Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:942/09.8BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:09/15/2022
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:FATURAÇÃO FALSA
ÓNUS DA PROVA
INDÍCIOS
MATERIALIDADE
Sumário:I-No domínio da faturação falsa, compete à AT demonstrar que os indícios por si recolhidos no decurso da ação inspetiva são sérios e suficientes para concluir pela inexistência ou simulação de uma relação económica que sustente as faturas.
II-Não é exigível que a AT efetue uma prova direta da simulação, pelo que cumprindo esse ónus e ilidindo a presunção de veracidade da declaração do sujeito passivo consagrada no artigo 74.º, n.º 1 da LGT, passa a competir a este o ónus da prova da realidade subjacente à fatura, infirmando os indícios recolhidos pela entidade fiscalizadora.
III-Se a AT se basta com elementos (indícios externos), sem obtenção de alguns indícios junto do contribuinte (indícios internos), e se não é sindicado o circuito financeiro, e os competentes pagamentos, não resultando, outrossim, do Relatório de Inspeção qualquer inferência de que tenham sido requeridos quaisquer esclarecimentos ou peticionados elementos referentes à própria Recorrente, nem prestadas declarações para o efeito, ter-se-á de concluir que os indícios recolhidos não são suficientes para legitimar a desconsideração dos custos.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I-RELATÓRIO


R..., LDA (doravante R... ou Recorrente), interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, que julgou improcedente a impugnação deduzida contra o ato de liquidação de Imposto sobre Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) do exercício de 2004, no montante de €4.773,30, e respetivos Juros Compensatórios (JC), no montante de €557,21.

A Recorrente formulou as conclusões que infra se descrevem:

“A. Por sentença datada de 27/01/2022, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou improcedente a impugnação apresentada da liquidação n.º 20088310037507, referente ao IRC do exercício de 2004, no valor de 4.773,50€ (quatro mil, setecentos e setenta e três euros e cinquenta cêntimos), dos quais 557,21€ (quinhentos e cinquenta e sete euros e vinte e um cêntimos) correspondem a juros compensatórios.

B. A sentença a quo deu como não provada que a sociedade comercial denominada “A..., Ldª” tenha procedido à prestação de serviços à Recorrente, serviços estes desconsiderados para efeitos de determinação da matéria tributável, com fundamento na inexistência material dos serviços prestados pela referida sociedade.


C. Acontece que, como decorre do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 24/01/2008, proferido no processo n.º 02887/04, quando forem apurados pela tutela indícios sérios e credíveis de que determinada operação comercial titulada por uma factura não é real, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade dessa transacção.

D. Ora o Tribunal a quo, entendeu por provado, que a tutela tributária em sede de inspecção, demonstrou que a operação titulada pelas facturas emitidas pela sociedade comerial “A..., Ldª” não correspondiam a uma operação real, porém, a conclusão a que chega o Tribunal não poderia ter sido formulada nos termos e com os fundamentos em que assenta.

E. Cumpre salientar que a empreitada sita em Sesimbra, resultou da adjudicação à Recorrente, pela sociedade comercial denominada V..., Lda, a 22/03/2004, quase duas décadas antes da produção de prova testemunhal, pelo que os inquiridos, que lidam com a construção civil diariamente, não consigam, atentas as regras da experiência normal, recordar em pormenor, que actos concretos efectuou uma sociedade subcontratada para uma empreitada.

F. Resultou expressamente da fundamentação do julgamento, que a testemunha Francisco Costa, confirmou ver o legal representante da sociedade “A... Unipessoal, Ldª” no local da empreitada, acrescentando que o mesmo coordenava trabalhadores naquela empreitada.

G. Da mesma forma, decorreu do depoimento da testemunha Manuel Pereira, que a sociedade “A... Unipessoal, Ldª” prestou serviços na empreitada em Sesimbra, acrescentando que o legal representante da mesma transportava vários trabalhadores para o local de obra.


H. Tanto assim é, que foi dado por provado, na al. F) do probatório, que “A..., trabalhou na obra de Sesimbra e fazia o transporte de trabalhadores para trabalharem nesse local (cfr. depoimento das testemunhas)”.

I. Temos por isso, que é dado como provado que existiram efectivamente operações reais, quando simultaneamente é dado por provado que a tutela tributária cumpriu o ónus da prova quanto às conclusões que retira em sede de procedimento, de onde se lê: “estamos perante a regularidade formal dos documentos, contrapondo-se à inexistência material da operação (…)”.

J. Pelo que, a decisão ora recorrida manifesta erro de julgamento, na medida em que assenta na distorção da realidade factual, traduzindo-se o decidido numa apreciação que não corresponde à realidade ontológica, razão pela qual se encontra viciada de nulidade nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC.

K. A contrario, deveria ter sido dado por provado que não estava cumprido o ónus da prova que competia à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos do art.º 74.º da LGT, por ser sido demonstrado que não estava em causa a inexistência material das operações tituladas pelas facturas, mas antes, operações reais, prestadas e facturadas pela sociedade A... Unipessoal, Ldª à Recorrente.

L. De acordo com a norma do art.º 23.º, n.º 1 e n.º 2, al. a) do CIRC, para determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC incluindo os gastos incorridos com a aquisição de serviços, matérias utilizadas, mão-de-obra, energia e outros gastos gerais.

M. Pelo que, os custos em que a Recorrente incorreu com a prestação de serviços da sociedade A... Unipessoal, Ldª, são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável.


N. In casu, para a empreitada adjudicada a 22/03/2004 e como resulta do artigos D) e E) do probatório, a Recorrente tinha apenas 4 ou 5 trabalhadores que executavam o trabalho de pedreiro, pelo que era naturalmente necessário que se socorresse de outros prestadores de serviços, estando preenchido o critério da indispensabilidade do custo, bem como o critério da comprovação, que resultou claramente da produção a prova testemunhal.

O. No caso concreto, os indícios eventualmente recolhidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira (que são manifestamente omissos no procedimento de inspecção) não se afiguram suficientes para se concluir que as facturas em causa não titulam serviços reais, como se verificou pelos factos dados como provados.

P. Ora no caso, “não basta uma fundamentação formal, sendo necessário verificar se os autos contêm elementos, ou melhor dizendo, se a administração tributária recolheu elementos demonstrativos dos pressupostos em que fundou o seu juízo, de modo a permitir que o tribunal sindique se os mesmos se verificam ou não.”.

Q. Com efeito, se os gastos foram deduzidos pela Recorrente para o exercício de 2004, constavam da contabilidade – contabilidade esta que goza de presunção de veracidade como impõe a norma do art.º 75.º, n.º 1 da LGT - presunção esta que não foi afastada.

R. A contabilidade da Recorrente espelhava correctamente a imagem real da situação patrimonial, financeira e das receitas da sociedade, pelo que, os custos que em referência à empreitada de Sesimbra foram suportados com a operação correspondente à prestação de serviços da sociedade A... Unipessoal, Ldª poderiam ter sido deduzidos para os efeitos a que se referem as normas dos art.º 17.º e seguintes do CIRC.

S. Ora se os custos incorridos pela Recorrente correspondem a operações efectivamente reais e não simuladas como defendeu a Autoridade Tributária e Aduaneira, as correcções efectuadas em sede de inspecção tributária, que originaram a liquidação n.º 20088310037507, são manifestamente ilegais,

T. E com esse fundamento, a sentença do Tribunal a quo, que julgou a impugnação improcedente por provada, padece de erro de julgamento, que traduz um erro de raciocínio lógico que conduziu à aplicação de uma decisão contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto e de Direito, porquanto o que resultou da produção de prova, deveria ter resultado necessariamente numa decisão em sentido oposto estando por isso a sentença viciada de nulidade nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC ex vi o art.º 2.º, al. e), pelo que deve ser revogada, substituindo-se por decisão que julgue a impugnação procedente por provada.

Termos em que, requer que o presente recurso seja julgado procedente por provado, revogando-se a sentença do Tribunal a quo e à final, anulando-se a liquidação n.º 20088310037507, referente ao IRC do exercício de 2004, tudo, com as devidas consequências legais.”


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A Recorrida DRFP optou por não apresentar contra-alegações.

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O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) teve vista nos termos do artigo 146.º do CPTA e emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

“III-1- Factualidade provada:

Dos documentos e elementos constantes dos autos, com interesse para a decisão da causa, atentas as soluções plausíveis de direito, julgo provada a seguinte factualidade:

A) A Impugnante desenvolve a atividade de “Construção de Edifícios”, com CAE – 45211 (cfr. pág. 6 do Relatório de Inspeção Tributária –RIT junto com a p.i.);

B) A Impugnante encontra-se enquadrada, em sede de IRC, no regime geral de tributação (cfr. pág. 6 do RIT junto com a p.i.);

C) Em 19/03/2004, a Impugnante apresentou, à Sociedade V..., Lda, orçamento para a obra “Lote com 29 apartamentos e 5 lojas” localizada em Sesimbra (cfr. doc. 5 junto com a p.i.);

D) Em 22/3/2004, o orçamento referido na alínea anterior foi aceite pela Sociedade V..., Lda. (cfr. doc. 5 junto com a p.i.);

E) A Impugnante tinha apenas 4 ou 5 trabalhadores na empreitada de Sesimbra, que executavam trabalho de pedreiro e os restantes trabalhos, eram realizados através de sub-empreitadas (cfr. doc. 5 junto com a p.i. e depoimento das testemunhas);

F) A..., trabalhou na obra de Sesimbra e fazia o transporte de trabalhadores para trabalharem nesse local (cfr. depoimento das testemunhas);

G) Em 30/10/2004, a sociedade A...- Sociedade Construção Civil Unipessoal, Ldª emitiu a factura nº 407, no valor de €18.742,50, em nome da Impugnante, onde consta o seguinte: “Execução de assentamento de cantarias na vossa obra em Sesimbra” (cfr. Anexo 2 ao RIT junto com a p.i.);

H) Em 30/11/2004, a sociedade A...- Sociedade Construção Civil Unipessoal, Ldª emitiu a factura nº 410, no valor de €17.255, em nome da Impugnante, onde consta o seguinte: “Execução de assentamento de alvenaria e reboco na obra em Sesimbra” (cfr. Anexo 2 ao RIT junto com a p.i.);

I) Em 29/12/2004, a sociedade A...- Sociedade Construção Civil Unipessoal, Ldª emitiu a factura nº 411, no valor de €16.065, em nome da Impugnante, onde consta o seguinte: “Execução de rebocos e cantarias” (cfr. Anexo 2 ao RIT junto com a p.i.);

J) Ao abrigo da Ordem de Serviço nº OI200701726 de 28/02/2007, foi realizada acção de inspecção ao sujeito passivo A...– Sociedade de Construção Civil, Unipessoal, Lda, tendo sido concluído que:

(…)



«imagem no original»


(…)

«imagem no original»





K) Do relatório referido na alínea anterior, constam documentos anexos que aqui se dão por integralmente reproduzidos (cfr. anexos ao RIT junto com a contestação);

L) Ao abrigo da Ordem de Serviço nº OI200800333 de 30/01/2008, foi realizada acção de inspecção à Impugnante, tendo por objectivo, proceder às correcções que se mostrarem devidas pela utilização de facturas, indiciadas como falsas e emitidas pelo sujeito passivo A...- Sociedade de Construção Civil Unipessoal, Lda. (cfr. fls. 5 do RIT junto com a p.i.);

M) Em 18/09/2008, foi concluído o Relatório de Inspecção Tributária, que no qual se refere, nomeadamente:

(…)


«imagem no original»




N) O relatório de Inspeção Tributária foi acompanhado por diversos documentos que constam dos anexos ao mesmo e que aqui se dão por integralmente reproduzidos (cfr. Anexos ao RIT junto com a p.i.);

O) Em 27/10/2008, foi emitida a liquidação de IRC nº 20088310037507 referente ao exercício de 2004, no valor de €4.773,50, que inclui juros compensatórios no valor de €557,21 (cfr. doc. 2 e 3 juntos com a p.i.);


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A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:

Não se provou que “A... Unipessoal, Ldª” tenha procedido à prestação dos serviços enunciados nas facturas a que se referem as alíneas respectivas do probatório.

Efectivamente, não foi produzida prova documental ou testemunhal no que respeita às operações materiais corporizadas nas facturas em causa.

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afetar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.


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A motivação da matéria de facto assentou no seguinte:

“Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na documentação junta com a petição inicial em confronto com o processo administrativo e documentos anexos ao RIT, bem como, depoimento das testemunhas.

Do depoimento das testemunhas resultou que o seu depoimento se mostrou imparcial e espontâneo, mas com pouco conhecimento dos factos, não obstante terem participado da obra realizada em Sesimbra.

A testemunha Francisco Costa, confirmou que a Impugnante, na referida obra, fazia tão só o trabalho de pedreiro e que, não obstante existirem trabalhadores da Impugnante na obra, costumava ver de vez em quando o A...que coordenava alguns trabalhadores.

A testemunha Manuel Pereira referiu ser funcionário da impugnante como pedreiro de 2ª, na obra de Sesimbra. Confirmou que a Impugnante tinha 4 ou 5 trabalhadores, e que os restantes trabalhavam ao abrigo de subempreitadas. Referiu também que o A...trabalhava lá na obra e também transportava vários trabalhadores para a mesma.

Quanto aos factos não provados, tal decorre de, apesar dos depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas terem referido a existência da obra em Sesimbra, certo é que não referiram, em concreto, os trabalhos descritos das supra identificadas facturas, nem os lograram referenciar ao alegado prestador dos serviços.

Quando questionadas sobre contratos, pagamentos em relação a A..., não responderam por falta de conhecimento.


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III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRC e respetivos JC, do exercício de 2004.

Importa, desde logo, ter presente que, em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se o Tribunal a quo:

¾ Incorreu na nulidade consignada no artigo 615.º, nº1, alínea c), do CPC, por contradição entre os fundamentos e a decisão.

¾ Valorou erradamente a factualidade vertida no probatório, mormente no atinente à prova testemunhal, importando aferir do cumprimento dos pressupostos contemplados no artigo 640.º do CPC.

¾ Incorreu em erro de julgamento por errada apreciação dos pressupostos de facto e de direito, no respeitante à manutenção das correções dos custos no valor de €43.750,00, concernentes a operações fictícias, competindo, nessa medida, aquilatar:

o Do âmbito e extensão do ónus probatório;

o Da existência de indícios suficientes para legitimar a atuação da AT, e

o Cumprido esse ónus aferir da prova da materialidade das operações.

Vejamos, então.

A Recorrente começa por arguir a nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão.

Sustenta, neste particular, que a decisão recorrida traduz um erro de raciocínio lógico que conduziu à aplicação de uma decisão contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto e de direito, porquanto o que resultou da produção de prova, deveria ter resultado necessariamente numa decisão em sentido oposto estando por isso a sentença viciada de nulidade nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. c) do CPC ex vi o artigo 2.º, al. e), do CPPT.

Vejamos, então.

Preceitua o artigo 125.º, nº1, do CPPT, que constitui causa de nulidade da sentença “[a] oposição dos fundamentos com a decisão.”

Dimanando tal nulidade também do já convocado artigo 615.º, alínea c), do CPC, em obediência ao preceituado no n.º 2 do artigo 608.º do CPC, segundo o qual é nula a sentença quando: “os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”.

De relevar, desde já, que são realidades díspares e não confundíveis a nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão e a mera discordância com a fundamentação jurídica.

A nulidade em análise concatena-se com a necessidade de um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artigo 154.º, nº.1, do CPC.

Com efeito, o vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adotada (1).

No caso sub judice, não vislumbra este Tribunal que a decisão recorrida padeça da nulidade em análise, uma vez que atentando no seu teor conclui-se que a mesma não comporta nenhuma contradição entre os fundamentos e a decisão, na medida em que, tendo decidido pela improcedência da impugnação, e consequente manutenção da liquidação face ao cumprimento do ónus probatório no âmbito dos indícios por parte da AT, e subsequente incumprimento do ónus por parte da Recorrente no atinente à materialidade das operações, a fundamentação jurídica vai no mesmo sentido.

Mais importa relevar que atentando no probatório, nenhuma contradição é passível de materializar a aludida nulidade, na medida em que se encontra plasmado enquanto facto não provado que “não se provou que “A... Unipessoal, Lda” tenha procedido à prestação dos serviços enunciados nas facturas a que se referem as alíneas respectivas do probatório”, o que em nada é contraditório com o consignado nas alíneas E) e F) do probatório, porquanto das mesmas não se retira o oposto do contemplado como não provado.

Pelo que, inexiste qualquer contradição entre a matéria de facto fixada, a fundamentação de direito expendida e o sentido da decisão. Com efeito, cotejando a fundamentação da decisão supra expendida, resulta que o decisor enuncia a factualidade que reputa de relevante, e, depois, convocando o direito que entende aplicável ao caso vertente, decide, de forma totalmente coerente e lógica-ainda que a Impugnante discorde da aludida fundamentação jurídica- que foi cumprido o ónus que impende sobre a AT no atinente aos indícios o mesmo não sucedendo quanto à prova concernente à materialidade das operações, cujo ónus se circunscrevia na esfera jurídica da Recorrente.

Ademais, a nulidade de oposição entre os fundamentos e a decisão não se confunde com o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, ou com a inidoneidade dos fundamentos para conduzir à decisão.

Conclui-se, assim, que a proposição final (conclusão) revela-se compatível com as proposições logicamente antecedentes (fundamentos), inexistindo, assim, vício de raciocínio, donde nulidade.

Prosseguindo.

A Recorrente convoca erro de julgamento porquanto entende que face à prova testemunhal prestada, mormente, dos depoimentos de Manuel Pereira e Francisco Costa, resulta demonstrada a materialidade das operações, não se encontrando, assim, correta a asserção contemplada como não provada.

Ora, se o que está em causa é o erro de julgamento de facto, importa, desde já, convocar o disposto no artigo 640.º do CPC e aferir do cumprimento dos requisitos legais.

Preceitua o aludido normativo que:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida (2).

Sendo que quanto à prova testemunhal tem de existir uma indicação exata das passagens de gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, porquanto além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova.

In casu, conforme se extrai do teor das alegações recursivas e suas conclusões, no atinente à prova testemunhal, dimana que a Recorrente não cumpriu o ónus a que estava adstrita, porquanto ainda que convoque o depoimento das testemunhas inquiridas, a verdade é que não indica, com a devida particularização no competente registo áudio, as passagens concretas desses mesmos depoimentos, nem, tão-pouco, procede à transcrição de excertos reputados de relevantes para efeito das visadas alterações. Ademais, não estabelece qualquer redação do facto a aditar ou a alterar, o que, per se, também inviabilizaria a apreciação de qualquer impugnação da matéria de facto.

De relevar, ainda neste particular, que carece de qualquer relevância o aduzido quanto à dilação temporal da audição de inquirição de testemunhas com o facto tributário visado, desde logo, porque não é demonstrado, nem, tão-pouco, alegado que as testemunhas se tenham escudado nessa realidade em termos de depoimento prestado.

E por assim ser, rejeita-se a aludida impugnação.

Assim, aqui chegados, uma vez estabilizada a matéria de facto, atentemos, então, se o Tribunal a quo incorreu no erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, começando, naturalmente, por densificar o ónus probatório com a competente transposição para o caso vertente, primeiramente em sede de indícios e ulteriormente, e ultrapassada essa prova, a demonstração da materialidade das operações.

Sustenta a Recorrente que a AT não recolheu indícios que legitimam a sua atuação não só porque os indícios são manifestamente omissos no procedimento de inspeção, como não se afiguram suficientes para se concluir que as faturas em causa não titulam serviços reais.

Ademais sustenta que, estando os gastos contraídos devidamente registados na contabilidade, esta goza de presunção de veracidade contemplada no artigo 75.º, nº1, da LGT.

O Tribunal a quo assim o não entendeu tendo ajuizado que os indícios são suficientes na medida em que “[r]esulta do probatório, que a AT concluiu que os serviços prestados pela sociedade A...- Sociedade de Construção Civil Unipessoal, Ldª não correspondem a serviços efectivamente prestados em virtude desta não ter qualquer estrutura, quer em equipamento, quer em pessoal para a realização dos trabalhos e de estar referenciado pelo DSIFAE como emitente de facturas falsas, não tendo sido aceites as deduções de IVA correspondentes às facturas assinaladas.”

Relevando, assim, que “[e]ste quadro factual indiciário suporta a conclusão da Administração Tributária, constante do RIT, de que as facturas se encontravam formalmente regulares, sem, contudo, se verificar a existência material da operação.”

Concluindo, nessa medida, pelo cumprimento do ónus da prova por parte da AT, razão pela qual, competia, à Impugnante, ora, Recorrente “[f]azer a prova de que adquiriu os serviços e que os mesmos lhe foram prestados pelo emitente das facturas.”

Vejamos, então, se a decisão recorrida padece do convocado erro de julgamento quanto ao ónus da prova circunscrito na esfera da AT, e à existência de indícios fundados.

Ora, estando o aludido erro de julgamento intrinsecamente ligado com a concreta enunciação e densificação do ónus probatório, impõe-se começar por aferir como se processa o direito adjetivo fiscal em sede probatória e quais as consequências que dimanam da sua regulamentação.

Em sede de procedimento administrativo tributário incumbe à AT a prova dos factos constitutivos do ato administrativo, ou seja, compete à entidade fiscalizadora aquilatar e indagar sobre a verificação do facto tributável e demais elementos pertinentes à liquidação do imposto, porquanto, o procedimento só pode produzir uma liquidação em sentido estrito quando, face aos elementos apurados, estiver adquirida a plena convicção da existência e conteúdo do facto tributário.

De resto, tal conclusão resulta evidente em face do princípio da verdade material, ínsito nos artigos 50.º, do CPPT e 58.º, n.º 1, da LGT.

Com efeito, o contribuinte goza da presunção de verdade da sua declaração, nos termos consignados no artigo 75.º, n.º 1 da LGT, logo compete à AT o ónus da prova dos pressupostos legais da sua atuação, in casu a demonstração de que os indícios por si recolhidos no decurso da ação inspetiva são sérios e suficientes para concluir pela inexistência ou simulação de uma relação económica que sustente as faturas em apreço.

De sublinhar, neste particular, que não é exigível que a AT efetue uma prova direta da simulação, pelo que cumprindo a mesma aquele ónus e ilidindo, desse modo, a presunção de veracidade da declaração do sujeito passivo passa a competir, por seu turno, a este último o ónus da prova da realidade subjacente à fatura, infirmando os indícios recolhidos pela entidade fiscalizadora.

Com efeito, no âmbito das chamadas “faturas falsas ou operações fictícias” “(…) vem-se entendendo de modo uniforme que, estando em causa a correção de liquidações de IRC por desconsideração dos custos documentados por faturas reputadas de falsas ou “de favor” pela administração tributárias, as regras de repartição do ónus da prova a ter em conta são as seguintes:

- Porque a liquidação de IRC tem por fundamento o não reconhecimento de custos declarados pelo sujeito passivo, compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, tendo o juízo da administração tributária assentado na consideração de que as operações e o valor mencionado na fatura em causa não corresponde à realidade, haverá de demonstrar a existência de indícios sérios de que a operação referida na fatura foi simulada;

- Feita essa prova, compete ao sujeito passivo o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a fazer refletir negativamente os custos declarados na determinação da respetiva matéria tributável nos termos que decorrem do artigo 23º do CIRC, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois neste caso o artigo 100.º do CPPT não tem aplicação; (…).(3)”

No mesmo sentido, apontam os Arestos do STA, proferidos em Plenário no âmbito dos processos com os nºs 01424/05, 587/15 e 0591/15, datados de 27 de fevereiro de 2019, 16 de março de 2016 e 17 de fevereiro de 2016, respetivamente.

Conclui-se, assim, que basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar os custos sindicados, factualidade essa que tem de ser suscetível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte, passando ulteriormente a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito à dedutibilidade dos custos, provando, assim, que as operações se realizaram efetivamente e ocorrem os pressupostos de que depende a sua dedutibilidade fiscal.

Visto o direito que releva para o caso vertente, importa, então, transpor o mesmo para o caso vertente e convocar, neste particular, o vertido no Relatório da AT no atinente aos indícios apurados.

Atentando no aludido Relatório Inspetivo, verifica-se que a fundamentação assentou no seguinte:

Face à informação recolhida pelos Serviços de Inspeção os custos contabilizados pela Recorrente referente aos serviços prestados pelo subempreiteiro “A...Soc. Construção Civil Unipessoal, Lda” não correspondem a serviços efetivamente prestados pelo mesmo, em virtude de:

- O sujeito passivo não ter qualquer estrutura quer em equipamento, quer em pessoal, para a realização dos trabalhos.

- O emitente das faturas é referenciado pelo DSIFAE como emitente de faturas falsas.

Concluindo, assim, que a regularidade formal dos documentos se contrapõe à inexistência material da operação, o que legitima a materialização da correção no valor de €43.750,00.

Ora, atentando nos aludidos indícios entendemos que a decisão recorrida não terá interpretado da melhor forma a realidade fática em discussão e realizado a adequada transposição para o regime jurídico aplicável e isto porque, como defendido pela Recorrente, os aludidos indícios não são de molde a justificar e desconsiderar a efetividade dos serviços contemplados nas faturas emitidas pela sociedade “A...Soc. Construção Civil Unipessoal, Lda”.

Senão vejamos.

Ab initio, importa, desde logo, relevar que os apontados indícios estão, como decorre da enumeração supra expendida, exclusivamente concatenados com fatores exógenos e a montante da Recorrente, o que, per se, fragiliza a factualidade apurada, porquanto na falta de apuramento de elementos concatenados com a própria e que permitam descredibilizar a contabilidade da Recorrente, os mesmos não permitem legitimar a atuação da AT e as correções dimanantes da ação inspetiva.

Com efeito, se atentarmos nos indícios supra expostos constata-se que todos eles advêm de elementos obtidos no âmbito de ação inspetiva à fornecedora da Recorrente e, totalmente coadunados com irregularidades e incumprimentos declarativos na sua esfera e circuito comercial.

De relevar, neste particular, que não se está a dizer que não é possível fazer-se uma extrapolação da faturação falsa mediante recurso ao cruzamento de informações decorrentes e resultantes de outras ações inspetivas, o que, efetivamente, se está a dizer é que fundar a falta de materialização das aquisições constantes nas faturas com base em indícios apenas e só resultantes de condutas exógenas e alheias à Recorrente não é suficiente e razoável para fundamentar a faturação falsa.

Note-se, ademais, que no Relatório de Inspeção Tributária da Recorrente nem, tão-pouco, são descritos, com pormenor, as razões e os indícios que foram apurados na ação inspetiva à fornecedora, existindo, tão-só, um juízo conclusivo atinente à falta de estrutura empresarial e ao facto de estar referenciada como emitente de faturas falsas.

Sem embargo do exposto, -e ainda que as razões tivessem de ser externadas no Relatório em contenda, ou mediante uma remissão expressa com a respetiva integração no processo, o que, não sucede, in casu- sempre se dirá que atentando no aludido Relatório contemplado em J), inexiste qualquer alusão expressa à, ora, Recorrente.

Com efeito, quando é convocada a irregularidade na sequência numérica das faturas não é evidenciada a sindicada nos autos, o mesmo se diga quanto à percentagem (98%) avançada dos custos suportados por dois subcontratos, os quais não traduzem qualquer conexão com a Recorrente, e bem assim quanto aos requisitos do artigo 35.º do CIVA e, in fine, quanto ao termo de declarações prestado o qual não respeita à empresa visada.

Aduza-se, em abono da verdade, que não há no Relatório de Inspeção Tributária da ora Recorrente, nenhum facto objetivo de que possa ser extraída a conclusão de que as declarações da Recorrente não devam ter-se como verdadeiras.

Note-se que, relativamente à Recorrente nada é especificamente contraditado quanto aos trabalhos propriamente ditos, nada sendo sindicado quanto ao seu circuito financeiro, não sendo sequer colocados em causa os seus pagamentos. De resto, do teor do Relatório Inspetivo não resulta, tão-pouco, uma inferência de que tenham sido requeridos quaisquer esclarecimentos ou peticionados elementos referentes à própria Recorrente, nem prestadas declarações para o efeito.

Não podendo, assim, inferir-se a existência de indícios razoáveis pela circunstância da fornecedora não ter estrutura empresarial e estar referenciada como emitente de faturação falsa, porquanto, como visto, inteiramente, coadunados com obrigações constantes na esfera do fornecedor e sem ser colocado o respetivo circuito financeiro da operação.

A adensar, neste e para este efeito, que dos elementos constantes dos autos se retira, inequivocamente, que a contabilidade da Recorrida se encontra organizada, sendo não controvertida tal asserção resultando, inclusive patenteada no respetivo Relatório de Inspeção Tributária.

Acresce que, e no sentido apontado pela Recorrente, tendo os visados custos sido devidamente inscritos na contabilidade, há que apelar ao princípio da verdade declarativa, o qual não é apartado com os aludidos indícios porquanto manifestamente insuficientes. Donde, para legitimar a insusceptibilidade de dedução dos custos contabilizados, a AT teria de ter ido mais longe, não sendo suficiente, como visto, bastar-se em elementos (indícios externos), tendo, necessariamente, de obter alguns indícios junto do contribuinte (indícios internos) que, ainda que conjugado com aqueles outros, conduzam à elevada probabilidade de que as faturas não correspondem a operações efectivas (4).

Como doutrinado no Aresto deste Tribunal, no âmbito do processo n.º 438/12, datado de 8 de maio de 2019:

“A contabilidade do Recorrido não continha erros ou omissões susceptíveis de justificar a cessação de presunção de veracidade e boa-fé resulta manifestamente do Relatório de Inspecção, cuja fundamentação está, toda ela, construída com base no seguinte raciocínio: sendo evidente que a contabilidade dos fornecedores não merece credibilidade porque, para além de terem omitido compras e vendas, não conseguiram identificar os meios de transporte de que se serviram para efectuar os transportes dos bens para o Recorrido e/ou a quem compraram as pinhas e/ou outro tipo de negócios desenvolvidos com aquele, então é porque não compraram a terceiros nem venderam ao Recorrido e, consequentemente, este não comprou efectivamente as mercadorias tal como resulta de forma indiscutível das declarações apresentadas e da sua contabilidade. Não há no Relatório de Inspecção, pese embora a sua extensão e a alusão à actividade e contabilidade dos fornecedores e do Recorrido, nenhum facto objectivo de que possa ser extraída a conclusão de que as suas declarações, sempre irrepreensível e pontualmente apresentadas, não devam ter-se como verdadeiras, atenta a forma, que se presume irrepreensível, da sua contabilidade e escrita, uma vez que nenhuma censura relevante lhe é feita no que respeita à facturação em questão que não a de existência de facturação falsa com base no escrutínio feito aos seus fornecedores e às omissões declarativas daqueles bem como à sua contabilidade. Em síntese, denota-se de forma ostensiva do Relatório de Inspecção que a sua “convicção”, as dúvidas fundadas que a Administração Tributária teve estão quase integralmente relacionadas com a actividade ou o modo como a actividade comercial era desenvolvida pelos emitentes das facturas e com o tipo de relação que esses emitentes estabeleciam com os seus próprios fornecedores, designadamente por a sua contabilidade – leia-se, dos emitentes das facturas – não espelhar com veracidade a actividade ou o volume de facturação que efectivamente desenvolviam e com quem.”

Conclui-se, portanto, que a realidade fática convocada pela AT não é suscetível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte, logo os indícios recolhidos pela AT não permitem suportar, objetivamente e à luz das regras da experiência comum, a conclusão a que chegou e que determinou as correções respeitantes a IRC quanto à sociedade “A...Soc. Construção Civil Unipessoal, Lda”.

Assim, face a todo o supra expendido, assiste razão à Recorrente quando sustenta que não estão reunidos os indícios para legitimar a atuação da AT, sendo manifestamente irrelevante, neste e para este efeito, o facto considerado como não provado, o qual já entronca na materialidade das operações, e cuja apreciação se encontra prejudicada face ao, ora, decidido.

Destarte, procede o recurso da Recorrente, resultando por esta via prejudicada a apreciação do erro de julgamento atinente à materialidade das operações, questões que, como já evidenciado anteriormente, se concatenam com o ónus probatório da Recorrente, donde, dependentes da prévia demonstração da existência de indícios fundados por parte da AT, o que, como visto, não sucedeu no caso vertente.

Pelo que, a AT incorre em ilegalidade implicante da invalidade do ato de liquidação adicional de IRC e respetivos JC, e nessa medida a sentença recorrida que assim o não decidiu não pode manter-se.


***

IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO, revogar a decisão recorrida, e em consequência julgar totalmente procedente a impugnação com todas as legais consequências.

Custas pela Fazenda Pública.

Registe. Notifique.


Lisboa, 15 de setembro de 2022

(Patrícia Manuel Pires)

(Jorge Cortês)

(Luísa Soares)


(1) Vide Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985.
(2) António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª edição, pp 165 e 166; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, CPC anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; Vide, designadamente, Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº 6505/13, de 2 de julho de 2013.
(3) Vide, Acórdão do TCA Norte, proferido no processo nº 01834/04, 24.01.2008; no mesmo sentido Arestos deste Tribunal, prolatados no âmbito dos processos nºs 1002/17, de 10.03.2022 e 937/08, de 07.05.2020.
(4) Vide, designadamente, Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul proferidos nos processos nºs 438/12.0 de 08 de maio de 2019 e 08959/15, de 22 de fevereiro de 2018