Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04777/11
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:03/13/2012
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. IVA. DEDUÇÃO. BENS NÃO AFECTOS À ACTIVIDADE DA SOCIEDADE.
Sumário:Doutrina que dimana da decisão:
1. Para além dos requisitos formais exigíveis, em regra, só confere direito à dedução do IVA o imposto suportado pelo sujeito passivo na aquisição de bens e serviços destinados aos seus inputs produtivos;
2. Assim, o imposto suportado na aquisição de bens e serviços que não estejam afectos à sua actividade produtiva e o imposto contido nos custos provenientes de prestação de serviços a sociedade de que o sujeito passivo é sócio, não confere o direito a tal dedução.

O Relator
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. A..., Sociedade Agrícola Limitada, identificada nos autos, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


A. A TITULARIDADE, PELA RECORRENTE, DE PARTICIPAÇÕES FINANCEIRAS EM sOCIEDADES DE DIREITO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL RESULTA INEQUÍVOCA DOS FACTOS APURADOS NAS ALÍNEAS E), F), H), N) AX) DA MATÉRIA DE FACTO;
B. DOS MESMOS FACTOS E, SOBRETUDO DA ALÍNEA s), RESULTA, TAMBÉM, QUE SUPORTOU, NO MESMO EXERCÍCIO OE 2003, E REGISTOU CUSTOS COM ASSISTÊNCIA TÉCNICA AO ACOMPANHAMENTO DAQUELES INVESTIMENTOS NO BRASIL, PRESTADOS POR UMA PESSOA, POR ORDEM, NO INTERESSE E POR CONTA DA RECORRENTE E DAS SUAS CO-SÓCIAS NOS CITADOS INVESTIMENTOS, NO MONTANTE DE €: 1.425,00;
C. AQUELAS PARTICIPAÇÕES SOCIAIS DA RECORRENTE REPRESENTAM UMA IMOBILIZAÇÃO FINANCEIRA QUE, POR NATUREZA, CONSTITUI UM FONTE PRODUTORA DE RENDIMENTOS A PRAZO, SEJA SOB A FORMA DE DIVIDENDOS, SEJA PELA MODALIDADE DE MAIS VAUAS REALIZÁVEIS (E NAS QUAIS SE INCORPORAM NÃO SÓ OS LUCROS NÃO DISTRIBUÍDOS COMO A VALORIZAÇÃO INTANGÍVEL DA PRÓPRIA PARTICIPAÇÃO, PELO B...QUE PODE INCORPORAR E INCORPORA) COM A SUA ALIENAÇÃO OU LIQUIDAÇÃO;
D. É DIREITO DE UM SÓCIO O DE PARTICIPAR EM ASSEMBLEIAS GERAIS DE PARTICIPADAS E O DE ACOMPANHAR E SER INFORMADO SOBRE O ANDAMENTO DOS NEGÓCIOS DAS MESMAS - ART. 21/1, B) E C) DO CSC - E É DAS REGRAS DA EXPERIÊNCIA E DO DIREITO QUE ASSIM DEVE PROCEDER, COMO UM NORMAL SUJEITO, UM BONUS PATER FAMILIAE SEMPRE FARIA E FAZ RELATIVAMENTE A INVESTIMENTOS DA MESMA NATUREZA, SUPORTANDO, PARA TANTO, OS RESPECTIVOS CUSTOS;
E. A RECORRENTE É QUE É A TITULAR DAS PARTICIPAÇÕES SOCIAIS NAS SOCIEDADES DE DIREITO BRASILEIRO E, PORTANTO, É ÀQUELA QUE COMPETE SUPORTAR OS CUSTOS EM QUE DEVA INCORRER, NO MÍNIMO, PARA MANTER A FONTE PRODUTORA, I. E., A INTEGRIDADE DA PRÓPRIA PARTICIPAÇÃO SOCIAL E DOS CAPITAIS COM QUE ENTROU (SOB A MAIS DIVERSAS FORMAS DE CAPITAL SOCIAL, SUPRIMENTOS, PRESTAÇÕES, ETC...);
F. POR IDENTIDADE DE RAZOES, o IVA COM OS CUSTOS INCORRIDOS PELA RECORRENTE COM A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS POR TERCEIRO, RELATIVOS ÀQUELES INVESTIMENTOS NO BRASIL, TAMBÉM NO INTERESSE E POR CONTA DA IMPUGNANTE DEVEM SER RELEVADOS FISCALMENTE COMO DEDUTÍVEIS;
G. A SENTENÇA A QUO ENTENDE QUE O INVESTIMENTO FINANCEIRO OPERADO NO BRASIL - QUE JULGA, ALIÁS PROVADO NO FACTO O) – NÃO SE ENCONTRAVA RELEVADO NA CONTABILIDADE DA IMPUGNANTE, MAS AFIRMA QUE MESMO QUE CONSTASSE, OS MENCIONADOS ENCARGOS NÃO FORAM INDISPENSÁVEIS PARA O DESENVOLVIMENTO DA ACTIVIDADE POIS NÃO OBTÉM QUALQUER RENDIMENTO DA EMPRESA BRASILEIRA O QUE CONSTITUI UM DUPLO ERRO;
H. PRIMEIRO, ERA DEVER DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, AGINDO COM INDEPENDÊNCIA E VERDAOE TRIBUTÁRIA, TENDO TIDO CONHECIMENTO E DOCUMENTAÇÃO SOBRE A OMITIDA CONTABILIZAÇÃO, MANDAR PROCEDER A ELA, INDEPENDENTEMENTE DAS CONSEQUÊNCIAS TRIBUTÁRIAS PODEREM SER FAVORÁVEIS OU DESFAVORÁVEIS PARA QUALQUER DOS SUJEITOS DA RELAÇÃO, SOB PENA DE DIRECTA
VIOLAÇÃO DO DIREITO DOS ART. 8 E 55 DA LGT E ART. 17, 20/1. c) E H), 21 DO CIRC; AO NÃO FAZÊ-LO, VIOLOU ESSE DIREITO E INQUINOU O ACTO SOB IMPUGNAÇÃO.
I. DEPOIS, TENDO A SENTENÇA RECORRIDA AFIRMADO A IRRELEVÂNCIA DE TAL INSCRIÇÃO CONTABILÍSTICA DO INVESTIMENTO PARA EFEITOS DE DEDUÇÃO DAQUELE CUSTO, ESQUECEU ESTA QUE A DEDUTIBIUDADEDE UM CUSTO NÃO SE AFERE, APENAS, EM RAZÃO DA APTIDÃO PARA GERAR RECEITA ANUAL, NEM APENAS DA CONCRETA GERAÇÃO DESSA RECEITA, MAS TAMBÉM EM RAZÃO DA SUA IMPRESCINDIBILIDADE PARA A MANUTENÇÃO DA FONTE PRODUTORA.
J. AO OMITIR QUALQUER REFERÊNCIA VALORATIVA À PARTE DO ART 23 DO CIRC QUE CONTEMPLA OS CUSTOS NECESSÁRIO SUPORTAR COM A MANUTENÇÃO DA FONTE GERADORA, A SENTENÇA A QUO DESPREZOU –INAPUCANDO-O, QUANDO O DEVIA CONSIDERAR E APLICAR -, O DIREITO DA PARTE FINAL DESSE ART. 23, VIOLANDO-O, POR ISSO E VIOLANDO AINDA O DIREITO DO ART. 20 DO IVA;
K. NO TOCANTE AOS EXERCÍCIOS DE 2003 E 2004, A SENTENÇA A QUO, NA ESTEIRA DO ACTO IMPUGNADO, NÃO ACEITOU A DEDUÇÃO DO IVA SOBRE CUSTOS, RESPECTIVAMENTE DE €: 23.537,97 E €: 22.764,57, OS SUPORTADOS COM ENCARGOS COM A CRIAÇÃO DE CAVALOS;
L. MAS FÊ-LO - TAL COMO A IMPUGNADA - EM CRASSO ERRO SOBRE OS PRESSUPOSTOS DE DIREITO APLICÁVEIS, POSTO QUE ASSIM DECIDIU PORQUE OS CAVALOS NÃO ERAM PROPRIEDADE DA RECORRENTE (PRESSUPONDO, ASSIM, NÃO PODER VENDER COISA ALHEIA);
M. CRASSO PORQUE NO EXERCÍCIO DO COMÉRCIO (EM SENTIDO JURÍDICO) É LÍCITO AO COMERCIANTE (EM SENTIDO JURÍDICO) VENDER COUSA INCERTA, OU DE ESPERANÇAS E, ATÉ, ALHEIA; MANDA E CONSENTE-O O DIREITO DO ART. 467 DO CÓDIGO COMERCIAL E POR ISSO, NUNCA OS CAVALOS PODIAM SER INSCRITOS NO ACTIVO IMOBILIZADO NEM NAS EXISTÊNCIAS;
N. EM CONSEQUÊNCIA, OS CUSTOS COM A MANADA DE CAVALOS SÃO INDISPENSÁVEIS QUER PARA GERAR RECEITAS QUER PARA MANTER A FONTE PRODUTORA, NOS TERMOS DO ART. 23 DO CIRC QUE A SENTENÇA RECORRIDA VIOLOU, APLICANDO ERRADAMENTE A PRIMEIRA PARTE E NÃO APLICANDO, DEVENDO FAZÊ-LO A SEGUNDA PARTE DO SEU INCISO; EM CONSEQUÊNCIA, VIOLOU TAMBÉM O ART. 20 DO CIVA;
O. POR MERA CAUTELA, MAS SEM CONCEDER, A SENTENÇA A QUO DEVERIA TER RECONHECIDO COMO PROVADOS OUTROS FACTOS, A SABER:
i. TRATAM-SE DE CAVALOS COMO FERRO SOMMER DE ANDRADE, O QUAL FOI INICIADO PELO AVÔ DAQUELA - DR. RUI ANDRADE- E QUE PRESTIGIOU ESSE FERRO A ELE SE DEVENDO A SOBREVIVÊNCIA DA ESPÉCIE SORRAIA, APESAR DE, AINDA AMEAÇADA DE EXTINÇÃO.
II. AJUSTARAM VERBALMENTE ENTRE SI E COM A IMPUGNANTE QUE OS MENCIONADOS CAVALOS SERIAM CRIADOS, TRATADOS À CUSTA DESTA E PROMOVIDA A VENDA E ARRECADADA A RESPECTIVA RECEITA PELA MESMA IMPUGNANTE, PARTILHANDO PORÉM COM A PROPRIETÁRIA DOS MESMOS CAVALOS OS PROVEITOS PROVENIENTES DA VENDA, NA MEDIDA QUE EXCEDER OS CUSTOS ENTRETANTO SUPORTADOS.
III. E OS CAVALOS SERIAM, FORAM E SÃO MANTIDOS REGISTADOS COMO PROPRIEDADE DA REFERIDA D... A FIM DE BENEFICIAREM DO PRESTÍGIO E MAIS VALIA DECORRENTES DA MANUTENÇÃO DO SEU REGISTO NA ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE CRIADORES DO CAVALO PURO SANGUE LUSITANO COM O FERRO SOMMER D'ANDRADE, NOS MERCADOS NACIONAL E INTERNACIONAL.
iv. A IMPUGNANTE, PRONUNCIANDO-SE SOBRE A ACÇÃO INSPECTIVA, ALERTOU A ADMINISTRAÇÃO PARA A CIRCUNSTÃNCIA DE A RAÇA SORRAIA ESTAR EM PERIGO DE EXTINÇÃO E SER OBJECTO DE PROTECÇÃO, DE A EXPLORAÇÃO CAVALAR OBRIGAR A UM LONGO PERÍODO DE MANUTENÇÃO E REPRODUÇÃO ATÉ SE TER UM NÚMERO SUFICIENTE QUE MANTENHA AS CARACTERÍSTICAS DA RAÇA E DE, APESAR DISSO, A PARTIR DE 2004 JÁ SE VERIFICAREM PROVEITOS ADVENIENTES DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E DA VENDA DE EXEMPLARES, A MAIS RECENTE DAS QUAIS SE TRADUZIU NA VENDA DE UMA ÉGUA PARA INGLATERRA POR €: 6.000,00.
v. O NEGÓCIO AJUSTADO E QUE DETERMINOU A IMPUGNANTE A SUPORTAR OS CUSTOS CONFIGURA UM NEGÓCIO CELEBRADO EM CIRCUNSTÂNCIAS SEMELHANTES À QUE SERIA E É CELEBRADO ENTRE SUJEITOS TOTALMENTE INDEPENDENTES ENTRE SI DE ACORDO COM REGRAS DE MERCADO PARA EQUIVALENTE CONDICIONALISMO.
P. A PROVA DESTES FACTOS RESULTA DOS DEPOIMENTOS DE TODAS AS TESTEMUNHAS E EXTRACTADOS NA SENTENÇA RECORRIDA, DO RELATÓRIO INSPECTIVO E DA RESPECTIVA DECISÃO DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA;
Q. TAIS FACTOS, CONJUNTAMENTE COM OS DEMAIS (E ATÉ ESTES, POR SI SÓ) PERMITEM QUALIFICAR O NEGÓCIO CELEBRADO COMO UMA PARCERIA PECUÁRIA E, TANTO A FACULDADE QUE O COMERCIANTE TEM DE VENDER COISA ALHEIA, COMO DA POSIÇÃO DE PARCEIRO PENSADOR (CONTRATO QUE NÃO EXIGE A FORMA ESCRITA) CONSTITUEM TÍTULOS BASTANTES PARA O EXERCÍCIO DO COMÉRCIO DAS UTILIDADES ECONÓMICAS INERENTES A EQUÍDEOS DE RAÇA, O QUE IMPLICA NECESSARIAMENTE, A INDISPENSABIUDADE DE SUPORTAR OS CUSTOS PARA CRIÁ-LOS, PROCRIÁ-LOS, PENSÁ-LOS, TRATÁ-­LOS E MANTÊ-LOS, JÁ QUE DE OUTRO MODO SE NÃO PODE APROVEITAR DAS SUAS VANTAGENS E UTILIDADES, NEM MANTER A FONTE PRODUTORA DE RENDIMENTO;
R. A PLURIANUAUDADE, ENQUANTO CONCEITO DE DIREITO (TRIBUTÁRIO) CONSISTE NUMA EXCEPÇÃO LEGAL AOS PRINCÍPIOS DA PERIODIZAÇÃO E DA ESPECIALIZAÇÃO E, NOS TERMOS DO ART. 18/5 DO CIRC, UMA FACULDADE, NA MEDIDA EM QUE AQUELA TANTO SE APLICA AOS CUSTOS COMO AS RESPECTIVAS RECEITAS; O CITADO DIREITO DEFINE A PLURIANUAUDADE COMO UM ACTO PRÓPRIO DO RESPECTIVO PRODUTO OU BEM (COMO É O CASO DA CORTIÇA OU DOS EUCALIPTOS); DAÍ QUE O ART. 18/6 DEFINA UMA REGRA ESPECIAL PARA ESSE TIPO DE ACTIVIDADE SILVÍCOLA;
S. PORÉM, A ACTIVIDADE ECONÓMICA DE CRIAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO DE EQUÍDEOS, ENQUANTO MANADA - UNIVERSALIDADE- NÃO É UMA ACTIVIDADE PLURIANUAL POIS QUE SE NÃO ESGOTA NUM CICLO PRÓPRIO; É, ANTES, UMA ACTIVIDADE DESENVOLVIDA AO LONGO DOS ANOS DE VIDA DE UMA EMPRESA, DE MODO CONTÍNUO; POR ISSO, A SENTENÇA RECORRIDA VIOLOU, TAMBÉM AQUELES PRECEITOS DO CIRC E O ART. 20 DO CIVA;
T. A RECORRENTE REGISTOU OS PROVEITOS DA VENDA DE EQUÍDEOS DESSA MANADA E A IMPUGNADA NÃO QUESTIONOU ESSA RECEITA PELO QUE OS BENS (RAÇÕES, PENSOS, FERRAGENS, MEDICAMENTOS ETC...) E SERVIÇOS (TRATADORES, CONSULTAS E VETERINÁRIOS) ADQUIRIDOS E CUJO IVA SUPORTOU E DEVE PODER DEDUZIR, POSTO QUE SE INSEREM NA ACTIVIDADE DA EMPRESA, o QUE RELEVA PARA EFEITOS DO ART. 20 DO CIVA, QUE, ASSIM, FOI VIOLADO PELA SENTENÇA A QUO;
U. AO DECIDIR COMO DECIDIU, A SENTENÇA A QUO VILOU AS DISPOSIÇÕES LEGAIS MENCIONADAS PELO QUE DEVE SER REVOGADA E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE, JULGANDO PROCEDENTE AS IMPUGNAÇÕES, ANULE AS LIQUIDAÇÕES ADICIONAIS DE IVA RELATIVAS AOS EXERCÍCIOS DE 2003 E 2004;

ESTES TERMOS e nos melhores do direito aplicável, deve a presente recurso ser julgado procedente como se deixou alegado e concluído, com o que será feita JUSTIÇA!


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


Também a recorrida veio a apresentar as suas alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais igualmente na íntegra se reproduzem:


I. À discussão do Venerando Tribunal é a trazida a nulidade da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria onde se decidiu pela improcedência da impugnação com fundamento na indedutibilidade fiscal do IVA contido em documentos respeitantes a custos deduzidos pela sociedade aqui recorrente relativos à criação/manutenção de cavalos e deslocações/estadas e estudos especializados acerca da implantação de uma sociedade de direito brasileiro naquele país.
II. Os argumentos invocados pela recorrente para sustentar tal nulidade assentam no seu entendimento de que uns e outros daqueles custos são indispensáveis para a manutenção da fonte produtora e obtenção do lucro, ainda que vindouro e eventual.
III. Não se pode perder de vista que a recorrente é uma sociedade agrícola, que não possuiu nos anos em análise quaisquer cavalos, nem registados na sua ­propriedade, nem registados nas suas existências, nem revelados os seus custos de produção em ordem a permitir o débito de custos (e imputação dos proveitos) nos moldes prescritos nos artigos 18º n.5 e 19º do CIRC.
IV. A Administração Fiscal corrigiu os custos deduzidos com os cavalos, assim como anulou o proveito resultante da venda de cavalos, não se projectando assim qualquer efeito no lucro tributável da recorrente derivado dos cavalos.
V. Os custos com as deslocações/estadas e trabalhos especializados respeitantes a uma empresa de direito brasileiro, devem ser-lhe (à sociedade de direito brasileiro) imputados, pois o seu resultado directo é a ela que aproveita.
VI. A conexão entre a fonte produtora e a obtenção de lucro estabelece-se entre os ditos custos e a sociedade brasileira e é esta, e não a recorrente, quem, em função deles obterá lucro ou prejuízo.
VII. A recorrente poderá, eventualmente, vir a beneficiar indirectamente, da incursão em tais custos, mas estes não são indispensáveis à manutenção da sua fonte produtora nem à obtenção do seu lucro.
VIII. Quer a produção agrícola da sociedade brasileira gere lucro ou não, a produção agrícola da recorrente não será afectada.
IX. Para que um SP possa aproveitar desde regime de imputação de custos e proveitos deve relevar na sua contabilidade qual o critério adoptado – critério da percentagem de acabamento ou critério de enceramento - e possuir registos em conformidade com o critério adoptado.
X. A recorrente adoptou qualquer metodologia nem efectuou qualquer registo contabilístico ou de outra natureza que permita sustentar a tese por que pugna em sua defesa.
XI. Para a dedução do IVA é imprescindível que os custos a que se reporta o imposto estejam directa e exclusivamente afectos ao exercício da actividade económica que o SP exerce, que não é o caso dos autos.
XII. Assim sendo, é absoluto o acerto da douta decisão, que não incorreu em vício de erro de julgamento, mostrando-se totalmente isenta de reparos.

Nestes termos e nos melhores de direito, promove-se a improcedência do presente recurso.


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, dizendo reiterar a posição do Ministério Público junto do tribunal “a quo”, que no mesmo sentido propugnou, sendo que a sentença recorrida se encontra suficientemente fundamentada de facto e de direito e fez uma correcta e suficiente análise da matéria de facto e correcta subsunção jurídica.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se o IVA suportado pela ora recorrente, na criação dos equídeos, confere o direito à respectiva dedução; E se o IVA suportado pela mesma, em serviços prestados a uma sociedade de que a ora recorrente é sócia, igualmente lhe confere o direito à respectiva dedução.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório o M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A) A Administração Tributária efectuou uma acção inspectiva, através de exame à escrita do exercício de 2003, em sede de IVA e IRC, da impugnante, "A..., Sociedade Agrícola, Lda", com o NIPC e matrícula 502.403.039 e sede na Agolada de Baixo, Coruche, com base na ordem de serviço interna na 01200600588 emitida pela Direcção de Finanças de Santarém, DPIT II, em 18/04/2006, tendo sido iniciada em 21/04/2006 e ficado concluída em 18/05/2006, cfr. relatório anexo, fls. 16-21/ss, cujo teor dou por reproduzido;
B) A Administração Tributária efectuou uma acção inspectiva, através de exame à escrita do exercício de 2004, em sede de IVA e IRC, da impugnante, "A..., Sociedade Agrícola, Lda", com o NIPC e matrícula 502.403.039 e sede na Agolada de Baixo, Coruche, com base na ordem de serviço interna na 01200600589 emitida pela Direcção de Finanças de Santarém, DPIT II, em 18/04/2006, tendo sido iniciada em 10/05/2006 e ficado concluída em 25/05/2006, cfr. relatório anexo, fls. 56-60/ss, cujo teor dou por reproduzido;
C) A Administração Tributária (AT) efectuou uma acção inspectiva, através de exame à escrita do exercício de 2005, em sede de IVA, da impugnante, "A..., Sociedade Agrícola, Lda", com o NIPC e matrícula 502.403.039 e sede na Agolada de Baixo, Coruche (de ora avante abreviadamente "A..."), com base na ordem de serviço interna na 01200600590 emitida pela Direcção de Finanças de Santarém, DPIT II, em 18/04/2006, tendo sido iniciada em 02/06/2006 e ficado concluída em 06/06/2006, cfr. relatório anexo, fls. 87-B-87-E/ss, cujo teor dou por reproduzido;
D) A gerência da impugnante é exercida pelos dois sócios, C...e D...;
E) Em 2003, 2004 e 2005, para além da actividade agrícola, no âmbito da qual a impugnante produziu milho, arroz, tomate, beterraba, também teve como actividade secundária a venda de "jornadas de caça ao javali"; sendo o seu objecto social Culturas Agrícolas Não Especificadas (C.A.E. 001112);
F) A impugnante não possui prédios próprios, quer rústicos quer urbanos, e os terrenos, onde é desenvolvida a actividade da mesma, pertencem a ambos os sócios gerentes, uns ao sócio C...e outros à sócia D...;
G) A impugnante encontra-se abrangida, em sede IRC, pelo regime normal, e, em sede de IVA, pelo regime normal de periodicidade mensal;
H) Em Julho de 2003, em sede de IVA, a impugnante "A..." contabilizou na conta 62023601-Trabalhos Especializados com Direito a Dedução, a quantia de 1.425€ (DI 83/Jul), factura 218, respeitante a "assistência técnica referente à Fazenda de s~ Maria - Campos Lindos - Ano 2002", debitado pela a "E..., Lda", a qual, com a "A...", são sócias daquela mesma empresa brasileira;
I) A impugnante não possui como existências ou como bens do imobilizado, quaisquer animais equinos; nem registo dos mesmos em seu nome, cfr. anexo 4 ao relatório de 2003, fls. 53/ss, anexo 4 ao relatório de 2004, fls. 86/ss do PA, e anexo 1 ao relatório de 2005, fls. 87­q)/ss, cujos teores dou por reproduzidos;
J) Durante o ano de 2003, em sede de IVA, a impugnante contabilizou e imputou como custos do exercício diversos encargos com a criação de cavalos nomeadamente aquisições de rações, consultas e tratamentos veterinários, análises clínicas, medicamentos, ferragens e salários do pessoal (desbastador de cavalos e tratador de cavalos), cfr. melhor descriminado no relatório, no quadro de fls. 29 do PA anexo, e Anexo 1 do referido relatório de 2003 (fls. 44);
K) Durante o ano de 2004, em sede de IVA, a impugnante contabilizou e imputou como custos do exercício diversos encargos com a criação de cavalos nomeadamente aquisições de rações, consultas e tratamentos veterinários, análises clínicas, medicamentos, ferragens e salários do pessoal (desbastador de cavalos e tratador de cavalos), cfr. melhor descriminado no relatório, no quadro de fls. 68 do PA anexo, e Anexo I do dito relatório de 2004 (fls.78);
L) De Janeiro a Agosto de 2005, em sede de IVA, a impugnante contabilizou e imputou como custos do exercício diversos encargos com a criação de cavalos nomeadamente aquisições de rações, consultas e tratamentos veterinários, análises clínicas, medicamentos, ferragens e salários do pessoal (desbastador de cavalos e tratador de cavalos), cfr. melhor descriminado no relatório de 2005, no quadro de fls. 87-h) do PA anexo;
M) A impugnante pagou as liquidações efectuadas pela AT, cfr. docs. 1 a 45, fls. 109 a 153, cujos teores dou por reproduzidos;
N) Dou por reproduzida a Acta n° 12, de 21/09/1998, de assembleia geral da impugnante, a fls. 46 e 47, que, entre o mais, relata uma visita do sócio C...ao Brasil e aprova a proposta de expansão de actividade para o Brasil e lhe confere poderes para adquirir ou arrendar propriedades agrícolas no Brasil, e constituir sociedade ou sociedades e subscrever quotas de sociedades a constituir e mandata o cidadão brasileiro, G..., economista, para representar a impugnante;
O) Dou por reproduzidos os documentos de fls. 157 a 162, atinentes a ordens de pagamento ao Banco Central do Brasil, S. Paulo, e Fax de correspondência, de 2000 e 2001, reporta a Impugnante e a "F..., Lda", no Município de Poá, Estado de S. Paulo, Brasil;
P) Dou por reproduzido o documento de fls. 163 a 166, atinente à constituição de uma sociedade denominada "Sociedade Agrícola F... S/C Ltda" por "A...- Sociedade Agrícola, Limitada", com representação pelo cidadão brasileiro, G..., economista, e por H..., no Município de Poá, Estado de S. Paulo, Brasil;
Q) Dou por reproduzido o documento de fls. 170 a 176, atinente à constituição de uma sociedade denominada " I... S/C LTDA", pela "Sociedade Agrícola F... S/C Ltda" e por H..., no Município de Poá, Estado de S. Paulo, Brasil;
R) Dou por reproduzido o documento de fls. 177 a 184, designado "Certidão de Registro e Matrícula de Imóvel Rural”, Município de Campos Limpos, Goiatins, Estado de Tocantins, Brasil, datado de 14/08/2002, e outro de 20/03/2001, atinente à aquisição de 1.423,11,05 Ha de terras, pela sociedade denominada "I... S/C LTDA" e documentos (fls. 182 e 183) da "J..., Lda", relativos a viagens Portugal-Brasil, passados com datas de 03/04/2003 e 17/11/2003, em nome da impugnante;
S) L..., é responsável pelo projecto de internacionalização da actividade agro-pecuária de um grupo de sociedades constituído pela impugnante, A..., pela E... e pela Sociedade Agrícola da Cortiça, levado a cabo no Estado brasileiro do Tocantis, situado na zona da Pré-Amazónia, que consiste na exploração agrícola de arroz, soja, milho, pasto, criação de gado e actualmente também exploração florestal, iniciado em 1997, tendo a primeira colheita tido lugar em 2001;
T) Para concretizar esta actividade a impugnante constituiu sociedade no Brasil, a supra referida Sociedade Agrícola F...S/C Ltda, com o referido sócio H..., possuindo a impugnante 999 quotas e o seu sócio 1 quota (v. t/b doc.49 citado);
U) Por sua vez, a Sociedade Agrícola F...S/C Ltda com o supra referido sócio brasileiro, H... constituem a supra referida I... S/C Ltda possuindo a primeira 999 quotas e o segundo 1 quota (v. t/b doc. 54 citado);
V) Os terrenos onde funciona a referida exploração agropecuária e florestal são pertença da supra referida sociedade brasileira I... S/C Ltda.
W) As referidas seguintes três empresas portuguesas formaram um consórcio que constituíram através da sociedade brasileira "K..." em que a impugnante, "A...", participa em 25%, a E... em 50% e a Sociedade Agrícola da Cortiça nos sobrantes 25%; para tornar possível e viável o investimento realizado no Brasil, porque Tocantins é um Estado do interior, nas cercanias da Amazónia, mal servido de vias de comunicação e o desbravamento das terras exige meios mecânicos de elevados custos;
X) As deslocações do sócio da impugnante, C..., e de L...e M..., destinavam-se a acompanhar trabalhos e administração das referidas sociedades brasileiras;
Y) Os cavalos encontram-se registados em nome da sócia e esposa do sócio gerente da impugnante, também conhecida por D. Mariazinha ou D..., na APSL (O...), cfr. anexo 4 ao relatório de 2003, fls. 53/ss, anexo 4 ao relatório de 2004, fls. 86/ss do PA, e anexo 1 ao relatório de 2005, fls. 87-q)/ss, cujos teores dou por reproduzidos;

Factos não provados:
Com interesse para a presente decisão não se provaram outros factos além dos fixados.

Motivação:
O tribunal fundou a sua convicção na análise crítica dos documentos referidos em cada ponto do probatório, tudo ponderado e conjugado com as regras da experiência comum da vida.
Fundou-se ainda no depoimento das seguintes testemunhas:
L..., ...
M..., ...
N..., ...

A que, nos termos da alínea a) do n.º1 do art.º 712.º do Código de Processo Civil (CPC), se acrescenta mais um alínea ao probatório fixado na 1.ª Instância, em ordem a dele melhor se perceber dos fundamentos das liquidações adicionais relativas aos exercícios dos anos de 2003 e de 2004.
Z) Para proceder às liquidações adicionais de IVA, impugnadas e ora recorridas, relativas a 2003 e a 2004, fundamentou-se a AT nos relatórios referenciados em A) e B) supra, donde consta:
“...
o sujeito passivo contabilizou ...diversos encargos com a criação de cavalos, nomeadamente aquisições e rações, consultas e tratamentos veterinários, análises, medicamentos ...tendo deduzido o IVA mencionado nos respectivos documentos de suporte. Verificou-se no entanto que tais encargos, não estão relacionados com o desenvolvimento da actividade da empresa, pelo que o IVA, no total de 433,65 € foi deduzido indevidamente nos termos do artº 20º alínea a) do Código do IVA:
...
Pelo documento interno 83/Julho, o sujeito passivo contabilizou como custo a quantia de 1.425 €, respeitante a “assistência técnica referente à fazenda de Sta Maria – Campos Lindos – Ano 2002”, debitado pela “E..., Lda”, constante da factura 218 de 23/7/03, tendo deduzido o respectivo IVA no valor de 270,75 €.
...
Ora os referidos encargos não se mostram indispensáveis para a realização dos proveitos do sujeito passivo, sendo que o IVA não foi deduzido para a realização de transmissões de bens ou prestações de serviços realizadas pelo sujeito passivo, pelo que nos termos do nº1 do art.º 20º do Código do IVA, o imposto mencionado na factura foi deduzido indevidamente.
...
o sujeito passivo contabilizou ...diversos encargos com a criação de cavalos, nomeadamente aquisições e rações, consultas e tratamentos veterinários, análises, medicamentos ...tendo deduzido o IVA mencionado nos respectivos documentos de suporte. Verificou-se no entanto que tais encargos, não estão relacionados com o desenvolvimento da actividade da empresa, pelo que o IVA, no total de 1.046,31 € foi deduzido indevidamente nos termos do artº 20º alínea a) do Código do IVA:
...”.
Cfr. relatórios das inspecções de fls 16 e segs do PA apenso.


4. Para julgar improcedente a impugnação judicial deduzida considerou o M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que as operações donde resultaram as liquidações adicionais de IVA impugnadas, dos exercícios de 2003, 2004 e 2005, não podiam constituir um custo fiscal para a mesma, já que não foram indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora, tendo incidido sobre bens que não se encontravam afectos à sua actividade produtiva, não conferindo o direito à dedução do IVA suportado ao abrigo do disposto no art.º 20.º do CIVA, quer porque os encargos em causa relativos aos cavalos, os quais não constam das existências da impugnante ou como bens do seu activo imobilizado, quer porque os encargos de assistência técnica, suportados por uma empresa de que a mesma impugnante é sócia, igualmente não configura um custo para esta, pelo que as liquidações que as desconsideraram não padecem dos vícios que lhe são imputados, citando doutrina que no mesmo sentido se tem pronunciado.

Para a impugnante e ora recorrente, de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, é contra esta fundamentação (e outra) que vem esgrimir argumentos em ordem a este Tribunal exercer um juízo de censura sobre a mesma sentença em ordem à sua revogação [que não à declaração da sua nulidade, como em erro, invoca a Exma RFP, nas suas conclusões I) e II)], pugnando que a sua participação no capital social da sociedade brasileira lhe pode trazer proveitos a prazo, pelo que os encargos que suportou na assistência técnica no Brasil, na criação dos cavalos, nessa empresa, devem constituir um custo fiscal, ainda que os cavalos não sejam pertença da ora recorrente, já que existia um parceria pecuária, que não carecia de ser reduzida a escrito, restringindo contudo o objecto deste recurso às liquidações impugnadas relativas aos exercícios dos anos de 2003 e de 2004, desta forma tendo deixado cair a parte da impugnação relativa à liquidação de 2005 – cfr. conclusões K) e U) – que assim se encontra fora do objecto do presente recurso – cfr. art.º 684.º, n.º3 do CPC.

Vejamos então.
Dispunha a norma do art.º 23.º do CIRC, sob a epígrafe, Custos ou perdas:
Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes:
....
Os custos indispensáveis equivalem, assim, aos gastos contraídos no interesse da empresa. A dedutibilidade fiscal do custo deve depender apenas de uma relação justificada com a actividade produtiva da empresa e este indispensabilidade verifica-se “sempre que – por funcionamento da teoria da especialidade das pessoas colectivas – as operações societárias se insiram na sua capacidade, por subsunção ao respectivo escopo societário e, em especial, desde que se conectem com a obtenção de lucro ainda que de forma indirecta ou mediata”(1).

O requisito da indispensabilidade de um custo tem sido jurisprudencialmente interpretado como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspectiva económica-empresarial, na percepção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um custo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objecto societário do ente comercial em causa, sendo vedadas à AT actuações que coloquem em crise o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo. Não obstante, se a AT duvidar fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, impende sobre o contribuinte o ónus de prova de que tal operação se insere no respectivo escopo societário, como se decidiu no acórdão do STA de 29.3.2006, recurso n.º 1236/05(2).

E para efeitos de IVA, o direito à dedução tem uma semelhante abrangência nos termos do disposto nos art.ºs 19.º e 20.º do CIVA, sendo seu pressuposto que os bens e serviços estejam directamente relacionados com o exercício da actividade do sujeito passivo em causa(3), o que no caso, manifestamente se não vislumbra, quanto aos encargos relativos à criação dos cavalos, que não consta do seu objecto social tal actividade e nem os mesmos constavam inscritos a seu favor, a qualquer título – cfr. matéria das alíneas E) e I) do probatório fixado na sentença recorrida – mas sim de uma das sócias da mesma impugnante – cfr. matéria da alínea Y) do mesmo probatório – não se vendo como é que os custos incorridos na criação desses equídeos possa, alguma vez, concorrer como proveito, para a formação do lucro tributável da ora impugnante ou para a sua manutenção, enquanto ente colectivo, próprio e distinto, dos rendimentos de pertença dos seus sócios.

A invocada parceria pecuária, ora expressamente assim qualificada na matéria da sua conclusão Q), na verdade já na matéria dos art.ºs 29.º e segs da sua petição inicial de impugnação judicial havia sido suscitada, como forma de os proventos a existirem e quando viessem a existir, na venda desses equídeos, que iriam reverter (também) para a ora recorrente, o que fariam assegurar a necessária qualificação como custo fiscal de tais operações e logo, em sede de IVA, com subsunção na norma do art.º 20.º, n.º1, alínea a) do CIVA, com direito à dedução do imposto suportado nesse input produtivo.

A parceria pecuária tem, efectivamente, os contornos que a ora recorrente lhe imputa nessa matéria – cfr. art.º 1121.º e segs do Código Civil – e dessa forma, a existir tal contrato (aliás, nominado), as despesas com a criação dos mesmos poderia configurar um custo fiscal e em sede de IVA, de operação subsumível nessa alínea a), onde o direito à dedução do imposto suportado tem lugar, pelo que liquidação que a não aceitou teria de ser anulada.

Porém, lendo e analisando a matéria de facto constante no probatório fixada na sentença recorrida, nada disto ecoa da mesma no sentido de que os equídeos tenham sido entregues pela sua proprietária à sociedade ora impugnante, para esta os criar, pensar e vigiar, e depois, aquando da venda, para repartirem entre si os lucros gerados, numa certa proporção, sendo certo que a impugnante nem sequer colocou em causa a matéria do mesmo de forma válida, derivada dos depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas, nos termos do disposto no art.º 690.º-A, n.º1, alíneas a) e b) do CPC (redacção de então e a aplicável), de molde a este Tribunal proceder ao reexame da mesma, que assim se tem de manter {é que ao contrário do afirmado na matéria da alínea P) das mesmas conclusões recursivas, o relatório inspectivo e a decisão da AT, em nada avançam no sentido da existência deste contrato de parceria pecuária, pelo contrário}, com a improcedência da matéria das mesmas conclusões nesta parte relativa a tais liquidações adicionais de IVA de 2003 e de 2004.

Ainda que a titularidade pela ora impugnante de quotas nas sociedades brasileiras não esteja em causa, conforme resulta da matéria de facto constante nas alíneas P) e segs. do probatório fixado na sentença recorrida, logo, a existência por banda desta, em regra, de um qualquer interesse económico no desenvolvimento e expansão da actividade dessas empresas participadas, o certo é que a lei vai mais longe e exige que tais custos tenham sido indispensáveis (não apenas convenientes) para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, o que não se verifica se tais custos se reportam a encargos por assistência técnica no caso, não directamente à ora recorrente, mas sim à sua participada E..., Lda, que por sua vez os veio a debitar a esta, já que deve ser esta sociedade que directamente beneficiou de tal assistência que os deve suportar, sob pena de os seus encargos não se encontrarem correlacionados com os seus proveitos, desvirtuando as regras de determinação do lucro tributável, contidas nos art.ºs 17.º e segs do CIRC.

Para que determinada verba seja considerada um custo do contribuinte é necessário que a actividade respectiva seja por ele próprio desenvolvido que não por outras sociedades. A não ser desta forma, como que podia ser imputada a uma sociedade o exercício da actividade de uma outra com a qual ela tivesse uma qualquer relação de interesse económico(4).

Assim, não podendo tal verba ser sequer considerada um custo fiscal para efeitos de IRC, também para o IVA suportado não confere o mesmo o direito à dedução nos termos do disposto no art.º 20.º do CIVA, porque não consistiu em qualquer operação de input produtivo que seja susceptível de vir a configurar numa transmissão de bens ou prestações de serviços sujeitas a imposto, ou seja, não vem a integrar-se em qualquer ouput produtivo, pelo que o direito à dedução inexiste, como bem se decidiu na sentença recorrida, a qual assim não poderá deixar de ser confirmada.


Improcede assim toda a matéria das conclusões das alegações do recurso, sendo de lhe negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.


Custas pela recorrente.


Lisboa, 13/03/2012

EUGÉNIO SEQUEIRA
ANÍBAL FERRAZ
LUCAS MARTINS



1- Cfr. neste sentido António Moura Portugal, A dedutibilidade dos custos, pág. 116, citando Tomás Tavares.
2- A que se poderia juntar, a título exemplificativo, também o acórdão do mesmo STA de 13.2.2008, recurso n.º 798/07, com semelhante interpretação sobre a questão dos custos fiscais.
3- Cfr. neste sentido o acórdão do STA de 2-5-2007, recurso n.º 1137/06.
4- Cfr. neste sentido, entre muitos outros, o acórdão do STA de 30-11-2011, recurso n.º 107/11, tirado a propósito de questão idêntica.