Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2511/14.1BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:07/04/2019
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:PROCESSO DISCIPLINAR
INFRAÇÃO
Sumário:
I. Apurando-se na fase de instrução do processo disciplinar que parte dos factos pelos quais o trabalhador vinha acusado, resultam não provados, nos termos vertidos no Relatório Final, em que assenta o ato sancionatório disciplinar, de aplicação da sanção de multa, impõe-se analisar se os factos que resultam provados integram os ilícitos disciplinares pelos quais foi acusado, de violação dos deveres gerais de zelo e de lealdade, nos termos das alíneas e) e g) do n.º 2, n.º 7 e n.º 9, do artigo do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 09/09.
II. O cumprimento de uma ordem emanada pelo superior hierárquico, para elaborar um auto de vistoria, que a chefia pensava ter sido retirado ou subtraído do processo, mas que nunca chegara a ser elaborado, sendo, por isso, necessária a sua elaboração, sem que o trabalhador informasse a sua chefia de que o auto nunca chegara a ter sido elaborado e, consequentemente, retirado, não configura a violação dos deveres de zelo e de lealdade por parte do trabalhador, por não se encontrarem preenchidos tais tipos de infrações disciplinares.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – RELATÓRIO

O Município de Cascais, devidamente identificado nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 18/04/2017, que no âmbito da ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo, instaurada por J...., julgou a ação procedente e anulou a decisão de aplicação da pena disciplinar de multa.


*

Formula o aqui Recorrente, Município de Cascais nas respetivas alegações (cfr. fls. 159 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem:

“A. O presente Recurso é interposto, da sentença proferida pelo Tribunal a quo, em 18.04.2017 nos autos acima referenciados, que julgou procedente a ação administrativa especial, e, em consequência anula a decisão impugnada datada de 7.7.2014, que aplicou ao Autor a pena de multa de € 200,00, suspensa, pelo período de 120 dias, nos termos do artigo n.º 25º n.º 2 do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro (doravante ED).

B. Entende a ora Recorrente que a sentença padece de vício de erro na apreciação da matéria de facto e, em consequência, de erro de julgamento, em virtude do Tribunal a quo ter concluído que o autor não pode ser punido porque não infringiu os deveres profissionais de zelo e lealdade.

C. Dos factos provados resulta claramente que a conduta do ora Recorrido violou os deveres de zelo e de lealdade em virtude de ter obrigação de saber que a sua conduta não era permitida.

D. Existindo um auto de vistoria no processo, o ora Recorrido não podia simplesmente ter elaborado outro auto e introduzi-lo no processo SPO 1709/2013.

E. O ora Recorrido tinha a obrigação de informar a sua Chefia de que aquele auto não era válido, por estar desconforme com a vistoria realizada em 12.8.2013, devendo ser, por isso, revogado e realizada nova vistoria.

F. Da factualidade provada resulta que o ora Recorrido, podia ter agido de outra forma e que intencionalmente não informou a sua Chefia de todos os factos, não reclamou da ordem recebida e elaborou outro auto, não afastando, por isso, a sua responsabilidade disciplinar.

G. O dever de zelo impõe a obrigação de se atuar utilizando os conhecimentos e as competências consideradas essenciais para a concretização dos objetivos do serviço.

H. O dever de lealdade implica que funcionário seja obrigado a prosseguir a sua atividade para além de um estrito cumprimento, criando-lhe deveres acessórios de "bom cumprimento", ou cumprimento tendo em vista os objetivos concretos do serviço.

I. No caso em concreto, o ora Recorrido tinha obrigação de saber, e sabia, que não podia inserir outro auto de vistoria no processo, ou outro documento com esse fim, sem que o primeiro tivesse sido revogado.

J. Acresce que o ora Recorrido agiu, em obediência a um ordem emanada da sua chefia, cuja finalidade sabia ser errónea, sem ter esclarecido a sua chefia do erro em que esta incorria e sem lhe dar conhecimento de todos os factos, pelo que, agiu violando o dever de zelo e o dever de lealdade ao abrigo do disposto nas alíneas e) e g) do n.º 2 do artigo 3º do Estatuto Disciplinar.

K. Do relatório final resulta claro que o Recorrido com a sua conduta violou os deveres de zelo e de lealdade, não se compreendendo a posição do Tribunal a quo ao considerar que a demandada não concretiza as normas violadas.

L. Da matéria provada não resulta que tenham sido detetadas ou invocadas causas de exclusão da ilicitude, nem fundamento para afastamento do dolo face à sua conduta já que atendendo à função desempenhada tinha pleno conhecimento dos factos e dos seus deveres.

M. Razão pela qual a ora Recorrente entende que a douta sentença merece censura, e requer a V. Exas. a respetiva revogação e substituição por outra que reconheça que foi praticada infração disciplinar por violação dos deveres de zelo e de lealdade.”.

Pede que o recurso seja julgado procedente e alterada a decisão recorrida.


*

O ora Recorrido, notificado da admissão do recursão, apresentou contra-alegações, tendo assim concluído:

“a) A título de conclusão, poderemos dizer que não assiste razão à recorrente, quando afirma que a sentença padece de vício de erro na apreciação da matéria de facto e, em consequência, de erro de julgamento, em virtude do tribunal a quo ter concluído que o recorrido não pode ser punido porque não infringiu os deveres profissionais de zelo e lealdade

b) O recorrido nunca perpetuou comportamentos que se consubstanciem em prática de violação dos deveres a que estava obrigado, até porque, nunca na acusação que lhe foi comunicada, o mesmo não vinha acusado de não avisar o chefe.

c) O recorrido defendeu-se dos factos que vinham vertidos na acusação e, em parte alguma, essa acusação fez referência a que o recorrido tinha que avisar o chefe de que já existia outro auto.

d) Na verdade, primeiro que tudo, o documento junto pelo recorrido, não era um auto, pois só estava assinado por este,

e) Depois, o auto elaborado a assinado pelos Técnicos V…., V… e P…., um auto de vistoria, que foi introduzido no processo, sem o conhecimento do recorrido.

f) Nunca o recorrido, introduziu no processo outro auto, pois só estaremos perante um auto de vistoria, quando elaborado pelos intervenientes e por este s assinados.

g) O auto de vistoria, resulta de um conjunto de intervenientes, um órgão colegial, que elabora e assina um auto comprovativo da sua intervenção, o que não foi o caso, pelo que não tinha nem tem razão a Recorrente, ao informar que houve por parte do tribunal a quo erro na interpretação da matéria de facto.

h) O recorrido não só informou a sua chefia da existência de um auto de vistoria assinado pelos Técnicos V…, V….. e P…., um auto de vistoria, que foi introduzido no processo como também deu conhecimento à chefia de que havia um auto de vistoria assinado pelos Técnicos V...., V....e P…., um auto de vistoria, que foi introduzido no processo, sem o seu conhecimento, pois este tinha isso efetuar uma vistoria e não tinha elaborado o auto de vistoria por discórdia entre os mesmos do colégio que constituíam a vistoria.

i) Portanto, não houve por parte do recorrido, qualquer obrigação de informar o chefe de que já existia um auto de vistoria.

j) O que o recorrido tinha que fazer e fez, foi informar a sua chefia que, na sua ausência, tinha sido elaborado um auto de vistoria, pelos Técnicos V...., V....e P…., um auto de vistoria, e que foi introduzido no processo.

k) Portanto e bem, o tribunal a quo decidiu e bem que o recorrido, não violou nenhum deveres a que estava obrigado, pelo que não assiste razão à recorrente mas ao tribunal a que bem decidiu.”.

Pede que seja mantida a decisão do Tribunal a quo.


*

Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não foi emitido parecer.

*

O processo vai, com vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas pelo Recorrente, resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de:

Erro de julgamento, por errada apreciação da matéria de facto ao concluir que o Autor não infringiu os deveres de zelo e de lealdade, em violação das alíneas e) e g), do n.º 2 do artigo 3.º do Estatuto Disciplinar.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:

“A) O autor é licenciado em arquitetura e exerce funções na Câmara Municipal de Cascais, na carreira de Técnico Superior – ver documentos juntos aos autos.

B) No dia 5.9.2013 foi efetuada participação pelo Engenheiro P...., Chefe da Divisão de Fiscalização, Obras e Infraestruturas da Câmara Municipal de Cascais, pela eventual prática do crime de falsificação de documento, pela eventual prática do crime de subtração de documento, previsto pelo art 259º do Código Penal, eventual violação do dever geral de prossecução do interesse público, eventual violação do dever geral de isenção, eventual violação do dever geral de obediência e eventual violação do dever geral de lealdade – ver processo administrativo apenso.

C) Na sequência desta participação foram instaurados processos disciplinares aos funcionários A...., assistente técnico, ao P…., assistente técnico, e V…., assistente técnico – ver paa.

D) Como testemunhas foram indicadas a engenheira M.... e o arquiteto J…., ora autor – ver paa.

E) Os processos disciplinares, daí decorrentes, foram iniciados e decretou-se a suspensão preventiva dos arguidos pelo período não superior a 90 dias – ver paa

F) No âmbito da sua instrução foram detetados factos indiciadores de eventuais ilícitos disciplinares e/ ou criminais, cometidos por dois outros funcionários pelo que as declarações aí produzidas foram objeto de duas participações dando lugar a dois novos processos disciplinares:

a) Processo disciplinar nº 08.06.01/2014/1, instaurado contra o arquiteto J...., ora autor, por despacho de 15.1.2014;

b) Processo disciplinar nº 08.06.01/2014/2, instaurado contra o engenheiro A....– ver paa.

G) Estava em causa, no caso do autor, o processo SPO 1709/2013, pedido de autorização de utilização, em que é requerente F….. Localidade: E….., nº 8…., A… A…. –– ver paa.

H) O autor teve intervenção no processo SPO 1709/2013, conjuntamente com os arguidos V.... e V…., na qualidade de membro fixo da Comissão de Vistorias – ver paa.

I) A 17.1.2014 foi nomeada instrutora do processo disciplinar M…., que foi a instrutora dos processos disciplinares enunciados na al C) – ver paa.

J) O processo disciplinar contra o autor teve início a 20.1.2014 – ver fls 63 do paa.

K) A 22.1.2014 foi levado ao conhecimento do autor – ver fls 70 do paa.

L) No âmbito da anterior participação aos Serviços do Ministério Público, processo nº 3282/13.4TACSC, 4ª secção, MP, foram participados ao MP as declarações do ora autor e os factos apurados em sede de processo disciplinar contra o mesmo – ver fls 60 do paa.

M) Foi proposto ao Presidente da CM, por informação interna reservada nº 1/2014, que fosse considerada a imediata transferência de serviço de modo a prevenir a ocorrência de mais danos – ver fls 64 do paa.

N) A 4.2.2014 foi deduzida acusação contra o ora autor, junta como doc nº 4 da pi, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de que se transcreve o seguinte:

Art 3º

No SPO 1709/2013, por despacho, emitido em 16.9.2013, pelo Sr Engenheiro P….., na qualidade de Chefe da DFEL, é atestado que o documento introduzido no processo (aqui entendido como o «auto reconstituído») foi «reproduzido» do «auto original» pelo arquiteto J...., referindo-se, mais especificadamente, ao auto de vistoria constante a fls 112 a 114 do SPO 1709/2013.

Art 4º

O auto de vistoria («reconstituído»), datado de 12.8.2013, foi «reproduzido» pelo Sr arquiteto J.... no dia 16.9.2013 (...).

Art 5º

Ainda que, com o intuito de «reconstituir» um auto de vistoria, alegadamente

«subtraído» do processo/ requerimento SPO 1709/2013 (...). Art 6º

O «auto original» nunca chegou a ser lavrado, como era do conhecimento do arguido e o próprio admitiu por diversas vezes ... nomeadamente ao referir: «não tive tempo de fazer o auto de vistoria».

Art 7º

E «não tendo sido deixado o auto no local porque houve divergência, ficando para mais tarde a elaboração do auto» (...).

Art 8º

O «auto de vistoria é sempre levado em branco e ele não foi preenchido» (...).

Art 9º

Não tendo existido o auto de vistoria, não poderia o mesmo ter sido subtraído.

Art 10º

O que se encontra suportado pelas suas declarações: «o auto de vistoria não desapareceu, ficou à espera de ser feito o auto, comigo com o V…. e com o V….» (...).

Art 11º

Não podendo ter sido subtraído, por ser inexistente, o que o ora participado sabia ser verdade, a referida «reconstituição» ou «reprodução» do auto de vistoria mais não foi do que a elaboração de um auto de vistoria «ab initio».

Art 12º

O ato de «reconstituição» de documento inexistente, eventualmente poderia consubstanciar a prática de crime, pelo que, a sê-lo, se enquadrava no preceituado no art 5º, nº 6 do ED, faria cessar o dever de obediência do ora arguido.

Art 13º

O trabalhador não recorreu aos mecanismos previstos no art 5º do ED, única forma de exclusão da sua responsabilidade disciplinar.

Art 14º

Não o tendo feito assumiu plenamente as consequências do seu ato o que consubstancia a prática de ilícito disciplinar, previsto e punido pelo art 3º, nº 3, 7 e 9 do ED, por ofensa dos deveres gerais de prossecução do interesse público, zelo e de lealdade a que todo o trabalhador se encontra adstrito.

(...).

Art 19º

... face às informações recolhidas pelos serviços, o ora arguido elaborou o documento sem se ter deslocado ao local.

Art 20º

O mesmo se podendo estender às restantes vistorias cuja folha de marcação foi apresentada pelo ora arguido ... e que o mesmo referiu que «nesse dia 12.8.2013, todos os autos foram favoráveis com exceção deste (...).

Art 21º

Resulta da análise dos tempos de paragem das viaturas utilizadas nesse dia que não se coadunam com a possibilidade de realização de qualquer vistoria (...).

Art 22º

Conforme declarações do seu superior hierárquico direto, engenheiro P...., a duração de uma vistoria em média demora entre meia hora e uma hora e meia o que é pacífico não ocorreu (...).

Art 23º

Tal implica que o documento «auto de vistoria» assinado pelo participado seja, na íntegra, um documento que contém falsas declarações, já que, face ao exposto no artigo anterior, as mesmas não foram verificadas «in loco», única forma de efetuar uma vistoria.

24º

Auto de vistoria que convém referir só se encontra assinado pelo arguido.

25º

Por outro lado, acresce o facto de não sendo possível «reconstituir» documento inexistente, a atuação do funcionário ora participado pode, adicionalmente, constituir eventual prática de ilicito criminal previsto e punido nos arts 255º a 257º todos do Código Penal (...).

Art 26º

Não militam a favor do arguido circunstâncias dirimentes da responsabilidade disciplinar previstas no art 21º do ED.

Art 27º

Não militam a favor do arguido qualquer circunstância atenuante especial prevista no art 22º do ED.

Art 28º

Verifica-se contra o arguido a seguinte circunstância agravante especial prevista No art 24º, al g) do ED.

Com o seu comportamento o arguido violou:

O dever geral de prossecução do interesse público (...).

O dever geral de zelo (...).

O dever geral de lealdade (...).

Nos termos do art 9º, nº 3 do ED deverá ser aplicada uma única pena que, atendendo à descrição fáctica ocorrida e acima narrada e atendendo ainda ao disposto no art 20º do ED, deverá consistir, em abstracto, na pena única de demissão, por se considerar que a sua atuação é inviabilizadora da relação funcional já que esta, pela sua gravidade, ao colocar em perigo a solenidade e a força probatória de documentos destinados a fazer fé pública e constitutivos de direitos abala a confiança que a comunidade deposita na administração, podendo causar prejuízos relevantes em especial ao serviço municipal a que pertence.

O) A acusação foi notificada ao ora autor – ver fls 124 a 131.

P) A 5.3.2014 o autor apresentou defesa, nos termos que constam de fls 148 a 185, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

Q) O autor suscitou dois incidentes de suspeição contra a instrutora do seu processo disciplinar, um na defesa e outro a 2.5.2014 – ver docs nº 1 e 2 juntos com a pi, fls 319 do paa, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

R) Que foram indeferidos, por despachos de 14.3.2014 e 6.5.2014 – ver fls 319 e 640 a 642 do paa.

S) A 18.6.2014 foi elaborado relatório final, inserto a fls 1091 a 1073 do paa, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de que se transcreve o seguinte:

(...).

O arguido efetuou, por ordem do seu superior hierárquico com o objetivo de repor informação retirada do processo, um auto de vistoria. Bem sabendo que, não fora subtraído qualquer ato do processo logo, como agora alega, que a sua chefia incorria em lapso.

Agiu, assim, em obediência a uma ordem emanada da sua chefia, cuja finalidade sabia ser errónea, sem contudo ter esclarecido a sua chefia do erro em que esta incorria e não recorrendo aos mecanismos previstos no ED para afastamento da sua responsabilidade disciplinar e ou criminal.

O arguido conseguiu porém demonstrar que se deslocou ao local, em viatura municipal (...).

Foi igualmente apurado que o auto de vistoria por si assinado não foi realizado na data constante, 12.8.2013, mas sim a 16.9., por ordem da sua chefia, mas que a divergência de datas nos autos resulta da «pendência» de processos.

T) Ato impugnado: Por deliberação de Câmara de 7.7.2014 foi aplicada ao ora autor a pena de multa de €: 200, suspensa pelo período de 120 dias, nos termos do art 25º, nº 2 do ED – ver paa.

U) Consta a fls 286 do paa, o auto de vistoria, com data de 12.8.2013, assinado pelos assistentes técnicos V...., V…, P…., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

V) Consta de fls 54 do paa, o despacho de 16.9.2013, do Chefe de Divisão P...., no SPO 1709/ 2013, que tem o teor seguinte:

«tendo-se verificado que:

- o auto de vistoria de 12.8.2013, que me foi apresentado pelo arquiteto A…. não consta do processo;

- que o anterior foi substituído por um autor de vistoria que se encontra enfermo de desconformidades;

- foi pelo arquiteto A…. reproduzido o auto original, que junto ao processo e que está conforme».

W) Consta a fls 53 do paa, o auto de vistoria, com data de 12.8.2013, elaborado e assinado, apenas, pelo ora autor, em 16.9.2013, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

X) Consta a fls 31 a 50 o auto de acareação, com data de 31.10.2013, em que, nomeadamente foram acareados, o participante P...., a testemunha J…., o arguido V.... e outros, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual à pergunta: o sr participante referiu nas suas declarações acerca deste documento que, «não tinha prova documental porque a prova foi extraída do processo mas temos prova testemunhal, a minha e a dos dois elementos da comissão de vistorias». Na sua participação refere também que «o documento original, que me foi apresentado pelo arquiteto J…., não consta do processo, desconhecendo-se qual o destino que lhe tenha sido dado» e no mail datado de 10.10. reitera «do auto que me foi mostrado da primeira vez não constavam as assinaturas dos arguidos». Logo declarou por diversas vezes que o viu?

Resposta: se declarei foi por erro, pois o auto não estava feito no início. Quando na participação me referia: «o documento original que me foi apresentado pelo arquiteto A….., não consta do processo, desconhecendo-se qual o destino que lhe tenha sido dado» queria dizer o documento reconstituído.”.

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise do fundamento do presente recurso jurisdicional.

Erro de julgamento, por errada apreciação da matéria de facto ao concluir que o Autor não infringiu os deveres de zelo e de lealdade, em violação das alíneas e) e g), do n.º 2 do artigo 3.º do Estatuto Disciplinar

Segundo a alegação do Recorrente a sentença recorrida enferma de erro na apreciação da matéria de facto ao concluir que o Autor não pode ser punido, por não ter infringido os deveres de zelo e de lealdade.

Sustenta que dos factos provados resulta que a conduta do Autor violou tais deveres, pois existindo um auto de vistoria no processo, o Autor sabia que não podia ter elaborado outro e introduzi-lo no processo, tendo o Autor a obrigação de informar a sua chefia de que aquele auto não era válido, por estar desconforme com a vistoria realizada, devendo ser revogado e realizada nova vistoria.

Alega que o Autor podia ter agido de outra forma e intencionalmente não informou a sua Chefia de todos os factos, não reclamando da ordem recebida e elaborou outro Auto.

O Autor agiu em obediência a uma ordem emanada da sua Chefia que sabia ser errónea, sem ter esclarecido a sua Chefia do erro em que esta incorria e sem lhe dar conhecimento de todos os factos, agindo em violação dos deveres de zelo e de lealdade.

Vejamos.

A sentença recorrida anulou o ato impugnado, de aplicação da pena disciplinar de multa no valor de € 200, com fundamento em os factos imputados ao arguido não serem suficientes para suportar a violação do dever ou dos deveres imputados e da consequente sanção disciplinar, podendo ler-se na sua respetiva fundamentação de direito, o que ora segue, por transcrição, na parte relevante:

O teor do despacho de 16.9.2017, do Chefe de Divisão do Departamento de Polícia Municipal e Fiscalização – Divisão de Fiscalização, Obras e Infraestruturas, é da responsabilidade do seu Autor.

Este despacho enferma de inverdades – o chefe de divisão diz ter-lhe sido apresentado um auto de vistoria que não consta do processo e que o arquiteto A… reproduziu o original do auto de vistoria – pelas quais a demandada responsabiliza disciplinarmente o ora autor, porque não corrigiu a sua chefia do lapso e porque não reclamou da ordem.

A hierarquia consubstancia-se na subordinação de um funcionário/ trabalhador de categoria inferior relativamente a outro de categoria superior dentro do mesmo serviço.

Assim, a hierarquia está associada à ideia de obediência, constituindo obrigação do trabalhador cumprir as ordens dos seus superiores, exceto se a ordem for ilegal.

No caso, não consta do processo que a ordem fosse ilegal.

A 12.8.2013, o ora autor, o assistente técnico V.... e o assistente técnico V…. vistoriaram a edificação situada na E…., nº 8…., da freguesia de A…. (SPO 1709/2013).

O auto de vistoria não foi elaborado, por divergências dos assistentes técnicos e do técnico superior (o ora autor).

O autor foi de férias a 16.8.2013 e regressou a 30.8.2013.

A 3.9.2013 o auto de vistoria estava feito e assinado pelos assistentes técnicos V.... e V…. e por P…., com data de 12.8.2013, com o parecer: obra concluída em conformidade com o projeto aprovado (fls 286 do paa) e assinado pelo Vereador.

Em consequência foi instaurado processo disciplinar a cada um daqueles assistentes técnicos.

E, por ordem do seu superior hierárquico, de 16.9.2013, o autor elaborou um auto de vistoria, datado de 12.8.2013, que sozinho assinou e que o relatório final concluiu dever-se a desconformidade das datas a «pendência» de processos.

Ainda o despacho da hierarquia, pese embora o auto de vistoria ter sido assinado apenas pelo aqui autor, disse estar conforme.

Pois bem, tal documento, elaborado pelo ora autor, a 16.9.2013, que a chefia mandou juntar ao processo SPO 1709/2013, apesar de atestar que a vistoria foi efetuada no dia 12.8.2013, por uma comissão composta por três técnicos da CMC, não foi assinado por todos os técnicos. O que, como declarou a engenheira M……, no auto de acareação, não é um auto de vistoria, antes se tratando de um documento que representa, estando só assinado pelo aqui autor, o que ele viu e detetou na vistoria realizada com os assistentes técnicos V…. e V…..

Portanto, o auto de vistoria elaborado pelo ora autor nem sequer é válido, por falta de assinatura dos restantes membros da Comissão de Vistoria.

No fundo o que a entidade demandada visa punir, na conduta do ora autor, é responsabilizá-lo pelas inverdades do despacho de 16.9.2013.

Mas a demandada não concretiza as normas violadas pela ordem dada e cumprida pelo autor, em 16.9.2013.

Mais, a demandada desconsidera as declarações do chefe do autor no decurso da diligência de acareação, nomeadamente, quando afirma que não viu o auto de vistoria, pois o auto não estava feito no início.

E efetivamente, como afirma o autor, no auto de acareação, e admite a fundamentação do ato punitivo, a Comissão de Vistorias, no dia 12.8.2013, não preencheu nem assinou o auto de vistoria no SPO 1709/2013. Pelo que o auto de vistoria não ficou no processo administrativo.

E, portanto, o termo «reconstituição», usado no despacho de 16.9.2013, não é correto.

O que foi pedido ao autor, foi que elaborasse o auto de acordo com a vistoria que foi efetuada no dia 12.8.2013, por o auto que só três assistentes técnicos elaboraram estar enfermo de desconformidades, de outro modo não se percebe porque foram instaurados processos disciplinares aos que elaboraram e assinaram o auto de fls 286 do paa.

Pelo que salvo melhor opinião não vislumbramos como pode o autor ter incorrido em infração disciplinar, por violação do dever de zelo/ competência profissional e de lealdade/ prossecução do interesse público, ao não advertir a sua chefia, em 16.9.2013, que em 12.8.2013 não foi elaborado auto de vistoria, que, por isso, o auto de vistoria não foi subtraído do processo, nem o por si elaborado a 16.9.2013 constitui uma reprodução do original.

Se o autor, com os factos que lhe vêm imputados no relatório final, não infringiu os deveres profissionais de zelo e de lealdade, não praticou infração disciplinar, motivo por que não pode ser punido.”.

De forma a apreciar o fundamento do recurso, importa atender, com detalhe, aos factos que resultaram demonstrados provados e não provados no Relatório Final, que sustenta a aplicação da sanção disciplinar de multa, assim como confrontando esse Relatório com o teor da Acusação deduzida.

Da análise efetuada, afigura-se evidente no caso trazido a juízo, que os factos pelos quais o trabalhador foi acusado se vieram a demonstrar durante o próprio procedimento disciplinar não se verificarem ou não serem verdade.

Tal veio a determinar as diferenças que existem entre a acusação e o relatório final, não existindo uma coincidência quanto aos factos que são imputados ao arguido.

Analisando o teor do Relatório Final, a que se refere a alínea S) do julgamento de facto da sentença recorrida e o seu confronto com o documento integral mediante consulta do processo administrativo, afim de compreender o exato teor desse instrumento, descortina-se com relevo para a decisão sobre o fundamento do recurso, que no processo disciplinar foram considerados provados os seguintes factos:

- no âmbito da vistoria realizada a 12/08, não foi lavrado qualquer auto;

- não existiu nenhum documento original que tenha sido subtraído do processo;

- face ao que não podia ser “substituído”;

- que o documento “reconstituído” não podia, como tal ter sido elaborado para substituição do documento retirado do processo;

- o auto de vistoria, que só se encontra assinado pelo Autor, datado de 12/08, foi elaborado em 16/09/2013;

- o Autor elaborou o auto por ordem da sua chefia no intuito de repor no processo informação subtraída, que sabia não ter ocorrido;

- não procurou corrigir, atempadamente, a sua chefia do lapso em que estava a incorrer;

- não tendo reclamado da ordem emanada (cfr. fls. 1074 do processo administrativo).

Segundo o Relatório Final foi considerado facto não provado que não existiu a deslocação aos locais da vistoria, conforme constava da Acusação (idem).

Com base nos factos que antecede, foi entendido pelo Réu que resultou demonstrado que o trabalhador, ora Recorrido incorreu na violação dos deveres gerais de zelo e de lealdade.

Resulta do Relatório Final em que se estriba a decisão administrativa impugnada, que o Auto de vistoria foi realizado pelo Autor e apenas por ele assinado, na sequência de uma ordem verbal, que depois passou a escrita, nos termos do despacho de 16/09/2013, com o intuito de que esse auto de vistoria reproduzisse o auto original, juntando essa reprodução ao processo, quando o Autor bem sabia que essa ordem era errónea, já que o documento original nunca tinha sido elaborado, sendo a ordem dada com o intuito de repor o processo, segundo a crença que o auto original tinha sido retirado do processo.

Em face dos factos apurados no processo foi entendido que competia ao Autor alertar a sua chefia de que o auto nunca chegara a ser elaborado e se para tanto solicitar a emanação de uma tal ordem por escrito, o que não foi feito.

Acresce resultar do Relatório Final que o processo a que respeita o auto de vistoria desapareceu e que o Autor ao informar a sua chefia do desaparecimento do processo, não a esclareceu convenientemente sobre o auto de vistoria, não tendo evitado a emanação de uma ordem e de um despacho que se vêm a verificar serem eles próprios erróneos quanto aos seus pressupostos.

Os factos descritos foram valorados como traduzindo a violação dos deveres gerais de prossecução do interesse público e de zelo e de lealdade.

Em face do que antecede, carece totalmente de sentido o alegado pelo Recorrente nas conclusões D., E. e I. do presente recurso, por essa factualidade ser desmentida nos termos do Relatório Final, em que se baseia o ato sancionatório, ora impugnado.

Os factos a que se reportam tais conclusões do recurso constavam da Acusação deduzida contra o arguido, mas após a fase de instrução e os meios de prova que foram produzidos, se vieram a dar como não provados no Relatório Final, não tendo o Autor sido sancionado por esses factos.

Por isso, o alegado nas conclusões D., E. e I. do presente recurso mostra-se inequivocamente infirmado pelos factos considerados provados no Relatório Final.

Tal revela uma preparação pouco cuidada na invocação dos fundamentos do presente recurso, sendo invocados fundamentos que manifestamente não têm qualquer sustento nos termos o Relatório Final que sustenta o ato administrativo impugnado e que apenas se podem dever a uma falta de diligência do ora Recorrente, que não soube corretamente interpretar a factualidade apurada e não apurada.

Por isso mesmo, de forma a dilucidar toda a real factualidade considerada provada e não provada no âmbito do processo disciplinar e que fundam o ato sancionatório, se procedeu a uma análise direta dos documentos que integram o processo administrativo, para além do que resulta dos factos constantes do julgamento de facto da sentença recorrida.

A única factualidade que se encontra imputada ao Autor e que sustenta a decisão punitiva traduz-se na circunstância de o trabalhador visado no procedimento disciplinar não ter informado e esclarecido a sua chefia de que realizara a vistoria em agosto de 2013, mediante deslocação do local, mas não chegou a elaborar o respetivo auto de vistoria, partindo para férias e apenas vindo a elaborar tal auto em setembro de 2013, na sequência da emanação de uma ordem verbal da sua chefia, de que não reclamou, nem pediu a sua redução a escrito, não obstante essa mesma ordem tenha sido depois reduzida a escrito.

Assim, de imediato se impõe afirmar que não incorre a sentença recorrida em qualquer erro na apreciação da matéria de facto e, consequentemente, em erro de julgamento, pois o que se extrai é que é o ora Recorrente que incorre nesse erro, ao alegar no presente recurso factos que foram considerados não provados no âmbito do próprio processo disciplinar e pelos quais o Recorrente não foi sancionado disciplinarmente.

Não obstante, impõe-se dilucidar se os factos que foram considerados provados no âmbito do processo disciplinar são, ainda assim, suficientes para a integração dos ilícitos disciplinares e, consequentemente, para a aplicação de uma sanção disciplinar pela sua violação.

Revela o Relatório Final todos os antecedentes ao processo disciplinar, assim como as várias diligências instrutórias nele realizadas.

Na Divisão de Fiscalização, Obras e Infraestruturas e no Departamento de Polícia Municipal e Fiscalização da Câmara Municipal, foram instaurados três processos disciplinares a três funcionários por atos indiciadores de ilícitos disciplinares e criminais, por crimes de falsificação e subtração de documento, respeitantes a intervenções em determinados processos, com participação criminal ao Ministério Público.

No decurso desses processos disciplinares foram detetados outros factos indiciadores de outros eventuais ilícitos disciplinares e criminais cometidos por outros funcionários, o que deu origem a outros dois processos disciplinares, dos quais, um respeita ao ora Autor.

Não obstante o enquadramento do processo disciplinar no âmbito do qual foi praticado o ato sancionatório, ora impugnado, em face da concreta factualidade apurada e perante a enunciação legal dos deveres gerais de zelo e de lealdade, não é possível concluir pela sua violação, tal como decidido na sentença recorrida.

Segundo o n.º 1 do artigo 3.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 09/09, “Considera-se infracção disciplinar o comportamento do trabalhador, por acção ou omissão, ainda que meramente culposo, que viole deveres gerais ou especiais inerentes à função que exerce.”.

Nos termos do n.º 2 do artigo 3.º do citado Estatuto Disciplinar, são deveres gerais dos trabalhadores:

a)…;

b) …

c) …

d) …

e) O dever de zelo;

f) …

g) O dever de lealdade;

(…)”.

O dever de zelo consiste em conhecer e aplicar as normas legais e regulamentares e as ordens e instruções dos superiores hierárquicos, bem como exercer as funções de acordo com os objetivos que tenham sido fixados e utilizando as competências que tenham sido consideradas adequadas.

O dever de lealdade consiste em desempenhar as funções com subordinação aos objectivos do órgão ou serviço.

Nos termos da alínea e), do n.º 2 e do n.º 7, do artigo 3.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, o dever geral se zelo consiste em “Conhecer e aplicar as normas legais e regulamentares e as ordens e instruções dos superiores hierárquicos, como exercer as funções de acordo com os objetivos que tenham sido fixados e utilizando as competências que tenham sido consideradas adequadas.”.

No caso o trabalhador ao elaborar o auto de vistoria em setembro de 2013, não deixou de cumprir uma ordem dada pela sua chefia, elaborando o auto que estava em falta e que sempre seria de elaborar, não obstante a sua chefia ter emanado essa ordem pensando que havia sido retirado ou subtraído o auto original.

Pelo que, não é possível em face dos factos apurados, concluir pela violação do dever de zelo.

Do mesmo modo em relação ao dever de lealdade que, segundo a alínea g), do n.º 2 e do n.º 9, do artigo 3.º do citado Estatuto Disciplinar, se traduz em “Desempenhar as funções com subordinação aos objectivos do órgão ou serviço.”.

A elaboração do auto de vistoria, em setembro de 2013, em cumprimento de uma ordem dada pelo superior hierárquico, sem dela antes reclamar ou elucidar em relação à falta de elaboração de qualquer auto de vistoria anterior, o que acarreta que fosse, por isso, necessária a elaboração do citado auto de vistoria, por o mesmo não ter sido elaborado antes, em face do demais contexto factual que o processo disciplinar revela, sobre o clima instalado, não permite verificar a integração do tipo de ilícito disciplinar em causa.

Analisados os factos, assim como a prova que foi produzida, é de entender no sentido decidido pela sentença recorria, de que, ao contrário do que resulta do ato impugnado, os factos dados como provados no processo disciplinar não permitem concluir pela violação dos deveres gerais de zelo e de lealdade e consequentemente, pela sanção de multa aplicada ao ora Recorrido.

Ao contrário do alegado no presente recurso, os factos descritos e que resultam provados não permitem a sua integração na violação dos deveres gerais imputados e, consequentemente, nas infrações disciplinares correspondentes, não preenchendo os tipos de ilícito disciplinar pelos quais o arguido, ora Autor e Recorrido, foi sancionado.

Nestes termos, não procede a censura que é dirigida contra a sentença recorrida, não enfermando de erro de julgamento quanto à interpretação e valoração dos factos e das provas produzidas no âmbito do procedimento disciplinar, improcedendo totalmente as conclusões do recurso, por não provadas.


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Em consequência, será de negar provimento ao recurso, por não provados os seus fundamentos, mantendo-se a sentença recorrida, que julgando procedente a ação administrativa, determinou a anulação da deliberação impugnada, de aplicação da pena disciplinar ao Autor, ora Recorrido.

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Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. Apurando-se na fase de instrução do processo disciplinar que parte dos factos pelos quais o trabalhador vinha acusado, resultam não provados, nos termos vertidos no Relatório Final, em que assenta o ato sancionatório disciplinar, de aplicação da sanção de multa, impõe-se analisar se os factos que resultam provados integram os ilícitos disciplinares pelos quais foi acusado, de violação dos deveres gerais de zelo e de lealdade, nos termos das alíneas e) e g) do n.º 2, n.º 7 e n.º 9, do artigo do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 09/09.

II. O cumprimento de uma ordem emanada pelo superior hierárquico, para elaborar um auto de vistoria, que a chefia pensava ter sido retirado ou subtraído do processo, mas que nunca chegara a ser elaborado, sendo, por isso, necessária a sua elaboração, sem que o trabalhador informasse a sua chefia de que o auto nunca chegara a ter sido elaborado e, consequentemente, retirado, não configura a violação dos deveres de zelo e de lealdade por parte do trabalhador, por não se encontrarem preenchidos tais tipos de infrações disciplinares.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, por não provados os seus fundamentos, mantendo-se a sentença recorrida, de anulação da decisão impugnada na ordem jurídica.

Custas pelo Recorrente.

Registe e Notifique.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)

(Pedro Marques)

(Alda Nunes)