Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 648/09.8BEALM |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 05/13/2021 |
Relator: | VITAL LOPES |
Descritores: | “PRÉMIOS TIR”; AJUDAS DE CUSTO; FUNDAMENTAÇÃO; ÓNUS DE PROVA; PRESUNÇÃO; ILISÃO DA PRESUNÇÃO. |
Sumário: | 1. É à entidade patronal que cabe o ónus (cf. artigos 342º, do C. Civil, 100, n° 1 do CPPT e 74º, nº 1 da LGT) de provar que os montantes por si pagos a título de Prémios ou ajudas de custo TIR revestem a natureza de ajuda de custo, não consubstanciando rendimentos que proporcionam ao trabalhador um acréscimo de capacidade contributiva e, como tal, susceptíveis de tributação pois que nos termos do nº 3 do art.º 249º do Código do Trabalho, existe uma presunção de que toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador constitui retribuição, pelo que, nos termos dos artigos 344º e 350º do Código Civil beneficia a Administração Fiscal de uma presunção a seu favor o que determina que não tenha de fazer prova do facto que invoca, sendo, contudo, elidível esta presunção pela entidade patronal pagadora daqueles “prémios TIR”. 2. Nessa tarefa, cabia à entidade patronal (impugnante e recorrente) provar que as quantias abonadas sob aquela designação constituíam ajudas de custas, pela demonstração de que correspondiam a despesas suportadas pelos beneficiários ao serviço e em favor da entidade patronal e que a esta competia reembolsar, não constituindo, assim, um elemento integrante da respectiva remuneração. 3. Não lhe bastava, pois, alegar, como se limitou a fazer, que os referidos prémios constituíam ajudas de custo, até porque a utilização dessa designação não assegura que as importâncias abonadas a título de "ajudas de custo" não integrem o conceito de retribuição para efeitos contributivos. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO D………., LDA., recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada na parte em que julgou improcedente a impugnação judicial e, em consequência, manteve a decisão da Segurança Social de proceder à declaração oficiosa de remunerações relativa ao período de Julho de 2005 a Agosto de 2008 A Recorrente termina as alegações de recurso, formulando as seguintes e doutas conclusões: « I. Vem o presente recurso interposto da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datada de 21.06.2019 na parte em que julgou a presente acção parcialmente improcedente, por não provada e, em consequência, manteve a decisão de proceder à declaração oficiosa de remunerações, relativas ao período de Julho de 2005 a Agosto de 2008. II. A presente acção foi intentada contra o Instituto da Segurança Social, IP (ISS), com vista à anulação do despacho proferido, em 12 de Fevereiro de 2009, pela Exma. Senhora Chefe de Sector de Setúbal do Instituto de Segurança Social, IP, nos termos do qual decidiu, após uma acção inspectiva, proceder ao registo oficioso das Declarações de Remunerações, relativas ao período de Outubro de 2003 a Outubro de 2008, no montante de € 52.141,76. III. A douta sentença recorrida julgou “a presente impugnação judicial parcialmente procedente, com o consequente reconhecimento e manutenção do acto que determinou a anulação da liquidação de contribuições a A...... - de 2003/10 a 2003/12 e de 2004/01 a 2004/02 e de 2004/04 a 2004/06; A...... - de 2003/12 a 2004/06 e de 2005/01 a 2005/07; P...... de 2003/12 a 2004/06 e de 2005/01 a 2005/07; A...... - de 2003/12 a 2004/06 e de 2005/01 a 2005/07 e A...... - de 2004/05 a 2004/06 e de 2005/01 a 2005/07 e improcedente quanto ao restante”. IV. Refere o Tribunal “a quo” que a “questão decidenda consiste em aferir a legalidade da decisão de correcção das contribuições para a Segurança Social relativas ao período Outubro de 2003 a Agosto de 2008, no valor de EUR 52.141,76, realizadas pelo Instituto da Segurança Social, I.P. (ISS, I.P.), designadamente a de saber se as importâncias pagas pela Impugnante, a título de “Prémio TIR” são, ou não, remunerações de trabalho dependente. V. Relativamente à alegada falta de fundamentação do acto impugnado, a douta sentença recorrida sufragou o entendimento de que “Do despacho notificado à impugnante, consta a referida fundamentação por expressa concordância e remissão para o relatório apresentado e deste constam as razões de facto e de direito que levaram ao ISS, I.P. a decidir o registo oficioso das declarações de remunerações para efeitos de apuramento das contribuições em falta. Resulta claro que as declarações oficiosas assentam no facto de que a Impugnante nas declarações anteriores por si efectuadas, não ter incluído as atribuições pecuniárias relativas à “Clausula 74.ª CCTV “ e os “subsídios de serviços internacionais”, bem como constam os fundamentos de direito que levam a entidade impugnada a considerar que estão sujeitos à incidência contributiva”. VI. Ao contrário do pressuposto na douta sentença recorrida, no presente recurso não estamos apenas perante uma mera discordância com a fundamentação vertida no acto impugnado, trata-se sim de sindicar se o Impugnado, ora Recorrido, cumpriu as exigências legais de fundamentação. VII. Por imposição constitucional exige-se que a fundamentação da decisão administrativa torne acessível, ao detentor do direito ou do interesse legalmente protegido afectado, os raciocínios inerentes à valoração por que se chegou a determinada conclusão. VIII. Daquilo que se trata é de assegurar a fiscalização do cumprimento dos respetivos limites legais e das respetivas autovinculações lícitas, o que não seria possível contra motivos falsos, errados, irrelevantes, contraditórios, deficientes, desviados, incongruentes ou ilegítimos, assim se violando ou defraudando a CRP. IX. A falta de fundamentação do acto impugnado não pode ser afastada pela mera consideração as formalidades pressupostas no acto impugnado foram cumpridas uma vez que a Recorrente exerceu o direito de audiência prévia. X. Ao pronunciar-se em sede de audiência prévia a Recorrente mais não vez do que exercer um direito legalmente facultado, possibilitando o Recorrido de ainda em fase procedimental alterar o sentido de decisão. XI. Contudo, o exercício desse direito não desonera o Recorrido de dar cabal cumprimento às exigências de fundamentação, o que não veio a suceder. XII. Ademais, os elementos transmitidos à Recorrente não lhe permitiam aferir quais as remunerações (por referência a determinados trabalhadores e períodos de tempo) que estariam em causa, o que viola de uma forma crassa o dever de fundamentação. XIII. Por conseguinte, o acto impugnado padece de uma ostensiva falta de fundamentação de facto e de direito, ou, pelo menos, esta é obscura, contraditória, insuficiente e incongruente. XIV. Rejeita-se em absoluto a argumentação vertida no despacho impugnado ao referir que “Para além de que estando o contribuinte representado no processo por Ilustre Advogado, conforme procuração junta nem sequer se põe a hipótese de falta de percepção do mesmo, não só porque ultrapassa o conceito de “destinatário normal”, mas também porque reagiu eficazmente pelas vias legais contra a “lesividade” do acto”. XV. Não pode a Administração pressupor que o destinatário de qualquer acto entende o seu conteúdo pelo facto de estar representado por um mandatário, exigência essa que, aliás, nem sequer decorre da Lei. XVI. Isto é, a Recorrente poderia a qualquer momento revogar o mandato conferido, mas caso o fizesse não poderia ser colocado numa situação desvantajosa o que é dizer, para este fim, que teria de estar na posse de todos os elementos de facto e de direito que lhe permitissem reagir de forma autónoma. XVII. Atenta a natureza do acto impugnado - lesivo da situação patrimonial da Recorrente - impõem-se exigências acrescidas de fundamentação. XVIII. Sucede que, não obstante as acrescidas exigências de fundamentação, não resulta do despacho impugnado o tipo de decisão se tratava, os meios de reacção à decisão contida no acto, designadamente prazos e formas de reacção, o que é absolutamente contrário às boas práticas administrativas. XIX. Com o teor do acto impugnado, o Recorrido não enunciou de forma clara, precisa e completa os factos, a fundamentação do acto e o sentido e o objecto da decisão, como exige o artigo 151.º, n.º 2 do CPA. XX. Ademais, no despacho impugnado não se invocou, nem se demonstrou a aplicação in casu de qualquer norma jurídica que pudesse fundamentar a decisão de apurar e registar oficiosamente os valores do prémio TIR como remunerações. XXI. Nem se demonstrou a aplicação in casu de qualquer norma jurídica que pudesse fundamentar a decisão de liquidar oficiosamente as contribuições alegadamente devidas, nem foram minimamente invocados quaisquer factos susceptíveis de fundamentar o referido procedimento. XXII. A concreta e contextual fundamentação da decisão notificada à Recorrente não responde às exigências contidas na lei, isto é, não são suficientes, e clara e facilmente apreensíveis, as razões que levaram a Administração a concluir que as “ajudas de custo TIR” pagas pela Recorrente aos seus motoristas revistam carácter de remunerações e, consequentemente, sejam passíveis dos inerentes descontos. XXIII. A fundamentação vertida no despacho impugnado, dada a sua natureza vaga, abstracta e conclusiva, não é suficiente para dar a conhecer, de forma clara e satisfatória, as concretas razões factuais que motivaram a Administração a qualificar as verbas abonadas a título de “ajudas de custo TIR” ou “prémio TIR” com o carácter de remunerações. XXIV. É por demais evidente que o acto impugnado enferma assim de manifesta falta de fundamentação de facto e de direito, pelo que foram frontalmente violados o artigo 268.º, n.º 3 da CRP e os artigos 152.º e 153.º do CPA, sendo o mesmo, por conseguinte, anulável, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 163.º do CPA. XXV. A questão em apreciação no presente recurso é a de saber se as quantias pagas pela Recorrente, a título de “Prémio TIR” são, ou não, remunerações de trabalho dependente, sujeitas a incidência das contribuições para a segurança social. XXVI. Entendeu o Tribunal “a quo” que “É à Impugnante que cabe o ónus (cf. Arts. 342.º, do C.Civil, artigo 100, n.º 1 do CPPT e 74º, n.º 1 da LGT) de provar que os montantes por si pagos a título de Prémios ou ajudas de custo TIR revestem a natureza de ajudas de custo, não consubstanciando rendimentos que proporcionam um acréscimo de capacidade contributiva e, como tal, susceptíveis de tributação, pois que como acima transcrito o n.º 3 do art.º 249.º do Código do Trabalho, contém uma presunção de que toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador constitui retribuição, pelo que, nos termos dos artigos 344º e 350º do Código Civil, o ISSP, I.P. tem uma presunção a seu favor o que determina que, não tem de fazer prova do facto que invoca”. XXVII. Ressalvado o devido respeito, entende a Recorrente que a douta sentença padece de erro de julgamento no que toca à interpretação e aplicação das correspondentes normas jurídicas ao caso. XXVIII. As ajudas de custo, cuja qualificação jurídica, se discute não constituem um efectivo rendimento dos trabalhadores, na medida em que as mesmas se limitam a reembolsar os trabalhadores das despesas que tiveram de suportar no âmbito da prestação laboral, inexistindo qualquer correspondência entre o seu recebimento e a prestação do trabalho. XXIX. Não obstante resultar dos factos provados que o objecto social da Recorrente compreende o “Transporte nacional e internacional, público ocasional de mercadorias”, o Tribunal “a quo” considerou que a Recorrente “não apresentou prova documental ou depoimento testemunhal, da realização e do número médio de deslocações internacionais realizadas pelos seus trabalhadores, dos destinos internacionais das mesmas, bem como um enquadramento geral sobre o valor médio das despesas efectuadas pelos seus trabalhadores, não cumprindo o ónus probatório que lhe competia nos termos do artigo 344.º e 360 do Código Civil, de modo a ilidir a presunção estabelecida no n.º 3 do artigo 249.º do CT”. XXX. Sucede que o entendimento correcto das normas jurídicas aplicáveis leva-nos à consideração de que era ao Recorrido que se impunha demonstrar que as importâncias em questão no presente recurso e que por si foram corrigidas correspondiam a complementos remuneratórios e não a ajudas de custo. XXXI. Não obstante, o Recorrido não demonstrou que as importâncias que corrigiu são complementos de remuneração e não ajudas de custo pagas aos trabalhadores, considerando, desde logo, ao escopo social da Recorrente, de transportes internacionais, a qual, pela sua própria natureza, pressupõe a necessidade de deslocações dos seus trabalhadores fora do país, que não prestam o seu trabalho em instalações fixas como sucede em empresas que actuam em outros sectores de actividade. XXXII. Com efeito, o que determina o pagamento dos valores em questão é o facto do trabalhador, para o exercício da sua actividade profissional e por força das mesmas, ver-se confrontado com a necessidade de deslocar-se, no interesse da entidade patronal, a outro país diferente daquele em que está sediado. XXXIII. O entendimento perfilhado pelos nossos tribunais vai no sentido de considerar que as ajudas de custo TIR não têm natureza retributiva, antes sendo verdadeiras e próprias ajudas de custo, ressaltando ainda da jurisprudência relevante que, em caso de dúvida, caberá à Administração o ónus de provar o carácter retributivo das mencionadas ajudas de custo. XXXIV. É sobre o Recorrido que recai o ónus de demonstrar que as quantias devidamente declaradas como ajudas de custo constituem retribuição uma vez que o pagamento de quantias mensais fixas a título de ajudas de custo de trabalhador deslocado no estrangeiro não constitui, em si mesmo, indicador de que essas quantias não constituem ajudas de custo. XXXV. Não obstante a douta sentença recorrida considerar que a Recorrente não cumpre o ónus da prova previsto no artigo 74.º da Lei Geral Tributária (LGT) incorre em erro de aplicação do Direito. XXXVI. Consta dos factos provados que “A Técnica Oficial de Contas preenchia as declarações de remunerações, nas quais não era declarado o valor pago a título de “Subsidio de Serviço Internacional” e de “Cláusula 74.ª dos CTT” porque o sócio gerente entendia que estes não estavam sujeitos a contribuições para a Segurança Social (cf. depoimento A......)”, pelo que a correcta interpretação e aplicação das normas não pode ser feita desconsiderando o disposto no artigo 75.º da LGT. XXXVII. Estando os montantes em causa nos presentes autos registados na contabilidade da Recorrente como ajudas de custo, atento o princípio da veracidade das declarações dos contribuintes e da contabilidade escrita, incumbe ao Recorrido provar que tais montantes não se destinaram a cobrir despesas suportadas pelos trabalhadores em virtude de estar deslocado do seu local de trabalho. XXXVIII. Dispõe o citado artigo 75.º, n.º 1 da LGT “Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos”. XXXIX. Em decorrência da presunção estabelecida no artigo 75.º da LGT recai sobre o Recorrido o ónus de demonstrar que os montantes pagos não se destinaram a cobrir despesas suportadas pelo trabalhador em virtude de estar deslocado do seu posto de trabalho. XL. Sucede que o acto impugnado, assente que o ónus da prova recai sobre o Recorrido, não logrou evidenciar factos concretos que possam conduzir à conclusão de que as ajudas de custo em causa assumem verdadeira natureza retributiva sendo que, diga-se desde já, o seu mero carácter periódico ou regular não é suficiente para a conclusão oposta. XLI. Como tal o acto impugnado não se pode manter na ordem jurídica porquanto o Recorrido não dispõe de elementos suficientes reveladores de que as ajudas de custo/prémio TIR constituem uma componente da remuneração auferida pelos trabalhadores da Recorrente. XLII. De acordo com o entendimento vertido no acto impugnado “a própria Nota ao anexo II da CCT celebrada entre a ANTRAM e a FESTRU determina a obrigatoriedade de pagamento mensal do denominado “subsídio TIR” aos motoristas deslocados em serviço internacional, conferindo-lhe deste modo, o carácter de regularidade e a expectativa do seu recebimento a que se refere o art.º 249.º do Código do Trabalho”. XLIII. Contudo, a associação profissional do sector a que o próprio acto impugnado se refere, considerou que a prestação pecuniária em causa tem a natureza de verdadeira ajuda de custo e foi como tal negociada no âmbito da contratação colectiva. XLIV. Subjacente à douta sentença recorrida encontra-se o entendimento de que caberia à Recorrente ilidir a presunção estabelecida no n.º 3 do artigo 249.º (actualmente artigo 258.º) do Código do Trabalho (CT). XLV. No entanto, a factualidade subjacente ao presente recurso não convoca a aplicação da presunção estalecida no artigo 249.º, n.º 3 do CT porquanto o objecto do recurso é o acto impugnado, extravasando por completo quaisquer considerações feitas pelo legislador em matéria laboral. XLVI. A presunção estatuída no artigo 249.º do CT decorre do princípio favor laboris, no entanto a mesma não é transponível para os restantes ramos do Direito, aqui se incluindo o direito fiscal e parafiscal. XLVII. Devidamente perspectivada a presunção estabelecida no artigo 249.º do CT cumprirá ter presente que a questão central a resolver no presente recurso terá de convocar o disposto no artigo 9.º do Código Civil, segundo o qual deverá ser reconstituído, a partir dos textos, o pensamento legislativo, que tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. XLVIII. Apesar da douta sentença recorrida referir que “a Portaria 932/2009 de 19 de Agosto, no seu artº 1º nº 3 estabeleceu que as ajudas de custo TIR constituem base de incidência contributiva para efeitos do sistema previdencial da segurança social e nos termos do seu artº 2º estabeleceu a possibilidade mediante condições expressas de as entidades empregadoras beneficiarem de isenção contributiva para a segurança social a seu cargo relativas a ajudas de custo TIR” estando em causa no presente recurso contribuições relativas ao período de Outubro de 2003 a Agosto de 2008 cumpre atentar devidamente na legislação em vigor no período referido. XLIX. Isso porque, nos termos do artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de Fevereiro, que regulamenta a base de incidência das contribuições para a segurança social, consideram-se remunerações as prestações a que, nos termos do contrato de trabalho, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito pela prestação do trabalho e pela cessação do contrato. L. O diploma em apreço vai além e no seu artigo 3.º procede a uma delimitação negativa porquanto refere que as ajudas de custo não se consideram remunerações. LI. Por conseguinte, a douta sentença recorrida padece de erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do direito impondo-se a sua substituição por outra decisão, que julgue procedente o presente recurso. E sempre com o douto suprimento de V. Excias., Deverá ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se ou revogando-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências. Pois assim o impõem o Direito e a JUSTIÇA!». O Recorrido, Instituto da Segurança Social, I.P., apresentou contra-alegações, que culmina com as seguintes e doutas conclusões: « I - Vem o presente recurso interposto da douta decisão de 21/06/2019, que julgou a impugnação judicial parcialmente procedente, com o consequente reconhecimento e manutenção do acto que determinou a anulação da liquidação de contribuições a A...... - de 2003/1/10 a 2003/12 e de 2004/1/01 a 2004/1/02 e de 2004/04 a 2004/1/06; A...... - de 2003/12 a 2004/06 e de 2005/01 a 2005/07; P...... de 2003/12 a 2004/06 e de 2005/01 a 2005/07; A...... - de 2003112 a 2004/06 e de 2005/01 a 2005/07 e A...... - de 2004/05 a 2004/06 e de 2005101 a 2005/07 e improcedente quanto ao restante, ou seja, na parte respeitante à manutenção da decisão de registo oficioso de remunerações, respeitante ao período de Julho de 2005 a Agosto de 2008. II - A ora Recorrente veio colocar em crise, na acção cuja decisão recorre, o acto de apuramento e registo oficioso de declarações de remunerações referentes ao período compreendido entre Outubro de 2003 e Agosto de 2008, no montante de € 52.141,76, proferido pela Directora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes dos Serviços de Fiscalização de Lisboa e Vale do Tejo, do Departamento de Fiscalização do Recorrido, que lhe foi notificado por ofício com data de saída de 12/02/2009. No essencial, está em causa a discordância da Recorrente acerca da qualificação, como base de incidência contributiva, dos valores pagos mensalmente aos seus trabalhadores a título de “prémios TIR”, os quais, na opinião do recorrido, revestem carácter de verdadeiras remunerações. III – Entende a Recorrente que o acto impugnado padece do vício de falta de fundamentação, não concordando com a decisão do tribunal recorrido, no entanto, o entendimento da ora Recorrente não pode proceder, pois não lhe assiste razão. Ora, na sequência da pronúncia da Recorrente, em sede de audiência prévia, a autoridade competente, acolhendo os argumentos por aquela invocados, procedeu à rectificação dos mapas de apuramento, no que concerne a erros relativos ao pagamento dos “prémios TIR” contabilizados nos dias feriados, rectificação essa que se estribou no disposto no artigo 148.º do CPA, e foi devidamente notificada à entidade no ofício de 12/02/2009, que até lhe é favorável, uma vez que o primeiro valor apurado, comunicado à Recorrente para efeitos de audiência prévia, era mais elevado. IV - O que sucedeu foi que, notificada do acto, a ora Recorrente apresentou resposta em sede de audiência prévia onde discordou da inclusão do Prémio TIR como base de incidência de TSU, nos termos e com os fundamentos nela vertidos. Perante a referida resposta, os serviços de Fiscalização do Recorrido procederam à devida análise e resposta. V - A Recorrente foi notificada do ofício que a informa das questões alegadas que foram procedentes, fazendo parte da notificação o relatório final e demais elementos com toda a fundamentação de facto e de direito. Como é que pode existir qualquer falta de fundamentação? VI - Como tem sido reconhecido pela doutrina e jurisprudência (cfr., a título de exemplo, Acórdão do STJ de 27-9-2011, proc. 61/11.7) o legislador atribuiu aos interessados o direito de, previamente à decisão, se pronunciarem sobre o sentido que a administração considera provável, mas este sentido não a vincula. VII – Havendo, portanto, que considerar que a Recorrente foi devidamente notificada de que seriam elaboradas as correspondentes declarações de remunerações com os elementos em falta, e que a entidade demandada atuou sempre em estreita colaboração com a Recorrente, procurando assegurar a adequada participação desta no procedimento, e agiu em conformidade com os princípios e normas que modelam a atuação da administração pública, designadamente com o princípio da legalidade, previsto no artigo 3.° do CPA, que constitui simultaneamente fundamento e limite daquela actuação. VIII - A propósito da fundamentação dos actos administrativos, como tem sido reconhecido pela doutrina e jurisprudência repare-se no Acórdão do Tribunal Administrativo Central Norte, Proc. 462/2000 – Coimbra, de 22/06/2011, na parte “IV. A fundamentação do acto administrativo é suficiente se, no contexto em que foi praticado e atentas as razões de facto e de direito nele expressamente enunciadas, forem capazes ou aptas e bastantes para permitir que um destinatário normal apreenda o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão; é contextual quando se integra no próprio acto e dela é contemporânea; é clara quando tais razões permitem compreender sem incertezas ou perplexidades qual foi o referido iter cognoscitivo-valorativo da decisão; é congruente quando a decisão surge como a conclusão lógica e necessária de tais razões.”. IX - A Recorrente, em todas as suas exposições, intervenções, demonstrou que o acto impugnado foi “suficiente” para que apreendesse “O itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão”, ou seja, as razões que motivaram a decisão impugnada – apuramento dos montantes em dívida à Segurança Social por omissão de declarações dos denominados “prémios TIR” pagos aos seus trabalhadores. X – De acordo com o Acórdão do STA de 19/09/2012, proc. 0902/12: “1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.”. XI – Afigura-se notório que, pela interpretação que a Recorrente faz, esta se apercebeu claramente das razões que motivaram a decisão dos serviços de fiscalização do Recorrido e do respectivo itinerário cognoscitivo, já que, não obstante pretender fazer crer que não entendeu tais razões, das mesmas recorreu, contraditando o enquadramento efectuado pelos serviços em causa, logo, o acto impugnado não padece do vício invocado. XII - Deste modo, não há qualquer reparo a fazer à sentença recorrida quando refere “Dos factos dados como provados, resulta que a entidade impugnada remeteu à impugnante o projecto de relatório de averiguações com a indicação de todos os meios de defesa contra a decisão que se viesse a tornar definitiva, que a impugnante se pronunciou sobre o mesmo em sede de audiência prévia e que o despacho final que determinou o registo das declarações oficiosas, deu como reproduzida toda a fundamentação contida no relatório final (cf. pontos 12 e 13 dos factos provados). Nos termos do artigo 125.° do Código do Procedimento Administrativo, a fundamentação pode consistir na declaração de concordância e respectiva remissão para os fundamentos contidos em informações, propostas ou relatórios anteriores, que constituem neste caso parte integrante do respectivo acto. Do despacho notificado à impugnante, consta a referida fundamentação por expressa concordância e remissão para o relatório apresentado e deste constam as razões de facto e de direito que levaram ao ISS, I.P. a decidir o registo oficioso das declarações de remunerações para efeitos de apuramento das contribuições em falta. Resulta claro que as declarações oficiosas assentam no facto de que a Impugnante nas declarações anteriores por si efectuadas, não ter incluído as atribuições pecuniárias relativas à ‘Clausula 74.ª CCTV’ e os “subsídios de serviços internacionais”, bem como constam os fundamentos de direito que levam a entidade impugnada a considerar que estão sujeitos à incidência contributiva. A motivação do acto impugnado é expressa, ainda que a Impugnante discorde com a mesma. Pelo que, se entende que a decisão impugnada não padece do alegado vicio de falta de fundamentação.” XIII - Quanto à questão de que, na verdade, estando o contribuinte representado no processo por Ilustre Advogado, conforme procuração junta, nem sequer se põe a hipótese de falta de percepção do mesmo, não só porque ultrapassa o conceito de “destinatário normal”, mas também porque reagiu eficazmente pelas vias legais contra a “lesividade” do acto, refira-se que, quando a ora Recorrente constituiu mandatário, uma opção que tomou, por si, mandatou alguém para a representar, que, atenta a sua qualidade de Advogado, além de a representar, presta os devidos esclarecimentos legais à sua constituinte, pelo que também não procede o entendimento da mesma quanto a esta questão. XIV – No que diz respeito à qualificação como prestação remuneratória do designado “prémio TIR“, sempre se dirá que o entendimento vertido pela Recorrente também deverá improceder. Desde logo, porquanto, a Recorrente, na audiência de inquirição de testemunhas, admitiu expressamente a existência da dívida, e, portanto, que os montantes apurados oficiosamente deviam ser regularizados, alegando que tentou proceder ao seu pagamento, através de plano prestacional, mas que nunca obteve resposta da parte dos serviços do Recorrido, pelo que tem vindo a efectuar esse pagamento periodicamente, de acordo com comprovativos que juntou aos autos. Em resposta, por requerimento de 19/06/2012, o Recorrido veio reconhecer que a Recorrente procedeu ao pagamento do valor de € 19.977,60, permanecendo ainda em dívida, àquela data e por referência ao período de outubro de 2003 a março de 2008, o valor de € 36.446,85, uma vez que, acrescida de juros, a dívida ascendia ao valor de € 56.424, 45. XV - O pagamento constitui o reconhecimento tácito da existência da dívida. Como salienta o Acórdão n° 0330567 do Tribunal da Relação do Porto de 15/05/2003, na esteira do que dispõe o artigo 458.° do Código Civil “1- A ordem de pagamento dado ao Banco concretizada no cheque, implica, em princípio, o reconhecimento unilateral de dívida. (...) IV - O cheque prescrito exprime a existência de documento particular, assinado pelo devedor, cujas declarações fazem prova contra o subscritor; retrata-se como reconhecimento de dívida”. XVI - Por sua vez, uma análise dos elementos constitutivos da noção legal de retribuição constante do Código do Trabalho (C.T.) (quer do actual artigo 258°, quer do artigo 249,° da versão de 2003), permite-nos concluir que se trata de uma prestação com valor patrimonial, paga de forma regular e periódica, devida pela entidade patronal aos trabalhadores como contrapartida da sua força de trabalho. O carácter regular e periódico da retribuição justifica-se pela própria natureza do contrato de trabalho, como contrato de execução duradoura ou continuada, daí que as atribuições patrimoniais tenham carácter de permanência e se vençam regularmente, criando no trabalhador uma expectativa de ganho relativamente às mesmas. Em suma, toda e qualquer prestação periódica, certa e obrigatória, que o trabalhador receba em razão do seu vínculo laboral, deve ser considerada retribuição, porquanto o trabalhador criou legítimas expectativas em relação ao seu recebimento (neste sentido, Acórdão da Relação de Lisboa de 09/06/2010, proc. 1907/07). XVII - Estabelece ainda o artigo 260.° do C.T. (2003) que: “(...) não se consideram retribuição as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respetivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador “. Por outro lado, XVIII - Determina o artigo 2° do Decreto Regulamentar n° 12/83, de 12 de fevereiro, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto Regulamentar n° 53/83, de 22 de junho, na parte que interessa para o efeito, que são consideradas remunerações “as prestações a que, nos termos do contrato de trabalho das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito pela prestação de trabalho e pela cessação do contrato (...)”. XIX - Serão, portanto, dois os critérios utilizados pelo legislador para determinar a qualificação de certa quantia como retribuição. O primeiro critério sublinha a ideia de correspectividade ou contrapartida negocial - é retribuição tudo o que as partes contratarem (ou resultar dos usos ou da lei para o tipo de relação laboral em causa) como contrapartida da disponibilidade da força do trabalho. O segundo critério assenta numa presunção: considera-se que as prestações que sejam realizadas regular e periodicamente pressupõem uma vinculação prévia do empregador e suscitam uma expetativa de ganho por parte do trabalhador, ainda que tais prestações se não encontrem expressamente consignadas no contrato (in Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 11ª edição, Coimbra). Em suma, constituirão retribuição todas as gratificações que o trabalhador tem legítima e fundada expectativa de receber, quer porque a sua atribuição está prevista no contrato ou nas normas que o regem, quer em virtude da regularidade com que são atribuídas durante um período significativo (Abílio Neto, Contrato de Trabalho. Notas Práticas, 8.” edição, Lisboa). XX - Como é sabido, a par da retribuição base, generalizam-se com frequência gratificações de diversa natureza, conhecidas pelas mais variadas designações que, sob a aparência de liberalidades compensatórias que o próprio termo sugere, são na realidade, e na maioria dos casos, prestações salariais complementares. “A retribuição integra assim todos os benefícios que se destinem a integrar o orçamento normal do trabalhador, conferindo-lhe ajusta expectativa do seu recebimento dada a sua regularidade e continuidade periódicas” (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 06/05/2003, Proc. 05 036/01). XXI - No entender do Recorrido, resulta da prova constante dos autos que os denominados “prémios TIR”, pagos pela Recorrente aos seus trabalhadores, não passam de despesas ficcionadas. De acordo com o entendimento perfilhado pelo Tribunal Central Administrativo Sul (proc. 03616/09, de 23/03/2010), “1. Consubstanciam «ajudas de custo» as importâncias pagas ao trabalhador visando compensá-lo pelas despesas que deva suportar, a favor e ao serviço da entidade patronal, por motivos de deslocações ou novas instalações; Ou, de outra forma, constituem abonos ocasionados mediatamente, pelas referidas circunstâncias, no interesse e por conta da entidade patronal, uma vez excedidas as balizas temporais e espaciais legalmente fixadas “. Acresce que as ajudas de custo não têm, em princípio, natureza retributiva, por não serem consideradas como uma contrapartida da prestação laboral, mas ainda assim carecem de uma causa específica e individualizável. Neste sentido, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11/04/2005, proc. 0415404: “Só integra o conceito de ajudas de custo ou de outras equivalentes, as importâncias destinadas a pagar despesas reais (de transporte, alojamento ou alimentação.), feitas pelo trabalhador por virtude da deslocação em serviço e não também despesas ficcionadas ou hipotéticas.”. XXII - O “prémio TIR”, não tendo previsão expressa na convenção colectiva de trabalho celebrada entre a ANTRAM — Associação Nacional dos Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias e a FESTRU — Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos, publicada no Boletim de Trabalho e Emprego (BTB) n.° 9, de 8/03/1980, vulgarizou-se, com esta ou outras designações, como a de “Ajuda de Custo TIR” para denominar a subvenção constante da Nota ao Anexo II do Contrato Colectivo de Trabalho publicado no BTE n.° 18, de 15/05/1987, nos termos do qual “Os motoristas deslocados em serviço internacional auferirão uma ajuda de custo mensal de 6.000$00.” XXIII - No caso vertente, os serviços de fiscalização do Recorrido constataram que a Recorrente pagou regularmente aos seus trabalhadores, no período em causa, quantias às quais atribuiu a designação de “Prémio TIR“. O pagamento teve natureza certa, regular e periódica, criando no trabalhador a legítima expectativa do seu recebimento, característica indiciária de uma prestação retributiva. Como aliás resulta do citado Anexo II. Por outro lado, não se apurou que a quantia paga a tal título tivesse em concreto uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade da força de trabalho, designadamente que existissem facturas de despesas em que os trabalhadores tivessem incorrido, ou outros documentos comprovativos, pelo que se terá que concluir que integra o conceito de retribuição. Neste sentido, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido em 29/03/2001, no proc. n° 339/01, cujo sumário reza que “Sendo o designado “prémio TIR” convencionalmente estabelecido e fixado no seu mínimo, e sendo essa importância paga independentemente das despesas que o trabalhador faça, tendo natureza regular, deve ser considerado como integrando a retribuição, apesar dese utilizar a expressão “ajuda de custo”. XXIV - Veja-se também o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 6/05/2003, proc. 05036/01: “Assim, as importâncias pagas a título de ajudas de custo tanto podem, como não podem, considerar-se parte da remuneração, consoante a realidade que lhes subjaz. (...) (À Recorrente) Não lhe bastava, pois, como se deixou salientado na sentença recorrida, alegar que os auferidos ‘prémio de Kms” e “prémio TIR” constituíam ajudas de custo, até porque dada a imprecisão jurídica de conceitos reinante nas Convenções Coletivas de Trabalho para o setor de transportes internacionais de mercadorias, a utilização dessa designação não assegura que as importâncias abonadas a título de “ajudas de custo” não integrem o conceito de retribuição à luz da definição dada pelo citado art. 82° da LCT, tributáveis, pois, em sede de IRS. Com efeito, a remuneração especial para os motoristas afetos ao serviço internacional, prevista na cláusula 74° n° 7 da Convenção Coletiva de Trabalho celebrada entre a ANTRAM e a FESTRU correspondente ao valor de 2 horas de trabalho extraordinário por dia (designada por “trabalho extraordinário TIR”) e a remuneração prevista na nota ao Anexo II dessa Convenção, correspondente a uma quantia fixa mensal de 21.200$00 para «os motoristas deslocados em serviço internacional» (designada por prémio TIR”), podem considerar-se como integrantes do conceito de retribuição, pese embora esta última vir aí designada de “ajuda de custo”. XXV - A este propósito, mais se diga, e segundo as normas actuais, que dispõe o Capítulo III da Lei n.° 7/2009, de 12 Fevereiro que aprovou o Código do Trabalho (C.T.) quanto a retribuição e outras prestações patrimoniais, estabelecendo o artigo 258º os princípios gerais sobre a retribuição, donde se retira que a mesma se suporta nos seguintes elementos: 1- corresponde à contrapartida do trabalho do trabalhador; 2 - pressupõe o pagamento da retribuição base e outras prestações de forma regular e periódica; 3 - a prestação tem de ser feita em dinheiro ou em espécie (até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador). XXVI - Constata-se que, “O conceito de retribuição tem vários sentidos, podendo falar-se em remuneração em sentido amplo, que abrange as diversas prestações remuneratórias de que o trabalhador beneficia, e retribuição em sentido estrito ou técnico-jurídico.” (vide, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16/12/2009). XXVII - A respeito da dificuldade quanto à distinção sobre o que é retribuição e o que não será, veja-se o seguinte entendimento: “O problema da qualificação de cada uma das atribuições patrimoniais feitas pelo empregador ao trabalhador, por referência ao conceito de retribuição, ganhou uma acuidade singular com a amplificação do leque daquelas atribuições, na contratação colectiva e na prática das empresas. É sabido que, por razões diversas – desde as que se relacionam com propósitos de aligeiramento da carga fiscal e para-fiscal até às derivadas da intenção de ladear limitações governamentais em matéria de política de rendimentos - , se registou, sobretudo a partir dos anos oitenta do século passado, uma considerável proliferação de «títulos» pelos quais são efectivadas vantagens económicas aos trabalhadores. Essa proliferação originou uma nebulosa de conceitos (subsídios, abonos, compensações, indemnizações, prémios, complementos de prestações de segurança social, valor de uso de bens da empresa) que, referidos ou não ao pilar central do «sistema» remuneratório (a retribuição «certa» ou «de base» que o empregador está contratualmente obrigado a pagar por mês ou com diferente periodicidade), transportam consigo uma certa indeterminação quanto ao nexo de correspectividade com a prestação de trabalho” (in Fernandes, António Monteiro, Direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 2010, p.484). XXVIII - Além do mais, contrariamente ao entendimento da Recorrente (artigo 62º, recurso), a questão em apreço não se pode dissociar da matéria laboral, sendo esta transponível para os restantes ramos do direito, nomeadamente fiscal e para-fiscal, in casu, no que concerne ao pagamento de contribuições. XXIX - Face ao exposto, além de assistir razão à douta sentença, também os factos e prova produzida no respectivo proave e na acção, sustentam o apuramento/registo realizado das contribuições devidas, não assistindo razão à Recorrente na pretensão formulada. XXX – Assim sendo, considera-se que a douta decisão recorrida não enferma de quaisquer vícios, mostrando-se inteiramente válida e legal, devendo a pretensão formulada pela Recorrente improceder por manifesta falta de fundamento. Termos em que se considera que a sentença recorrida não padece de quaisquer vícios ou ilegalidades, tendo feito uma correcta aplicação do direito aos factos, pelo que, deverá ser mantida nos seus precisos termos, negando-se provimento ao recurso. Como é de Lei e de Justiça.». A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu mui douto parecer concluindo pela improcedência do recurso. Colhidos os vistos legais, e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão. II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para o conhecimento do objecto do recurso. Assim, analisadas as conclusões da alegação do recurso, as questões que importa conhecer reconduzem-se a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir pela suficiente fundamentação da decisão de apuramento oficioso de contribuições em dívida e, quanto à natureza remuneratória e consequente sujeição contributiva, dos “prémios TIR” abonados a trabalhadores. *** II. FUNDAMENTAÇÃO A) DE FACTO Na sentença recorrida deixou-se consignado em sede factual: « III.1 De facto: 1. Em 12/4/2000, foi constituída a sociedade comercial D………. Lda. com o objecto social de ¯Transporte nacional e internacional, público ocasional de mercadorias (cf. Registo de Sociedade a fls. 149 do Processo Administrativo Tributário de ora em diante designado de PAT). 2. Da análise dos recibos de vencimento e das listagens mensais de processamento dos vencimentos, constata-se que, para além do vencimento-base, a empresa pagava mensalmente aos seus motoristas, valores denominados de ¯Subsidio de Serviço Internacional nos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006 no valor mensal de EUR 122,00 e no ano de 2007 no valor de EUR 125,00 (cf. declaração de remunerações a fls. 6 e seguintes do PAT). 3. Da análise dos recibos de vencimento e das listagens mensais de processamento dos vencimentos, constata-se que, para além do vencimento-base, a empresa pagava regularmente aos seus motoristas, uma quantia a título de Ajudas de Custo Diversas que a partir de Janeiro de 2006 denominou de ¯Cláusula 74.ª do CTT, correspondente a horas extraordinárias diárias nos anos de 2003, 2004, 2005, 2006 no valor de EUR 317,85 e no ano de 2007 no valor de EUR 325,80 (cf. declaração de remunerações a fls. 6 e seguintes do PAT). 4. As prestações pagas e descritas no ponto que antecede têm um valor fixo mensal e semelhante a todos os trabalhadores motoristas (cf. declaração de remunerações a fls. 6 e seguintes do PAT). 5. A Técnica Oficial de Contas preenchia as declarações de remunerações, nas quais não era declarado o valor pago a título de ¯Subsidio de Serviço Internacional e de ¯Cláusula 74.ª dos CTT porque o sócio gerente entendia que estes não estavam sujeitas a contribuições para a Segurança Social (cf. depoimento A......). 6. Das prestações pagas aos seus trabalhadores, a Impugnante não fez incidir a taxa social única nas ¯ajudas de custo diversas e ¯cláusula 74 e no ¯subsídio de Serviço Internacional (cf. declaração de remunerações a fls. 6 e seguintes do PAT) 8. Em 17/11/2008, o Serviço de Fiscalização LVT – Sector de Setúbal emitiu a informação com a referência PROAVE N.º…….., com o assunto NISS …….. – D …………. LD, constante de fls. 176 a 181 do PAT, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido e da qual consta em síntese o seguinte: Quanto à gerência foi confirmado, através de Certidão Permanente válida até 2009/08/04, que o único gerente nomeado em deliberação de 2005/11/04, é o trabalhador da empresa J....., tendo sido verificado que a situação contributiva do mesmo se encontrava regular; A empresa, abona os trabalhadores com a categoria de motoristas com complementos remuneratórios denominados, até 12/2005, inclusive, como ¯Ajudas de custo diversas e ¯Subsídio de serviços internacionais. 11. O Inspector do ISS, I.P. enviou ao Impugnante o oficio constante de fls. 202, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido, do qual consta em síntese, a solicitação para comparecer nas instalações do ISS, I.P, no dia 14/1/2009, às 9h30, acompanhado dos recibos de vencimento de todo o pessoal referentes ao ano de 2008, Balancete geral analítico acumulado em 30/6/2008 e os documentos de suporte das verbas pagas ao trabalhador J......., referentes a deslocações nos meses de Abril e Agosto de 2008, incluindo os respectivos boletins itinerários. 12. Em 26/1/2009, o Serviço de Fiscalização LVT – Sector de Setúbal emitiu a informação constante de fls. 239 a fls. 249 do PAT, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido, da qual consta em síntese o seguinte: * A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, e especificados nos vários pontos da matéria de facto provada, analisados os depoimentos de A......, Técnica Oficial de Contas da Impugnante, A......, I...... ambos Inspectores do ISS, I.P e D......., Directora do Departamento de Fiscalização de Lisboa e Vale do Tejo do ISS, I.P. constatou-se que não obstante a isenção e coerência dos depoimentos prestados, nada acrescentam à matéria de facto apurada na prova documental constante dos autos e do Processo Administrativo Tributário excepto no facto provado n.º 5. * Inexistem factos não provados com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir. III. B) DE DIREITO A recorrente começa por invocar erro de julgamento da sentença ao concluir que a decisão de apuramento oficioso de contribuições para a segurança social relativamente a trabalhadores seus a quem, nomeadamente, abonou os designados “prémios TIR”, não contém a fundamentação legal. Como vem sendo reiteradamente afirmado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, de que destacamos o seu recente acórdão de 02/12/2020, tirado no proc.º 01661/14.9BEPRT, «A exigência legal e constitucional de fundamentação do acto tributário, decorrente dos arts. 268º da CRP, 77º da LGT e 125º do CPA, visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a Administração a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa. Para que a fundamentação possa ser considerada suficiente terá de ser compreensível para um destinatário médio, o que exige clareza nas razões de facto e de direito apresentadas. A compreensibilidade do destinatário médio, postado numa situação concreta, será, pois, o critério adequado para aquilatar da suficiência da fundamentação. Como vem afirmando a jurisprudência e a doutrina o acto encontra-se suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair qual o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática. Ponto é que a fundamentação responda, às necessidades de esclarecimento do contribuinte informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto de liquidação, permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática. No que concerne à decisão do procedimento tributário dispõe o artigo 77.º, nº1 da Lei Geral Tributária dispõe que deve ser fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária. Por sua vez, no que se refere aos actos tributários de liquidação, o nº 2 do artº. 77º da LGT estabelece os parâmetros mínimos de fundamentação. Estes actos podem conter uma fundamentação sumária, que, no entanto, não pode deixar de conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.» (fim de citação). Neste modo de ver e baixando aos autos, basta atentar nos pontos 8 e 9 do probatório, que transcrevem a informação que suporta a decisão e o conteúdo da notificação ao sujeito passivo, para resultar evidente que a decisão contém as razões factuais e jurídicas que levaram à sua prática. Com efeito, na informação que suporta a decisão de inscrição oficiosa de remunerações consta, nomeadamente e entre o mais: “…foi verificado que a mesma exerce actividade de transporte internacional de mercadorias entre Portugal e a Alemanha, processando aos seus trabalhadores complementos remuneratórios contemplados no CCT do sector como Cláusula 74a e Prémio TIR, embora a empresa atribua a este último a denominação de Subsídio de Serviços Internacionais”; “as verbas relativas ao Prémio TIR não são submetidas a TSU pela entidade contribuinte em virtude de as considerar como ¯ajudas de custo”; “A entidade empregadora exerce efectivamente a actividade de transportes TIR”; “A empresa, abona os trabalhadores com a categoria de motoristas com complementos remuneratórios denominados, até 12/2005, inclusive, como ¯Ajudas de custo diversas e ¯Subsídio de serviços internacionais”; “foi verificado que o complemento ¯Subsídio de serviços internacionais é efectivamente e na prática o Prémio TIR, previsto no CCT do Sector. No entanto, foi aferido que este não foi, até à presente data, considerado para efeitos de base de incidência”; “…constatam-se valores pagos aos trabalhadores a que correspondem contribuições em falta relativas ao período compreendido entre 10/2003 e 08/2008, inclusive, no montante de € 52.329,18, que o contribuinte deveria ter declarado e liquidado à Segurança Social”; “Conforme referido no ponto anterior, tais valores resultam dos montantes pagos a título de ¯Ajudas de custo diversas - Clausula 74a e ¯Subsidio serviços internacionais - Prémio TIR, aos motoristas ao serviço do contribuinte, aquando das deslocações efectuadas em território internacional (exclusivamente no percurso entre Portugal e Alemanha) e configuram verdadeiras remunerações, dado o carácter fixo e periódico com que são atribuídos, estando por isso sujeitos a incidência da TSU, como adiante se demonstrará…”. Segue-se uma extensa motivação da decisão, com indicação dos preceitos legais convocados e da jurisprudência julgada pertinente, concluindo-se assim: “Nestes termos e considerando que o pagamento das Ajudas de Custo/ Prémio TIR tem carácter periódico e regular, foi entendido ser o mesmo passível de incidência de TSU, pelo que se procedeu ao apuramento de contribuições em divida no montante de € 52.329,18”. Já no teor da notificação da decisão, pode alcançar-se: “No âmbito do Processo de Averiguações n°………….., instaurado à Entidade Empregadora D.... LD, constatou-se a existência de remunerações não declaradas por V. Exa(s). à Segurança Social, referentes ao período de 10/2003 a 08/2008, a que correspondem omissões nas contribuições devidas, no valor de 52.329,18 €, conforme cópia(s) do(s) mapa(s) de apuramento que se anexa(m) e se dá(ão) como integralmente reproduzido(s)”; “As citadas omissões resultam de não terem sido declaradas como base de incidência de contribuições as remunerações pagas a trabalhadores dessa empresa a título de ¯prémio TIR e ¯Cláusula 74a, que revestem o carácter de verdadeiras remunerações e que, de acordo com o Contrato Colectivo de Trabalho e Jurisprudência variada, nomeadamente do Supremo Tribunal de Justiça, são passíveis de descontos para a Segurança Social”; “Mais se informa que, na falta de resposta, a decisão torna-se definitiva e ocorre no primeiro dia útil seguinte ao do termo do prazo acima referido, data a partir da qual se inicia a contagem dos prazos de 15 dias para reclamar; de 3 meses para recorrer hierarquicamente; e de 3 meses para recorrer contenciosamente, prazo que se suspende caso tenha reclamado ou recorrido hierarquicamente”. Assim, a fundamentação apresenta-se suficiente, clara, congruente e acessível ao homem médio, dela podendo apreender-se que os “prémios TIR” abonados pela empresa a trabalhadores do serviço internacional não constavam da declaração de remunerações para efeitos contributivos, tendo sido determinada a sua inscrição oficiosa no entendimento de que assumem carácter remuneratório e não meramente compensatório, dado terem natureza periódica e regular. E estão indicados os preceitos legais convocados: “Decreto-Lei n.º 12/83, de 12 de Fevereiro”; “Decreto-lei n.º 8-B/2002, de 15 de Janeiro”; “art.º 2.º n.°1 al. a) do CIRS”, bem como a interpretação que deles faz a jurisprudência, nomeadamente, a do Supremo Tribunal de Justiça, que cita, bem como a quantificação dos “prémios TIR” omitidos à declaração de remunerações: “cujo mapa de apuramento que se anexa e dá por reproduzido”. Mais, se indica na notificação da decisão os prazos de exercício das garantias administrativas e contenciosas, embora se deva realçar que a eventual omissão deste elemento na notificação apenas contende com a eficácia do acto, que não com a sua validade. É, pois, de validar o decidido na sentença quanto à existente e suficiente fundamentação formal da decisão correctiva, improcedendo este segmento do recurso. Questão diversa prende-se com a correcção dos fundamentos externados. É questão que indagaremos de seguida e se prende com a natureza dos abonos designados de Prémios ou ajudas de custo TIR. Acompanhando os considerandos que sobre o tema se deixaram vertidos no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 07/05/2012, tirado no proc.º 0764/10, começaremos por dizer que o carácter de permanência ou regularidade dos reembolsos das despesas não permite, por si só, a conclusão de que deixaram de constituir uma compensação, ou seja, não permite, por si só, descaracterizar a sua qualidade de ajuda de custo. E para que assim não seja, torna-se necessário que se demonstre que existiu uma vantagem patrimonial retirada pelo beneficiário, ou seja, como vem sendo jurisprudência uniforme (cfr. os acs. do STA, 2ª Secção, de 5/4/2000, Rec. n° 24568, e de 29/3/2000, e do TCA, de 7/10/2003, Rec. n° 466/03, de 13/5/2003, Rec. n° 6910/02 e de 30/9/2003, Rec. n° 700/03), que não se trate de um montante com inequívoco intento compensatório, porque se for esse o carácter da quantia paga ao trabalhador, então não se encontra o mesmo abrangido pelas normas de incidência tributária, designadamente para efeitos de contribuições para a Segurança Social. Diremos, também, que no caso, cremos que é à sociedade recorrente que cabe o ónus (cf. artigos 342º, do CCivil, 100, n° 1 do CPPT e 74º, nº 1 da LGT) de provar que os montantes por si pagos a título de Prémios ou ajudas de custo TIR revestem a natureza de ajuda de custo, não consubstanciando rendimentos que proporcionam ao trabalhador um acréscimo de capacidade contributiva e, como tal, susceptíveis de tributação pois que nos termos do nº 3 do art.º 249º do Código do Trabalho, existe uma presunção de que toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador constitui retribuição, pelo que, nos termos dos artigos 344º e 350º do Código Civil tem a Administração Fiscal, no caso em questão, uma presunção a seu favor o que determina que não tenha de fazer prova do facto que invoca, sendo, contudo, elidível esta presunção, que entendemos competir à impugnante, ora recorrente (neste sentido, o acórdão do STJ de 8 de Outubro de 2008, proferido no Proc. nº 08S1984, em que se refere: “Posto isto há que proceder à tarefa de conciliação dos preceitos contidos nos n.ºs 2 e 3 do art.º 249º e no n.º 1 do art.º 260º do CT. Tal conciliação faz-se nos seguintes termos: Cabe à entidade empregadora, nos termos dos art.ºs 344º, n.º 1 e 350º, n.º 1 do CC, provar que a atribuição patrimonial por ela feita ao trabalhador reveste a natureza de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes (por comodidade, passaremos a designar tais atribuições apenas por “ajudas de custo”), sob pena de não lhe aproveitar a previsão do art.º 260º do CT e de valer a presunção do n.º 3 do art.º 249º do CT de que se está perante prestação com natureza retributiva”). Feitos os considerandos preliminares que se impunham, a questão essencial a equacionar neste recurso consiste em saber se as quantias pagas pela impugnante a título de "prémio TIR" ou “ajudas de custo TIR” constituem uma forma de retribuição aos beneficiários, sujeita a incidência contributiva para efeitos de desconto para a Segurança Social, ou se constituem, antes, ajudas de custo excluídas dessa tributação, como advoga a recorrente. Continuando a acompanhar de perto o citado acórdão do STA, é oportuno mencionar o acórdão deste TCA Sul, de 05/06/2003, tirado no proc.º 05036/01 onde sobre o conceito de retribuição, e ressalvadas as distâncias temporais para os dias de hoje e a evolução legislativa entretanto operada, se expendeu: «(…) A retribuição surge, assim, como um conjunto de valores, expressos ou não em moeda, a que o trabalhador tem direito, por título contratual ou normativo, correspondente a um dever da entidade patronal, integrando todos os benefícios outorgados dela entidade patronal que se destinem a integrar o orçamento normal do trabalhador conferindo-lhe a justa expectativa do seu recebimento dada a sua regularidade e continuidade periódicas. Da retribuição se excluem apenas as prestações que, embora sendo devidas, têm um carácter meramente ocasional (v.g., a remuneração por trabalho suplementar - art. 86° da LCTI) e as que se traduzem em simples compensações ou reembolsos por despesas do trabalhador feitas em serviço da entidade patronal - art. 87° da LCTI). No tocante à sua estrutura, a retribuição pode ser certa, variável ou mista, abrangendo neste caso uma componente certa - a remuneração-base -, calculada em função do tempo de trabalho e que representa o rendimento mínimo com que o trabalhador conta, pelo exercício da sua actividade, para a satisfação das suas necessidades quotidianas e do seu agregado familiar, e outra variável, composta por prestações complementares ou acessórias, calculadas em função de outros factores e com uma periodicidade distinta da remuneração-base. Estas prestações complementares encontram-se ligadas a contingências especiais da prestação do trabalho, a produtividade, a certas situações pessoais dos trabalhadores ou até ao acréscimo de despesas em certas épocas do ano. É o que acontece com os subsídios de férias e de natal. E até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador. Porém, de acordo com o art. 87° da LCT, não se consideram retribuição as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações ou novas instalações feitas em serviço da entidade patronal, salvo quando, sendo tais deslocações frequentes, essas importâncias, na parte em que excedam as despesas normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da remuneração do trabalhador. Na verdade, as ajudas de custo e demais prestações enumeradas no citado art. 87° visam compensar o trabalhador por despesas efectuadas ao serviço e em favor da entidade patronal e que, por razões de conveniência, foram suportadas pelo próprio trabalhador, não constituindo um correspectivo da prestação do trabalhador, característica da retribuição. Característica essencial destas prestações é o facto de representarem uma compensação ou reembolso pelas despesas a que o trabalhador foi obrigado na sequência de deslocações ocasionais e instalações que teve de efectuar em serviço, inexistindo na sua percepção qualquer correspectividade em relação ao trabalho (cfr. Jorge Leite e Coutinho de Almeida, in "Colectânea de Leis do Trabalho"; pág. 89 e segs.; Menezes Cordeiro, in “Manual de Direito do Trabalho”; págs. 721 e segs. e Monteiro Fernandes, in “Direito do Trabalho”; vol. I, 8ª edição, págs. 361 e segs.). Daí que essas importâncias não se integram no conceito de retribuição consagrado na LCT, salvo no caso especial excepcionado na parte final do artigo 87° previsto para aduelas e, actividades em que as deslocações do trabalhador são frequentes e os abonos respectivos (atribuídos, designadamente sob a forma de prémios) foram estruturados de forma a cobrir as despesas normais. Assim, as importâncias pagas a título de ajudas de custo tanto podem, como não podem, considerar-se parte da remuneração, consoante a realidade que lhes subjaz (…)». Ora, face a tudo o expendido anteriormente, a sorte do recurso depende da prova, que à impugnante cabia fazer, de que os designados “prémios TIR” abonados aos trabalhadores do serviço de transporte internacional, não obstante o seu carácter periódico e regular, se destinavam a compensar os beneficiários das despesas em que incorriam naquelas deslocações ao serviço da entidade patronal, elidindo a presunção legal do seu carácter remuneratório. Nessa tarefa, não bastava à recorrente alegar, como se limitou a fazer, que os referidos “prémios TIR” constituíam ajudas de custo, até porque a utilização dessa designação não assegura que as importâncias abonadas a título de "ajudas de custo" não integrem o conceito de retribuição para efeitos contributivos. Na verdade, compulsado o probatório e os elementos dos autos, não alcançamos qualquer materialidade que suporte a ilação de que os “prémios TIR” correspondiam a despesas que os beneficiários suportavam ao serviço e em favor da entidade patronal e que a esta competia reembolsar, não constituindo, assim, bem que presuntivamente, um elemento da respectiva remuneração. Na falta dessa prova decisiva, o recurso está votado ao insucesso, também neste segmento. Em consequência, mantém-se a sentença recorrida e nega-se provimento ao recurso. IV. DECISÃO Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida. Custas a cargo da Recorrente. Lisboa, 13 de Maio de 2021 [O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Juízes–Desembargadores integrantes da formação de julgamento, Luísa Soares e Cristina Flora]. Vital Lopes |