Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:6530/13.7BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:05/21/2020
Relator:ISABEL FERNANDES
Descritores:IRC;
REINTEGRAÇÕES;
INDEMNIZAÇÕES PESSOAL;
CUSTOS.
Sumário:I – O activo imobilizado da empresa é o conjunto de bens que revestem um carácter de permanência, ou seja, os bens que a empresa pretende manter por mais do que um exercício económico.

II – A vida útil de um elemento do activo imobilizado é, para efeitos fiscais, o período durante o qual se reintegra ou amortiza totalmente o seu valor ( nº1 do artigo 3º do Decreto Regulamentar nº2/90, de 12 de Janeiro).

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

"M... SGPS, S.A.", tributada pelo lucro consolidado do grupo de que é sociedade dominante, veio deduzir IMPUGNAÇÃO JUDICIAL do acto de fixação do prejuízo fiscal de IRC do ano de 1993.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por decisão de 4 de Outubro de 2012, julgou parcialmente procedente a impugnação.

Nas suas alegações, a recorrente FAZENDA PÚBLICA, formula as seguintes conclusões:

«a) Salvo o devido respeito, que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação dos factos sujeitos à sua apreciação e como tal a uma errada interpretação do direito aplicável.

b) No que respeita às indemnizações pagas aos trabalhadores por rescisão do contrato de trabalho, tal como referido na fundamentação das correcções efectuadas, constantes de tis. 25 dos autos, as mesmas não se mostram indispensável à actividade das sociedades;

c) Se as referidas sociedades não necessitavam de tais trabalhadores ao seu serviço deveriam ter negociado o trespasse com a M... SA, sem assumir como seus os trabalhadores afectos aos estabelecimentos trespassados;

d) No que respeita à renda do mês de Janeiro de 1993, paga pela sociedade A... - Comércio de Automóveis, Lda., verifica-se também que a douta sentença ora recorrida fez uma errada interpretação dos factos invocados quer pala Administração Tributária, quer essencialmente pela Impugnante.

e) Resulta dos factos alegados pela Impugnante no artigo 22° e 28° da p.i. os imóveis onde se encontram instalados os estabelecimentos comerciais objecto do trespasse eram propriedade da M..., SA., assim, contrariamente ou doutamente decidido a M..., SA, não tinha que incorrer em qualquer custo com a renda do referido imóvel.

f) Pelo que, no caso concreto considerar-se ser indiferente a quem se imputam os custos uma vez que devem ser consideradas no apuramento do lucro tributável do grupo já que se trata em qualquer caso de um custo incluído no perímetro de consolidação da empresa dominante, não está conforme os factos alegados.

g) No que respeita às correcções às reintegrações dos bens do activo imobilizado corpóreo, entende a douta decisão recorrida que, considerando as taxas fixadas na tabela II a que se refere o art° 5°, nº 1, do Dec. - Reg. 2/90, e especificamente o Grupo 3, em que aqueles bens se inserem, será de considerar como não resultando excessivas as reintegrações praticadas pelo Impugnante não sendo de considerar quaisquer outras taxas relativas a bens adquiridos ao abrigo de anterior legislação já que os valores corrigidos pela Administração não dizem respeito a anteriores aquisições de bens daquela activo;

h) Se assim é não devem ser considerados documentos justificativos apresentados pela Impugnante respeitantes ao ano de 1989, constantes de fls. 52 a 55, 122 e 123, no montante global de 14.536.816$00.

i) Dos comprovativos apresentados pela Impugnante resulta que nem todos dizem respeito a computadores ou máquinas de fotocópias, conforme resulta entre outros dos constantes de fls. 164 a 171, o material constantes destes últimos de considerar como máquina electrónicas e como tal enquadrada na rubrica 2220, da Tabela II anexa ao Dec. Reg. Nº 2/90 de 12.01, às quais é aplicável a taxa de 14,28%, pelo que, também relativamente a esta questão a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação dos factos.

j) Conforme mapa de reintegrações apresentado pela Impugnante e constante de fls. 31, 32 e 33 é a própria que enquadra os equipamentos na rubrica 2220 da Tabela II anexa ao Dec. Reg. Nº 2/90 de 12.01, pelo que, em consonância com a mesma deveria ter aplicado a taxa de 14,28% e não de 20%.

k) Salvo o devido respeito pela opinião sufragada pela decisão recorrida, entendemos que o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo fez uma errada interpretação da lei no que respeita ao pagamento de custas processuais por parte da Fazenda Pública.

l) O Código das Custas Judiciais aprovado pelo Dec. Lei nº 224-A/96, de 26 de Novembro, previa no seu artº 2°, nº 1, ai. a) a isenção de custas da Fazenda Publica, enquanto serviço ou organismo do Estado.

m) Com a aprovação e publicação do Dec. Lei nº 324/2003, de 27 de Dezembro, a Fazenda Pública deixou de estar isenta do pagamento de custas judiciais;

n) No entanto, atento o disposto no art° 14° do Dec. Leis nº 324/2003, de 27 de Dezembro, as alterações introduzidas no Código das Custas Judiciais, só se aplicam aos processos instaurados após a sua entrada em vigor.

o) Tendo a presente acção sido instaurada em 2001, a Fazenda Publica encontra-se isenta de custas em relação à mesma, face às normas legais supra citadas.

p) Mesmo com a entrada em vigor do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Dec. Lei nº 34/2008, de 26 de Fevereiro, no caso em apreço a Fazenda Pública continuou a beneficiar da supra referida isenção, atento o disposto no art° 27° daquele diploma legal.

q) O mesmo se verificando após a entrada em vigor das alterações introduzidas ao Regulamento da Custas Processuais, pela Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, por força do disposto no seu art° 8°, nº 4.

r) Pelo que, a douta sentença ora recorrida ao decidir como decidiu violou o disposto no art° 8°, n°4 da Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, pelo que, deve ser anulada, na parte ora impugnada, por vício de violação de Lei.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente Recurso ser provido e, consequentemente ser anulada na parte ora impugnada a sentença proferida pelo Douto Tribunal "a quo", assim se fazendo a costumada Justiça.»


*

Nas suas alegações, a também recorrente S... Automóvel SGPS, que outrora tinha a denominação de M... SGPS, S.A”, formula as seguintes conclusões:
«4.1. O presente recurso diz respeito à aliás douta sentença de fls na parte em que julgou improcedente e não provada as reintegrações com o aumento de capital e com a aquisição de activo imobilizado corpóreo feita no âmbito de trespasse de estabelecimentos comerciais.
4.2. A correcção efectuada pela Administração Fiscal de 2.441.843$00 respeitava à rubrica Encargos com aumento de capital da M... S.A. o qual teve lugar em 1988, não tendo sido aceites como custo, a amortização feita no exercício de 1993, por se ter entendido que teriam ultrapassado o período máximo de vida útil, praticadas sobre elementos do activo imobilizado incorpóreo nos termos da alínea d) do nº 1do artº 32 do CIRC e nº 5 do artº 3º do D.R. nº 2/90.
4.3. À data em que foi efectuado o aumento de capital (1988), e iniciadas as amortizações, estava em vigor a Portaria nº 737/81 de 29 de Agosto, e cujo regime jurídico foi alterado pelo Decreto-Regulamentar nº 2/90.
4.4. No caso em apreço, ou seja a taxa máxima e mínima de amortização para despesas com o aumento de capital social não se alteraram com a entrada em vigor do Decreto-Regulamentar nº 2/90, mantendo-se em 33,33%, a taxa máxima que se podia aplicar num ano, sendo a taxa mínima, de percentagem igual a metade da máxima ou seja 16,67%.
4.5. A fazer-se a amortização à taxa mínima de 16,67% em cada exercício, isto corresponde a fazerem-se amortizações ao longo de seis anos, pelo que a sociedade M... teria sempre o direito de amortizar aqueles custos incorridos com o aumento de capital realizado em 1988 à razão de 16,67% por ano, quer no âmbito da Portaria 737/81 de 29 de Agosto, em vigor à data em que começou a efectuar as amortizações, quer no âmbito do decreto Regulamentar 2/90.
4.6. Se o aumento de capital teve lugar em 1988, e se o período possível para a amortização era seis anos, em 1993, era ainda possível amortizar aqueles encargos, à razão de 16,67% do custo incorrido, ao contrário do que, diversamente se decidiu na sentença recorrida.
4.7. A impugnante aceitou e reconheceu que a amortização por si efectuada não estava correcta, porquanto foi alem daquele limite de 16,67% contudo, esse facto não podia justificar a desconsideração da amortização na sua totalidade porquanto de acordo com os indicados critérios legais, o valor correcto a amortizar seria de 405.956$00.
4.8. A sentença recorrida julgou improcedente a impugnação desconsiderando as amortizações com os custos incorridos na aquisição de bens corpóreos feitos no âmbito de negócios de trespasse.
4.9. A administração fiscal tinha desconsiderado as reintegrações de bens e equipamentos transmitidos com o trespasse, ao entender que estes (i) fazem parte do local e a sua utilização compreendida na renda paga ao senhorio (ii) não foi feita a discriminação elemento a elemento.
4.10. A aliás douta sentença recorrida, apesar de concordar com a impugnante na parte em que concluía que a aquisição de bens e equipamentos vendidos e entregues pela trespassante à trespassária no âmbito de um contrato de trespasse, constitui um negócio translativo do direito de propriedade daqueles bens, que passaram a integrar o activo imobilizado corpóreo, julgou improcedente a impugnação, por, alegadamente, não ser possível discernir "entre aquilo que diz respeito ao trespasse como elemento incorpóreo propriamente dito das outras componentes corpóreos que integram o estabelecimento comercial ou industrial sujeito a deperecimento, pelo que a falta de identificação dos elementos corpóreos que a sustentavam ... impede a sua consideração enquanto elementos reintegráveis daquele activo imobilizado da empresa."
4.11. A aliás douta sentença, enferma de claro erro nos pressupostos porquanto, na contabilidade das sociedades adquirentes, encontravam-se perfeitamente autonomizados os elementos do activo imobilizado corpóreo dos elementos do activo imobilizado incorpóreo, não se confundido uns e outros, tanto que nos factos provados se menciona essa realidade, ou seja a de que “... Na tradução contabilística destes contratos estas empresas registaram parte do elemento corpóreo do trespasse em instalações não especificadas código 2195- ou instalações (arranjos urbanísticos) código 2080."
4.12. Ou seja, está provado nos autos quais os valores pelos quais as empresas registaram nas suas contabilidades como activos do seu imobilizado corpóreo bens cujo direito de propriedade adquiriram com o trespasse.
4.13. A falta de discriminação invocada pela Administração fiscal, tem que ver com o facto de, no mapa de reintegrações e amortizações modelo 32.1, aqueles elementos corpóreos não foram discriminados per si, mas isto sucedeu porque ao tempo, as sociedades preencheram o modelo 32.1 de acordo com as Notas para preenchimento do modelo que tinham uma chamada de atenção em que a Administração Fiscal escrevia textualmente o seguinte:
''A discriminação elemento a elemento não é permitida para os restantes bens do activo imobilizado, os quais devem, ser discriminados somente por grupos homogéneos, conforme as designações tabelas anexas ao Decreto Regulamentar."
4.14. E foi em obediência a este princípio que os registos contabilísticos foram efectuados, na medida em que os bens em causa não estavam compreendidos naqueles que a Administração Fiscal mandava discriminar.
4.15. Ao julgar como o fez, violou entre outros o Meritíssimo Julgador recorrido o disposto na Portaria 737/81 de 29 de Agosto, e Decreto Regulamentar 2/90.

Termos em que deve ser dado inteiro provimento ao presente recurso com todas as legais consequências.»

*

A Exma. Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu douto parecer no sentido da procedência do recurso apresentado pela Fazenda Pública e que deve ser julgado improcedente o recurso apresentado pela Impugnante.
*

Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência desta 1ª Sub-Secção do Contencioso Tributário para decisão.



*

II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«a) Foram efectuadas correcções à matéria colectável do grupo sujeito a tributação pelo lucro consolidado do exercício de 1993, tendo-se fixado um prejuízo fiscal de Esc. 2 397.733.090$, notificado ao impugnante. - cfr "Oficio de notificação", de fls 19, dos autos.

b) As correcções referidas em 1, resultaram de uma acção de inspecção realizada pela I.T., das quais foram objecto de desconsideração, entre outras importâncias, de reintegrações não aceites como custos, indemnizações ao pessoal e rendas, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido, e do qual consta o seguinte:


«Imagem no original»


e) Dão-se aqui por reproduzidas as facturas de aquisição de equipamentos sujeitos a reintegração constante de fls 49 a 171, dos autos.

d) Dão-se aqui por reproduzidos as escrituras de trespasse efectuadas pelas sociedades integradas no grupo, de fls 172 a 21O, dos autos.

Factos Não Provados

Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.


X


Motivação da decisão de facto

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e infarmações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.»



*

- De Direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Interpostos que foram recursos quer pela Fazenda Pública, quer pela Impugnante, cumpre apreciar cada um, separadamente.

Assim, e no que diz respeito ao recurso interposto pela Fazenda Pública, verifica-se que entende a Recorrente que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, por errada interpretação dos factos e, como tal, errada interpretação do direito aplicável.

Lidas as conclusões de recurso apresentadas pela Recorrente Fazenda Pública, temos que dissente esta do entendimento preconizado pela sentença recorrida relativamente a indemnizações pagas aos trabalhadores por rescisão do contrato de trabalho, uma vez que considera não serem estes custos indispensáveis à actividade, à renda relativa ao mês de Janeiro de 1993 (A…) e a reintegrações de bens do activo imobilizado corpóreo.

Dissente, ainda, quanto à condenação em custas, por entender que, considerando a data de entrada do processo de impugnação judicial, beneficiava a Fazenda Pública de isenção de custas, pelo que deverá ser anulada a sentença recorrida.

Vejamos, então.

Da correcção relativa a indemnizações a trabalhadores por rescisão do contrato de trabalho

Na sequência de análise interna à declaração de rendimentos Modelo 22, de IRC, referente ao exercício de 1993, a AT efectuou correcções que conduziram à redução do prejuízo declarado e de que resultou imposto a recuperar no valor de Esc. 1.131.980$00.

A Impugnante, discordando das correcções efectuadas pela AT, deduziu a presente Impugnação Judicial, tendo sido proferida sentença pelo TAF de Sintra, que considerou parcialmente procedente aquela, no que toca à correcção relativa a indemnizações pagas a trabalhadores por rescisão do contrato de trabalho.

Recordemos o teor da fundamentação da correcção efectuada pela AT, e que consta da alínea b) do probatório fixado na sentença recorrida:

“(…) Quadro 20 – LINHA 21:

Valor de 48.993.180$00 – indemnizações ao pessoal relativa às seguintes situações: A sociedade M..., S.A. estabeleceu contratos de trespasse de estabelecimentos comerciais, no exercício de 1993, para as sociedades A... – Comércio de Automóveis, Lda, A... – Comércio de Automóveis, Lda e P... – Comércio de Automóveis, Lda. Nas escrituras de trespasse vem expressamente referido que este incluía o direito ao arrendamento das instalações, respectivos recheios e os trabalhadores afectos aos estabelecimentos. Contudo, ainda em 1993 estas sociedades negociaram e acordaram com alguns trabalhadores o pagamento de indemnizações para rescisão dos contratos de trabalho. Estas indemnizações compreendiam essencialmente o tempo de trabalho prestado por estes trabalhadores na M..., SA. Ora, se o beneficiário dos serviços prestados por estes trabalhadores foi durante anos, a M..., SA, não deveriam ser estas sociedades a suportar os custos das mesmas. Nestes termos, propõe-se que, de acordo com o art. 23º do CIRC, não sejam aceites como custo do exercício de cada uma das sociedades a seguir identificadas as verbas relativas a indemnizações ao pessoal, referentes aos períodos em que os trabalhadores prestaram serviço para a M..., SA (relatórios de exame à escrita elaborados em 19/11/1996 pela DDF de Lisboa):

· A... – Comércio de Automóveis, Lda – 7.241.704$00

· A... – Comércio de Automóveis, Lda – 15.390.000$00

· T... – Comércio de Automóveis, Lda – 1.200.000$00

· P... – Comércio de Automóveis, Lda – 25.161.476$00 (…)”

Recuperemos a fundamentação da sentença recorrida, por referência à correcção em apreciação:

“(…)No entanto, já se entende que as despesas relativas aos trabalhadores (indemnizações por rescisão do contrato de trabalho) ainda que imputáveis a uma sociedade do grupo, devem ser consideradas no apuramento do lucro tributável do grupo já que trata-se em qualquer caso de um custo incluído no perímetro de consolidação da empresa dominante.- cfr artº 59° do CIRC.(…)”

Discorda a Recorrente do entendimento seguido pela sentença recorrida, pelas seguintes razões:

“ No que respeita às indemnizações pagas aos trabalhadores por rescisão do contrato de trabalho, tal como referido na fundamentação das correcções efectuadas, constantes a fls. 25 dos autos, as mesmas não se mostram indispensável [veis] à actividade das sociedades, na verdade, se as referidas sociedades não necessitavam de tais trabalhadores ao seu serviço deveriam ter negociado o trespasse com a M..., SA sem assumir como seus os trabalhadores afectos aos estabelecimentos trespassados, pelo que, os custos incorridos não se mostram indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos. (…)”

A questão da indispensabilidade dos custos societários para a realização dos proveitos ou ganhos tem sido tratada pela jurisprudência dos tribunais superiores, de que é exemplo o Acórdão do TCAS de 31 de Janeiro de 2012, proferido no âmbito do processo nº 5097/11, e do qual se extrai o seguinte:

“(…) Nesta matéria cabe, desde logo, com apoio no Ac. deste Tribunal de 19-01-2011, Proc. nº 04155/10, ao que se crê inédito, referir que “no que toca à noção de “necessidade” e/ou “indispensabilidade” prevista no art.º 23º nº 1 do CIRC, - no caso tendo em consideração a redacção vigente e aplicável ao exercício de 1993 -, não deixamos de nos identificar com a jurisprudência e a doutrina, quando preenche tal conceito por reporte ao interesse societário do sujeito passivo que pretende qualificar as (determinadas) despesas como custos fiscalmente relevantes.

Em suporte desse entendimento socorremo-nos do Ac. deste Tribunal tirado no Proc. n.º 1.107/06, de 2007JUL17 e de que respigamos, por transcrição, o seguinte excerto;

«Nos termos do art. 23° nº l do CIRC consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto.(...).

A questão a decidir passa, portanto, pela apreciação da alegada indispensabilidade de tais custos para a realização dos proveitos sujeitos a imposto, sendo que o referido art. 23º do CIRC enuncia, exemplificativamente, nas suas diversas alíneas, várias categorias concretas de encargos dedutíveis. Porém, da necessidade de comprovação da indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, resulta claro que a lei só contempla os encargos que sejam determinantes para aquele fim.

Sem embargo da relevância assumida pela realidade jurídico-económica subjacente às normas fiscais, a lei exige a comprovação da indispensabilidade do custo na obtenção dos proveitos e não apenas a comprovação da possibilidade de obtenção desses proveitos.
Mas como deve aferir-se o conceito de indispensabilidade?

Aceitando-se que estamos perante um conceito vago necessitado de preenchimento (cfr, o ac. do STA, de 23/9/98, AD 452/453, p. 1057) e aceitando-se que não estamos, quanto a tal preenchimento, perante qualquer poder discricionário (em termos de discricionariedade técnica) por parte da AT, importa, então, atentar nos termos em que a lei enquadra tal conceito.
Ora, como se disse, o art. 23° do CIRC dispunha, na redacção à data Redacção que, como ao que aqui nos importa, é a aplicável aos exercícios em questão – redacção dada pela Lei n.º 127-B/1997DEZ20.:

«1 - Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes:

(...)».
Fazendo apelo ao Estudo de Tomás de Castro Tavares (Da Relação de Dependência Parcial entre a Contabilidade e o Direito Fiscal na Determinação do Rendimento Tributável das Pessoas Colectivas: Algumas Reflexões ao Nível dos Custos, in CTF, nº 396, págs. 7 a 177) e confrontando as três interpretações possíveis ali enunciadas em termos da interpretação da regra constante do art. 23º do CIRC (indispensabilidade como sinónimo de absoluta necessidade, ou com o significado de conveniência, ou identificando-se com a noção de interesse societário) diremos, como aponta o autor, parecer evidente que da noção legal de custo fornecida pelo art. 23° do CIRC não resulta que a AT possa pôr em causa o princípio da liberdade da gestão, sindicando a bondade e oportunidade das decisões económicas da gestão da empresa e considerando que apenas podem ser assumidos fiscalmente aqueles de que decorram, directamente, proveitos para a empresa ou que se revelem convenientes para a empresa.

A indispensabilidade a que se refere o art. 23° do CIRC como condição para que um custo seja dedutível não se refere à necessidade (a despesa como uma condição sine qua non dos proveitos), nem sequer à conveniência (a despesa como conveniente para a organização empresarial), sob pena de intolerável intromissão da AT na autonomia e na liberdade de gestão do contribuinte, mas exige, tão-só, uma relação de causalidade económica, no sentido de que basta que o custo seja realizado no interesse da empresa, em ordem, directa ou indirectamente, à obtenção de lucros.

A noção legal de indispensabilidade recorta-se, portanto, sobre uma perspectiva económico-empresarial, por preenchimento directo ou indirecto, da motivação última de contribuição para a obtenção do lucro.»

(…)

«Os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou, por outras palavras, em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo. Este desiderato aproxima, de forma propositada, as categorias económicas e fiscais, através de uma interpretação primordialmente lógica e económica da causalidade legal. O gasto imprescindível equivale a todo o custo realizado em ordem à obtenção de ingressos e que represente um decaimento económico para a empresa. Em regra, portanto, a dedutibilidade fiscal do custo depende, apenas, de uma relação causal e justificada com a actividade da empresa. E fora do conceito de indispensabilidade ficarão apenas os actos desconformes com o escopo social, aqueles que não se inserem no interesse da sociedade, sobretudo porque não visam o lucro.

«Neste sentido vai, também, o entendimento de António Moura Portugal (A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pags. 113 e sgts.), quando sustenta que «A solução acolhida entre nós (pelo menos na doutrina), na esteira dos entendimentos propugnados pela doutrina italiana, tem sido a de interpretar a indispensabilidade em função do objecto societário», que esta exigência da indispensabilidade dos custos para a realização dos proveitos ou manutenção da fonte produtora se encontrava «inicialmente associada a uma condição de “razoabilidade” (artigo 26° do CCI)» e que se é certo «que a “razoabilidade” está presente em algumas disposições do CIRC, de forma expressa (23º), … deixou de ser tolerável a sua utilização como fundamento para limitar quantitativamente os encargos incorridos pelos sujeitos passivos. O problema é que o Fisco tem vindo a utilizar a indispensabilidade para precludir que determinados gastos, por si valorados como excessivos ou inapropriados, possam ser acolhidos pelo balanço fiscal. Talvez por isso se note na doutrina uma propensão para uma interpretação ampla do termo, recusando qualquer leitura do mesmo que pressuponha ou contemporize com juízos subjectivos do controlador público sobre a bondade da gestão empreendida (…).

A indispensabilidade deve assim ser aferida a partir de um juízo positivo da subsunção na actividade societária, o qual, por natureza, não deve ser sindicado pelo Direito Fiscal, que se não deve imiscuir, muito menos valorar as decisões empresariais do contribuinte. Só esta concepção está de acordo com os princípios de liberdade de gestão empresarial e, ao mesmo tempo, respeita interesses específicos do direito fiscal (que estão na base da limitação expressa que é feita à dedutibilidade de certos encargos).
Os custos indispensáveis equivalem, assim, aos gastos contraídos no interesse da empresa. A dedutibilidade fiscal do custo deve depender apenas de uma relação justificada com a actividade produtiva da empresa e esta indispensabilidade verifica-se “sempre que - por funcionamento da teoria da especialidade das pessoas colectivas - as operações societárias se insiram na sua capacidade, por subsunção ao respectivo escopo societário e, em especial, desde que se conectem com a obtenção de lucro ainda que de forma indirecta ou mediata”». (1)

Para este autor, a interpretação para a indispensabilidade «deve ser aferida a partir de um juízo positivo da subsunção na actividade societária. Este, por sua vez, não deve ser sindicado pelo Fisco ou pelos tribunais, porque a isso obriga a liberdade de iniciativa económica. (…) uma interpretação da indispensabilidade em função do objecto social e da actividade desenvolvida pela sociedade. A identificação com a actividade comercial, industrial ou agrícola desenvolvida pelo sujeito passivo é critério suficiente. Se se quiser falar de “relação causal”, esta só pode ter lugar por via de uma ligação entre os custos e a actividade da empresa. Nunca entre os custos e os proveitos ou a manutenção da fonte produtora.».
Isto mesmo para quem, como nós, se perfila na linha dos que consideram que não basta a ocorrência de toda e qualquer despesa, desde que subsumível ao tipo de actividade exercida pelo sujeito passivo, para que, necessariamente, tenha/possa ser havida como custo fiscal relevante para efeitos do artigo em questão, considerando-a como “indispensável”, sob pena de se não vislumbrar qualquer efeito e, muito menos, útil, à letra da lei que, apesar de subsequentes alterações legislativas, desde o tempo do CCIndustrial (art.º 26.º do respectivo compêndio legal) até aos dia de hoje (art.º 23.º/1 do CIRC) sempre manteve o conceito de “indispensabilidade” como pressuposto legal à qualificação de determinada despesa como custo fiscal, mas que entendem que essa aferição se há-de processar numa relação entre o custo (despesa) e a actividade, concretamente, desenvolvida pelo sujeito passivo, assim tendo, de alguma forma, ínsita a necessidade de apreciação “a posteriori” da gestão empresarial; mas, reafirma-se, apenas enquanto pressuposto à referida aferição, em concreto, do custo à actividade societária e já não quanto à bondade e/ou oportunidade, particularmente económica, da realização dessa mesma despesa.
Ou seja acompanha-se o entendimento da ilegitimidade da administração pública, rectius da administração fiscal, em emitir juízos de valor sobre a bondade da gestão empresarial prosseguida, na esteira do escopo societário, mas apenas quando tal juízo de valor reflicta uma pronúncia sobre a oportunidade de determinado tipo de conduta empresarial e, por maioria de razão, sobre a orientação dessa mesma conduta, enquanto conduta devida para a obtenção de ganhos, ou seja, acolhe-se o argumento de que a emissão de um juízo de valor sobre “(...) a bondade da gestão empreendida (...)”, por parte da AF, é ilegítimo para qualificação de uma determinada despesa enquanto custo ao abrigo do art.º 23.º/1 se e na medida em que essa aferição repousar numa ponderação de causalidade entre o custo e os proveitos.

Assim sendo, neste domínio, porque o preceito existe e tem de ter aplicabilidade prática, apenas não será de aceitar como custos fiscais relevantes e, por isso, dedutíveis, aqueles que, independentemente de corresponderem a uma correcta ou incorrecta actuação de gestão, não forem, objectivamente, adequados ao desenvolvimento da actividade da empresa.(…)”

A Recorrente Fazenda Pública afirma que os custos não podem ser aceites por não serem indispensáveis à actividade da Impugnante. No entanto, a sua argumentação limita-se a colocar em causa a decisão de gestão, da Impugnante, de ter negociado os trespasses em causa com a inclusão dos trabalhadores dos estabelecimentos trespassados, sem cuidar de demonstrar em que medida fundamenta a falta do pressuposto de indispensabilidade daqueles custo para a prossecução da actividade da Impugnante.

Refira-se que não vem posta em causa a circunstância de terem ocorrido os trespasses dos estabelecimentos comerciais e que, nos mesmos, se incluíam os respectivos trabalhadores. É, igualmente, certo que a rescisão dos contratos de trabalho é posterior à celebração dos trespasses.

Ora, uma vez que não cabe à AT formular juízos de valor quanto à bondade de determinada decisão de gestão dos sujeitos passivos (no caso, quanto às condições em que foram negociados os contratos de trespasse), e considerando que as razões que alega em sede de recurso em nada colocam em causa o decidido pela sentença recorrida, que entendeu que os custos com indemnizações com pessoal devidas pela rescisão de contrato de trabalho ainda que imputáveis a uma sociedade do grupo, devem ser consideradas no apuramento do lucro tributável do grupo já que trata-se em qualquer caso de um custo incluído no perímetro de consolidação da empresa dominante- cfr artº 59° do CIRC, concluímos pela improcedência deste fundamento do recurso.

Da renda relativa ao mês de Janeiro de 1993 paga pela sociedade A..., Ldª

Afirma a Recorrente Fazenda Pública, relativamente a esta correcção que a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação dos factos invocados quer pela Administração Tributária, quer essencialmente pela Impugnante. Entende que resulta dos factos alegados pela Impugnante no artigo 22° e 28° da p.i. que os imóveis onde se encontram instalados os estabelecimentos comerciais objecto do trespasse eram propriedade da M..., SA., assim, contrariamente ou doutamente decidido a M..., SA, não tinha que incorrer em qualquer custo com a renda do referido imóvel. Conclui que, no caso concreto considerar-se ser indiferente a quem se imputam os custos uma vez que devem ser consideradas no apuramento do lucro tributável do grupo já que se trata em qualquer caso de um custo incluído no perímetro de consolidação da empresa dominante, não está conforme os factos alegados.

Recordemos o teor da sentença recorrida, no que respeita à referida renda de Janeiro de 1993:

“(…)No entanto,(…) ainda que imputáveis a uma sociedade do grupo, devem ser consideradas no apuramento do lucro tributável do grupo já que trata-se em qualquer caso de um custo incluído no perímetro de consolidação da empresa dominante.- cfr artº 59° do CIRC. "Mutatis Mutandii", quanto ao custo da renda suportada por uma empresa do grupo, o que não foi questionado pela Adm Fiscal, desde que incorrida pela mesma ou por outra empresa dominada.(…)”

A Recorrente Fazenda Pública insurge-se contra o decidido pela circunstância de não estar em consonância com os factos alegados pela Impugnante nos artigos 22º e 28º da p.i.

Porém, o vertido nos referidos artigos da p.i., no que concerne à propriedade dos imóveis, não faz parte do elenco dos factos dados como provados pela sentença recorrida, nem tampouco foi tomado em consideração na fundamentação daquela. De facto, a sentença recorrida entendeu ser de anular a correcção referente à renda de Janeiro de 1993, pela circunstância de se tratar de um custo incluído no perímetro de consolidação da empresa dominante, e essa asserção não vem posta em causa pela Recorrente.

Nessa medida, improcede este segmento do recurso.

Das correcções às reintegrações dos bens do activo imobilizado corpóreo

Dissente a Recorrente Fazenda Pública do decidido em 1ª instância quanto às correcções relativas a reintegrações de bens do activo imobilizado corpóreo.

Para tanto, afirma que não devem ser considerados documentos justificativos apresentados pela Impugnante respeitantes ao ano de 1989, constantes de fls. 52 a 55, 122 e 123, no montante global de 14.536.816$00.

Dos comprovativos apresentados pela Impugnante resulta que nem todos dizem respeito a computadores ou máquinas de fotocópias, conforme resulta entre outros dos constantes de fls. 164 a 171, o material constantes destes últimos de considerar como máquina electrónicas e como tal enquadrada na rubrica 2220, da Tabela II anexa ao Dec. Reg. Nº 2/90 de 12.01, às quais é aplicável a taxa de 14,28%, pelo que, também relativamente a esta questão a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação dos factos.

Conforme mapa de reintegrações apresentado pela Impugnante e constante de fls. 31, 32 e 33 é a própria que enquadra os equipamentos na rubrica 2220 da Tabela II anexa ao Dec. Reg. Nº 2/90 de 12.01, pelo que, em consonância com a mesma deveria ter aplicado a taxa de 14,28% e não de 20%.

Vejamos.

A sentença, no probatório (alínea c)), deu como reproduzidos os documentos juntos aos autos constantes a fls. 49 a 171, que identificou como facturas de aquisição de equipamentos sujeitos a reintegração.

E, na fundamentação, entendeu que:

“(…) Quanto às correcções às reintegrações dos bens do activo imobilizado corpóreo, considerando as taxas fixadas na tabela II a que se refere o artº 5°, do nº 1, do Dec-Reg. Nº 2190, e especificamente o Grupo 3, em que aqueles bens se inserem, será de considerar como não resultando excessivas as reintegrações praticadas pelo impte não sendo de considerar quaisquer outras taxas relativas a bens adquiridos ao abrigo de anterior legislação já que os valores corrigidos pela Adm. não dizem respeito a anteriores aquisições de bens daquela activo.(…)”

Comecemos por apreciar a questão relativa à não aceitação da reintegração, pretendida pela Recorrente, dos bens cuja aquisição ocorreu em 1989, reflectidos nos documentos constantes dos autos a fls. 52, 55, 122 e 123. Entende a Recorrente que não deve ser aceite a respectiva reintegração pelo facto de a sentença ter referido que os valores corrigidos pela AT não respeitam a anos anteriores.

Não tem razão.

Por um lado, como a sentença refere, e se constata dos mapas de reintegrações anexos ao DC-22, os bens cuja amortização não foi aceite não foram adquiridos em 1989, pelo que é irrelevante a argumentação de que os documentos não os suportam, já que, como se diz na sentença, os valores corrigidos pela Adm. não dizem respeito a anteriores aquisições de bens daquele activo.

Por outro lado, a taxa que a Recorrente pretende ver aplicada, de 14,28 %, a que corresponde a rúbrica 2220 da tabela II, anexa ao Decreto-Regulamentar nº2/90, respeita a equipamento de precisão e de laboratório, de que não há notícia nos autos ser a natureza dos bens em causa.

Ainda que se entendesse que se tratava de aparelhos electrónicos, que não se demonstrou, sempre seria de aplicar a taxa de 20 %, prevista na rúbrica 2200 da referida tabela II, grupo 3.

Ou seja, considerando que a taxa aplicada pela Impugnante foi a de 20%, entendemos, como a sentença, que a taxa aplicada foi a da categoria em que os bens se inserem, pelo que improcede este segmento do recurso.

Das custas


Assiste inteira razão à Recorrente.


Tendo a presente impugnação sido autuada em 06/05/1999 (vide carimbo aposto a fls. 2 do 1º Volume) ou seja no domínio do Código das Custas Judiciais aprovado pelo D.L. 224-A/96 de 26/11, (na redacção anterior às alterações introduzidas pelo D.L. nº 324/03 de 27/12 as quais só se aplicam aos processos instaurados após a sua entrada em vigor). Assim, considerando o disposto na al. a) do nº 1 do artigo 2º do CCJ, que consagrava a isenção do Estado, onde se incluía a Fazenda Pública, está esta isenta de custas.


Nessa medida, procede este segmento do recurso, devendo ser tida em consideração, na condenação em custas, a isenção de que beneficiava a Fazenda Pública.



*




Recurso interposto pela Impugnante


Das correcções referentes a reintegrações para além do período de vida útil


A AT efectuou correcções relativas a reintegrações relativas a aumento de capital, por ter sido ultrapassado o período de vida útil, nos seguintes termos (vide alínea b) do probatório):


“(…) 2.441.843$00, relativo a reintegrações contabilizadas pela sociedade M..., SA não aceites como custo nos termos da alínea d) do nº1 do artº 32º do CIRC e nº5 do artigo 3º do D.R. nº 2/90, pelo facto de ter sido ultrapassado o período máximo de vida útil, praticadas sobre elementos do activo imobilizado incorpóreo (anexo nº2, fls.4 e 5). (…)”


A sentença recorrida considerou improcedente a impugnação judicial relativamente a esta correcção, tendo, para tanto, referido o seguinte:


“(…) Quanto ao período de amortização praticado pelo impte relativo a encargos com aumento de capital, resulta do próprio preenchimento pelo contribuinte do Mapa de Reintegrações do ano em que se verificou o encargo e os anos de utilidade esperada de três anos ( cfr anexo 2, junto à fundamentação das correcções), pelo que carecia de demonstração que o mesmo resultava de uma incorrecção por parte do impte, sendo de imputar aqueles encargos a mais exercícios, não justificando o mesmo tal circunstância com base na interpretação das normas legais aplicáveis já que as mesmas não se incluem nas situações elencadas exaustivamente no nº4, do artº 17º, do referido regime de reintegrações ,as quais constituem um elenco fechado "numerus clausus" para a consideração de despesas não consideradas como imobilizações incorpóreas e susceptíveis de amortização.(…)”


Considerou, pois, a sentença que a Impugnante não logrou demonstrar que o preenchimento do Mapa de Reintegrações do ano em que se verificou o encargo, onde se identificou como sendo de três os anos de utilidade esperada desse encargo, resultou de erro de preenchimento.


A Impugnante, aqui Recorrente, não concorda com a conclusão a que chegou a sentença recorrida, tendo alinhado os seguintes argumentos:

“À data em que foi efectuado o aumento de capital (1988), e iniciadas as amortizações, estava em vigor a Portaria nº 737/81 de 29 de Agosto, e cujo regime jurídico foi alterado pelo Decreto-Regulamentar nº 2/90.
No caso em apreço, ou seja a taxa máxima e mínima de amortização para despesas com o aumento de capital social não se alteraram com a entrada em vigor do Decreto-Regulamentar nº 2/90, mantendo-se em 33,33%, a taxa máxima que se podia aplicar num ano, sendo a taxa mínima, de percentagem igual a metade da máxima ou seja 16,67%.
A fazer-se a amortização à taxa mínima de 16,67% em cada exercício, isto corresponde a fazerem-se amortizações ao longo de seis anos, pelo que a sociedade M... teria sempre o direito de amortizar aqueles custos incorridos com o aumento de capital realizado em 1988 à razão de 16,67% por ano, quer no âmbito da Portaria 737/81 de 29 de Agosto, em vigor à data em que começou a efectuar as amortizações, quer no âmbito do decreto Regulamentar 2/90.
Se o aumento de capital teve lugar em 1988, e se o período possível para a amortização era seis anos, em 1993, era ainda possível amortizar aqueles encargos, à razão de 16,67% do custo incorrido, ao contrário do que, diversamente se decidiu na sentença recorrida.
A impugnante aceitou e reconheceu que a amortização por si efectuada não estava correcta, porquanto foi além daquele limite de 16,67% contudo, esse facto não podia justificar a desconsideração da amortização na sua totalidade porquanto de acordo com os indicados critérios legais, o valor correcto a amortizar seria de 405.956$00.”

Vejamos.


Relativamente a esta matéria, dispunha o nº4 do artigo 17º do Decreto Regulamentar nº 2/90:

“Embora não sendo imobilizações incorpóreas, devem, contudo, ser consideradas como custos, em partes iguais, em mais do que um exercício, as despesas ou encargos de projecção económica plurianual, sendo aquela repartição feita durante um período mínimo de três anos em relação às seguintes:

a) Despesas com a emissão de obrigações;

b) Encargos financeiros com a aquisição ou produção de imobilizado, correspondentes ao período anterior ao da sua entrada em funcionamento, quando não tenha sido utilizada a faculdade prevista no n.º 6 do artigo 2.º;

c) Diferenças de câmbio desfavorável relacionadas com o imobilizado e correspondentes ao período anterior à sua entrada em funcionamento;

d) Encargos com campanhas publicitárias.”


Por sua vez, preceituava o artigo 3º do mesmo diploma:


Artigo 3.º


Período de vida útil


1 - A vida útil de um elemento do activo imobilizado é, para efeitos fiscais, o período durante o qual se reintegra ou amortiza totalmente o seu valor, excluído, quando for caso disso, o respectivo valor residual.


2 - Qualquer que seja o método de reintegração ou amortização utilizado, considera-se:


a) Período mínimo de vida útil de um elemento do activo imobilizado o que se deduz das taxas que podem ser aceites fiscalmente segundo o método das quotas constantes;


b) Período máximo de vida útil de um elemento do activo imobilizado o que se deduz de uma taxa igual a metade das referidas na alínea anterior.


3 - Exceptuam-se do disposto na alínea b) do número anterior as despesas de instalação e as despesas de investigação e desenvolvimento, cujo período máximo de vida útil é de cinco anos.


4 - Os períodos mínimo e máximo de vida útil contam-se a partir da ocorrência dos factos mencionados no n.º 2 do artigo 1.º


5 - Não são aceites como custos ou perdas para efeitos fiscais as reintegrações ou amortizações praticadas para além do período máximo de vida útil, ressalvando-se os casos devidamente justificados e aceites pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos.”


Resulta do Mapa de Reintegrações constante dos autos a fls. 32 e que constitui o Anexo I ao DC-22 a que se refere a alínea b) do probatório, que os encargos com aumento de capital foram incorridos em 1988, ano que se iniciou a sua utilização, tendo sido preenchido o campo relativo ao número de anos de utilidade esperada com o algarismo 3, e o campo relativo à taxa com o número 33.3333%.


A Recorrente M..., SGPS, SA, discorda do decidido, argumentando que à data da realização do aumento de capital, a sociedade M..., S.A. tinha a faculdade de amortizar as despesas com o aumento de capital social, num período mínimo de três anos (33,33%/ano) e máximo de seis anos (16,67%/ano).


Afirma que, a fazer-se a amortização à taxa mínima de 16,67% em cada exercício, isto corresponde a fazerem-se amortizações ao longo de seis anos. Entende que sempre a Recorrente teria direito a amortizar aqueles custos incorridos à razão de 16,67% por ano, quer no âmbito da Portaria 737/81 de 29 de Agosto (cujo regime era semelhante ao do DR nº2/90), em vigor à data em que começou a efectuar as amortizações, quer no âmbito do Decreto Regulamentar nº2/90.


Sucede que não foi demonstrado nem provado que a taxa de amortização aplicada nos exercícios anteriores tinha sido a pretendida de 16,67%, o que, eventualmente, permitiria a amortização pelo período de seis anos. Pelo contrário, o que resulta do Mapa de Reintegrações supra referido, é que a taxa aplicada foi a de 33,33%, razão para que se conclua pela improcedência deste fundamento de recurso, sendo de manter a sentença recorrida, relativamente a esta correcção.


Das reintegrações não aceites referentes a activos do imobilizado corpóreo


A sentença recorrida entendeu ser de manter a correcção efectuada pela AT referente a reintegrações não aceites referentes a activos do imobilizado corpóreo nos seguintes termos:


“(…) Quanto às reintegrações de bens não sujeitos a deperecimento por se haver considerado como inerentes ao trespasse dos estabelecimentos em causa vem, no entanto, a impugnante, sustentar que tal valor de aquisição de bens de equipamento, deveriam ser considerados como um activo imobilizado em resultado do trespasse do estabelecimento comercial, de cuja decomposição dos elementos activos que integram a unidade económica adquirida, resultaria aqueles bens de equipamento transaccionados , os quais seriam objecto de amortização face ao período de utilidade esperada. O que dizer desta problematização da questão posta?


Importa dizer desde já que, efectivamente, e como resulta implícito do Relatório da I.T., aquelas importâncias deveriam ter sido consideradas no âmbito dos bens patrimoniais activos que a empresa utiliza como meio de realização dos seus objectivos (bens de equipamento) e consequentemente como incluídas no seu activo imobilizado. Também é certo que, não sendo apurado qualquer diferença entre a importância global dispendido na operação e o somatório dos justos valores activos e passivos que integram a unidade económica adquirida, dele não resultando qualquer remanescente positivo, não há que falar de registo da mesma na conta "trespasses", enquanto constituindo um seu imobilizado incorpóreo - cfr nesse sentido "Elementos de Contabilidade Geral", de A. Borges, A.Rodrigues e R.Rodrigues" pags 487 e M. dos Prazeres Lousa, in "Algumas questões relativas ao trespasse", Cadernos de C.T.F. nº 380, 1995. Assim sendo,


Tal não obstaria à consideração dos mesmos no âmbito das imobilizações corpóreas face aos elementos que a compõem e assim susceptíveis de amortização. O problema então coloca-se noutro nível que é identificado pelo relatório da I.T. e diz respeito à consideração da natureza daqueles bens, não permitindo discernir entre aquilo que diz respeito ao trespasse como elemento incorpóreo propriamente dito das outras componentes corpóreos que integram o estabelecimento comercial ou industrial sujeito a deperecimento, pelo que a falta de identificação dos elementos corpóreos que a sustentavam e da anterior situação de reintegração dos mesmos no âmbito do grupo, impede a sua consideração enquanto elementos reintegráveis daquele activo imobilizado da empresa. (…)”


A Recorrente/Impugnante não se conforma com o decidido, assacando à decisão recorrida o vício de erro sobre os pressupostos, porquanto, na contabilidade das sociedades adquirentes, encontravam-se perfeitamente autonomizados os elementos do activo imobilizado corpóreo dos elementos do activo imobilizado incorpóreo, não se confundido uns e outros, tanto que nos factos provados se menciona essa realidade, ou seja a de que “... Na tradução contabilística destes contratos estas empresas registaram parte do elemento corpóreo do trespasse em instalações não especificadas código 2195- ou instalações (arranjos urbanísticos) código 2080."

Entende que está provado nos autos quais os valores pelos quais as empresas registaram nas suas contabilidades como activos do seu imobilizado corpóreo bens cujo direito de propriedade adquiriram com o trespasse.

Afirma que a falta de discriminação invocada pela Administração fiscal, tem que ver com o facto de, no mapa de reintegrações e amortizações modelo 32.1, aqueles elementos corpóreos não terem sido discriminados per si, mas isto sucedeu porque ao tempo, as sociedades preencheram o modelo 32.1 de acordo com as Notas para preenchimento do modelo que tinham uma chamada de atenção em que a Administração Fiscal escrevia textualmente o seguinte:
''A discriminação elemento a elemento não é permitida para os restantes bens do activo imobilizado, os quais devem, ser discriminados somente por grupos homogéneos, conforme as designações tabelas anexas ao Decreto Regulamentar."
Adiante-se que entendemos que a sentença recorrida decidiu com acerto, ao considerar que a falta de identificação dos elementos corpóreos que a sustentavam e da anterior situação de reintegração dos mesmos no âmbito do grupo, impede a sua consideração enquanto elementos reintegráveis daquele activo imobilizado da empresa.
Efectivamente, não é possível identificar a natureza dos bens em causa, nem a Recorrente logrou demonstrar em que moldes era feita a amortização dos referidos bens anteriormente aos trespasses (no âmbito do grupo), o que impede a sua consideração enquanto elementos do activo imobilizado sujeitos a reintegração.
Assim sendo, a argumentação da Recorrente não é suficiente para abalar o decidido, pelo que improcede este segmento da alegação de recurso.

III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em;


· Julgar parcialmente procedente o recurso interposto pela Fazenda Pública, em concreto, no segmento da condenação em custas;


· Julgar improcedente o recurso interposto pela Impugnante.

Custas pela Impugnante, beneficiando a Fazenda Pública de isenção em ambas as instâncias.

Registe e notifique.

Lisboa, 21 de Maio de 2020


(Isabel Fernandes)

(Jorge Cortês)

(Lurdes Toscano)