Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:925/19.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:01/16/2020
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores:ASILO, INADMISSIBILIDADE DO PEDIDO
Sumário:I - Como o estrangeiro requerente de asilo em Portugal já detém o estatuto de refugiado concedido e não questionado por outro Estado-membro da U.E., o Estado português tinha e tem o dever legal (1º) de concluir pela inadmissibilidade do pedido de asilo e, assim, (2º) de prescindir da análise das condições a preencher pelo interessado para beneficiar em Portugal do estatuto de proteção internacional (artigo 19º-A, nº 1, al. b), e nº 2, da Lei do Asilo).

II – Em tal situação cabe apenas proceder à transferência do cidadão estrangeiro, já detentor do estatuto de refugiado, para o país que lhe concedeu tal estatuto.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

H……, cidadão da Somália, veio propor, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA, ação administrativa em matéria de asilo nos termos do artigo 25.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de junho, na qual formula o seguinte pedido:

“(...) deferimento do pedido de asilo com a prolação de uma nova decisão por parte do SEF e a concessão da proteção internacional ao requerente.”

Por despacho liminar, o tribunal a quo decidiu indeferir liminarmente a p.i.

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Inconformado, o autor interpôs o presente recurso de apelação contra aquela decisão, formulando na sua alegação o seguinte quadro conclusivo:

1- O despacho liminar deve ser revogado, dando lugar a um deferimento do pedido formulado na p.i. pelo Autor (pedido de proteção internacional e de asilo).

2- O processo deverá ser remetido para o SEF e deverá ser reapreciado com base na omissão de critérios de avaliação da proteção internacional requerida – ponto 4 da INFORMAÇÃO Nº 082…/GAR/2019.

3- A douta sentença deverá ser revogada na totalidade no que ao indeferimento se refere.

4- A não ser assim, cumpre investigar os motivos que levaram o Autor a requerer o pedido de proteção no Estado Português.

5- Foram, assim, violados os artigos 15.º (Deveres dos requerentes de proteção internacional) e 18.º(1), e 28.º-1(2) da Lei 27/2008, assim como foi desrespeitado o disposto relativo à audiência dos motivos que conduziram este cidadão a requerer o apoio e proteção ao território nacional.

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Cumpridos que estão os demais trâmites processuais, incluindo a pronúncia do M.P. junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, vem o recurso à conferência para o seu julgamento.

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Delimitação do objeto da apelação - questões a decidir:

Os recursos, sendo dirigidos contra a decisão do tribunal a quo, têm o seu âmbito objetivo delimitado pelo recorrente nas conclusões da sua alegação de recurso. Esta alegação apenas pode incidir sobre as questões de facto e ou de Direito que tenham sido apreciadas pelo tribunal recorrido ou que devessem ser aí oficiosamente conhecidas.

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II – FUNDAMENTAÇÃO

II.1 – FACTOS PROVADOS

O tribunal a quo fixou o seguinte quadro factual:

A)A 10 de Maio de 2019, pela Diretora Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras foi proferida decisão, no âmbito do pedido de proteção internacional formulado por H....... e que tramitou com o n.º…………., considerando infundado o pedido formulado, de acordo com o disposto na alínea b) do n.º 1 do Artigo 19.º-A (3) e no n.º 2 do Artigo 37.º(4), ambos da Lei n.º 27/08, de 30 de Junho e com base na informação n.º 082…/GAR/2019 – cfr. fls. 1 e seguintes do SITAF junto aos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

B)Daquela informação consta o seguinte:

“I. FUNDAMENTOS DE FACTO

1.O requerente apresentou pedido de proteção internacional a 02/04/2019 no Gabinete de Asilo e Refugiados, que foi registado sob o número de processo 51.../19.

2.Nos termos previstos no Regulamento (EU) nº 603/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de junho (Regulamento Eurodac), relativo à criação do sistema "Eurodac" foram recolhidas as impressões digitais de todos os dedos.

3.Após registo e consulta à base de dados Eurodac, foram rececionados vários acertos com os "Cases ID's DE115……, inserido pela ALEMANHA; DK115……, inserido pela DINAMARCA; SE10051…./…, inserido pela SUÉCIA; IT1VA0……, inserido pela ITÁLIA; chl90925….., inserido pela Suíça.

4.Aos 17/04/2019 foram tomadas as declarações do requerente, mediante realização de entrevista e relatório (cf. pags. 19 a 26 anexo aos autos e entregue na mesma data ao requerente), a que se refere o n 6 do artigo 5º do Regulamento Dublin. Por esta via, foi possível confirmar a situação descrita no número anterior, essencial para a determinação do Estado responsável, bem como, apurar outras situações pertinentes para a correta aplicação dos critérios enunciados no Regulamento Dublin.

5.Aos 29-04-2019, o GAR apresentou um pedido de retoma a cargo às autoridades italianas ao abrigo do artigo 18, N 1 b), do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de junho (Regulamento Dublin)(5)

6.Aos 09-05-2019, as autoridades italianas recusaram o pedido de retoma a cargo do (a) cidadão (ã), por este ser beneficiário de estatuto de refugiado naquele Estado-Membro, tendo título válido até 12/09/2023.

7.Após a recusa da Itália e na impossibilidade da aplicação do Regulamento (EU) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 junho, deve o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras proferir uma decisão de inadmissibilidade do pedido.

II. FUNDAMENTOS DE DIREITO

8.A Ler n.º 27/08, de 30 de junho, alterada pela Lei n 26/2014 de 05 de maio, que estabelece as condições e procedimentos para a análise dos pedidos de proteção internacional e concessão do estatuto de refugiado ou proteção subsidiária, prevê na alínea b), do n. 1 do artigo 192-A que o pedido é considerado inadmissível quando se verifique que beneficia do estatuto de proteção internacional noutro Estado-Membro.

Ainda nos termos do n. 2 do artigo 19-A, nos casos previstos no número anterior deste artigo, prescinde-se da análise das condições a preencher para beneficiar do estatuto de proteção internacional.

Assim deverá proceder-se à notificação do requerente nos termos do n.º 3 do artigo 20 da Lei n 27/08, de 30 de junho, alterada pela Lei nº 26/2014 de 05 de maio.”

- cfr. fls. do SITAF, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

C)A 23 de Maio de 2019, deu entrada neste Tribunal petição inicial que deu origem aos presentes autos – cfr. fls. 1 do SITAF, cujo por aqui se dá por integralmente reproduzido

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II.2 – APRECIAÇÃO DO RECURSO

Tendo presente o exposto, passemos agora à análise dos fundamentos do presente recurso.

Da alegada violação dos artigos 15º (deveres dos requerentes de proteção internacional(6)), 18º(7) e 28º/1 da Lei do Asilo e da alegada violação do dever de ouvir o requerente sobre o seu pedido

1. INTRODUÇÃO

As bases jurídico-constitucionais da política comum de asilo concentram-se no artigo 78.º do TFUE. Este artigo integra-se no capítulo 2 (“Políticas relativas aos controlos nas fronteiras, ao asilo e à imigração”) do Título V da Parte III, dedicado ao espaço de liberdade segurança e justiça. Trata-se, como é sabido, de uma atribuição fundamental da UE que o artigo 3.º, n.º 2, do TUE formula nos seguintes termos: “proporciona[r] aos seus cidadãos um espaço de liberdade, segurança e justiça sem fronteiras internas, em que seja assegurada a livre circulação de pessoas, em conjugação com medidas adequadas em matéria de controlos na fronteira externa, de asilo e imigração, bem como de prevenção da criminalidade e combate a este fenómeno”. No elenco das atribuições da UE estabelecido pelo artigo 3.º do TUE, o espaço de liberdade, segurança e justiça precede e enquadra o mercado interno desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa.

O artigo 67.º, n.º 2, do TFUE, incluído no capítulo 1 (“Disposições gerais”) do Título V, vincula a “política comum em matéria de asilo, de imigração e de controlo das fronteiras externas” à “solidariedade entre os Estados-Membros” e a ser “equitativa em relação aos nacionais de países terceiros” (aos quais, para o efeito, são equiparados os apátridas). Em concretização deste preceito, o artigo 80.º especifica que tal política se rege pelo princípio da solidariedade e da partilha equitativa de responsabilidades entre os Estados-Membros, inclusive no plano financeiro, e que, sendo necessário, os atos adotados pela UE em execução de tal política “conterão medidas adequadas para a aplicação desse princípio”.

Nos termos do artigo 78.º, n.º 2, do TFUE a política comum em análise estrutura-se numa série de atos a adotar de acordo com o processo legislativo ordinário e também em atos de direito internacional convencional, cujo conjunto forma o chamado SECA (sistema europeu comum de asilo: quatro diretivas e dois regulamentos).

A Carta dos Direitos Fundamentais garante o direito de asilo no artigo 18.º, remetendo quer para a Convenção de Genebra - a pedra angular do regime jurídico internacional relativo à proteção dos refugiados - e o Protocolo de Nova Iorque, relativos ao estatuto dos refugiados, quer para o TUE e o TFUE. Ora, nos termos do artigo 52.º, n.º 2, da Carta, os direitos por ela reconhecidos, “que se regem por disposições constantes dos Tratados, são exercidos de acordo com as condições e limites por eles definidos”.

Revestem-se de grande importância enquanto parâmetros de validade dos vários tipos de atos de execução da política comum de asilo, de fonte europeia e de fonte nacional, os artigos 4.º (“Proibição da tortura e dos tratos ou penas desumanos ou degradantes”), 19.º (“Protecção em caso de afastamento, expulsão ou extradição”) e 47.º (“Direito à ação e a um tribunal imparcial”) da Carta.

Uma vez que os mencionados artigos correspondem a direitos também garantidos pela CEDH, os “sentido e âmbito” de tais direitos, por força do artigo 52.º, n.º 3, primeira parte, da Carta, “são iguais aos conferidos por essa Convenção”, tal como interpretada pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

Por força do artigo 78.º, n.º 1, in fine, do TFUE, a política comum em matéria de asilo “deve estar em conformidade com a Convenção de Genebra, de 28 de Julho de 1951, e o Protocolo, de 31 de Março de 1967, relativos ao Estatuto dos Refugiados”.

Para os “direitos e vantagens concedidos aos refugiados”, que a Convenção contempla a título não exaustivo (artigo 5.º), prevêem-se, portanto, duas modalidades de tratamento dos refugiados, as quais levam em conta a natureza e o modo de exercício desses direitos e vantagens: (i) o mesmo tratamento que os Estados Contratantes concedem aos estrangeiros em geral; é esse o princípio estabelecido pelo artigo 7.º, n.º 1; (ii) o mesmo tratamento que os Estados Contratantes concedem aos seus próprios nacionais, nas hipóteses expressamente previstas pela Convenção.

Por outro lado, o artigo 47.º da Carta garante a todas as pessoas cujos direitos, liberdades e garantias resultantes do direito da União (e designadamente o direito de asilo) sejam violados, o “direito a um recurso jurisdicional efectivo”.

A prerrogativa de expulsão do refugiado prevista nos termos do artigo 32.º está, por sua vez, limitada pelo disposto no artigo 33.º, que consagra o princípio fundamental da não repulsão. Fá-lo nos seguintes termos: “Nenhum dos Estados Contratantes expulsará ou repelirá um refugiado, seja de que maneira for, para as fronteiras dos territórios onde a sua vida ou a sua liberdade sejam ameaçadas em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou opiniões políticas”. A expressão “seja de que maneira for” obriga a considerar abrangidos pelo princípio da não repulsão, quer os refugiados que se encontrem no interior do território dos Estados Contratantes, quer aqueles que se encontrem simplesmente nas respectivas fronteiras, não reunindo as condições exigidas para poder atravessá-las legalmente.

Para ativar a proteção da Convenção de Genebra e impedir uma expulsão, importa que o refugiado seja alvo de perseguição por um dos cinco motivos elencados em que se baseia a definição de refugiado.

Quando aplicamos o artigo 3.º da CEDH para impedir uma transferência, as razões para o tratamento desumano ou degradante são “imateriais”, sendo bastante a existência de um risco real de exposição a este tratamento, independentemente da sua causa ou origem. A ausência de uma intenção de lesar, humilhar ou depreciar a vítima não pode por si só excluir uma violação do artigo 3.º. Esta é uma interpretação conforme com a Diretiva Qualificação que, além do estatuto de refugiado aplicável a pessoas que arrisquem perseguição, concede proteção subsidiária nomeadamente aos que se encontrem em risco de “pena ou tratamento desumano ou degradante do requerente no seu país de origem” (artigo 15.º). Para integrar o âmbito de proteção desta norma, o tratamento deve atingir um grau mínimo de severidade, cuja definição tem sido reiteradamente considerada relativa e depende de variados fatores relacionados com a duração da sujeição a esse tratamento, os efeitos mentais e físicos induzidos e elementos relacionados com o perfil ou circunstâncias de especial vulnerabilidade da vítima.

Tendo em atenção estes fatores, o decisor deverá analisar se a transferência para determinado país de uma pessoa com determinado perfil poderá levar à sua sujeição a um tratamento inadmissível à luz da Carta e da Convenção. Para o tratamento ser “desumano” deverá envolver um prolongado sofrimento físico ou mental, sendo considerado “degradante” se provocar na vítima um sentimento humilhante de medo, angústia ou inferioridade. Ao aferir a possibilidade de humilhação deve o decisor atender à perspetiva da própria vítima, não sendo necessário que a comunidade veja o tratamento como humilhante.

Por outro lado, as garantias de que a transferência não colocará o requerente em risco de sujeição a estes tratamentos deve estender-se a todo o período de duração da análise do pedido de asilo de modo a prevenir o refoulement do requerente, igualmente contrário ao artigo 3.º.

2. APRECIAÇÃO

A exposição antecedente serve apenas para ilustrar a mais complexa e exigente realidade jurídica europeia a propósito dos requerentes de proteção internacional, que não das pessoas já detentoras do estatuto legal de refugiado num Estado-membro.

Porém, é esta última a situação do aqui autor e recorrente. Mais simples.

Em causa nos presentes autos está a decisão da Diretora Nacional dos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras, de 10 de Maio de 2019, que considerou o pedido de proteção internacional do Autor inadmissível, uma vez que se verificou que o Autor beneficia do estatuto de proteção internacional noutro Estado-Membro.

O tribunal recorrido considerou, em síntese e invocando os artigos 110º/1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e 590º/1 do Código de Processo Civil, o seguinte:

-a p.i. não ataca com qualquer fundamento a decisão do SEF;

-a decisão do SEF está correta, porque se verificam os pressupostos previstos no artigo 19º-A/1-b)/2 da Lei do Asilo, cit., artigo inserido nas disposições comuns sobre o procedimento administrativo relativo a proteção internacional.

Ora, tendo metodologicamente presente o artigo 9º do Código Civil, bem como a nossa Constituição e a metodologia jurídica dos direitos fundamentais, aquilo que resulta da factualidade provada é que o autor, quando iniciou o procedimento administrativo aqui em causa, já tinha, como ainda tem (até set.-2023), o estatuto de refugiado concedido e não questionado por outro Estado-membro da U.E.; do que resulta, por imposição do transcrito artigo 19º-A/1-b)/2 da Lei do Asilo, que o Estado português tinha e tem o dever legal (1º) de concluir pela inadmissibilidade do pedido e, assim, (2º) de prescindir da análise das condições a preencher pelo interessado para beneficiar em Portugal do estatuto de proteção internacional.

Note-se que a cit. atitude deste outro Estado-membro, de recusa de retoma a cargo, é de entender juridicamente, como decorre da legislação europeia (Regulamento (UE) n.° 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013) e nacional. Ou seja, que tal Estado, afirmando simultaneamente que já concedera ao autor o estatuto de refugiado, que ainda persiste até 2023, não irá atuar como se prevê em tal legislação a propósito do procedimento administrativo de retoma a cargo, pela óbvia razão de que o ora autor e recorrente já tem ali proteção internacional através do estatuto legal de refugiado num dos Estados-membros da U.E.

Não se tratou, portanto, de recusar a transferência do refugiado, ora autor.

A retoma a cargo é bem diferente do procedimento legal de mera transferência do estrangeiro para o país da U.E. aonde o autor já é legalmente um refugiado.

Tudo isto significa, aqui, que Itália, um Estado democrático de Direito, não negou a transferência do ora autor, mas sim que tal Estado-membro afirmou que o autor é já legítimo refugiado no seu país, motivo pelo qual, obviamente, não terá de analisar -de novo - um pedido de proteção internacional do autor.

Assim, haverá lugar apenas à transferência do autor de Portugal para Itália, Estado-membro este onde o autor é já legalmente um refugiado, tudo dentro da letra e do espírito do Regulamento europeu cit.

Finalmente, cabe sublinhar que em Itália, um Estado democrático de Direito da U.E., há proteção internacional efetiva nos termos da Convenção de Genebra e da CEDH, onde, comprovadamente, o autor, como refugiado que já é, não será objeto de ameaças à sua vida e liberdade. E onde é respeitado o princípio de não repulsão, bem como o direito de não ser objeto de tortura ou tratamento cruel, desumano ou degradante (vd. assim, por ex., o Acórdão do TEDH Mohammed Hussein e Outros contra Países Baixos e Itália, de 2 de abril de 2013, Queixa n.º 27725/10, parágrafo 78; o Acórdão do TEDH Tarakhel c. Suíça, parágrafo 114; e ainda o Acórdão do TEDH A.S. c. Suíça, de 30 de junho de 2015, Queixa n.º39350/13).

Portanto, devemos concluir que o Estado português, ao aqui decidir como decidiu, não violou nenhuma das normas legais e dos princípios jurídicos indicados nas conclusões do recurso.

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III - DECISÃO

Nestes termos e ao abrigo do artigo 202.º da Constituição e do artigo 1.º, nº 1, do EMJ (ex vi artigo 57.º do ETAF), os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul acordam em negar provimento ao recurso.

Sem custas.

Lisboa, 16-01-2020


Paulo H. Pereira Gouveia - Relator

Catarina Jarmela

Paula de Ferreirinha Loureiro


[1] - Na apreciação de cada pedido de proteção internacional, compete ao SEF analisar todos os elementos pertinentes, designadamente as declarações do requerente, proferidas nos termos dos artigos anteriores, e toda a informação disponível.

[2] - Na apreciação do pedido, o SEF tem em conta especialmente:

a) Os factos pertinentes respeitantes ao país de origem, obtidos junto de fontes como o Gabinete Europeu de Apoio em matéria de Asilo, o ACNUR e organizações de direitos humanos relevantes, à data da decisão sobre o pedido, incluindo a respetiva legislação e regulamentação e as garantias da sua aplicação;

b) A situação e circunstâncias pessoais do requerente, por forma a apreciar, com base nessa situação pessoal, se este sofreu ou pode sofrer perseguição ou ofensa grave;

c) Se as atividades do requerente, desde que deixou o seu país de origem, tinham por fim único ou principal criar as condições necessárias para requerer proteção internacional, por forma a apreciar se essas atividades o podem expor a perseguição ou ofensa grave, em caso de regresso àquele país;

d) Se é razoável prever que o requerente se pode valer da proteção de outro país do qual possa reivindicar a cidadania;

e) A possibilidade de proteção interna se, numa parte do país de origem, o requerente:

i) Não tiver receio fundado de ser perseguido ou não se encontrar perante um risco real de ofensa grave; ou

ii) Tiver acesso a proteção contra a perseguição ou ofensa grave, tal como definida no artigo 5.º e no n.º 2 do artigo 7.º, puder viajar e ser admitido de forma regular e com segurança nessa parte do país e tiver expectativas razoáveis de nela poder instalar-se.

[3] - Constitui um indício sério do receio fundado de ser perseguido ou do risco de sofrer ofensa grave, o facto de o requerente já ter sido perseguido ou diretamente ameaçado de perseguição ou ter sofrido ou sido diretamente ameaçado de ofensa grave, exceto se existirem motivos fundados para considerar que os fundamentos dessa perseguição ou ofensa grave cessaram e não se repetirão.

[4] - As declarações do requerente devem ser confirmadas mediante prova documental ou outros meios de prova admitidos em direito, a não ser que estejam reunidas cumulativamente as seguintes condições:

a) O requerente tenha feito um esforço autêntico para fundamentar o seu pedido;

b) O requerente apresente todos os elementos ao seu dispor e explicação satisfatória para a eventual falta de outros considerados pertinentes;

c) As declarações prestadas pelo requerente forem consideradas coerentes, plausíveis, e não contraditórias face às informações disponíveis;

d) O pedido tiver sido apresentado com a maior brevidade possível, a menos que o requerente apresente justificação suficiente para que tal não tenha acontecido;

e) Tenha sido apurada a credibilidade geral do requerente.

O SEF procede às diligências requeridas e averigua todos os factos cujo conhecimento seja conveniente para uma justa e rápida decisão, competindo-lhe a instrução dos procedimentos de proteção internacional.

1 - O pedido é considerado inadmissível, quando se verifique que:

a) Está sujeito ao procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional, previsto no capítulo IV;

b) Beneficia do estatuto de proteção internacional noutro Estado membro;

c) Um país que não um Estado membro é considerado primeiro país de asilo;

d) Um país que não um Estado membro é considerado país terceiro seguro;

e) Foi apresentado um pedido subsequente em que não surgiram nem foram apresentados novos elementos ou dados relacionados com a análise do cumprimento das condições para beneficiar de proteção internacional;

f) Foi apresentado um pedido por uma pessoa a cargo do requerente, depois de ter consentido que um anterior pedido fosse apresentado em seu nome e não existam elementos que justifiquem um pedido separado.

2 - Nos casos previstos no número anterior, prescinde-se da análise das condições a preencher para beneficiar do estatuto de proteção internacional.

Aceite a responsabilidade pelo Estado requerido, o diretor nacional do SEF profere, no prazo de cinco dias, decisão nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 19.º-A e do artigo 20.º, que é notificada ao requerente, numa língua que compreenda ou seja razoável presumir que compreenda, e é comunicada ao representante do ACNUR e ao CPR enquanto organização não governamental que atue em seu nome, mediante pedido apresentado, acompanhado do consentimento do requerente.

[5] O Estado-Membro responsável por força do presente regulamento é obrigado a retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o, o requerente cujo pedido esteja a ser analisado e que tenha apresentado um pedido noutro Estado-Membro, ou que se encontre no território de outro Estado-Membro sem possuir um título de residência.

[6] Inserido nas disposições comuns sobre o procedimento administrativo relativo a proteção internacional.

[7] Idem.