. art.ºs. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do RCP e 189.º, n.º 2 do CPTA).

Lisboa, 20 de Setembro de 2018.
(Sofia David)

(Conceição Silvestre)

(José Correia)