Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03748/10
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:09/21/2010
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL.
IRS.
INDEMNIZAÇÃO POR RESCISÃO.
ANTIGUIDADE.
Sumário:1. O montante da indemnização por rescisão do contrato de trabalho outorgada entre o trabalhador e a respectiva entidade patronal, apenas era tributável na parte em que excedia o valor correspondente a uma vez e meia o valor médio das remunerações fixas sujeitas a imposto, multiplicado pelo número de anos ou fracção de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora;

2. Não tendo o legislador fiscal, ele próprio, definido para este efeito, o conceito de antiguidade do trabalhador, temos de nos socorrer do conteúdo desse conceito tal como vigora no direito laboral;

3. E neste direito, encontrando-se tal conceito definido no ACT aplicável ao sector de actividade em causa (bancário), que por força da norma do art.º 2.º da LCCT constitui fonte imediata do direito laboral, é o conteúdo deste conceito tal como aqui se encontra definido, que é o aplicável em sede de incidência do IRS.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. A Exma Representante da Fazenda Pública (RFP), dizendo-se inconformada com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa - 1.ª Unidade Orgânica - que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por Jorge ......................, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


I- O ora impugnante celebrou em Maio de 1988 um Contrato de Trabalho a Termo Certo com o .......... - Banco ..............., SA, que decorreu até ao ano 2000.
II - Em Julho de 2000 celebrou com o Banco ................, SA novo contrato de trabalho cuja extinção ocorreu em 8 de Junho de 2001.
III- No ano de 2001 o impugnante recebeu rendimentos da categoria A no montante total de € 215868,33 sendo a quantia de € 111.053,38, recebida a título de indemnização em resultado da extinção do contrato de trabalho a qual não foi, contudo inscrita na respectiva declaração de rendimentos por ter entendido que a antiguidade por força do ACTV Bancário se reportava a 31 de Maio de 1988.
IV - O impugnante prestou serviços no Banco ................., SA entre Agosto de 2000 e Junho de 2001, o que corresponderia o valor de € 7 812,85 de indemnização não sujeita a tributação, conforme determina o n° 4 do artº 2º do CIRS.
V - Os instrumentos de contratação colectiva como é o caso dos ACTV (s) bancário destina-se a regular as relações entre os trabalhadores e entidade patronal sendo por vezes contratadas cláusulas que se mostram mais favoráveis para o trabalhador, do que noutros sectores de actividade dependendo da capacidade negocial em causa, não podendo, contudo, estas clausulas contratadas apenas com alguns sectores (ou apenas um) se extrapolarem para a lei fiscal influenciando negativamente outros com menor capacidade negocial.
VI- Mostrar-se-ia violado o Princípio da Igualdade se fosse, aqui considerado o tempo de Antiguidade, desde o momento em que o trabalhador, entrou para o sector bancário, conforme determina o ACTV bancário para efeitos de não sujeição à tributação em IRS, da indemnização enquanto que qualquer outro trabalhador de qualquer outro sector de actividade ainda que tivesse trabalhado toda a sua vida activa nesse mesmo sector, que não o bancário, mas em empresas diferentes, apenas lhe é contado o tempo de serviço na empresa com que rescindiu o contrato de trabalho.
VII – Assim, pelo facto do instrumento de regulamentação colectiva (ACTV), para o sector bancário, dispor sobre uma matéria de carácter indemnizatório, a fim de atribuir e salvaguardar direitos dos trabalhadores do sector, tal não implica, de maneira alguma, que possa vir de alguma forma colidir com determinada norma fiscal, imperativa, em vigor, que tributa essa mesma indemnização, mas que não põe em causa, quer o pagamento assumido por parte da entidade patronal e muito menos a justeza do montante a pagar.
VIII – Não restam, pois, dúvidas de que o ora impugnante considerou indevidamente que todo o montante da indemnização por si auferida não estaria sujeito a tributação, por ter incluído todos os anos de trabalho, no sector bancário, independentemente de apenas ter trabalhado cerca de um ano para o Banco ............., SA, com quem veio a rescindir o contrato.
IX - Face ao enquadramento legal expendido não pode, pois, a Fazenda Pública concordar com a douta sentença ora recorrida até porque a mesma viola o n° 4 do artº 2° do CIRS, o artº 5° e 55° da LGT e artº 13° CRP.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação improcedente,
PORÉM V. EXAS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


Também o recorrido veio a apresentar as suas alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais igualmente na íntegra se reproduzem:


A) No recurso interposto a F.P. não põe em causa a matéria de facto dada como provada na douta sentença recorrida, pelo que a mesma se mantém e se dá por inteiramente reproduzida para todos os legais efeitos;
B) O Impugnante ingressou no B......... em 30.05.1988, contrato que vigorou até 21.08.2000;
C) Em 22.08.2000, iniciou novo Contrato Individual de Trabalho com o Banco .........., S.A., tudo como melhor se alcança de fls. 35, 36 e 37, designadamente a referencia à aplicação, na parte omissa, do disposto no clausulado do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical para o Sector Bancário, sendo que o Impugnante era e continuou a ser sócio do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas;
D) No Acordo de Cessação do Contrato de Trabalho com o Banco ............., em 29.05.2001, este reconheceu que o aludido contrato de trabalho produziu efeitos a partir de 31 de Maio de 1988 - fls. 44;
E) Logo no Contrato celebrado em 26.05.88, as partes fizeram referência à aplicação do ACTV do Sector Bancário, cuja aplicação foi transversal ao longo do trabalho prestado no Sector Bancário até 29.05.2001;
F) Nunca o Impugnante se afastou, em termos laborais, daquele Sector Bancário;
G) Daí que o regime de determinação da antiguidade previsto e definido na cláusula 17.ª dos diversos e sucessivos ACT., se lhe aplicasse, como um todo, como se tivesse trabalhado sempre para uma única empresa;
H) O recurso apresentado pela F.P. fundamenta-se exclusivamente em matéria de direito e prende-se unicamente com a forma como deve ser interpretado, no caso, o disposto no n° 4 do art. 2° do CIRS;
I) A sentença recorrida considerou que devia computar-se todo o tempo prestado no Sector Bancário, em contraponto à antiguidade decorrente do tempo de trabalho prestado à ultima entidade patronal, para determinar a aplicação do regime previsto no art. 2.º, n.º 4 do CIRS;
J) Nada permite fazer uma interpretação restritiva daquele dispositivo tributário, no qual não possam subsumir-se os conceitos laborais, que englobam, designadamente, as normas de aplicação obrigatória, emergentes de legislação avulsa, do Código do Trabalho, dos Instrumentos de Regulamentação Colectiva de Trabalho, dos usos e práticas na empresa e no Sector, dos Contratos Individuais de Trabalho, etc.;
K) O Tribunal "a quo" concluiu ainda, que o Recorrido, no Banco ..............., teria a antiguidade emergente do trabalho prestado aos dois Bancos e que os seus efeitos que as partes quiseram contemplar na cláusula de rescisão se estendia a terceiros, designadamente à Administração Fiscal;
L) Porém, o n° 4 do art. 2° do CIRS refere-se expressamente ao "número de anos ou fracção de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora" (letra da lei);
M) Presumindo que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, como o impõe o nº3 do art. 9° do Código Civil, a "ratio" ou fim último daquela expressão consiste em atribuir até determinado montante, calculado com referência a um mês e meio de remuneração, o direito de não tributação em sede de IRS, equiparando trabalhadores que perante a mesma entidade devedora tenham a mesma antiguidade (espírito da lei);
N) Considerando sobretudo a unidade do sistema jurídico, em especial o princípio da consensualidade e liberdade de forma no direito laboral (art. 6° da LCT), e também as condições específicas do tempo em que a Lei é aplicada, designadamente a transferência corrente de trabalhadores entre empresas interligadas, ou, do mesmo sector de actividade, como é o caso dos bancários, temos que a cláusula de rescisão do contrato celebrado com o Banco ..............., S.A., em Maio de 2001, respeitante à antiguidade, vincula necessariamente a Administração Fiscal;
O) Seria mesmo um intolerável abuso de direito, na modalidade de "venire contra factum proprium", a Administração Fiscal servir-se do montante de rendimento apurado com base na antiguidade de 13 anos e fracção do Recorrido para arrecadar maior receita fiscal e impedir a consideração dessa mesma antiguidade para efeitos de não tributação duma pequena parte desse mesmo rendimento;
P) Ainda que a lei colidisse com os Princípios da Justiça Tributária, o que não sucede como ficou demonstrado, sempre haveria que atender ao disposto no n° 2 do art. 8° do Código Civil que determina que "o dever de obediência à lei não pode ser afastado sob pretexto de ser injusto ou imoral o conteúdo do preceito legislativo";
Q) Daí que a posição assumida pela F.P. nunca poderia sobrepor-se ao primado da legalidade, emergente da norma constante no n.º 4 do art. 2.º do CIRS, em articulação perfeita com o n.º 2 do art. 11.º da L.G.T.;
R) Não se encontra qualquer base legal ou fáctica que possa justificar a posição da F.P. em insistir na liquidação adicional respeitante a IRS do ano de 2001, no montante de € 46.234,66;
S) Tanto mais que a DMMP se pronunciou no sentido da procedência do pedido por considerar que o que está em causa é uma indemnização paga por extinção do vínculo laboral, visando compensar o trabalhador que ficou sem trabalho a partir daquele momento e não o pagamento de uma retribuição emergente da vigência de um Contrato de Trabalho;
T) Caso fosse acolhida a tese da F.P., estar-se-ia a violar o princípio da legalidade emergente do disposto no n.º 2 do art. 11.º e 55.º da L.G.T., no n.º 4 do art. 2.º do CIRS, art.ºs 6.º e 12.º da LCT (D.L. n.º 49.4081 de 24.11.1969), no art.º 8.º, n.º 4 do D.L. n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, nos art.ºs 1.º, n.º2, 8.º, n.º2 e 9.º, n.º 3 todos do CC e a cláusula 17.ª do ACTV do Sector Bancário, entre outros;
U) Ao decidir como fez, a M.ª Juiz "a quo", interpretou e aplicou correctamente a lei aos factos, não tendo violado qualquer disposição legal ou convencional, pelo que a sentença recorrida não merece qualquer censura;

Nestes termos e nos mais de Direito, deve negar-se provimento ao recurso, confirmando-­se a douta sentença recorrida, com a consequente anulação do acto impugnado, ou seja, a liquidação adicional respeitante a IRS do ano de 2001, no montante de € 46.234,66 com todas as legais consequências, fazendo-se Justiça.


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, dizendo louvar-se no parecer pré-sentencial que no mesmo sentido entendeu.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. A única questão a decidir consiste em saber se a antiguidade de um trabalhador bancário para efeitos da incidência do IRS em caso de indemnização por rescisão do contrato de trabalho, deve ser por referência a todo o tempo de serviço prestado nesse sector, ainda que a entidades patronais diversas, ou apenas o prestado à última delas e com quem veio a efectivar essa mesma rescisão.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A) Em 26/5/1988, Jorge ................., ora Impugnante celebrou com o B...... - Banco ............., SA, um contrato de trabalho a prazo, com início em 30/5/1988 - cf. fls. 30 dos autos;
B) No ano de 1988 o B....... - Banco ............, SA, procedeu aos descontos no vencimento do Impugnante para o Sindicato e para o SAMS - cf. documento de fls. 47;
C) O B.... - Banco .............., SA, foi incorporado no Banco ............, SA, a que lhe sucedeu o Banco ........, .........., SA - cf. fls. 30 e 35;
D) Em 28/6/2000, o Impugnante apresentou ao banco ....... P........, SA, um pedido de demissão com efeitos a partir de 21/8/2000-cf. fls. 46 e 35;
E) Em 14/6/2000, o ora Impugnante celebrou com o Banco de ............, SA, um contrato de trabalho com efeitos reportados a 22/8/2000 donde constam, entre outras, as cláusulas seguintes: “Cláusula (Categoria Profissional) O segundo Contratante será admitido ao serviço do BNA com a categoria de Director, Grupo 1, nível 16, nos termos estabelecidos no Acordo Colectivo de Trabalho Vertical do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas (de ora em diante" ACTV"). (...)
Cláusula (Situações Omissas) O presente contrato fica sujeito, em todo o omisso, às disposições do ACTV, bem como às disposições dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho que o revejam ou substituam, nos precisos termos em que o B.. a eles aderir." - cf. fls. 36;
F) Em 29/5/2001 foi celebrado entre o Impugnante e o Banco de .........., SA, um acordo de rescisão de contrato de trabalho que aqui se dá por integralmente reproduzido, donde se extrai por súmula o seguinte: "1 - O Banco e o Segundo Outorgante estão de acordo em fazer cessar as relações laborais emergentes do Contrato de Trabalho entre si celebrado, o qual produziu efeitos a partir de 31 de Maio de 1988" - cf. fls. 44;
G) Na sequência de acção de fiscalização externa, ao Banco .........., SA, apurou a Inspecção Tributária que o Impugnante recebeu em 2001 uma indemnização no valor de e 215 868,33, considerando não ter declarado e 101922,69 - cf. fls. 141 do PAT e fls.15 dos autos;
H) Na sequência da audiência prévia do Impugnante, em 6/12/2005, pela Divisão de Liquidação de Impostos sobre o Rendimento e sua Defesa, da Direcção de Finanças de Lisboa, foi prestada informação donde se extrai por súmula o seguinte: "( . . .) 5 - A entidade devedora é o B...., pelo que para o cálculo da parte da indemnização isenta de IRS é o período de tempo que o contribuinte esteve vinculado a esta entidade que conta. Pelo exposto propõe-se que não sejam atendidas as razões do contribuinte, mantendo-se as correcções à declaração de rendimentos do ano de 2001 (.. .)" – cf. documento de fls. 49;
I) Sobre a referida informação, recaiu despacho de concordância datado de 7/12/2005 - cf. fls. 49;
J) Foi efectuada liquidação adicional de que resultou um apuramento de imposto a pagar pelo Impugnante relativo a IRS de 2001, no valor de € 36 568,38 - cf. fls. 58 e 59.
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Com interesse para a decisão da causa, inexistem factos alegados e não provados.
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A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame crítico das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.


4. Para julgar procedente a impugnação judicial deduzida considerou a M. Juiz do Tribunal “ quo”, em síntese, que o montante de remuneração para efeitos de tributação, independentemente do critério utilizado entre as partes, é sempre o que exceda essa remuneração correspondente a um mês e meio multiplicado pelo número de anos ou fracção de antiguidade na entidade devedora, desta forma relevando o número de anos ou fracção de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora, pelo que a antiguidade do trabalhador, prestada na profissão ou sector de actividade, encontrada no âmbito laboral, releva em sede fiscal, e como no caso remonta a 31/05/1988, deve ser a data relevante também para efeitos fiscais, por expressa determinação legal da respectiva norma de incidência, pelo que a decisão que enforma a liquidação adicional e que assim não entendeu e decidiu, não se pode manter, a qual assim anulou.

Para a recorrente, de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, é contra esta fundamentação que se vem insurgir, por as cláusulas do ACT bancário, no caso, não se poderem sobrepor à lei fiscal, restringindo a sua aplicação às entidades outorgantes, sob pena de violação do princípio constitucional da igualdade e dos princípios que presidem à tributação contidos nos art.ºs 5.º e 55.º da LGT.

Vejamos então.
Nos termos do disposto no art.º 2.º do IRS, sob a epígrafe Rendimentos da categoria A (redacção então vigente em 2001, introduzida pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, com entrada em vigor em 1.1.2001 (1), por força do seu art.º 21.º), dispunha o seu n.º4:
Quando, por qualquer forma, cessem os contratos subjacentes às situações previstas nas alíneas a), b) e c) do n.º1, mas sem prejuízo do disposto na alínea d) do mesmo número, quanto às prestações que continuem a ser devidas mesmo que o contrato de trabalho não subsista, ou se verifique a cessação das funções de gestor, administrador ou gerente de pessoa colectiva, as importâncias auferidas, a qualquer título, ficam sempre sujeitas a tributação na parte que exceda o valor correspondente a uma vez e meia o valor médio das remunerações fixas sujeitas a imposto, auferidas nos últimos 12 meses, multiplicado pelo número de anos ou fracção de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora, salvo quando nos 24 meses seguintes seja criado novo vínculo profissional ou empresarial, independentemente da sua natureza, com a mesma entidade, caso em que as importâncias serão tributadas pela totalidade.

Para o presente caso de cessação da relação laboral por mútuo acordo, entre o ora recorrido e a sua entidade patronal, esta norma de incidência do n.º4, não deixa dúvidas que a tributação se fará, apenas na parte excedente a uma vez e meia o valor médio das remuneração auferidas nos últimos 12 meses, multiplicado pelo número de anos ou fracção de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora, ou seja, nesta sua última entidade patronal com quem acordou tal cessação, como nesta matéria nem as próprias partes dissentem, desta forma importando apurar, em primeiro lugar, a respectiva antiguidade do mesmo, já que é a mesma que determina, em primeira linha, a dimensão quantitativa desse mesmo rendimento tributável e por conseguinte, dessa correspondente liquidação adicional.

E para o fazer, temos de nos socorrer do conceito de antiguidade do trabalhador tal como ele se encontra definido no respectivo ramo de direito, ou seja no direito do trabalho, por força hoje, do disposto no art.º 11.º, n.º2 da LGT, mas que já assim anteriormente era entendido, sempre que se utilizassem termos próprios dos outros ramos do direito, como bem se fundamenta na sentença recorrida(2), já que o legislador fiscal optou por não proceder, ele próprio, a tal definição de antiguidade do trabalhador para efeitos de IRS(3).

Mas esta norma, manda remeter para os termos próprios de outros ramos de direito, que não apenas para as normas de outras leis, em que se colocaria a questão de saber se o ACT bancário, no caso aplicado, poderia ter aqui em sede fiscal qualquer relevância, sabido que este não é lei (formal), desde logo por força do disposto no art.º 112.º da CRP e do art.º 1.º do Código Civil, não tendo sido emanado por qualquer órgão estadual, ao abrigo da sua competência objectiva e nos limites materiais da respectiva competência subjectiva, antes repousa num acordo de vontades formado entre as associações sindicais e patronais do sector de actividade, e no âmbito do domínio privado da vontade das partes, a que a lei, contudo, não deixa de conferir relevância jurídica, desde logo nas normas dos art.ºs 405.º e segs do mesmo Código [aqui em contrário do que parece defendido na matéria da conclusão N) do recorrido, ao defender os termos de tal acordo laboral só por si, como se impondo à própria AT], ou seja, tal acordo não pode deixar de conter normas jurídicas, vinculantes entre as partes, mas não constitui lei em sentido formal e próprio, ainda que por força de tais normas do direito do trabalho tenha o mesmo relevo que de lei formal se tratasse.

Quer ao tempo em que o ora recorrido iniciou a sua actividade profissional aqui em causa (1988) e por cuja antiguidade a contar de então lhe foram pagas as remunerações donde resultou a controvertida liquidação adicional, o Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho aprovado pelo art.º 1.º do Dec-Lei n.º 49408, de 24/11/1969, não definia, ele próprio, o que se deveria entender por antiguidade de um trabalhador, embora na norma do seu art.º 12.º, definisse uma ordem de aplicação dos instrumentos de regulamentação de trabalho, onde as convenções colectivas de trabalho surgiam como uma das fontes desse direito, ainda que em último lugar, ordem esta que foi invertida com a regulamentação introduzida pelo Dec-Lei n.º 519-C/79, de 29 de Dezembro, também designado por LCCT, em cujo art.º 2.º veio colocar à cabeça da regulamentação colectiva de trabalho, com especial primazia, as respectivas convenções colectivas celebradas entre associações sindicais e associações patronais, mantendo ainda as demais, como a decisão arbitral, o acordo de adesão e a via administrativa, esta com um carácter residual, ou seja por portaria, desde que verificados determinados pressupostos, como se pode ver na norma do art.º 29.º deste último diploma.

E também o actual Código do Trabalho aprovado pelo art.º 1.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto(4), não regula, ele próprio, o conceito de antiguidade do trabalhador, continuando contudo, a colocar em primeiro lugar, os instrumentos de regulamentação colectiva, como as fontes do direito donde promanam, em primeira linha, as normas aplicáveis ao contrato de trabalho, e definindo as formas que estes podem assumir, como se pode ver do seu art.º 2.º: contratos colectivos, acordos colectivos e acordos de empresa.

E assim sendo, temos então de nos socorrer dos instrumentos de regulamentação colectiva aplicáveis no sector bancário em causa, onde se define e consagra no direito laboral o termo antiguidade do trabalhador, por força daquelas normas do RJCIT e da LCCT que lhes atribuem tal relevância, primeira, segundo este último diploma, de fontes do direito laboral, onde tal antiguidade se mostra definida, como sendo a correspondente àquela que o trabalhador detenha por todo o tempo de serviço prestado em Portugal nas instituições de crédito com actividade em território português, cláusulas 16ª, alínea a) do ACTV publicado no BTE, 1.ª Série n.º 28, de 29/7/1986 e 17ª, do ACTV publicado no BTE, 1.ª Série n.º 31, de 22/8/1999, como a ora recorrente nem coloca em causa nesta parte, pelo que a antiguidade tem de ser efectivamente esta a reportada a Maio de 1988, que não só pelo tempo prestado nesta última entidade patronal, como pretende a recorrente, já que também não se coloca em causa que o mesmo tenha trabalhado no respectivo sector de actividade, pelo menos desde Maio de 1988, como consta na matéria provada na alínea A) da matéria fixada no probatório da sentença recorrida, por referência ao doc. constante de fls 30 a 32 dos autos, que a Exma RFP, na sua posição, constante de fls 79 dos autos, nem contestou, já que também nada se prova que não tenha sido este o conceito de antiguidade para este efeito, que o legislador do CIRS tenha querido vazar na norma do citado art.º 2.º, n.º4, citada.


A invocada violação do princípio da igualdade invocada pela Exma RFP (no caso da norma de tal ACTV que fixa a antiguidade no início da actividade no sector), a nosso ver, apenas resultará pelos termos incorrectos em que tais premissas são colocadas.
Desde logo, nenhum outro concreto instrumento de regulamentação colectiva a ora recorrente invoca que faça reportar a antiguidade do trabalhador em caso similar, por referência apenas ao tempo de trabalho prestado nesta sua última entidade patronal, nem invoca nenhuma norma ou princípio que o estabeleça nestes termos, pelo que o termo de comparação invocado, para além de não se mostrar provado, nem se mostra que seja o legalmente decorrente da lei ou princípio jurídico a que esta deva obedecer, pelo que tal norma do art.º 13.º da CRP, jamais poderia quedar violada nesta situação em que inexiste norma jurídica ou princípio jurídico que tal entendimento impusesse (que a antiguidade do trabalhador apenas se pode reportar ao tempo de trabalho prestado na sua última entidade patronal, que não desde o início da sua actividade no respectivo sector, ainda que em diversas entidades patronais), bem se podendo igualmente invocar que, caso fosse fixado uma forma de contagem da antiguidade por referência ao tempo prestado apenas nesta última entidade patronal, que esta sim, é que fosse violadora de tal norma do art.º 13.º da CRP.


Também se não vislumbra que tal forma de contagem da antiguidade do ora recorrido, possa violar as normas dos art.ºs 5.º e 55.º da LGT, com a mesma veio a invocar, mas que não substancia de que forma, sabido que os fins da tributação vão muito para além da mera arrecadação de receitas das fontes donde os rendimentos brotam, visando também, uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza – n.º1 do art.º 103.º da CRP – e se o legislador, no âmbito das suas competências objectiva e subjectiva, optou por apenas tributar tais rendimentos do trabalho nos termos em que o fez, certamente, foi porque, sopesando todos fins pretendidos atingir com tal norma de incidência fiscal, considerou que a mesma era a que melhor preenchia todos esses fins, o que o intérprete, ao abrigo do disposto no n.º3 do art.º 9.º do Código Civil, não poderá deixar de presumir.


Improcedem assim todas as conclusões do recurso, sendo de lhe negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.


Custas pela recorrente.


Lisboa,21 de Setembro de 2010
Eugénio Sequeira
Aníbal Ferraz
Lucas Martins

(1) E não alterada pela Lei do Orçamento para 2001 – cfr. Lei n.º 30-C/2000, de 9 de Dezembro (2.º Suplemento), no seu art.º 32.º, n.º3.
(2) Citando, aliás, acórdão deste TCAS de 11/05/2004, recurso n.º 600/01, em que o ora Relator aqui interveio como 2.º Adjunto.
(3) Cfr. no mesmo sentido o acórdão do STA de 16/10/2002, recurso n.º 26.829, bem como os demais neste citados.
(4) Não aplicável ao caso, por este só ter entrado em vigor em 1.12.2003, e não ser de aplicação retroactiva – cfr. art.º 3.º da citada Lei.