Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04438/10
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:01/19/2011
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:OPOSIÇÃO EXECUÇÃO FISCAL. AGREGADO FAMILIAR. RESPONSABILIDADE POR DÍVIDAS DE IMPOSTOS. ILEGITIMIDADE DA EXECUTADA. ILEGALIDADE CONCRETA. (IM)POSSIBILIDADE DE CONVOLAÇÃO
Sumário:I) -Tendo a liquidação do imposto por objecto pessoas singulares, no caso contribuintes casados, a lei determina, em sede de IRS, que o imposto devido é o conjunto de rendimentos do agregado familiar.
II) -A noção legal de agregado familiar é dada pela lei civil, à qual se vai buscar as regras por que se devem regular os cônjuges, na salvaguarda da unidade familiar, o que impõe presumir, como principio, que o agregado familiar é composto pelos cônjuges que tem uma residência de família adoptada, de comum acordo.
III) -Estando em causa dívidas de impostos incidentes sobre certos e determinados bens, quer sobre actividades lucrativas, são da responsabilidade de ambos os cônjuges, a responsabilidade pelo seu pagamento era de ambos os cônjuges, podendo qualquer deles praticar todos os actos relativos à situação tributária do agregado familiar e aos bens e interesses do outro cônjuge, nos termos do art. 16° da LGT.
IV) -Na oposição à execução a causa de pedir é constituída pelo facto material ou jurídico de qualquer dos fundamentos do artº204° do CPPT, e apenas desses;
V) -Em oposição à execução fiscal não pode estabelecer-se qualquer equiparação entre a ilegitimidade substantiva da pessoa citada que não figura como devedora no título executivo e da pessoa citada que, embora figurando como devedora no título, não auferiu o rendimento sujeito a tributação, de onde emergiu a dívida exequenda.
VI) - O entendimento sufragado em V) não corresponde a uma interpretação restritiva e meramente literal do art° 204º 1- b) do C.P.P. Tributário porquanto ela não corresponde à pronúncia sobre a legalidade da liquidação do imposto, na medida em que a pronúncia excedia o poder cognitivo do Tribunal em sede de oposição à execução, não recusa qualquer equiparação entre a ilegitimidade substantiva da pessoa citada que não figura como devedora no título executivo e da pessoa citada que, embora figurando como devedora no título, não auferiu o rendimento sujeito a tributação, de onde emergiu a dívida exequenda, e a pretendida identidade de tratamento é que violaria a natureza do título executivo, equiparado a decisão com trânsito em julgado.
VII) -Independentemente da ocorrência e compatibilidade do requisito legal da causa de pedir, falhando o pedido adequado ao processo de impugnação, tal prejudica o conhecimento sobre a tempestividade da respectiva petição inicial, que é o outro requisito cumulativo da convolação, o que tanto basta para que a petição inicial no presente caso não possa ser convertida em processo de impugnação judicial.
VIII) -A «convolação» da oposição em impugnação judicial, só poderia operar-se desde que, não sendo manifesta a improcedência, ela fosse tempestiva e a petição se mostrasse idónea para o efeito pelo que, in casu, a convolação seria um acto inútil proibido por lei - artigo 137.° do Código de Processo Civil.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acorda-se, em conferência, nesta 2ª Secção do TCAS:

1.- A FAZENDA PÚBLICA, com os sinais identificadores dos autos, recorreu da sentença do Mº Juiz de Ponta Delgada que julgou procedente a oposição deduzida por A...à execução fiscal contra si instaurada para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IRC do exercício do ano de 2005, concluindo as suas alegações como segue:
“1. A douta sentença recorrida considerou procedente a oposição pelo facto do imposto liquidado ter incidido sobre um bem próprio não pertencente à oponente existindo assim ilegitimidade da pessoa citada nos termos da alínea b) do n.° 1 do artigo 204° do CPPT.
2. Contudo, e como ficou exposto, os factos que a oponente alegou não são susceptíveis de integrar esse fundamento de oposição à execução;
3. Estando em cobrança coerciva divida proveniente de IRS que foi liquidado a ambos os cônjuges na sequência da apresentação conjunta de declaração de rendimentos, não pode um deles invocar como fundamento de oposição a sua falta de responsabilidade pela dívida, pois as dívidas de IRS dizem respeito a ambos os cônjuges, uma vez que a liquidação é efectuada com base na totalidade dos elementos declarados que englobam a totalidade dos rendimentos do agregado familiar [alínea a) do n.° 3, n.° 2 do artigo 13° e artigo 76° do CIRS].
4. O tipo de ilegitimidade previsto na alínea b) do n.° 1 do artigo 204° do CPPT reporta-se exclusivamente aos impostos em que a posse, fruição ou propriedade de determinados bens seja pressuposto da incidência.
5. Aliás, aquele argumento contende com a legalidade concreta da liquidação e como tal não serve de fundamento de oposição à execução fiscal.
6. Pelo que a douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo fez, a nosso ver uma incorrecta interpretação das normas legais e da ratio legis que as fundamentam, incorrendo assim em erro de julgamento, devendo, por esse motivo, ser revogada, com as legais consequências.
Pelo supra exposto e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.”
Não houve contra – alegações.
O EPGA pronunciou-se no sentido de que o recurso merece provimento pelas razões a que infra se fará alusão.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
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2.- Na sentença recorrida, com base na análise dos documentos juntos aos autos e do acordo das partes, deram-se como assentes os seguintes factos, ordenados alfabeticamente por nossa iniciativa:
“a) A oponente e B...casaram a 2 de Julho de 1991, sem convenção antenupcial.
b) A 7 de Julho de 1992, B...e seus pais outorgaram escritura pública, através da qual estes doaram àquele um prédio urbano sito à Rua de ..., freguesia de Santa Cruz, município de Praia da Vitória, ao qual foi atribuído o valor de quinhentos mil escudos.
c) A 3 de Maio de 2005, B...outorgou escritura pública, através da qual, com o consentimento da sua cônjuge, vendeu esse prédio pelo valor de cento setenta e cinco mil euros.
d) Na declaração de rendimentos que apresentaram relativamente ao ano fiscal de 2005, a oponente e B...declararam essa venda e ainda que pretendiam reinvestir a mais-valia correspondente na aquisição de habitação própria permanente.
e) Como, porém, não fizeram essa aquisição, a 17 de Junho de 2009 a administração fiscal efectuou liquidação adicional de IRS, no valor de 2.4652,99 euros.
f) B...pagou metade desse valor.
g) A outra metade não foi paga pela oponente, tendo sido instaurada a execução a que ela ora se opõe.”
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Ao abrigo do artº 712º do CPC adita-se ao probatório a seguinte factualidade relevante para decisão da causa:
h) - A presente execução foi instaurada contra ambos os cônjuges como se alcança do título dado à execução que se encontra a fls. 2 do apenso.
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3.- Fixada a factualidade relevante, vejamos agora o direito donde emerge a solução do pleito, sendo certo que as conclusões de quem recorre balizam o âmbito de um recurso concreto ( artºs. 684º e 690º do CPC).
É inquestionável o regime segundo o qual este Tribunal aplica o Direito ao circunstancialismo factual que vem fixado, pelo que a questão que se impõe neste recurso é a de juridicamente fundamentar a ilegitimidade/legitimidade da oponente já que, como se vê das conclusões recursórias a recorrente Fazenda Pública insurge-se contra a decisão da Mª Juíza que considerou procedente a oposição pelo facto do imposto liquidado ter incidido sobre um bem próprio não pertencente à oponente existindo assim ilegitimidade da pessoa citada nos termos da alínea b) do n.° 1 do artigo 204° do CPPT.
Evidencia o probatório que a recorrida e respectivo cônjuge apresentaram declaração conjunta de IRS do ano de 2005 no qual o cônjuge da oponente, com o consentimento desta, alienou um imóvel propriedade daquele.
Sucede que as mais valias não foram reinvestidas na aquisição de habitação própria e permanente pelo que a AT procedeu à liquidação adicional, cuja dívida deu origem à execução a que se reporta a presente oposição, a qual foi instaurada contra ambos os cônjuges.
Mas, como bem denota o EPGA, evocando o pertinente ensinamento do Prof. Rui Duarte Morais in Sobre o IRS, 2.a edição, página 29, "Entre nós (no caso dos residentes) optou-se pela tributação do agregado familiar: existindo, o imposto é devido pelo conjunto dos rendimentos das pessoas que o constituem, considerando-se sujeitos passivos aqueles a quem incumbe a sua direcção (art.13.°, n°2).
Temos, assim, que o agregado familiar é a unidade económica relativamente à qual se afere a tributação. Tal não significa que tenha sido reconhecida personalidade jurídica às famílias, mesmo que só para efeitos deste imposto. Os sujeitos passivos são as pessoas a quem incumbe a direcção do agregado familiar (ambos os cônjuges, sendo o caso), existindo, portanto, uma titularidade plural das obrigações fiscais e uma responsabilidade solidária de ambos os cônjuges pela dívida de imposto".
Por isso que o EPGA assertivamente conclua que a recorrida é solidariamente responsável pelo pagamento da dívida exequenda.
Na verdade, o sistema de tributação regra constitui o conjunto de normas parâmetros estruturais que são necessários à aplicação de um imposto e, no caso do CIRS, tais parâmetros são, entre outras, as regras de incidência, a anualidade da tributação, a noção da agregado familiar, a determinação dos sujeitos passivos do imposto, etc.
Por outro lado, apurando-se que o título executivo foi extraído contra ambos os cônjuges, é inelutável a conclusão de que a questão da ilegitimidade suscitada pela oponente, tal como ela foi colocada, se prende com a legalidade, em concreto, do acto de liquidação do IRS exequendo, pelo que não constitui fundamento subsumível no art.º 204.º do CPPT, concretamente no seu n.º 1/b, como invoca.
É que, como vimos e agora se reafirma, tratando-se de pessoas singulares, no caso de contribuintes casados, para efeitos de IRS a lei determina que o imposto é devido pelo conjunto dos rendimentos do agregado familiar, composto, ao que aqui releva, pelos cônjuges não separados judicialmente de pessoas e bens.
E a noção de “agregado familiar” fiscalmente relevante, ainda que mais extensa, comporta em si a noção que de “família”, do ponto de vista restrito e enquanto resultante do casamento, é dada pela lei civil.
Desse modo, se é certo que o Código Civil, após a reforma operada pelo Dec.-Lei nº. 496/77NOV25, e no acatamento do imperativo constitucional decorrente do preceituado na Lei Fundamental, revogou o artigo 86º daquele compêndio legal e que dispunha sobre o domicílio legal da mulher casada (que era, até então e por princípio, o do marido) atento o princípio da igualdade de direitos entre os cônjuges contemplada na constituição, a verdade é que não deixou de continuar a vincular, qualquer dos cônjuges, entre outros e ao que aqui releva, ao dever de coabitação o que vale por dizer que, por princípio e salvo casos de excepção, que, por isso mesmo terão de ser demonstrados por quem aproveitem, os cônjuges estão obrigados, como refere Abel P. Delgado, O Divórcio, pág. 24, com relevância actual, «[...] a viver em comum, a viverem juntos, sob o mesmo tecto, enfim a viverem na residência da família», sob pena de darem causa a divórcio litigioso (cfr. artºs. 1672º e 1779º do CC).
É em coerência com o exposto, que o artº. 1673º do C.Civil, vem definir as regras por que, por princípio, se devem regular os cônjuges na salvaguarda da unidade familiar, para o que deverão adoptar a residência de família, a escolher, em primeira linha, de comum acordo.
Ora, a "situação pessoal e familiar" de que fala a norma do art° 14°/7 do CIRS tem apenas a ver com aquela que consta dos primeiros números do mesmo preceito – nºs. 1 a 4 -, ou seja, com o estado civil dos membros do agregado familiar (situação pessoal) e a sua quantificação (situação familiar), se se preferir, com os aspectos relevantes para efeitos de tributação, e isto sempre associado ao conceito de sujeito passivo de IRS estabelecido no normativo de incidência pessoal ou subjectiva que constitui o preceito.
Estando em causa dívidas de impostos a responsabilidade pelo seu pagamento era de ambos os cônjuges, podendo qualquer deles praticar todos os actos relativos à situação tributária do agregado familiar e aos bens e interesses do outro cônjuge, nos termos do art. 16° da LGT. Como se escreveu no acórdão n° 14026 de 4 de Março de 1992 do Supremo Tribunal Administrativo, "as dívidas por impostos, quer estes incidam sobre certos e determinados bens, quer sobre actividades lucrativas, são da responsabilidade de ambos os cônjuges”.
De qualquer forma releva a circunstância de que a invocada questão legitimidade fá-la, o recorrente, ancorar numa questão de ilegitimidade substantiva, decorrente da circunstância de apesar de em sede tributária a responsabilidade dos cônjuges pelo pagamento do imposto relativo aos rendimentos do seu agregado familiar ser de natureza solidária nos termos do art.º 21.º da LGT, a verdade é que tal está dependente da verificação dos pressupostos do facto tributário ocorrerem em relação às pessoas que o compõem, o que não sucede no caso vertente já que alteração dos rendimentos que suportou a liquidação em causa, resulta da venda de um imóvel, feita por um dos cônjuges que compõem o casal da recorrente, com o consentimento da sua cônjuge, por respeitarem a bens próprios já que adquiridos a título gratuito sendo certo que o regime de bens do casamento é o da comunhão de adquiridos.
Ora, a alegação de que o bem em causa não pertenciam ao património comum do casal o que tem relevância fiscal no sentido de excluir a tributação de forma conjunta, constitui uma questão que se prende essencialmente, com a legalidade do acto tributário de liquidação onde foi apurado o imposto exequendo, com fundamento na inexistência de factos tributários relevantes por referência aos cônjuges que compõem o casal do recorrente e por referência à aludida venda de imóvel, à luz da sua forma de aquisição.
Sendo assim, como é, tal questão, porque contende com a legalidade da liquidação, não tinha o tribunal «a quo» que entrar na sua apreciação, (julgamento) o qual não podia deixar de ser feita em sede de impugnação judicial do acto tributário de liquidação na parte inquinada de vício.
Do que vem dito, resulta que existe assim legitimidade da pessoa citada nos termos da alínea b) do n.° 1 do artigo 204° do CPPT.
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Mas há outra vertente da ilegitimidade, também sustentada pela sentença recorrida por apelo à segunda situação referida na alínea b) do artigo 204.° do CPPT que é a do executado figurar no título executivo, mas não ter sido o possuidor dos bens que originaram a dívida, no período a que respeita a dívida.
Ora, como é pacífico e observa o EPGA, este tipo de ilegitimidade liga-se às situações de reversão da execução contra possuidores, fruidores e proprietários, previstas no artigo 158.° do CPPT, podendo esta reversão ser uma consequência do julgamento que se fizer sobre a ilegitimidade referida na alínea b) do artigo 204.° do CPPT., que nada tem a ver com situação, ora, em análise.
Tributos do tipo dos referidos no citado artigo 158.° do CPPT são os impostos de circulação e camionagem, o imposto municipal sobre veículos, a contribuição autárquica e o IMI.

Dada a invocação concreta de um dos legais fundamentos previstos no artº 204º do CPPT terá de apreciar-se a susceptibilidade de subsumir-se a alegação da oponente na al. b)- do nº 1 daquele normativo, à luz do qual foi a presente oposição deduzida.
Como é sabido, a alínea b) especifica três tipos de ilegitimidade, como fundamento da oposição à execução fiscal, quais sejam:
a)- a ilegitimidade da pessoa citada por esta não ser o próprio devedor que figura no título nem o seu sucessor , que contempla o caso de erro na identificação do executado no acto da citação: citou-se pessoa diversa daquela que figura no título executivo como devedora (art. 195.º n.º l, alínea b), do Cód. Proc. Civil)- o qual é manifesto que não se verifica no caso concreto; o caso de certa pessoa haver sido citada na pressuposição errónea de que era “sucessora» do executado, hipótese que só é viável quando o funcionário encarregado da citação verificar que o executado faleceu e identificar erradamente o respectivo cabeça de casal ou herdeiros (art.241.º), o que também não aconteceu no caso concreto.
A este nível, visto que não houve lapso e a pessoa citada é realmente o próprio devedor que figura no título não pode a recorrente vir alegar a sua ilegitimidade.
b)- a ilegitimidade decorrente do facto de a pessoa citada, embora figurando no titulo como executada, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram é o segundo tipo previsto na lei como fundamento de oposição.
Prevêem-se nesse preceito legal vários tipos de ilegitimidade do executado designadamente e ao que ao caso interessa o decorrente do facto de a pessoa citada, embora figurando no título como executada, «não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram».
Nestas situações tem de haver uma relação directa entre a dívida exequenda e os bens a que se reporta, para que o possuidor destes seja parte legítima na execução respectiva.
Como já se ensinava no Ac. do STA-Pleno- de 23/2/77, in ADs. 190º-956, «Sempre que os próprios bens sejam a causa da dívida, só o respectivo possuidor, no período a que esta respeita, pode ser parte legítima na execução para cobrança coerciva da mesma dívida, por apenas ele, possuidor, ser o verdadeiro e efectivo devedor».
Ora, a oponente alega a falta de posse e fruição do bem no período a que respeita a dívida exequenda.
E para a verificação deste tipo de ilegitimidade, como resulta da doutrina do aresto citado, apenas releva a falta de posse ou de fruição do bem, sendo indiferente a existência ou não de um direito de propriedade, sendo até admissível que o executado deduza oposição com este fundamento não obstante figurar no registo como titular do direito sobre o próprio bem que originou a dívida.
É que, como expende Oliveira Ascenção, «Direitos Reais», 1971, pág. 395, «A responsabilidade do titular do direito real não depende do que consta do registo mas da realidade substantiva».
Contudo, competia à oponente a prova dos factos integradores do fundamento da oposição tendo em conta que o título executivo goza da presunção de legalidade, fazendo fé da existência da obrigação exequenda, presumindo-se a ausência de causas impeditivas, modificativas ou extintivas.
Assim sendo, porque, na verdade, estamos em presença de um rendimento e não de um bem, não se pode sustentar a existência ou não de posse, é improcedente o fundamento invocado já que a ilegitimidade em causa, de a pessoa citada, embora figurando como executada, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram - como é jurisprudência uniforme- é um tipo de ilegitimidade que só se verifica em relação às execuções por dívidas de impostos rodoviários e de contribuição autárquica, não cabendo nele a “posse” de um bem ou rendimento por ele gerado que, num simples juízo de normalidade, se refere à fruição de bens e, como já se disse, nestas situações tem de haver uma relação directa entre a dívida exequenda e os bens a que se reporta, para que o possuidor destes seja parte legítima na execução respectiva.
Este entendimento não corresponde a uma interpretação restritiva e meramente literal do art° 204º 1- b) do C.P.P. Tributário porquanto ela não corresponde à pronúncia sobre a legalidade da liquidação do imposto, na medida em que a pronúncia excedia o poder cognitivo do Tribunal em sede de oposição à execução, não recusa qualquer equiparação entre a ilegitimidade substantiva da pessoa citada que não figura como devedora no título executivo e da pessoa citada que, embora figurando como devedora no título, não auferiu o rendimento sujeito a tributação, de onde emergiu a dívida exequenda, e a pretendida identidade de tratamento é que violaria a natureza do título executivo, equiparado a decisão com trânsito em julgado.
O que definitivamente quer dizer que este fundamento de oposição só se verificará em relação às execuções por dívidas de impostos incidentes sobre o rendimento ou fruição de imóveis ou certos móveis, como no caso da contribuição predial, autárquica ou IMI e nos impostos rodoviários, como os de circulação, compensação e camionagem e, bem assim, na taxa de conservação da rede geral de esgotos.
Não pode, pois, a sentença recorrida manter-se, improcedendo o fundamento de ilegitimidade.
Assim, vê-se que a sentença se pronunciou sem acerto pois, sob a invocação da sua ilegitimidade substantiva, a oponente pretendia discutir na oposição à execução a concreta legalidade da dívida exequenda, em sobreposição a impugnação judicial e com violação de imperativo legal.
É que sobre a questão de saber se a oponente recebeu efectivamente rendimento baseado na venda do imóvel, dúvidas não podem subsistir de que essa factualidade também não constitui fundamento de oposição, pois que se trata de apreciar da legalidade da liquidação, constituindo, na procedência do invocado, inexistência de facto tributário.
Ora, a matéria da legalidade da liquidação está excluída do processo de oposição, salvo se não for assegurado meio de recurso ou impugnação (art° 204º CPPT); sendo que no caso o meio existe: - impugnação judicial com fundamento em inexistência de facto tributário ou qualquer outra ilegalidade – cfr. artº 99º do CPPT. Por outro lado, aquilo a que a oponente apoda de ilegitimidade tem também a ver com a legalidade da liquidação, especificamente com a determinação do sujeito passivo e a ilegitimidade relevante como fundamento para oposição é apenas a que se reporta às concretas situações referidas na al. b) do n° 1 do art° 204 CPPT (em que, manifestamente, se não integra o alegado).
A norma da alínea h) do artº 204° do Código de Procedimento e Processo Tributário) estabelece, como fundamento da oposição: “ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação.”
Em regra, a fase executiva é precedida da uma fase administrativa prévia em que é feita a liquidação da dívida exequenda, sendo esta notificada ao interessado, que a pode impugnar pelos meios administrativos e contenciosos previstos na lei (designadamente reclamação graciosa e impugnação judicial), dentro dos prazos legais.
Por isso, como regra, não pode discutir-se na oposição à execução fiscal, a legalidade dessa liquidação, que só pode sê-lo pelos meios próprios de reclamação ou impugnação.
Com efeito, a oposição à execução, em principio, não pode funcionar como uma segunda oportunidade para poderem fazer valer os seus direitos os contribuintes que deixaram passar os prazos de impugnação administrativa ou contenciosa sem os defenderem,
Como fundamento de oposição à execução, apenas está prevista a designada ilegalidade abstracta da liquidação (al. a) do nº 1 do artº 204º do CPPT), por a ilegalidade não residir directamente no acto em que faz aplicação da lei ao caso concreto, mas residir na própria lei cuja aplicação é feita, não sendo, por isso a existência de vício dependente da situação real a que a lei foi aplicada nem do circunstancialismo em que o acto foi praticado.
A oponente pretende discutir a Ilegalidade concreta da dívida exequenda, mas a lei assegurava-lhe o meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação.
Face ao invocado pela oponente, não tendo a mesma reagido contra a ilegalidade da liquidação, em devido tempo e pelo processo adequado, ficou precludida a sua apreciação em sede de execução fiscal; assim, o processo de oposição à execução não é o instrumento processual, adequado para nele ser apreciada a questão da inexistência de facto tributário decorrente da cessação de actividade.
A oponente acaba por sustentar que o que está em causa nos presentes autos é um caso de inexistência de acto tributário e que tal vício consubstancia um problema de legalidade da liquidação da divida exequenda e, como tal, deveria ser conhecido em sede de impugnação e não de oposição.
Coloca-se, no entanto, a questão de o Tribunal ter poderes oficiosos de convolação, alterando a forma de processo, designadamente para a impugnação fiscal, porquanto, tratando-se da inexistência de acto tributário.
Quid juris?
Adiante-se que a possibilidade de convolação é questão que é de conhecimento oficioso.
Sendo inquestionável que a oponente veio discutir a legalidade da liquidação e que a oposição à execução fiscal não é o meio próprio para discutir a legalidade em concreto da mesma, tem de concluir-se que ela devia ter sido apreciada em sede de impugnação judicial ou de reclamação graciosa, meios esses que não foram usados pela oponente.
Donde a conclusão definitiva de que a presente oposição é meio inidóneo para obter a anulação da liquidação cuja ilegalidade por inexistência de acto tributário é invocada e poderá ser fundamento de impugnação judicial.
Neste raciocínio, está implícito o entendimento de que, porque só a liquidação afecta, em princípio, os direitos e interesses do contribuinte, só ela é impugnável, abarcando, todavia, essa impugnação todos os referidos actos anteriores, de harmonia com o princípio da impugnação unitária consagrado na nossa lei (impugnação que pode ter por fundamento quaisquer ilegalidades cometidas ao longo do procedimento de liquidação, com vista à respectiva anulação, designadamente a verificação de pressupostos de facto e de direito para determinada isenção que não foi tida em conta pelo órgão liquidador, assegurando-se, desta forma, uma completa e eficaz tutela dos direitos dos contribuintes a não pagarem impostos ilegais).
Vale isto por dizer que a liquidação em sentido estrito se insere num processo típico - processo de liquidação ou liquidação em sentido amplo - e que só esta define a situação jurídica do contribuinte em relação ao imposto.
A liquidação em sentido amplo é o «acto pelo qual se fixa não só o montante da prestação mas todo o conteúdo da relação juridicamente tributária nascida da conjugação do facto concreto com a lei» (cfr. Rodrigues Pardal e Rúben de Carvalho, in "Código de Processo das Contribuições e Impostos, Anotado", Vol. I, pág. 43 e A. Xavier, in "Conceito e Natureza do Acto Tributário", pág. 245 e segs.), abarcando toda a actividade desenvolvida pela administração fiscal até à exigência final do tributo: desde a determinação da incidência, das isenções, da matéria colectável, da liquidação propriamente dita (cfr. ob. citada de Rodrigues Pardal e Rúben de Carvalho, pág. 42).
Assim, porque só a liquidação define a situação jurídica do contribuinte em relação ao imposto, só ela pode afectar ou lesar - como prestação pecuniária que é - os seus direitos e interesses, nomeadamente de carácter patrimonial (cfr., aliás, o Acórdão do STA, Pleno, de 27/06/75, in A.D. nº 168, pág. 1637).E porque só ela afecta, em princípio, os direitos e interesses dos contribuintes, só ela é impugnável, abarcando todos os actos anteriores, dentro do princípio da impugnação unitária, sem prejuízo dos chamados actos destacáveis que também definem determinada situação jurídica e que por isso são igualmente impugnáveis (cfr. arts. 99º e segs. do CPPT, que prevêem a impugnação do acto tributário com fundamento em qualquer ilegalidade, designadamente, vício de forma, incompetência, violação de lei, inexistência de facto tributário, etc., visando sempre a anulação da liquidação).
No caso vertente, tendo sido efectuada a liquidação adicional de IRS, definindo dessa forma a situação jurídica da contribuinte, há que concluir que aquele acto constitui o acto tributário definidor da situação tributária do recorrente, um acto lesivo dos seus legítimos interesses, tratando-se, pois, de um acto definitivo e executório e lesivo (na terminologia do nº 4 do art. 268º da CRP), contenciosamente impugnável (suposto que constitui acto lesivo aquele que atinge por forma negativa direito ou interesse legítimo legalmente protegido do administrado).
Ora, embora a oponente tivesse ao seu dispor o processo de impugnação para atacar a liquidação do IRS, tal não o impedia de, em alternativa, usar o meio de reclamação que vigorava ao tempo dos factos e que estabelecia que «O processo gracioso de reclamação visa a anulação total ou parcial dos actos tributários». Donde que os meios próprios para atacar qualquer ilegalidade da liquidação eram a impugnação judicial e/ou a reclamação da mesma, nos termos e com os fundamentos estabelecidos no CPPT.
Daí que a recorrente podia deduzir a competente impugnação judicial junto do TAF para atacar a legalidade dessa liquidação, nos termos do art. 99º e segs. do CPPT, invocando a pertinente ilegalidade e requerendo a consequente anulação do imposto a mais liquidado.
Mas também podia reclamar nos termos do artº 70º e ss do CPPT, com os mesmos fundamentos e pedido de anulação do acto de liquidação, sendo admissível, outrossim e subsequentemente, o recurso hierárquico e recurso contencioso.
E, como fundamento poderia invocar-se qualquer ilegalidade, designadamente, a inexistência de facto tributário decorrente de não ter recebido a verba em causa por o bem não lhe pertencer.
No que tange à inexistência de facto tributário, refere CARDOSO DA COSTA, “Curso de Direito Fiscal”, 2ªed., 1972, pág. 126, que «frequentemente o legislador fiscal liga a obrigação do imposto à prática de actos, ao exercício de actividades e ao gozo de situações, que são disciplinadas enquanto tais pelo direito privado».
Nesses casos, o facto gerador do imposto deriva ou é pelo menos influenciado nos seus contornos pela celebração dum negócio jurídico de determinado tipo.
E, assim, no douto ensinamento de ALBERTO XAVIER, «Conceito e Natureza do Acto Tributário», 324,
«O facto tributável com ser facto típico, só existe como tal, desde que na realidade se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos que, por esta nova óptica, se convertem em elementos do próprio facto».
Ora, o vício apontado pela recorrente é de anulabilidade, e, por isso, importa, antes de tudo o mais, apreciar a questão da tempestividade da impugnação judicial pois a mesma logra prioridade conhecimento da pretendida convolação e, a verificar-se, que impede o conhecimento do fundo da causa.
Ora, é assertivo o entendimento de que a regra geral para a invalidade dos actos administrativos como sendo a anulabilidade, consagrada no artigo 135° do CPA e que os casos de nulidade estão expressos no artigo 133° do mesmo diploma.
É que, como se expendeu no Acórdão do TCA de 22/10 /2002, no Recurso nº 6515/02 e nos arestos que aí se citam, mesmo tratando-se de impostos, os actos tributários impugnados - adiante-se já - não são nulos mas meramente anuláveis, pois que mesmo o vício de inconstitucionalidade da respectiva norma jurídica não implica sempre a sua nulidade.
De tais arestos resulta que é este o entendimento que vem sendo afirmado pelo STA, em vários e recentes acórdãos: o de que actos como os aqui sindicados são meramente anuláveis.
Na senda da jurisprudência aludida, a regra geral no regime de invalidade do acto administrativo é a da anulabilidade - art. 135° do CPA. Sendo, todavia, nulos, nomeadamente - art. 133° n° 2 al. d) -os actos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental. O que não é o caso já que aí se não insere o disposto no art. 103° n° 3 da Constituição da República.
O que aí se confere é um direito de resistência jurídica ao pagamento, o que significa que, na própria execução coerciva, o contribuinte pode alegar, em termos de oposição, a inconstitucionalidade da lei, base da liquidação do tributo.
É certo que os direitos de audiência e à justiça administrativa (artigo 268.°, n.° 5, da Constituição), o direito de participação dos cidadãos na administração pública, o direito ao contraditório, resultante do Direito Internacional, nomeadamente a Convenção europeia sobre os Direitos do Homem, artigo 6.°, o direito à fundamentação dos actos administrativos, enquanto garante de controle de legalidade dos mesmos (artigos 3.°, n.° 2 e 268.°, n.° 3, ambos da Constituição), o princípio do Estado de Direito Democrático (artigo 2.° da Constituição ), o princípio da tutela jurisdicional efectiva, acolhido no artigo 268.°, n.º 4, da Constituição, o princípio do direito ao procedimento justo e equitativo, direito a um "due process of law", ínsito no artigo 268.°, da Constituição, o artigo 18.°, n.° 1, da Constituição, o princípio de um "due process of law", a garantia dos particulares que, no artigo 268.°, n.° 3, da Constituição, têm assento constitucional, como é bom de ver.
O princípio da audiência e os demais atrás referidos, assumem-se como uma dimensão qualificada do princípio da participação consagrado no artigo 8.º do mesmo CPA, surgindo na sequência e em cumprimento da directriz constitucional contida no n.º 4 do art. 267.º da C.R.P. obrigando o órgão administrativo competente a, de alguma forma, associar o administrador à preparação da decisão final, transformando tal princípio em direito constitucional concretizado.
E, para que, com eficácia, sejam cumpridas as formalidades de audiência do interessado e da fundamentação, é necessário que a este seja facultado o expediente administrativo, de modo a que fique habilitado a exercer convenientemente o seu direito.
Sendo também uma das manifestações do princípio da transparência do procedimento, ao se facultar ao interessado a sua audiência e as razões por que se decidiu de um modo e não de outro, no âmbito do procedimento está-se a privilegiar um controle preventivo por parte do particular em relação à Administração.
Todavia, os direitos constitucionais referidos têm natureza instrumental, assumindo a natureza de direito fundamental quando o for o direito dominante.
Ora, no caso concreto, como já se disse, o direito dominante é um interesse particular que se reconduz ao direito de resistência jurídica ao pagamento de impostos ilegais.
Assim, não está em causa a ofensa ao conteúdo essencial do direito fundamental de natureza análoga a que se refere o artigo 17º da Constituição da República Portuguesa, não lhe sendo aplicável, por isso, o regime constitucional específico dos direitos liberdades e garantias.
O acto tributário de liquidação impugnado não põe, pois, em causa o conteúdo essencial de um direito fundamental e, em consequência, não é nulo, porque não é subsumível a nenhuma das causas de nulidade das catalogadas no artigo 133º do Código do Procedimento Administrativo, não podendo arguir-se a todo o tempo os vícios alegados – cfr. artº 134º nº 2 do CPA.
Destarte, o vício imputado ao acto de liquidação a impugnar, segue o regime da anulabilidade, contando-se o prazo de acordo com o n° l a) do artigo 102º do CPPT: 90 dias contados a partir de termo do pagamento voluntário do imposto.
Em face do que vem dito, impõe-se-nos determinar sobre se deve a p.i. de oposição ser convolada para processo de impugnação judicial.
Neste passo remetemos para a fundamentação do Acórdão deste TCA, tirado no Recurso nº 6851/02 em 08.10.2002 e que, com a devida vénia, passamos a transcrever:
“Segundo o ensinamento de Alberto dos Reis, no Código de Processo Civil Anotado, II, p. 291, e em anotação ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-2-1952, na Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 85.°, pp. 222 e 223, o fim concretamente visado pelo autor e o fim abstractamente figurado pela lei tem de ser coincidentes; se assim acontecer, terá sido bem empregado o processo; se, pelo contrário, o pedido não se ajustar à finalidade para que a lei concebeu o processo, há erro na forma de processo; o erro na forma de processo utilizada afere-se, pois, pelo desajustamento à finalidade para a qual a lei criou o respectivo processo.
Verificado o erro na forma de processo, a petição inicial deve ser indeferida, se não puder ser aproveitada; se a acção tiver ultrapassado a fase liminar, há-de anular-se todo o processado, e absolver-se o réu da instância, nos termos do artigo 288.°, n.° l, alínea b), do Código de Processo Civil - cf., neste sentido, Alfredo de Soveral Martins, Lições de Processo Civil (Pressupostos Processuais), Apontamentos, Coimbra, 1969, p. 263 e 264; cf. também, por exemplo, o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 7-2-1990, no Apêndice ao Diário da República de 15-10-1992, pp. 25 a 28.
A absolvição da instância, porém, não obsta a que outra acção (apropriada) seja proposta sobre o mesmo objecto - de acordo com os termos do artigo 289.° do Código de Processo Civil.
Por seu turno, o artigo 199.° do Código de Processo Civil - compêndio subsidiariamente aplicável em processo judicial tributário, por força da alínea e) do artigo 2.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, (…) - dispõe que o erro na forma de processo importa unicamente a anulação dos actos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei (n.° l); e não devem aproveitar-se os actos já praticados, se do facto resultar uma diminuição de garantias do réu (n.° 2).
De resto, tal solução encontra também fundamento nos princípios da celeridade e da economia processual.
Por força do disposto nos artigos 202.° e 206.°, n.° 2, do mesmo Código de Processo Civil, o erro na forma de processo é de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final, inexistindo obstáculos processuais insuperáveis a que um processo de oposição possa ser convolado em processo de impugnação judicial.
Ademais e como já se referiu, alguns fundamentos do processo de impugnação judicial, pela sua particular gravidade, são também fundamentos de oposição à execução fiscal, como são manifestamente os casos de ilegalidade em abstracto da dívida exequenda, de inconstitucionalidade de normas que suportam e regem a liquidação e a execução e de duplicação de colecta.
Com tais fundamentos, é admissível a discussão da legalidade da liquidação em processo de oposição à execução em termos de, se reconhecida a ilegalidade da liquidação, esta ser anulada declarando-se, em consequência, extinta a respectiva execução fiscal.
O próprio Código de Procedimento e de Processo Tributário, no n.° 2 do seu artigo 204.°, prevê casos de oposição à execução fiscal que devem seguir a forma de processo de impugnação judicial
Em boa verdade, toda a oposição à execução fiscal, ao intentar a extinção do processo em que decorre a cobrança coerciva da obrigação liquidada, pode ter como objectivo também a eliminação da liquidação tributária. A liquidação da obrigação tributária constitui, no entanto, apenas o seu objecto mediato - pois que o objecto imediato da oposição é a execução fiscal, tendo em vista a extinção desta, total, ou apenas parcial.
Daqui resulta que não existe essencial antítese entre a impugnação judicial e a oposição à execução fiscal - cf. os acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 27-5-1992 (recurso n.° 13 840), de 20-10-1993 (o mesmo recurso em Pleno da Secção), e de 2-11-1994, recurso n.° 17891.”
Ora, sendo embora certo que a causa de pedir (inexistência de facto tributário) seja compatível com o processo de impugnação judicial, já o pedido (extinção da presente execução : “Assim sendo, deverá o presente processo de excução fiscal ser arquivado quanto à executada” –é este, ipsis verbis, o pedido formulado na presente oposição, como se vê do ponto 24 da p.i. ) o não é ( na impugnação o pedido é a anulação da liquidação).
Assim, independentemente da ocorrência e compatibilidade do requisito legal da causa de pedir, falha o pedido adequado ao processo de impugnação, o que prejudica o conhecimento sobre a tempestividade da respectiva petição inicial, que é o outro requisito cumulativo da convolação.
Tanto basta, a nosso ver, para que a petição inicial no presente caso não possa ser convertida em processo de impugnação judicial.
A «convolação» da oposição em impugnação judicial, só poderia operar-se desde que, não sendo manifesta a improcedência, ela fosse tempestiva e a petição se mostrasse idónea para o efeito (tem sido esta, sem discrepância, a jurisprudência do STA cfr., por mais recentes, os acs. de 27/2/2002, Rec. 26722, de 21/6/2000, Rec. 24.605 e de 23/2/2000, Rec. 24.357).
A convolação seria, assim, um acto inútil e, por conseguinte, proibido por lei - artigo 137.° do Código de Processo Civil.
Termos em que procede o recurso.

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4.- Face ao exposto, acordam os Juízes da 2ª Secção do TCAS, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a oposição ordenando o prosseguimento da execução em relação à oponente.
Custas pela oponente apenas em 1ª instância.
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Lisboa, 19 de Janeiro de 2011
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Joaquim Condesso)