Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05719/12
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:03/05/2013
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:PRESCRIÇÃO. NULIDADE DA SENTENÇA. SISA. COMPETÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO. COMPRA PARA REVENDA. ISENÇÃO. CADUCIDADE.
Sumário:I) Tratando-se de imposto pago, a prescrição não pode ocorrer na medida em que tal pagamento determina a extinção da correspondente obrigação da relação jurídica em apreço, não fazendo mais sentido, e sendo impossível fazer extinguir, pela prescrição, o que já não existe, tendo já sido extinto, ainda que por outro fundamento.
II) Quanto à nulidade da sentença por falta de fundamentação, é preciso distinguir a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação ( é neste âmbito que opera o citado art. 668º nº 1 al. b) do C. Proc. Civil); a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
III) Quanto à competência para a prática do acto, tem de entender-se que a conduta do funcionário que subscreve a denominada Liquidação do Imposto de SISA que consta de fls. 55 dos autos é sancionada pelo referido Adjunto que subscreve o ofício nº 4505, aí apontando os elementos a considerar com referência à liquidação apontada nos autos, sendo esta a matéria que interessa neste domínio, não podendo reduzir-se a questão à nota demonstrativa da liquidação nos termos apontados pela Recorrente. IV) A exigência legal e constitucional de fundamentação visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa, de modo que, considerando os elementos presentes nos autos, tem de entender-se que a fundamentação externada pela AT satisfaz o requisito de fundamentação exigível, do ponto de vista formal, sendo suficiente porque permite a reconstituição do iter cognoscitivo que determinou a decisão da Administração, sendo clara porque é inteligível e sem ambiguidades ou obscuridades e é congruente porque exprime concordância entre os pressupostos normativos do acto e os motivos do mesmo, encontrando-se em suma, suficientemente fundamentado tal acto de liquidação de sisa.
V) Para efeitos do disposto nos arts. 11º, nº 3 e 16º nº 1 do Código da Sisa, não importa a caducidade da respectiva isenção o acabamento de um edifício em construção (em fase de acabamentos) no lote de terreno adquirido e a posterior constituição da propriedade horizontal e revenda em fracções autónomas
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O Relator
Pedro Vergueiro
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário ( 2ª Secção ) do Tribunal Central Administrativo Sul:
1. RELATÓRIO
“A...- Sociedade de Compra e Venda de Propriedades e de Empreendimentos Turísticos, Lda.”, agora “A...- Empreendimentos Turísticos, S.A.”, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 27-06-2011, que julgou improcedente a IMPUGNAÇÃO pela mesma deduzida, tendo como pano de fundo o acto de liquidação de sisa no valor de 4.200.000$00 (20.949,51€), juros compensatórios no valor de 533.630$00 (2.661,74€) e imposto de selo no valor de 320.000$00 (1.596,15) e juros compensatórios no valor de (202,80€).

Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 321-350), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(...)
A) QUESTÃO PRÉVIA - DA PRESCRICÃO
I De acordo com o artigo 180.º do CIMSISSD, na versão aplicável a estes autos, o imposto municipal de sisa prescreve nos termos do artigo 34.º do CPT;
II A contagem do prazo de prescrição de dez anos iniciou-se no dia 01 de Janeiro de 1997, ou seja no início do ano seguinte àquele em que ocorreu o facto tributário - a escritura de divisão de 05 de Junho de 1996;
III O processo de impugnação judicial da liquidação foi autuado a 13 de Abril de 2000;
IV Decorreram desde o início da contagem do prazo de prescrição até à autuação da impugnação judicial, 3 (três) anos. 3 (três) meses e 13 (treze) dias;
V Nenhum acto foi praticado nos autos desde o dia 24 de Outubro de 2002 (data da emissão do parecer do Digno Magistrado do Ministério Publico) até ao dia 29 de Junho de 2010 (data em que foi proferida a sentença), tendo decorrido 7 (sete) anos, 8 (oito) meses e 5 (cinco) dias;
VI No dia 24 de Outubro de 2003, cumpriu-se um ano de paragem dos autos, por motivo não imputável à Impugnante, pelo que a partir dessa data cessou o efeito da interrupção da prescrição;
VII Sobre essa data e até hoje (08 de Novembro de 2010) decorreram 7 (sete) anos e 15 (quinze) dias, a que devem acrescer os 3 (três) anos. 3 (três) meses e 13 (treze) dias que decorreram desde o início da contagem do prazo de prescrição até à autuação, o que resulta num total de 10 (dez) anos. 3 (três) meses e 28 (vinte e oito) dias;
VIII Encontra-se, assim, prescrita a obrigação fiscal, por forca do decurso do prazo de prescrição, o que se requer seja declarado
Ainda que assim não se entenda, o que por mero dever de patrocínio, sem conceder, se admite, sempre se diga:
B) DA NULIDADE PARCIAL POR FALTA DE FUNDAMENTACAO DA SENTENCA
IX A sentença recorrida não fundamenta nem de facto nem de direito os motivos pelos quais a decisão foi no sentido de julgar não verificada a incompetência do autor do acto;
X Com efeito, no que a tal matéria respeita, consta apenas da sentença recorrida o seguinte: Quanto à a1egada incompetência do autor do acto a mesma não ocorreu”;
XI Ante a total ausência na sentença de qualquer referência à motivação que levou o Tribunal a quo a decidir como decidiu, encontramo-nos perante uma sentença parcialmente nula, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil;
Ainda que assim não se entenda, o que por mero dever de patrocínio, sem conceder, se admite sempre se diga:
C) NO PLANO FACTUAL
XII A Recorrente entende que se verificaram erros na fixação da matéria de facto, devendo em concreto ser corrigidos os seguintes pontos da fundamentação de facto:
XIII O ponto 5. da fundamentação de facto, com base na escritura pública de divisão (fls. 27 a 32). deverá passar a ter o seguinte teor: “Os outorgantes referidos em 3. decidiram, aquando da referida escritura, adjudicar à Impugnante o prédio objecto da divisão e a construção nele efectuada, constando da escritura que o prédio adjudicado se destina a revenda”;
XIV O ponto 7. da fundamentação de facto, com base no Oficio 4505 de 20 de Junho de 1997 (fls. 53), deverá passar a ter o seguinte teor: “Em 20-06-97 o serviço de finanças de Lisboa 7 emitiu o ofício n.º 4505 segundo o qual notificava a Impugnante para efectuar o pagamento de sisa no valor de 4.200.000$00 (20.949,510, juros compensatórios no valor de 533.630$00 (2.661,740, imposto de selo no valor de 320.000$00 (1.596,150 e juros compensatórios no valor de 40.658$00 (202,80€), perfazendo o valor total de 5.094.288$00 (25.410,20€), referente à escritura de divisão de 05-06-1996 realizada no 24.º Cartório Notarial de Lisboa (fl. 53)”;
XV Deverá ser acrescentado um ponto 13. na fundamentação de facto (renumerando­-se os pontos seguintes) com base na Liquidação do Imposto de Sisa (fl. 55), no Oficio 4505 de 20 de Junho de 1997 (fls. 53) e na Delegação de Poderes (fls. 78 e 79), com o seguinte teor: “A liquidação referida no ponto anterior (fl. 55) não foi assinada pelo Adjunto Mário Anselmo de Sã Barbosa Novo, não estando demonstrada nos autos qualquer delegação de poderes na pessoa do funcionário signatário da liquidação.”;
D) NO PLANO JURÍDICO
A - Da nulidade da liquidação por incompetência do respectivo autor
XVI Da análise dos pontos 9., 10., 12. e 13. (novo), é evidente que quem procedeu à liquidação dos impostos de sisa e de selo em causa nestes autos não tinha competência para a prática desse acto, por a mesma não lhe ter sido delegada;
XVII Ainda que sem as supra anotadas correcções à matéria de facto, conclui-se que quem tinha competência delegada para efeitos da liquidação do imposto municipal de sisa era o Adjunto Mário Anselmo de Sã Barbosa Novo, sendo certo que não foi o mesmo quem procedeu à liquidação (pontos 7. a 10. e 12. da fundamentação de facto);
XVIII Donde, deveria ter sido declarada nula a liquidação impugnada por incompetência do autor do acto, com as legais consequências.
XIX Ao decidir diferentemente, o Tribunal a quo violou o artigo 46.º do CIMSISD e o artigo 21.º do Regulamento do Imposto de Selo (nas versões aplicáveis aos autos);
Ainda que assim não se entenda, o que por mero dever de patrocínio, sem conceder, se admite, sempre se diga:
B - Da nulidade da liquidação por falta de fundamentação
XX O Digno Magistrado do Ministério Público pronunciou-se pela procedência da falta de fundamentação do acto aqui em causa (Cfr. Fls. 259 e 260);
XXI Da nota de liquidação impugnada consta apenas como “fundamentos da liquidação: alteração do destino (revenda)”, não sendo feita qualquer remissão para outro documento ou elemento;
XXII O dever de fundamentação expressa encontra-se consagrado no n.º 2 do artigo 268.º da Constituição, nos artigos 19.º, alínea b), 21.º e 82.º do Código de Procedimento Tributário e nos artigos 124.º e 125.º do Código de Procedimento Administrativo;
XXIII A fundamentação expressa dos actos administrativos (neles se incluindo actos tributários ou em matéria tributária) deve ser entendida como a exposição descritiva das razões do acto (da decisão), compreendendo a matéria de facto e a matéria de direito que determinaram a autoridade administrativa à prática de certo acto:
XXIV Deve ainda a fundamentação ser clara, congruente e suficiente, explícita e contextual;
XXV A fundamentação tem de ser contemporânea do acto e não sucessiva - a fundamentação do acto de liquidação é apenas a que consta do respectivo texto e só esta. Não é admissível que a administração fiscal venha mais tarde apresentar uma fundamentação suficiente;
XXVI A haver vício de falta de fundamentação, como sucede nos presentes autos, esta já se radicou e é, por natureza, insuprível a posteriori;
XXVII O texto expresso na liquidação impugnada não permite “conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo do acto”;
XXVIII O acto de liquidação impugnado deveria descrever, ainda que sucintamente, uma matéria de facto e um quadro legal, subsumindo a primeira no segundo, e concluir. Nada disto aconteceu no acto impugnado;
XXIX A expressão “alteração do destino (revenda)” é meramente conclusiva, constitui uma fórmula vaga, genérica e abstracta, que poderia fundamentar qualquer acto administrativo, independentemente do seu tipo legal e das concretas circunstâncias de facto;
XXX Sempre se diga que o facto da administração fiscal ter enviado à Impugnante um auto de notícia, onde descreve de maneira sucinta as circunstâncias que terão levado à prática do acto impugnado, não serve para conferir ao acto de liquidação a imprescindível fundamentação;
XXXI O auto de notícia não é um acto administrativo, nunca fundamenta, de per si, uma liquidação, e não constitui prova no tocante à existência e quantificação do imposto;
XXXII Não há qualquer correlação entre os dois indicados documentos, - nota de liquidação e auto de notícia - sendo certo ademais que o acto de liquidação não remete, nem explícita nem implicitamente, para o teor do auto de notícia, nem, diga-se, para qualquer outro documento;
XXXIII O facto de a administração fiscal, ao notificar a Impugnante da nota de liquidação ter enviado conjuntamente o auto de notícia, não consubstancia fundamentação daquela, pois, como bem anotou o Digno Magistrado do Ministério Público (fl. 259), que “(…) o acto de notificação não é confundível com o acto de liquidação notificado. A notificação, como a jurisprudência o vem entendendo, consiste na comunicação de uni acto aos que nele são interessados a qual, salvo disposição em contrário, não se integra na formação e emissão do próprio acto.”;
XXXIV A fundamentação do acto de liquidação impugnado é insuficiente, o que equivale à falta de fundamentação
XXXV O vício de falta de fundamentação é determinador da nulidade do acto impugnado, o que deveria ter sido declarado na Sentença ora recorrida
XXXVI Ao decidir diferentemente, Tribunal a quo violou n.º 2 do artigo 268. ° da Constituição, nos artigos 19.º, alínea b), 21.º e 82.º do Código de Procedimento Tributário e nos artigos 124.º e 125.º do Código de Procedimento Administrativo;
Ainda que assim não se entenda, o que por mero dever de patrocínio, sem conceder, se admite, sempre se diga:
C - Da ilegalidade substantiva da liquidação
XXXVII O Digno Magistrado do Ministério Público pronunciou-se no seu parecer (Cfr. Fls. 259 e 260) pela procedência da impugnação, entendendo que se verifica o invocado erro sobre os pressupostos da liquidação;
XXXVIII Também o Ilustre Representante da Fazenda Pública, nas suas alegações de fls. 247 a 249, considera que a revenda do prédio adquirido já em fracções autónomas após término das obras não releva para a perda do beneficio de isenção de sisa;
XXXIX Com relevância para esta questão, ficou demonstrado nos autos:
- A Impugnante adquiriu a metade indivisa do prédio em causa com intenção de revenda do mesmo, intenção essa devidamente exarada na escritura de divisão (ponto 5 da fundamentação de facto);
- No prédio objecto da divisão adjudicado à Impugnante, estava em construção um edifício em fase de acabamentos, o que foi consignado na escritura (pontos 4 (corrigido, conforme supra se defendeu) e 5 da fundamentação de facto);
- Após término da respectiva construção e dentro do prazo legalmente previsto de três anos, a Impugnante constituiu-o em propriedade horizontal e revendeu-o em fracções autónomas (ponto 27 da fundamentação de facto, depoimento de fls. 134 e documentos de fls. 147 e ss);
XL Entende a Recorrente que o facto de ter procedido à venda do prédio adquirido após término da construção e constituição da propriedade horizontal não consubstancia alteração do objecto nem da destinação;
XLI Tal como refere no seu parecer o Jurista Nuno Sã Gomes (in CTF n.º 380, págs. 488 a 490), em situação idêntica foi concedida e mantida isenção de sisa pela aquisição de prédio em construção, adquirido para revenda, sabendo-se que a empresa adquirente concluiu aquela construção e a constituiu em propriedade horizontal, revendendo as fracções autónomas daí resultantes;
XLII Porquanto, na verdade e segundo defende o mesmo autor, o término da construção nos termos do projecto aprovado não altera substancialmente a natureza do prédio adquirido;
XLIII Como bem se preconiza no douto parecer do Digno Magistrado do Ministério Público (fls. 260), “(...) constando do documento aquisitivo do terreno em causa que no mesmo se encontra em construção um edifício em fase de acabamentos, parece evidente que a conclusão dessa obra, como aconteceu no caso vertente, não acarreta alteração substancial da natureza do prédio e, consequentemente, alteração do respectivo destino do prédio, por forma a determinar a extinção do beneficio da isenção de sisa, nos termos do disposto no art. 16.º, 1.º do CIMSISD”
XLIV Existe erro nos pressupostos que conduziram à liquidação impugnada, pelo que a mesma deveria ter sido anulada na sentença recorrida, por violação de lei substantiva;
XLV Ao decidir diferentemente, o Tribunal a quo violou os artigos 11.º, 3.º, e 16.º, 1.º do CIMSISD;
XLVI Em face do exposto, deveria o Tribunal a quo ter anulado a liquidação impugnada, mercê dos apontados vícios de forma (incompetência do autor do acto e falta de fundamentação) e de violação de lei substantiva, e, consequentemente ter condenado o Estado a ressarcir a Impugnante dos montantes pagos a título de imposto de sisa, respectivos juros compensatórios, imposto de selo e respectivos juros compensatórios, bem como a pagar-lhe juros indemnizatórios nos termos do artigo 24.º do CPT.
São termos em que, deve ser concedido provimento ao presente recurso, com a consequente:
- Verificação da prescrição da obrigação tributária, com as legais consequências:
Caso assim não se entenda,
- Declaração de nulidade parcial da sentença recorrida por falta fundamentação;
Caso assim não se entenda,
- Correcção dos pontos de facto incorrectamente julgados e supra assinalados e, em consequência, alterada a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, revogando-se a sentença recorrida;
Caso assim não se entenda,
- Alteração da aplicação do direito aos factos, nos termos expostos, revogando-se a sentença recorrida e julgando-se verificados os apontados vícios de forma e violação de lei substantiva, com as demais consequências.
Só assim, efectivamente, será possível que, como se impõe e a ora Recorrente espera, em concreto se cumpra a lei, produzindo-se DIREITO e fazendo-se triunfar a verdadeira JUSTIÇA!”

A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, impondo-se apreciar a questão da prescrição, da nulidade parcial da sentença por falta de fundamentoção, além do erro de julgamento da matéria de facto e ainda apreciar a matéria da nulidade da liquidação por incompetência do respectivo autor e por falta de fundamentação, sem olvidar a questão da ilegalidade substantiva da liquidação.
3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
1. A Impugnante encontrava-se, em sede de IRC, inscrita no serviço de finanças de Lisboa 5 com actividade de compra e venda de bens imobiliários a que corresponde o código de actividade económica (CAE) 070120 (fl. 51 e 80);
2. Por cota 01, Av. 1 e Av. 2, foi registada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa o contrato da sociedade A...- Sociedade de Compra e Venda de Propriedades e de Empreendimentos Turísticos, Lda. que tinha como objecto a compra e venda de imóveis e a aquisição e exploração de empreendimentos turísticos (cf. certidão da conservatória do registo comercial de Lisboa a fl. 234 a 243 que se dá por reproduzida);
3. No dia 05/06/1996 foi, no 4° cartório notarial de Lisboa, outorgada entre o B..., como primeiro outorgante em representação da Impugnante e C..., segundo outorgante, na qualidade de gerente da sociedade D... Lda., uma escritura de divisão de coisa comum, referente ao prédio urbano constituído por um lote de terreno para construção com a área de 300 metros quadrados, sito na Rua ...em Sta. Maria de Belém, inscrito na triz predial urbana sob o artº 2605º e melhor identificado na escritura a fl. 27 a 32 que aqui se dá por reproduzida
4. No prédio identificado no ponto anterior encontrava-se em construção um edifício em fase de acabamentos (fl. 27 a 32);
5. Os outorgantes referidos em 3 decidiram, aquando da referida escritura, adjudicar à Impugnante o prédio objecto da divisão, constando na escritura que o prédio adjudicado se destinava a revenda (fl. 31 e 32);
6. O notário atestou que “face ao valor adjudicado verifica-se que a sociedade representada pelo 1º outorgante leva um excesso fiscal no valor de dois milhões de escudos, excesso esse que não paga sisa em virtude de nos termos do número três do artigo décimo primeiro e artigo 13° - A, ambos do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações, a sociedade A...destinar o prédio adjudicado a revenda, estar colectada pela actividade de prédios dos adquiridos para esse fim e ter exercido normal e habitualmente a referida actividade no ano transacto como consta da certidão emitida pela Repartição de Finanças de Lisboa, Quinto Bairro Fiscal, em 13 de Maio de 1996, de que arquivo uma fotocópia” (fl. 32);
7. Em 20-06-97 no serviço de finanças de Lisboa 7 emitiu o oficio nº 4505 segundo o qual notificava a Impugnante para efectuar o pagamento de sisa no valor de 4.200000$00 (20.949,51€), juros compensatórios no valor de 533.630$00 (2.661,74€), imposto de selo no valor de 320.000$00 (1.596,15) perfazendo o valor total de 5.094.288$ (25.410,20), referente á escritura de divisão de 05-06-1996 realizada no 24° Cartório Notarial de Lisboa (fl. 53);
8. No oficio referido no ponto anterior a Administra Tributária fez contar que “juntam-se fotocópia da nota demonstrativa da liquidação, do auto de notícia e da informação dos serviços de fiscalização tributária, donde constam os fundamentos inerentes à liquidação efectuada” (fl. 53);
9. O ofício nº 4505 referido nos pontos anteriores foi assinado pelo Adjunto E..., no uso de delegações de poderes do Chefe do serviço de finanças (fl. 53);
10. Dá-se por reproduzida a delegação de competências do Director Geral das Contribuições e Imposto em E... onde se incluem os poderes para liquidar os impostos ora impugnados (78 2 79);
11. Em 25-06-1996 foi assinado o aviso de recepção dirigido à Impugnante (fl. 54);
12. Dá-se por reproduzido o documento a fl. 55 onde constam os cálculos dos valores impugnados e onde consta que o destino constante na escritura de aquisição era revenda;
13. No auto de notícia de 19-06-1996 consta que:
a. A Impugnante adquiriu com isenção de sisa ao abrigo do art.º 11 nº 3 do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações (doravante CIMSISSD), cf. escritura de 05-06-1996 metade indivisa do lote de terreno para construção (identificado supra) onde se encontrava á data implantada uma construção em fase de acabamento;
b. Não obstante a obrigação de registo contabilístico nas contas do activo permutável, nelas não se encontra relevada, nem tão pouco nas contas do activo imobilizado tal como resulta da informação da inspecção tributária de 11-06-l997;
c. Concluída a construção e a sua constituição em propriedade horizontal e tendo por objecto a sua venda em fracções autónomas, a Impugnante solicitou a sua inscrição na matriz em 02-09-1996, de que veio a resultar o art.º urbano 2622º da freguesia de Sta. Maria de Belém;
d. Ora, a isenção prevista no nº 3 do art.º 11º do CIMSISSD constitui uma isenção real condicionada a título resolutivo;
e. A não afectação ao activo permutável da metade do lote de terreno adquirido, bem como a sua eliminação da respectiva matriz, por força da inscrição da construção nele edificada, são reveladores da alteração do destino estabelecido na escritura de aquisição (revenda no mesmo estado em que foi adquirido);
f. Com a alteração do destino inicial (manifestado em acto contínuo à data da compra), deixou de beneficiar da isenção face ao disposto no nº1 do artº 16º do CIMSISSD pelo que nos termos dos artigos 91º e nº 5 do artº 115º do mesmo diploma deveria no prazo de 30 dias a contar da data em que a isenção ficou sem efeito (cf. fotocópia do auto de notícia que se dá por reproduzido a fl. 56 frente e verso);
14. Foi efectuada uma acção de inspecção à Impugnante no âmbito da qual o Inspector Tributário declarou que a divisão efectuada por escritura de 05-06-1996, no 24° Cartório Notarial de Lisboa e pela qual a Impugnante ficou a deter a restante parte do lote de terreno adquirido à sociedade D... Lda., “verifiquei que a transacção não se encontra descrita nos registos contabilísticos” (fl. 57);
15. No dia 03-07-1997 compareceu no serviço de finanças de Lisboa 7 Paulo Fernandes, na qualidade de gestor de negócios da Impugnante e declarou que pretendia pagar a sisa que fosse devida face à escritura de divisão que foi outorgada, em 05-06-1996, com a sociedade D... Lda., (cf., conhecimento de sisa 173 que se dá por reproduzido);
16. O prédio urbano, edificado, sobre o lote de terreno para construção identificado na escritura supra, deu lugar ao artigo da matriz predial urbana da freguesia de Sta. F...com o nº 2622º inscrito na matriz com base na escritura de propriedade horizontal de 03-09-1996 (fl. 48 a 50 e 81);
17. Por ap.2 de 04-09-1996 foi registada a propriedade horizontal referente ao artigo referido no ponto anterior (cf., certidão do registo predial a fl. 140 a 146);
18. O lote de terreno para construção referido neste probatório, com o artº 2605º, da freguesia de Sta. F...foi “eliminado” para efeito de cadastro da propriedade predial urbana na referida freguesia (fl. 48 e 81);
19. O conhecimento de sisa referido no ponto anterior consta que em “20-06-1997 foi levantado o auto de notícia, entr. Nº 7921 pelo facto de haver sido alterado o destino (manifestado em acto contínuo) à data da aquisição pelo que a sisa é assim determinada 42.000.000$00 x 10% = 4.200.000$00 a que acrescem juros compensatórios desde 06/07/96 até 20/06/1997 à taxa de 13,25% (533.630$) na importância total de 4.733.630$00. Foi paga nesta data a importância de 320.000$00 de Imposto de Selo (artº 50º da Tabela) e juros compensatórios no valor de 40.658$00 perfazendo o valor de 360.658$00” (fl. 71 2 72);
20. A liquidação de Sisa, nº 173 foi assinada pelo Chefe da Repartição de Finanças (fl. 72 verso);
21. Em 05-07-1997 foram pagos os impostos referidos em 19 e o Imposto de selo no valor de 360.658$00, (1,798,95), (fl. 70);
22. A Impugnante requereu junto do Serviço de Finanças a emissão de uma certidão nos termos do artº 22º do CPT (fl. 33);
23. Na certidão referida no ponto anterior a Impugnante requeria, na sequência da notificação efectuada através do ofício nº 4505 de 20-06-1996, a certificação do teor integral da informação da fiscalização tributária de 11-06-1997 e respectivos documentos de suporte referidos no auto de notícia, a data, autor e teor do despacho de delegações em Mário Anselmo Sá Barbosa Novo, mencionado no auto de notícia, bem como a data e o local da respectiva publicação e qualquer outro documento fundamentador das liquidações referidas no oficio de 20-06-1997 (fl. 33);
24. Em 10-07-1997 foi emitida a certidão referida nos pontos 22 e 23 (fl. 34 e seguintes);
25. C... no âmbito da diligência probatória prestada nos autos declarou que a sociedade de que era sócio gerente - D... Lda. - vendeu à Impugnante metade de um lote de terreno e da construção, já acabada, no mesmo existente, tendo conhecimento que foi adquirido para revenda, tendo também conhecimento que na data de 03-11-2000 já se encontravam vendidas todas as fracções;
26. A testemunha Carlos Alberto Baptista Maia Faria, técnico oficial de contas, prestou colaboração na acção de inspecção referida nos pontos anteriores e declarou que efectivamente não foi contabilizada a metade indivisa do lote de terreno para construção, referido supra, que aponta para tal omissão o facto de não ter sido enviada pelos serviços da impugnante a respectiva escritura (fl. 134);
27. A testemunha identificada no ponto anterior declarou em 20-03-2001, saber que há cinco anos atrás, a Impugnante, na maioria dos casos comprava imóveis para revenda e que também sabe que a construção no terreno em causa nestes autos foi terminada e constituída em propriedade horizontal, podendo assegurar que todas as suas foram totalmente vendidas no ano de 1997 (fl. 134).
No tocante aos factos provados, a convicção do Tribunal sustentou-se na prova documental junta aos autos, em concreto no teor do documento indicado no probatório.
Não se provaram outros factos que, em face das possíveis soluções de direito, importe registar como não provados.”
Ao abrigo do disposto no art. 712º nº 1 al. a) do C. Proc. Civil, adita-se ao probatório o seguinte:
28. A denominação da Impugnante foi alterada para a sua actual denominação “A...- Empreendimentos Turísticos, S.A.” (cópia da certidão que consta de fls. 351-354 dos autos).
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3.2. DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que importa, desde já, apreciar a questão prévia suscitada com referência à prescrição da obrigação tributária.
Quanto a este ponto, é sabido que muito embora a prescrição da obrigação tributária não constitua vício invalidante do acto de liquidação e não seja fundamento da respectiva impugnação, isso não deve impedir que o Tribunal no processo de impugnação não considere a prescrição da obrigação para concluir pela inutilidade superveniente da lide, pois que prescrita a obrigação se torna inútil a decisão sobre a legalidade do acto da liquidação.
No entanto, no caso presente, a matéria descrita não tem qualquer virtualidade, dado que, o probatório informa (ponto 21) que em 05-07-1997 foram pagos os impostos referidos em 19 (Sisa) e o Imposto de selo no valor de 360.658$00, (1,798,95), sendo de sublinhar que quanto ao imposto pago, a prescrição não pode ocorrer pela simples razão de que o imposto está pago, na medida em que tal pagamento determina a extinção da correspondente obrigação da relação jurídica respectiva, não fazendo mais sentido, e sendo impossível fazer extinguir, pela prescrição, o que já não existe, tendo já sido extinto, ainda que por outro fundamento, o que condena de imediato ao insucesso a pretensão da Recorrente neste domínio.
Em seguida, cumpre entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, está cometida, desde logo, a tarefa de indagar da nulidade parcial da sentença, na medida em que não fundamenta nem de facto nem de direito os motivos pelos quais a decisão foi no sentido de julgar não verificada a incompetência do autor do acto, pois que, no que a tal matéria respeita, consta apenas da sentença recorrida o seguinte: Quanto à a1egada incompetência do autor do acto a mesma não ocorreu”, o que significa que ante a total ausência na sentença de qualquer referência à motivação que levou o Tribunal a quo a decidir como decidiu, encontramo-nos perante uma sentença parcialmente nula, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil;
Pois bem, neste domínio, é preciso distinguir a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação ( é neste âmbito que opera o citado art. 668º nº 1 al. b) do C. Proc. Civil); a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade, de modo que, não pode considerar-se a alegação da Recorrente quanto ao ponto descrito.

A Recorrente refere depois que se verificam erros na fixação da matéria de facto, devendo em concreto ser corrigidos os seguintes pontos da fundamentação de facto:
O ponto 5. da fundamentação de facto, com base na escritura pública de divisão (fls. 27 a 32). deverá passar a ter o seguinte teor: “Os outorgantes referidos em 3. decidiram, aquando da referida escritura, adjudicar à Impugnante o prédio objecto da divisão e a construção nele efectuada, constando da escritura que o prédio adjudicado se destina a revenda”;
O ponto 7. da fundamentação de facto, com base no Oficio 4505 de 20 de Junho de 1997 (fls. 53), deverá passar a ter o seguinte teor: “Em 20-06-97 o serviço de finanças de Lisboa 7 emitiu o oficio n.º 4505 segundo o qual notificava a Impugnante para efectuar o pagamento de sisa no valor de 4.200.000$00 (20.949,510, juros compensatórios no valor de 533.630$00 (2.661,740, imposto de selo no valor de 320.000$00 (1.596,150 e juros compensatórios no valor de 40.658$00 (202,80€), perfazendo o valor total de 5.094.288$00 (25.410,20€), referente à escritura de divisão de 05-06-1996 realizada no 24.º Cartório Notarial de Lisboa (fl. 53)”;
Deverá ser acrescentado um ponto 13. na fundamentação de facto (renumerando­-se os pontos seguintes) com base na Liquidação do Imposto de Sisa (fl. 55), no Oficio 4505 de 20 de Junho de 1997 (fls. 53) e na Delegação de Poderes (fls. 78 e 79), com o seguinte teor: “A liquidação referida no ponto anterior (fl. 55) não foi assinada pelo Adjunto Mário Anselmo de Sã Barbosa Novo, não estando demonstrada nos autos qualquer delegação de poderes na pessoa do funcionário signatário da liquidação.”.
Ora, constituindo tal erro de julgamento aquele de cuja decisão estaria dependente o que este Tribunal de recurso viesse a decidir quanto ao erro de julgamento de direito, impõe-se, naturalmente, que à sua apreciação venha a ser dada primazia.
Quanto aos dois primeiros elementos descritos, a proposta da Recorrente revela-se pertinente, de modo que, e por constarem dos autos todos os elementos que permitem a este tribunal reapreciar a matéria de facto, determina-se, ao abrigo do artigo 712º do CPC, aplicável ex vi artigo 1º c) do CPPT, que os pontos 5. e 7. do probatório passem a ter a seguinte redacção:
5. Os outorgantes referidos em 3. decidiram, aquando da referida escritura, adjudicar à Impugnante o prédio objecto da divisão e a construção nele efectuada, constando da escritura que o prédio adjudicado se destina a revenda” (fls. 27 a 32 dos autos);
7. Em 20-06-97 o serviço de finanças de Lisboa 7 emitiu o ofício n.º 4505 segundo o qual notificava a Impugnante para efectuar o pagamento de sisa no valor de 4.200.000$00 (20.949,510, juros compensatórios no valor de 533.630$00 (2.661,740, imposto de selo no valor de 320.000$00 (1.596,150 e juros compensatórios no valor de 40.658$00 (202,80€), perfazendo o valor total de 5.094.288$00 (25.410,20€), referente à escritura de divisão de 05-06-1996 realizada no 24.º Cartório Notarial de Lisboa (fl. 53)”.
No mais, está em causa matéria conclusiva, que traduz a análise da Recorrente sobre a matéria em apreço, não existindo fundamento para acolher a sua pretensão neste domínio, impondo-se, isso sim, entrar na análise da essência da questão em apreço, defendendo a Recorrente a nulidade da liquidação por incompetência do respectivo autor, pois que da análise dos pontos 9., 10., 12. e 13. (novo), é evidente que quem procedeu à liquidação dos impostos de sisa e de selo em causa nestes autos não tinha competência para a prática desse acto, por a mesma não lhe ter sido delegada, sendo que quem tinha competência delegada para efeitos da liquidação do imposto municipal de sisa era o Adjunto Mário Anselmo de Sã Barbosa Novo, sendo certo que não foi o mesmo quem procedeu à liquidação (pontos 7. a 10. e 12. da fundamentação de facto).
Neste domínio, o probatório refere que:
. Em 20-06-97 no serviço de finanças de Lisboa 7 emitiu o oficio nº 4505 segundo o qual notificava a Impugnante para efectuar o pagamento de sisa no valor de 4.200000$00 (20.949,51€), juros compensatórios no valor de 533.630$00 (2.661,74€), imposto de selo no valor de 320.000$00 (1.596,15) perfazendo o valor total de 5.094.288$ (25.410,20), referente á escritura de divisão de 05-06-1996 realizada no 24° Cartório Notarial de Lisboa (fl. 53);
8. No oficio referido no ponto anterior a Administra Tributária fez contar que “juntam-se fotocópia da nota demonstrativa da liquidação, do auto de notícia e da informação dos serviços de fiscalização tributária, donde constam os fundamentos inerentes à liquidação efectuada” (fl. 53);
9. O ofício nº 4505 referido nos pontos anteriores foi assinado pelo Adjunto E..., no uso de delegações de poderes do Chefe do serviço de finanças (fl. 53);
10. Dá-se por reproduzida a delegação de competências do Director Geral das Contribuições e Imposto em E... onde se incluem os poderes para liquidar os impostos ora impugnados (78 2 79).
A partir daqui, considerando que a própria Recorrente entende que quem tinha competência delegada para efeitos da liquidação do imposto municipal de sisa era o Adjunto Mário Anselmo de Sã Barbosa Novo, é manifesto que o presente recurso tem de improceder neste âmbito, na medida em que a conduta do funcionário que subscreve a denominada Liquidação do Imposto de SISA que consta de fls. 55 dos autos é sancionada pelo referido Adjunto que subscreve o ofício nº 4505, aí apontando os elementos a considerar com referência à liquidação apontada nos autos, sendo esta a matéria que interessa neste domínio, não podendo reduzir-se a questão à nota demonstrativa da liquidação nos termos apontados pela Recorrente.

Avançando, cabe notar que o direito à fundamentação do acto tributário, ou em matéria tributária, constitui uma garantia específica dos contribuintes e, como tal, visa responder às necessidades do seu esclarecimento, procurando-se informá-lo do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto por forma a permitir-lhe conhecer as razões de facto e de direito que determinaram a sua prática e porque motivo se decidiu num sentido e não noutro.
Diga-se ainda que a questão da fundamentação corresponde ao cumprimento duma directiva constitucional decorrente do actual art. 268º, n.º 3 da C.R.P. no qual se consagra o dever de fundamentação e correspondente direito subjectivo do administrado à fundamentação, sendo que com a consagração de tal dever se visa harmonizar o direito fundamental dos cidadãos a conhecerem os fundamentos factuais e as razões legais que permitem a uma autoridade administrativa conformar-lhes negativamente a esfera jurídica com as exigências que a lei impõe à administração de actuar, na realização do interesse público, com presteza, eficácia e racionalidade ( Acs. do S.T.A. de 17-01-1989, B.M.J. n.º 383, pag. 322 e ss. e de 04-06-1997 - Proc. n.º 30.137). ---
Do cotejo dos normativos citados temos que fundamentar é enunciar explicitamente as razões ou motivos que conduziram o órgão administrativo à prática de determinado acto, acto este que deverá conter expressamente os fundamentos de facto e de direito em que assenta a decisão sem que a exposição dos fundamentos de facto tenha de ser prolixa já que o que importa é que, de forma sucinta, se conheçam as premissas do acto e que se refiram todos os motivos determinantes do conteúdo resolutório, sendo que na menção ou citação das regras jurídicas aplicáveis não devem aceitar-se como válidas as referências de tal modo genéricas que não habilitem o particular a entender e aperceber-se das razões de direito que terão motivado o acto em questão, pelo que importa e se impõe que a decisão contenha os preceitos legais aplicados e que conduziram a tal decisão.
A fundamentação consiste, portanto, em deduzir de forma expressa a decisão administrativa com as premissas fácticas e jurídicas em que assenta, visando impor à Administração que pondere antes de decidir, contribuindo para uma mais esclarecida formação de vontade por parte de quem tem a responsabilidade da decisão além de permitir ao administrado seguir o processo mental que a ela conduziu ( Prof. Freitas do Amaral, "Direito Administrativo", vol. III, pag. 244 ).
Conforme é jurisprudência uniforme e constante a fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo concreto de cada acto e das circunstâncias concretas em que é praticado, cabendo ao tribunal em face do caso concreto ajuizar da sua suficiência, mediante a adopção de um critério prático que consiste na indagação sobre se um destinatário normal face ao itinerário cognoscitivo e valorativo constante dos actos em causa, fica em condições de saber o motivo porque se decidiu num sentido e não noutro.
Com tal dever de fundamentação visa-se "captar com transparência a actividade administrativa", sendo que tal dever, nos casos em que é exigido, é um importante sustentáculo da legalidade administrativa e constitui um instrumento fundamental da respectiva garantia contenciosa, para além de um elemento fulcral na interpretação do acto administrativo.
Para se atingir aquele objectivo basta uma fundamentação sucinta, mas que seja clara, concreta, congruente e que se mostre contextual.
Note-se que a fundamentação do acto administrativo é suficiente se, no contexto em que foi praticado, e atentas as razões de facto e de direito nele expressamente enunciadas, forem capazes ou aptas e bastantes para permitir que um destinatário normal apreenda o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão.
É contextual a fundamentação quando se integra no próprio acto e dela é contemporânea.
A fundamentação é clara quando tais razões permitem compreender sem incertezas ou perplexidades qual foi iter cognoscitivo-valorativo da decisão, sendo congruente quando a decisão surge como conclusão lógica e necessária de tais razões.
Quanto à fundamentação de direito, tem sido entendimento do S.T.A. que na fundamentação de direito dos actos administrativos não se exige a referência expressa aos preceitos legais, bastando a referência aos princípios jurídicos pertinentes, ao regime legal aplicável ou a um quadro normativo determinado ( neste sentido, os Acs. do S.T.A. de 28-02-02, Rec. nº 48071, de 28-10-99, Rec. nº 44051, de 08-06-98, Rec. nº 42212, de 07-05-98, Rec. nº 32694, e do Pleno de 27-11-96, Rec. nº 30218 ).

Mais do que isto, tem sido dito que em sede de fundamentação de direito, dada a funcionalidade do instituto da fundamentação dos actos administrativos, ou seja, o fim meramente instrumental que o mesmo prossegue, se aceita um conteúdo mínimo traduzido na adução de fundamentos que, mau grado a inexistência de referência expressa a qualquer preceito legal ou princípio jurídico, possibilitem a referência da decisão a um quadro legal perfeitamente determinado - Ac. do S.T.A. ( Pleno ) de 25-05-93, Rec. nº 27387, de 27-02-97, Rec. nº 36197.

Esta jurisprudência passa, assim, da suficiência de uma referência aos princípios jurídicos pertinentes, ao regime legal aplicável ou a um quadro normativo determinado, para a suficiência de uma completa ausência explícita de referência normativa, se se puder concluir que o destinatário do acto pôde ou pode perceber o concreto regime legal tido em conta.

Note-se que é efectivamente diversa a situação de inexistência da indicação numerada e específica das normas tidas por aplicáveis, inexistência compensada pela referência expressa aos princípios jurídicos pertinentes, ao regime legal aplicável ou a um quadro normativo determinado, de uma outra em que se verifica uma completa ausência de referência normativa.

Ainda que se considere ajustada esta linha jurisprudencial, a apreciação, em cada caso, de um acto como fundamentado de direito, apesar de nenhuma referência legal directa, supõe, em regra, o preenchimento de duas condições:

- A primeira é a de que se possa afirmar, inequivocamente, perante os dados objectivos do procedimento, qual foi o quadro jurídico tido em conta pelo acto;

- A segunda é a de que se possa concluir que esse quadro jurídico era perfeitamente conhecido ou cognoscível pelo destinatário, hipotizando-se que o seria por um destinatário normal na posição em concreto em que aquele se encontra.

A segunda condição não funciona sem a primeira, pois esta integra-a.

Se não se sabe qual o quadro jurídico efectivamente tido em conta pelo acto, jamais pode ser realizada; e, por isso, é irrelevante que o destinatário possa saber, e até saiba, qual o quadro jurídico que deveria ter sido considerado, sendo que o destinatário não se pode substituir nem ao acto nem ao autor do acto e a fundamentação é requisito do acto.

O destinatário tem o direito de saber qual o quadro jurídico que foi levado em consideração, ao abrigo de que regime legal entendeu o autor do acto praticá-lo.

Diga-se ainda que a fundamentação dos actos serve fins de inteligibilidade e de esclarecimento, devendo mostrar o «iter» cognoscitivo e valorativo que conduziu à estatuição, sendo que, na perspectiva do visado, o que lhe interessa é conhecer os antecedentes da consequência decisória - mesmo que mal extraída - para, assim esclarecido, seguidamente optar entre acatá-la ou impugná-la.

Além disso, cumpre ter presente que em matéria tributária, o dever de fundamentação dos actos decisórios de procedimentos tributários e dos actos tributários é concretizado, de forma genérica, no art. 77.º da LGT.
Nos termos deste último artigo, «a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária» e a «fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».
Por outro lado, como já ficou dito, a exigência legal e constitucional de fundamentação visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa.
Para ser atingido tal objectivo a fundamentação deve proporcionar ao destinatário do acto a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que praticou o acto, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente.
Ora, considerando os elementos presentes nos autos, tem de entender-se que a fundamentação externada pela AT satisfaz o requisito de fundamentação exigível, do ponto de vista formal, dado que permite a reconstituição do iter cognoscitivo que determinou a decisão da Administração, sendo de salientar o exposto no ofício 4505, onde se refere, além do mais, que “juntam-se fotocópias da nota demonstrativa da liquidação, do auto de notícia e da informação dos serviços de fiscalização tributária, donde constam os fundamentos inerentes à liquidação efectuada”.
Como já ficou dito, não se partilha da visão redutora que pretende reduzir a liquidação ao exposto a fls. 55, impondo-se aqui, mais do que tudo, considerar a posição assumida, afinal, por quem tinha competência para o efeito e que considerou os vários elementos acima descritos com referência à fundamentação da liquidação, o que significa que não podem ser dissociados neste âmbito, sendo que não está em causa a notificação do acto mas sim a liquidação informada pelos elementos descritos como fundamentos inerentes à liquidação efectuada, não podendo atender-se ao exposto pela Recorrente quanto à reclamada nulidade da liquidação por falta de fundamentação.

A Recorrente aponta ainda que o facto de ter procedido à venda do prédio adquirido após término da construção e constituição da propriedade horizontal não consubstancia alteração do objecto nem da destinação, aludindo ao parecer do Digno Magistrado do Ministério Público (fls. 260), “(...) constando do documento aquisitivo do terreno em causa que no mesmo se encontra em construção um edifício em fase de acabamentos, parece evidente que a conclusão dessa obra, como aconteceu no caso vertente, não acarreta alteração substancial da natureza do prédio e, consequentemente, alteração do respectivo destino do prédio, por forma a determinar a extinção do beneficio da isenção de sisa, nos termos do disposto no art. 16.º, 1.º do CIMSISD”, de modo que, existe erro nos pressupostos que conduziram à liquidação impugnada, pelo que a mesma deveria ter sido anulada na sentença recorrida, por violação de lei substantiva.
Neste âmbito, revela-se decisivo o exposto no Ac. do S.T.A. (Pleno) de 26-01-2005, Proc. nº 0798/04, www.dgsi.pt, onde se ponderou que:
“…
O art. 16º, n.º 1 do Código de Sisa, na redacção do DL n.º 91/89, de 27 de Março, aplicável nos autos, estabelecia que as transmissões de que tratam os n.ºs 3, 8, 9 e 12, al. a) e 21, 26, 30 e 31 do art. 11º e n.º 7 do art. 12º, deixarão de beneficiar de isenção logo que se verifique respectivamente:
1- Que aos prédios adquiridos para revenda, foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda ...
É que o seu art. 11°, n.º 3 isentava do mesmo tributo as aquisições de prédios para revenda, nos termos do art. 13°-A, verificados os demais requisitos ali enunciados.
Considerando-se então constituir destino diferente a alteração substancial do prédio, nomeadamente a transformação de um terreno em prédio urbano, através da construção de um edifício, posteriormente vendido ou da demolição de uma casa e seguinte venda do terreno para construção.
Cfr., por todos, os Ac’ds do STA de 08/03/1979, 01/07/1981 in Ac’ Dout`, respectivamente, 242-218 e 211-569, 16/05/1973 rec. 16.235, 10/03/1972 rec. 1970.
Pois que aí não haveria propriamente uma revenda do mesmo prédio para tal adquirido, como a lei exige, mas, antes, a venda de algo diferente do que, para tal, se adquirira.
Como assinala Teixeira Ribeiro, in RLJ, Ano 117, págs. 105 e segts., a ratio da isenção «era a de colocar, no mesmo plano, os revendedores de prédios e os construtores de prédios para venda. Assim como estes não pagavam sisa pelos prédios que construíam, também aqueles não deviam pagá-la pelos prédios que adquiriam».
Ora tal paralelismo, como se afirma no acórdão fundamento, «necessariamente conduz a que, no domínio de tal isenção, não possa ser relevante (negativamente) a revenda fraccionada do prédio, à semelhança da usual venda de fracções autónomas por banda dos construtores de prédios».
Ou a sua constituição em propriedade horizontal, que não dá lugar à existência de um prédio diverso do anterior, submetendo-o apenas a um regime jurídico diferente.
Tanto assim que, nos termos do art. 170º do CCP - cfr. art. 9º do DL n.º 442-E/88, de 30 de Novembro - «a cada edifício em regime de propriedade horizontal, corresponderá uma só inscrição na matriz», devendo mencionar-se, na descrição genérica do edifício, «o facto de ele se encontrar em regime de propriedade horizontal» e pormenorizando-se cada fracção autónoma pela letra maiúscula que lhe competir segundo a ordem alfabética.
O edifício não deixa, pois, de ser um só e o mesmo - cfr. o Ac’d do Pleno deste STA, de 10/11/1982 in Ac’ Dout’ 260/61, págs. 1084 e segts. - apenas estando dividido em andares, constituindo fracções autónomas.
Também não obsta à isenção o facto de o prédio não estar ainda totalmente construído: o que foi adquirido - n.º 2 do probatório - foi «um lote de terreno com um prédio em construção, ainda em tosco, a ser acabado».
De tal não resulta, todavia, nenhuma alteração substancial da sua estrutura externa ou disposição interna do edifício.
Como assinala Nuno Sá Gomes, in CTF 380, págs. 488 e segts., o fundamento da isenção em causa está na circunstância de os prédios adquiridos se manterem, como mercadorias, no activo permutável da empresa tributada pelo exercício da actividade de aquisição de prédios para revenda, «não sendo esta característica afectada pelo acabamento dos prédios adquiridos, ainda em construção, e pela constituição posterior da propriedade horizontal».
Como, aliás, acontece com a aquisição de prédios rústicos adquiridos para revenda e posterior loteamento com venda por lotes, não obstante as numerosas obras que, em geral, tal operação implica, desde a construção da rede viária ao saneamento básico.

É essa, aliás, a doutrina actual da Administração como pode ver-se em Pinto Fernandes, Código de Sisa Anotado, 4ª edição, 1997, págs. 196 e 296: relativamente à aquisição de prédios inacabados, em tosco, para o adquirente os adquirir e vender posteriormente, mantendo-se o prédio no activo permutável do adquirente, a ultimação da construção e a constituição de propriedade horizontal e posterior venda em fracções autónomas não conduz à perda da isenção pois que não alterou substancialmente a natureza do prédio adquirido. …”.
Tendo presente a realidade em análise e a leitura do aresto apontado, e porque não se vê razão para entender de modo diferente, e na medida em se trata de uma realidade que vai ao encontro da factualidade vertida no probatório, conclui-se que a decisão recorrida não pode se acompanhada na parte em que defende que “tal revenda, no mesmo estado, tem que ocorrer”, o que significa que neste segmento o recurso terá provimento, determinando-se a anulação da liquidação impugnada.
Ora, com a anulação da liquidação impugnada em referência, com todas as consequências legais, o Recorrente reclama o pagamento de juros indemnizatórios.
Segundo o disposto no nº 1 do artigo 43º da LGT, «São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido», o que significa que o direito a juros indemnizatórios depende da existência de um erro, de facto ou de direito, imputável aos serviços, de que tenha resultado o pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, ou seja, a lei quis somente relevar, para efeito de pagamento de juros indemnizatórios, o erro que tenha levado a Administração Tributária a uma ilegal definição da relação jurídica tributária do contribuinte, não relevando, assim, os vícios que, ferindo, embora, de ilegalidade o acto, não impliquem uma errónea definição daquela relação, não impliquem a existência de uma liquidação superior à legalmente devida (como acontece com os vícios formais ou procedimentais).
Na verdade, o reconhecimento judicial de um vício formal nada diz ou revela sobre a relação jurídica fiscal e sobre o carácter indevido da prestação tributária face às normas substantivas, pois que se limita a exprimir a desconformidade com a lei do procedimento adoptado para a declarar, não implicando, pois, a existência de um vício na relação jurídica tributária, nem a existência de um juízo sobre o carácter indevido da prestação pecuniária cobrada pela Administração.
Assim sendo, e na medida em houve erro imputável aos serviços para efeitos no disposto no art. 43º nº 1 da Lei Geral Tributária, que levam ao pagamento de juros indemnizatórios sobre os montantes de imposto pagos, calculados desde a data em que a Impugnante efectuou o respectivo pagamento do imposto até à data em que vier a ser emitida a respectiva nota de crédito, em conformidade com o disposto no artigo 61º nº 3 do CPPT.

4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar procedente a presente impugnação judicial, com a consequente anulação da liquidação impugnada, condenando-se a Administração Tributária a pagar à Impugnante juros indemnizatórios calculados sobre o montante de imposto pago por ela, desde a data em que foi efectuado esse pagamento até à data em que vier a ser emitida a respectiva nota de crédito.
Sem custas.
Notifique-se. D.N..
Lisboa, 05 de Março de 2013

PEDRO VERGUEIRO
PEREIRA GAMEIRO
JORGE CORTÊS