Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1621/07.6BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:03/14/2019
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:INCIDENTE DE NULIDADE DE ACÓRDÃO.
FUNDAMENTOS.
OMISSÃO DE PRONÚNCIA.
Sumário:1. A possibilidade de dedução do incidente de nulidade da sentença (acórdão) visa satisfazer a preocupação de realização efectiva e adequada do direito material e o entendimento de que será mais útil à paz social e ao prestígio e dignidade que a administração da Justiça coenvolve, corrigir do que perpetuar um erro juridicamente insustentável, conforme se retira do preâmbulo do dec.lei 329-A/95, de 12/12.
2. Tal como as sentenças de 1ª. Instância, os acórdãos proferidos pelos Tribunais Superiores podem ser objecto de arguição de nulidade. Além das nulidades previstas nas diferentes alíneas do artº.615, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, surgem-nos ainda duas situações decorrentes da colegialidade do Tribunal que profere o acórdão e que dão origem a nulidades específicas deste: o acórdão ser lavrado contra o vencido e, por outro lado, sem o necessário vencimento (cfr.artº.666, nº.1, e 667, do C.P.Civil).
3. Entre os possíveis fundamentos da nulidade de um acórdão vamos encontrar a omissão de pronúncia prevista no artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma. Segundo a jurisprudência, a nulidade da sentença/acórdão em causa verifica-se quando o Tribunal não toma conhecimento de questão de que podia e devia conhecer. a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a presente nulidade.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
"L……. - COMÉRCIO E PRONTO A VESTIR, S.A.", notificada do acórdão datado de 25/10/2018 e exarado a fls.745 a 786 do processo físico, suscitou o incidente de nulidade de acórdão, em sede de alegações e conclusões de recurso de revista deduzido através do requerimento junto a fls.810 e seg. dos autos, arguindo, em síntese (conclusões L) a QQ) do requerimento de interposição da revista):
1-Que o acórdão objecto do presente incidente não apreciou, como devia, a apelação deduzida quanto à matéria de facto e relativamente a todos os erros identificados pelo apelante;
2-Especificamente, esta reapreciação não foi efectuada quanto à data de abertura da loja de Arrancada do Vouga;
3-Tal como, quanto à ausência de debate contraditório em sede de exame e decisão de recurso de revisão;
4-Termina, pedindo que o acórdão recorrido seja revogado, por omissão de pronúncia, com todas as consequências legais.
X
Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação (cfr.artºs.657, nº.4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.Tributário).
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Uma vez proferida a sentença (ou acórdão), imediatamente se esgota o poder jurisdicional do Tribunal relativo à matéria sobre que versa (cfr.artº.613, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Excepciona-se a possibilidade de reclamação com o objectivo da rectificação de erros materiais, suprimento de alguma nulidade processual, esclarecimento da própria sentença ou a sua reforma quanto a custas ou multa (cfr.artºs.613, nº.2, e 616, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.125, do C.P.P.Tributário).
Tanto a reclamação, como o recurso, passíveis de interpor face a sentença (ou acórdão) emanada de órgão jurisdicional estão, como é óbvio, sujeitos a prazos processuais, findos os quais aqueles se tornam imodificáveis, transitando em julgado. A imodificabilidade da decisão jurisdicional constitui, assim, a pedra de toque do caso julgado (cfr.artºs.619 e 628, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6).
A possibilidade de dedução do incidente de nulidade da sentença (acórdão) visa satisfazer a preocupação de realização efectiva e adequada do direito material e o entendimento de que será mais útil à paz social e ao prestígio e dignidade que a administração da Justiça coenvolve, corrigir do que perpetuar um erro juridicamente insustentável, conforme se retira do preâmbulo do dec.lei 329-A/95, de 12/12 (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.400/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 19/10/2011, rec.497/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/4/2013, proc.3013/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/7/2013, proc. 5594/12; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.356 e seg.; António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.321 e seg.; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.133 e seg.).
Tal como as sentenças de 1ª. Instância, os acórdãos proferidos pelos Tribunais Superiores podem ser objecto de arguição de nulidade. Além das nulidades previstas nas diferentes alíneas do artº.615, nº.1, do C.P.Civil, surgem-nos ainda duas situações decorrentes da colegialidade do Tribunal que profere o acórdão e que dão origem a nulidades específicas deste: o acórdão ser lavrado contra o vencido e, por outro lado, sem o necessário vencimento (cfr.artº.666, nº.1, e 667, do C.P.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/7/2013, proc.5594/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/6/2014, proc.7094/13; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.356 e seg.; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.133 e 134; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.59 e seg.).
“In casu”, o requerente alega a existência da nulidade do acórdão exarado nos presentes autos, em virtude da específica falta de reapreciação (omissão de pronúncia) dos seguintes erros de julgamento de facto identificados pelo apelante:
1-A data de abertura da loja de Arrancada do Vouga;
2-A ausência de debate contraditório em sede de exame e decisão de recurso de revisão.
Nos termos do preceituado no artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença (acórdão) quando o Tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença (acórdão) em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.362 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.7029/13).
Revertendo ao caso dos autos, conforme se retira do exame do acórdão lavrado nos presentes autos e constante de fls.745 a 786 do processo físico, o Tribunal pronunciou-se sobre todas as questões constantes das conclusões do recurso deduzido para este T.C.A.Sul.
Concretizando, tanto no que diz respeito ao alegado erro de julgamento de facto da decisão de 1ª. Instância incidente sobre a data de abertura da loja de Arrancada do Vouga, tal como, sobre o aduzido erro de julgamento relativo à ausência de debate contraditório em sede de exame e decisão de recurso de revisão, o T.C.A. Sul pronunciou-se sobre tal matéria, como, de resto, reconhece o próprio requerente (cfr. v.g.conclusões Q), R), T), DD), LL), MM) e NN) do requerimento de revista). Agora pode é a mesma pronúncia, e deliberação, não ter sido do agrado do requerente. Tal não configura, no entanto, uma nulidade devido a omissão de pronúncia, antes tudo se passando, eventualmente, no domínio dos erros de julgamento.
Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se totalmente improcedente este incidente de nulidade de acórdão, ao que se provirá na parte dispositiva.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em INDEFERIR A REQUERIDA NULIDADE DO ACÓRDÃO exarado a fls.745 a 786 do processo físico.
X
Condena-se o requerente, "L…. - Comércio de Pronto a Vestir, S.A.", em custas pelo presente incidente, fixando-se a taxa de justiça em três (3) U.C. (cfr.artº.7 e Tabela II, do R.C.Processuais).
X
Registe.
Notifique.
Após, ordeno se abra conclusão para que o Tribunal aprecie o recurso de revista deduzido através do requerimento junto a fls.810 e seg. dos autos.
D.N.
X
Lisboa, 14 de Março de 2019



(Joaquim Condesso - Relator)



(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Vital Lopes - 2º. Adjunto)