Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05922/12
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:05/21/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:TRIBUNAIS ARBITRAIS.
REGIME DA ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA EM DIREITO TRIBUTÁRIO (DEC.LEI 10/2011, DE 20/1).
PRINCÍPIOS PROCESSUAIS INERENTES AO PROCESSO ARBITRAL.
RECURSO DE DECISÃO PROFERIDA POR UM TRIBUNAL ARBITRAL (ARTºS.25, 27 E 28, DO RJAT).
FUNDAMENTOS DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO ARBITRAL JUNTO DOS T.C.ADMINISTRATIVOS.
NULIDADE DA DECISÃO ARBITRAL QUANDO OS FUNDAMENTOS ESTÃO EM OPOSIÇÃO COM A DECISÃO (CFR. ARTº.28, Nº.1, AL.B), DO RJAT).
Sumário:
1. A possibilidade de existência de tribunais arbitrais surgiu na Constituição da República a partir da sua revisão em 1982 (cfr.artº.211, nº.2, da C.R.P.), actualmente estando consagrada no artº.209, nº.2, do diploma fundamental.
2. O regime da arbitragem voluntária em direito tributário foi introduzido pelo dec.lei 10/2011, de 20/1 (RJAT), sendo que os Tribunais arbitrais têm competência para apreciar um conjunto vasto de pretensões, as quais vêm taxativamente elencadas na enumeração constante do artº.2, nº.1, do citado diploma.
3. Os princípios processuais inerentes ao processo arbitral vêm referidos e elencados no artº.16, do RJAT, e, genericamente, são os mesmos princípios que se aplicam a um processo de partes, de que é exemplo o processo civil.
4. No que toca à possibilidade de recorrer de uma decisão proferida por um Tribunal arbitral pode, desde logo, referir-se que esta é muito limitada. Assim, quando se tiver em vista controlar o mérito da decisão arbitral, isto é, o seu conteúdo decisório, o meio mais adequado para colocar em crise a decisão arbitral será o recurso. Em termos práticos, só há uma via de recurso: ou directamente para o Tribunal Constitucional, com fundamento em (in)constitucionalidade, ou directamente para o Supremo Tribunal Administrativo, em caso de oposição de acórdãos (cfr.artº.25, do RJAT).
5. Pelo contrário, quando se pretenda controlar a decisão arbitral em si, nos seus aspectos de competência, procedimentais e formais, o meio adequado será já a impugnação da decisão arbitral para os T. C. Administrativos (cfr.artºs.27 e 28, do RJAT).
6. No que se refere aos fundamentos da impugnação da decisão arbitral, vêm estes elencados no texto do artº.28, nº.1, do RJAT. São eles, taxativamente, os seguintes:
a-Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
b-Oposição dos fundamentos com a decisão;
c-Pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia;
d-Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artº.16, do diploma.
7. Ou seja, os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reacção da decisão dos Tribunais arbitrais para os T. C. Administrativos, consistem na impugnação de tal decisão, consagrada no artº.27, com os fundamentos que se ancorem nos vícios de forma expressamente tipificados no artº.28, nº.1, e atrás elencados, correspondendo os três primeiros aos vícios das sentenças dos Tribunais tributários, nos termos do plasmado no artº.125, nº.1, do C.P.P.T., com correspondência ao estatuído nas alíneas b), c) e d), do artº.668, nº.1, do C.P.Civil.
8. Nos termos do preceituado no citado artº.668, nº.1, al.c), do C. P. Civil (cfr.artº.28, nº.1, al.b), do RJAT), é nula a sentença (ou acórdão) quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artº.158, nº.1, do C.P.Civil. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada.
O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
“A..., S.A.” (E OUTRO), com os demais sinais dos autos, deduziu impugnação de decisão arbitral, ao abrigo dos artºs.27 e 28, nº.1, al.b), do dec.lei 10/2011, de 20/1, dirigida a este Tribunal visando decisão proferida no procedimento arbitral nº.18/2012-T, tendo por objecto actos de liquidação adicional de I.M.T. e de Imposto de Selo, no valor global de € 212.113,36.
X
O apelante termina as alegações da impugnação (cfr.fls.3 a 17 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-As ora impugnantes reclamam, simplesmente, o cumprimento dos princípios da legalidade e da igualdade vertidos na Constituição fiscal;
2-Reclamam fundamentação dos actos da administração e reclamam, o casamento entre a fundamentação (de facto e de direito) e a respetiva decisão sobre a matéria objeto do presente pleito. O Tribunal arbitral não foi capaz de oferecer uma decisão cuja fundamentação estivesse em sintonia com a decisão;
3-Ora, como ficou assente na decisão arbitral o contrato de permuta de um bem imóvel presente por parte de imóvel futuro foi o facto gerador da obrigação de impostos que no presente pleito se discute, ou melhor, os actos de liquidação adicional do Imposto Municipal sobre transmissões Onerosas de Imóveis e do Imposto de Selo - verba 1.1. da Tabela Geral (TCIS), nos montantes de € 94.434,03 e € 11.622,65 respectivamente;
4-As impugnantes pretendem a anulação dos actos de liquidação adicional com fundamento na insuficiente e errónea fundamentação dos mesmos;
5-A fundamentação apresentada pela Administração Fiscal Estadual, nos actos de liquidação adicional é silenciosa, pois, omite a forma como, em concreto, chegaram ao apuramento dos valores liquidados;
6-A Constituição e a Lei Geral Tributária não só obrigam a que a fundamentação dos actos tributários contenha as disposições legais aplicáveis, a qualificação e a quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo (artº.78, nº.2), como ainda exige que a fundamentação da avaliação contenha obrigatoriamente “a indicação dos critérios a utilizar e a ponderação dos fatores que influenciaram a determinação do seu resultado (artº.84, nº.3);
7-As impugnantes não se conformam, porque, sabem que não é possível aceitar que a fundamentação do valor apurado e liquidado seja resultado da aplicação automática dos factores indicados na Portaria nº. 1337/03, de 5 de Dezembro, fazendo-se tábua rasa do valor constante do contrato de permuta, violando, assim, uma vez mais a requerida a lei;
8-Isto porque, uma portaria não pode sobrepor-se à lei, que obriga a considerar o valor do contrato, por outro lado o âmbito de aplicação desta portaria em concreto está limitado aos prédios urbanos;
9-Na verdade, o nº.1, do artº.16, do C.I.M.I., preceitua: “O Ministro das Finanças decide, por portaria, a avaliação geral dos prédios rústicos e/ou urbanos de todos ou de qualquer município”, contudo após a entrada em vigor da reforma da tributação do património, não tinha sido até à data em os requerentes foram notificados dos actos de liquidação adicional do I.M.T. e I.S. publicada qualquer portaria regulamentadora deste artigo;
10-Nesta medida, os actos de liquidação adicional carecem de fundamentação legal;
11-Os actos de liquidação cuja anulação os sujeitos passivos pedem, estão, repete-se feridos de morte, são contrários à lei e à Constituição;
12-A Administração Fiscal, ao realizar a liquidação adicional de imposto atropelou a lei e os critérios legalmente fixados;
13-Por outro lado, a permuta de bens presentes por bens futuros impôs e impõe à Fazenda Nacional, que o acto de liquidação do I.M.T. seja em desdobrado em “dois actos” ou “dois momentos”;
14-Assim, é no momento da primeira liquidação que as partes declaram e confirmam, para efeitos fiscais, os valores declarados para efeitos civis;
15-É neste 1º. momento que se torna claro se as partes confirmam que as respectivas prestações de transmissão de imóveis são equivalentes em valor ou, caso não o sejam, qual a compensação monetária que uma delas dará à outra para que a equivalência das prestações se verifique;
16-No momento da segunda liquidação, quando os bens futuros já se encontrem determinados com base em projeto de construção aprovada pela câmara municipal, isto é, se transformem e adquirem o estatuto de bens presentes, que se verifica qual delas se assumirá como liquidação definitiva;
17-No entanto, a comparação entre duas diferenças só tem sentido, como assinala António Carlos dos Santos, se os critérios que estão na base da 1ª. e 2ª. liquidação forem os mesmos;
18-A liquidação do I.M.T. e I.S. quando tem por objeto a permuta de bens presentes por bens futuros é levada a efeito em dois momentos distintos, contudo os critérios de avaliação aplicáveis deverão ser os mesmos, sob pena, de o princípio da segurança jurídica e legalidade previsto no Constituição e no sistema fiscal português serem letra morta, “in casu”, os actos de liquidação adicional de I.M.T. e I.S. da Autoridade Tributária e Aduaneira não cumpriram esta exigência legal;
19-Os sujeitos passivos não estão esclarecidos e não foram informados sobre os critérios com base no qual foi feita a liquidação adicional de I.M.T. e I.S.;
20-Os Serviços de Finanças limitam-se a elencar normas contraditórias sobre este tema, pelo que há neste caso repete-se uma manifesta falta de fundamentação do acto administrativo de liquidação;
21-Não existem, em suma, na fundamentação apresentada pelos serviços, quaisquer elementos concretos sobre os critérios que conduziram ao valor decorrente da avaliação;
22-Cumpre relembrar que a Administração Fiscal dispunha de vários tipos de valores, o valor da compra do bem 1 (isto é, o preço de 2.493.989,49 euros fixado na escritura pública de compra do prédio efectuada em 2 de Fevereiro de 2001, que não foi considerado como simulado), o valor atribuído no contrato de permuta em 30 de Janeiro de 2004 (2.500.000,00 euros) o valor patrimonial constante da matriz (762,13 euros) e o valor patrimonial para I.M.T. de 11.477,68 euros;
23-Os valores oferecidos foram irrelevantes, para o efeito, quer o custo histórico do bem (de que tinham conhecimento aquando da transmissão anterior), quer o actual valor de mercado deste mesmo bem, que a lei, como vimos, obriga a observar, socorrendo-se, em claro contraste com a razão de substituição da sisa pelo I.M.T., de um valor profundamente desactualizado para a sua avaliação actual;
24-De facto, ninguém, dotado de capacidade de entender e querer dará 2.500.000,00 euros por um bem que, afinal, segundo a Fazenda Nacional, não valeria mais que 11.477,68 euros;
25-A não ser que se tratasse de uma doação disfarçada, mas os serviços não cuidaram de investigar tal hipótese. Ao recorrerem a um valor irrisório, desconsiderando o próprio valor que não contestaram aquando da transmissão de 2003 (que deveria ter originado uma actualização das matrizes) e o valor do contrato, os serviços realizam um verdadeiro planeamento fiscal abusivo, dirigido tão só à captação do máximo de receita possível;
26-Repare-se que, se tivermos em conta os valores declarados nas escrituras de 2003 e de 2006, o aumento de valor do terreno seria de 7.010,51 euros;
27-Ora o valor do I.M.T. a pagar com a liquidação adicional é de 94.434,03 euros (a que acresce o imposto de selo no valor de 11.622,65 euros);
28-Este valor é um verdadeiro confisco. É esta avaliação indirecta que distorce completamente a diferença de valores patrimoniais. E que, contrariamente aos fundamentos do próprio I.M.T., conduz a uma tributação sem qualquer relação com a capacidade contributiva do sujeito passivo. E mais uma vez a Constituição, o Sistema Fiscal Português e os Direitos dos Contribuintes são letra morta;
29-Nos tempos da Sisa, como no actual tempo do I.M.T., no caso das permutas, só está sujeita a imposto a diferença de valores entre os bens imóveis adquiridos e os que foram dados em permuta, pois, só a diferença é reveladora da capacidade contributiva do adquirente de bens imóveis a título oneroso e só esta é que deve ser objecto de tributação como de resto impõem os princípios constitucionais vertidos na Constituição Fiscal;
30-No passado e no presente sempre que se permutam bens presentes por bens futuros, a determinação da matéria colectável, impõe a avaliação de todos os bens nela envolvidos, a qual se fará após a celebração do respectivo contrato mas reportar-se-á à data da celebração deste como de resto defende a doutrina e a jurisprudência;
31-Em contrapartida a Administração Tributária presa a uma interpretação literal nega a Constituição, o Sistema Fiscal Português e o espírito a que obedece a tributação dinâmica do património;
32-A actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira corresponde à negação dos valores defendidos pela Doutrina e Jurisprudência;
33-A Fazenda Nacional ao realizar a liquidação adicional, na realidade fez uma nova liquidação, onde ignorou a data da celebração do contrato como momento revelante na determinação do facto tributário e respectiva tributação;
34-A Fazenda Nacional ignora os princípios da segurança jurídica, da tipicidade tributária e da capacidade contributiva, cumpre relembrar a Constituição, a Lei Geral Tributária e o Código do I.M.T. e Código do I.S. nos quais os aludidos princípios são limite dos poderes tributários independentemente destes incidirem sobre o rendimento, consumo ou património;
35-Autoridade Tributária e Aduaneira na sua actuação violou a constituição e a lei. Os direitos e garantias dos contribuintes ora requerentes foram cerceados e sucessivamente negados;
36-A Fazenda Nacional faz tábua rasa dos princípios da segurança jurídica, da tipicidade tributária e da capacidade contributiva, cumpre relembrar a Constituição, a Lei Geral Tributária e o Código do I.M.T. e Código do I.S. nos quais os aludidos princípios são limite de toda a tributação independentemente de incidir sobre o rendimento, consumo ou património;
37-O legislador constituinte no artº.103, nº.2, da C.R.P., proclama o princípio da legalidade Tributária, segundo o qual: “Não Há Imposto sem Lei”, isto quer dizer, que a incidência objectiva e subjectiva da obrigação fiscal, taxas, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes estão necessariamente tipificadas em acto legislativo;
38-Os sujeitos passivos acreditam no Estado de Direito e reconhecem o valoroso papel da Administração Fiscal na realização da missão do Estado, no entanto a necessidade inelutável de receitas públicas não justifica o atropelo da lei e das garantias mais elementares dos contribuintes corporizadas no velho brocado: “Não Há Imposto sem Lei”;
39-A Fazenda Nacional faz tábua rasa dos princípios da segurança jurídica, da tipicidade tributária e da capacidade contributiva, cumpre relembrar a Constituição, a Lei Geral Tributária e o Código do I.M.T. e Código do I.S. nos quais os aludidos princípios são limite de toda a tributação independentemente de incidir sobre o rendimento, consumo ou património;
40-Os actos de liquidação são inválidos, por falta ou insuficiente fundamentação o que sempre determinou e determina o pedido de anulação dos actos de liquidação adicional e a impugnação da decisão arbitral;
41-Constituindo a fundamentação dos actos administrativos um imperativo constitucional como decorre do estatuído no nº.3, do artº.268, da Lei Fundamental e exigência reiterada e reforçada pela Lei Geral Tributária no seu artº.77, ora, a Administração tributária ao proceder à liquidação adicional não ofereceu às contribuintes ora impugnantes elementos que lhes possibilitassem conhecer quanto mais compreender o “iter” que conduziu ao resultado da sua decisão, como de resto reconhecem na douta decisão os Juízes Árbitros;
42-Os elementos de facto e direito que serviram de base à douta decisão do tribunal arbitral apresentam uma contradição insanável entre si;
43-O douto acórdão do tribunal arbitral reconhece que a Autoridade Tributária e Aduaneira não fundamentou os actos de liquidação adicional, isto é reconhece a violação do dever de fundamentação por parte desta contudo decide ao arrepio da Constituição e da Lei Geral Tributária reiterando a violação do Estado de Direito e a negação dos mais elementares direitos e garantias dos contribuintes na relação que estes têm com Estado, “in casu”, com a Autoridade Tributária e Aduaneira, que infelizmente exerce o poder tributário de forma cega e arbitrária, contrariando a Constituição, a L.G.T. e no fundo Estado de Direito;
44-Nestes termos e nos demais de direito aplicável, deverá a presente Impugnação ser julgada por provada e, consequentemente, dar a mesma como procedente, tudo com as legais consequências.
X
Contra-alegou a entidade impugnada, Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, a qual pugna pela confirmação do julgado, sustentando nas Conclusões o seguinte (cfr.fls.103 a 129 dos autos):
1-A decisão recorrida não enferma do vício que lhe é assacado;
2-Os fundamentos em que a decisão se sustenta em nada contrariam o sentido da mesma;
3-O alegado em 4 das alegações não é fundamento de impugnação, nos termos do nº.1, do artº.28, do RJAT;
4-Aliás, os impugnantes, limitam-se a repetir quanto já constava do pedido de pronúncia arbitral, aproveitando para aqui, alargarem os seus argumentos;
5-O que fazem, descrevendo a alegada realidade fáctica e prosseguindo aduzindo razões contra o acto da Autoridade Tributária;
6-Não basta alegar a existência de “contradição insanável entre os fundamentos e a decisão” (3 das alegações de impugnação);
7-Aos impugnantes cabe provar que os fundamentos invocados na decisão deveriam conduzir, num processo lógico, à solução oposta da que foi adoptada;
8-O recorrente arguiu também a nulidade da al.c) do mesmo nº.1, que estabelece ser uma decisão nula “Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão”. Esta nulidade está relacionada, por um lado, com a obrigação imposta pelos artºs.158 e 659, nºs.2 e 3, do Cód. Proc. Civil, de o juiz fundamentar os despachos e as sentenças e, por outro, pelo facto de a sentença dever constituir um silogismo lógico-jurídico, em que a decisão deverá ser a consequência ou conclusão lógica da conjugação da norma legal (premissa maior) com os factos (premissa menor). (...) Esta nulidade nada tem, no entanto, com “o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro da construção do silogismo judiciário”, que atrás se referiram, ou com a “inidoniedade dos fundamentos para conduzir à decisão” (...); Não existe a oposição, geradora desta nulidade, se o julgador erra na subsunção, que fez, dos factos à norma jurídica aplicável ou se, porventura, ele errou na interpretação da norma ou na indagação da norma aplicável. Se o juiz tiver entendido, erradamente, que os factos apurados acarretam determinadas consequências jurídicas e consegue exprimir tal entendimento nos fundamentos invocados e destes retira a conclusão lógica, haverá um erro de julgamento e mas não há a nulidade da oposição entre os fundamentos e a decisão. Ora, no caso sub judice, não resulta das conclusões, nem das próprias alegações em si, a existência de contradição lógica entre os fundamentos indicados na sentença e a decisão tomada, mas apenas a indicação de que com os elementos existentes na sentença, e sobretudo nos autos, se devia ter chegado a conclusões diferentes e que, consequentemente, as decisões deviam ter sido diferentes. Mas, como já repetidamente se disse atrás, aqueles invocados erros de julgamento não são a oposição entre os fundamentos e a decisão, que levaria à anulação daquele acórdão." - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 09/07/2002, proc. 02B331;
9-Ora, no caso, o que os impugnantes, veladamente, alegam são erros de julgamento e não a oposição entre os fundamentos e a decisão;
10-Donde, resulta não provada a alegada oposição entre os fundamentos da decisão e o sentido da mesma;
11-À Cautela, se assim não se entender, por mero dever de ofício, porque a presente impugnação segue o regime do recurso de apelação e, ainda, atento o facto de o tribunal arbitral se encontrar, já, dissolvido vai requerido o conhecimento do mérito da causa;
12-Os A. formulam pedido de anulação de actos de liquidação;
13-Mas, aos actos de liquidação não é assacado qualquer vício. As liquidações de IMT e IS notificadas aos A., como os próprios confessam em 18 da PI, são legais e inteiramente válidas e resultam da aplicação de critérios estritamente vinculados, objectivos, aos valores patrimoniais previamente fixados e anteriormente notificados aos A.;
14-O que os A. querem ver discutido nesta sede são os actos de fixação dos valores patrimoniais atribuídos, quer ao prédio rústico, quer aos 38 lotes de terreno para construção, a constituir naquele prédio;
15-A discordância dos A. reside, tão só, nos valores patrimoniais fixados àqueles prédios, e só a estes imputam vícios;
16-Como referem em 20 e 21 da PI, os A. discordam da actualização do valor patrimonial do prédio rústico porque, esta, não teve em conta os valores declarados pelos sujeitos passivos, nem o valor do mercado, nem as legítimas expectativas resultantes da possibilidade de urbanização. E discordam do valor de avaliação dos lotes de terreno para construção, imputando-lhe insuficiente fundamentação (24 da PI);
17-Em 31 da PI os A. explicitam a sua posição, novamente, e sempre, por referência à determinação da matéria colectável e à respectiva avaliação "sempre que se permutam bens presentes por bens futuros, a determinação da matéria colectável, impõe a avaliação de todos os bens nela envolvidos, a qual se fará após a celebração do respectivo contrato";
18-Nenhum vício vem assacado aos actos tributários de liquidação, apenas os actos de fixação dos valores patrimoniais enfermam, segundo defendem os A., de vícios que os inquinam;
19-Ora, o pedido de apreciação destas pretensões, previstas na parte final da alínea b) do nº.1 do artº.2° do Regime Jurídico da Arbitragem em matéria tributária (aprovado e regulado pelo Decreto-Lei n° 10/2011, de 20 de Janeiro), deve ser deduzido junto da presente instância, no prazo de 30 dias, por determinação da alínea b), do n° 1 do art. 10° do mesmo diploma;
20-Donde, tendo o pedido sido deduzido muito depois de decorrido aquele prazo, caducou o direito de acção;
21-Donde, resulta inequívoca e se deixa invocada a intempestividade do presente pedido de pronúncia arbitral;
22-Sem conceder, por mero dever de patrocínio, impugnamos;
23-A actuação da administração fiscal pautou-se pela estrita legalidade, designadamente pela conjugação do n° 1 do art. 15° do DL 287/2003, de 12 de Novembro, do art. 27° n° 1 al. a), do mesmo diploma, do n° 2 al. a) deste artigo, do art. 27° n° 1 al. c) do regime transitório daquele diploma e da Portaria n° 1337/2003, de 5 de Dezembro;
24-No caso concreto, a transmissão operou-se por via da permuta do prédio rústico, inscrito na matriz predial urbana da freguesia e Concelho da Moita - um bem presente -por 38 lotes de terreno para construção, a constituir naquele prédio, - tendo declarado como valor correspondente de cada bem permutado, o mesmo valor de € 2.500.000,00;
25-A al.b) do n° 5 do art. 2° do CIMT sujeita a IMT as permutas, pela diferença declarada de valores ou pela diferença entre os valores patrimoniais tributários, consoante a que for maior, à semelhança do que já sucedia com o CIMSSD;
26-A base tributável do imposto é, pois a diferença declarada de valores, quando superior à diferença entre os valores patrimoniais tributários (art. 12°, regra 4ª.);
27-Se a diferença entre os valores patrimoniais tributários for superior, é esta diferença que constitui a base tributável;
28-Se assim não fosse, estaria encontrada a forma de driblar a tributação das permutas. Bastaria que as partes atribuíssem aos bens a permutar o mesmo valor. Como tentaram os A.;
29-Cabe perguntar se o argumento que usam para justificar o valor que atribuíram ao prédio presente, "valores praticados pelo mercado e as legítimas expectativas jurídicas resultantes da possibilidade de urbanização em razão do deferimento em 09/09/2003 pelo Município da Moita do pedido de licenciamento para operação de loteamento", valerá, também, para justificar o valor pelo qual o haviam adquirido 3 anos antes?
30-O elevadíssimo valor, que alegam ter pago pelo bem rústico em 02 de Fevereiro de 2001, mas não provam difere apenas do declarado em 30 de Janeiro de 2004 (3 dias antes do prazo de caducidade da isenção), em € 6.000,00;
31-Cabe, pois, indagar se em 3 anos, o prédio valorizou apenas 6.000?, se os valores praticados pelo mercado, entre 2001 e 2003, tempos de conhecida e notória especulação imobiliária, variaram, numa razão de € 2.500.000,00 apenas € 6.000,00?
32-E quanto às “legítimas expectativas jurídicas resultantes da possibilidade de urbanização em razão do deferimento em 09/09/2003 pelo Município da Moita do pedido de licenciamento para operação de loteamento” (21 da PI), que peso tiveram afinal no valor atribuído ao prédio? Valem como justificação para o valor atribuído em 2004, e em 2001?
33-Conhecedores do sistema fiscal, os A. atribuíram ao prédio em 2001 um valor sobre o qual saberiam estar isentos de SISA, porque o declararam como prédio para revenda;
34-Sendo certo que, esse mesmo valor seria, aproximadamente, o valor patrimonial dos bens futuros, avaliados nos termos dos n°s 2 e 3 do artº.14° do CIMT - donde resultaria ausência total de tributação;
35-O n° 2 do artº.14° do CIMT estabelece uma regra especial de acordo com a qual “no caso de contratos de permuta de bens presentes por bens futuros, a avaliação do bem futuro será efectuada quando o bem adquirir a natureza de prédio, nos termos do CIMI”, considerando-se para aquele efeito que “o bem futuro adquire a natureza de prédio quando, no caso de imóveis urbanos a construir, já se encontre aprovado o respectivo projecto de construção” (n° 3 do art. 14°);
36-E isto ainda que, à data da permuta, os bens não tivessem a natureza de bens futuros, porquanto já tinha sido desencadeado o processo de avaliação dos 38 lotes, tendo por base uma declaração modelo 1 de IMI, apresentada em 24/01/2004;
37-No que toca a IS, face ao quadro legal - o art. 1°, n° 1, verba 1.1 da tabela geral do Imposto de Selo e Lei n° 60-A/2005, de 30 de Dezembro, que veio aditar o n° 4 do art. 9° do CIS - e à diferença declarada de valores entre os bens permutados (que, no caso, não existe) a Administração Fiscal procedeu a uma liquidação inicial de valor nulo;
38-“In casu”, o bem futuro permutado não é um imóvel a construir, mas 38 lotes de terreno para construção, a constituir no prédio rústico correspondente ao bem presente permutado;
39-O facto de se tratar da 1a transmissão operada na vigência do IMI obrigou à avaliação dos prédios urbanos recebidos/permutados, de acordo com o novo modelo de avaliações previsto no CIMI, avaliação que se fez totalmente com base em factores objectivos, e de que resultou o valor de € 2.917.140,00, valor que não foi objecto de contestação pelos A.;
40-Assim, também, e face ao regime transitório fixado para os prédios rústicos, a Administração Fiscal procedeu à actualização do valor patrimonial tributário do prédio rústico permutado, com base no coeficiente de desvalorização da moeda previsto na Portaria n° 1337/2003, de 5 de Dezembro;
41-Donde, é inequívoco que a Administração Fiscal cumpriu, na íntegra, o disposto na lei;
42-Não atendendo, porque não tinha, nem o podia fazer, ao valor de mercado do prédio rústico, sob pena, outrossim, de violação do princípio da legalidade a que se encontra vinculada legal e constitucionalmente;
43-O recurso ao valor normal de mercado, apenas é admissível quando o valor dos bens não possa ser determinado por aplicação do CIMI - vide n° 4 do art. 14° do CIMT;
44-O que não é o caso, porque a lei prevê 3 modelos de avaliação dos prédios rústicos, bem como o modelo de avaliação dos prédios urbanos e um regime transitório enquanto não for efectuada a avaliação geral da propriedade imobiliária;
45-Além de que, não é verosímil que um prédio rústico tenha o mesmo valor que a soma de 38 lotes de terreno para construção!
46-É que, os bens recebidos em permuta pelos A. são lotes de terreno para construção, o que significa que, dependem de uma série de operações físicas - obras de urbanização - decorrentes da concretização da operação de loteamento;
47-O valor atribuído aos lotes permutados há-de reflectir, já, todos estes custos;
48-Pelo que, é impossível que a soma do valor dos lotes seja igual à do valor do prédio de origem. A soma do valor dos lotes, há-de, sempre, ser consideravelmente superior;
49-Porque, podendo fazê-lo, não usaram da faculdade do art.° 130, n° 3 a), do CIMI, com vista à actualização do valor patrimonial do prédio rústico a que, agora, em seu benefício pretendem atribuir o valor de € 2.500.000,00;
50-Na verdade, nunca os A. mostraram qualquer desagrado pelo valor patrimonial do prédio rústico que deram em permuta, assim beneficiando de liquidações de contribuição autárquica e IMI, com base no valor patrimonial tributável constante do cadastro, que não quiseram actualizar, mas que agora pretendem contestar;
51-Não o tendo feito, a Administração Fiscal não podia atribuir outro valor patrimonial ao prédio rústico, para efeitos de liquidação, que não aquele que resulta da aplicação do coeficiente de desvalorização monetária ao valor patrimonial tributário do mesmo;
52-Nem outro poderia ter sido o valor patrimonial fixado para os prédios urbanos (lotes);
53-Quanto à alegada insuficiência de fundamentação, desde logo, os critérios de avaliação dos lotes de terreno não têm que constar da liquidação, mas sim do acto administrativo de avaliação, que os A. não contestaram;
54-E, mesmo aqui, é ampla a jurisprudência que considera que, face à objectividade dos parâmetros legais de fixação do valor patrimonial previstos no CIMI para os prédios urbanos, tal fundamentação está suficientemente assegurada quando seja indicada a localização dos prédios e a referência do quadro legal aplicável para que se compreenda como foi determinado o valor patrimonial tributário;
55-E, quanto à fundamentação da liquidação adicional, desde que seja possível extrair do acto de liquidação, qual o percurso cognoscitivo e valorativo seguido pelo agente, bem como conhecer as razões de facto e de direito que determinaram a sua prática, forçoso é concluir que o mesmo se apresenta devidamente fundamentado;
56-Pelo que, contrariamente ao que vem arguido, a referida fundamentação está em tudo conforme à doutrina que emana do Ac. do STA de 22.02.2006, proc. 01077/05, uma vez que habilitou, amplamente, os A. a reagirem, quer graciosa quer contenciosamente;
57-Resulta claro, das diversas petições, que os A. perceberam a forma como foram apurados os valores patrimoniais e, bem assim, reconhecem a base legal que sustentou as consequentes liquidações adicionais. Simplesmente, discordam do facto de não ter sido avaliado o prédio rústico permutado, nos termos do CIMI, alegando que, sempre que se permutarem bens presentes por bens futuros a determinação da matéria colectável impõe a avaliação de todos os bens nela envolvidos (31 da PI);
58-No entanto, se esta argumentação era válida no âmbito do Código do Imposto Municipal de Sisa, por imposição da regra 8a do parágrafo 3° do art. 19° do respectivo código, já o não é para efeitos de IMT, porquanto o respectivo código não dispõe de norma semelhante, remetendo a matéria de avaliação para o Código do IMI - art. 14° do CIMT;
59-O CIMT não prevê a avaliação de todos os imóveis nos contratos de permuta de bens presentes por bens futuros, tal como não o prevê no caso de permuta de bens presentes por bens igualmente presentes, com valores desajustados do mercado, como pretendem os A.;
60-Também não têm razão os A. ao afirmar que a Administração Fiscal não teve em conta a data da celebração do contrato de permuta quando efectuou a liquidação adicional;
61-O artº.16° do CIMT determina que "o valor patrimonial tributário para efeitos deste imposto é o valor dos bens imóveis inscritos na matriz à data da liquidação.";
62-Ora o valor patrimonial dos prédios urbanos foi determinado com base no valor patrimonial tributário vigente à data da liquidação e não com base em qualquer outro;
63-E o coeficiente de desvalorização monetária previsto na Portaria 1334/2003, de 5 de Dezembro, foi aplicado ao valor patrimonial tributário do prédio rústico vigente à data da liquidação e não ao VPT inicial;
64-Logo, as liquidações ora impugnadas fundam-se num quadro normativo legal, obrigatório, pelo que não enfermam de qualquer tipo de ilegalidade;
65-Nestes termos, nos mais de direito, e com o mui douto suprimento de V. Exas., deve ser rejeitada a impugnação, por falta de fundamento, ou, se assim não se entender, deve ser julgada improcedente a impugnação, com as devidas e legais consequências, ou, se assim não for decidido, deve, quanto ao pedido de pronúncia arbitral, ser julgada procedente a invocada excepção, ou, se assim não se entender, julgado improcedente o pedido, absolvendo-se a requerida, como é de Direito e de Justiça.
X
Os impugnantes responderam à excepção de caducidade do direito de acção pugnando pela sua improcedência (cfr.fls.139 e 140 dos autos).
X
Foi cumprido o artº.146, nº.1, do C.P.T.A. (“ex vi” do artº.27, nº.2, do dec.lei 10/2011, de 20/1), tendo o Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitido pronúncia sobre a presente impugnação no sentido da não admissão da mesma por falta de fundamento legal (cfr.fls.147 dos autos).
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Corridos os vistos legais (cfr.fls.149 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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Não tendo havido impugnação da matéria de facto nas conclusões do recurso deduzido, igualmente não se vislumbrando a necessidade de alteração da factualidade constante do probatório, o Tribunal remete para a decisão arbitral impugnada, a qual julgou provada a matéria de facto inserta a fls.363 a 367 do processo administrativo apenso e se dá aqui por integralmente reproduzida (cfr.artº.713, nº.6, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.29, nº.1, al.e), do dec.lei 10/2011, de 20/1).
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a decisão impugnada julgou improcedente a petição que originou o procedimento arbitral, em consequência do que manteve os actos tributários objecto dos presentes autos, as liquidações adicionais de I.M.T. e de Imposto de Selo, no valor global de € 212.113,36.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.685-A, do C.P.Civil, “ex vi” dos artºs.140, do C.P.T.A., e 27, nº.2, do dec.lei 10/2011, de 20/1).
Começa o Tribunal pela apreciação da alegada caducidade do pedido de pronúncia arbitral, chamada à colação pela entidade impugnada nas conclusões 19 e 20 das contra-alegações.
Tal excepção já foi decidida pelo Tribunal Arbitral na decisão ora impugnada, sendo julgada totalmente improcedente.
Concorda este Tribunal com a decisão de tal excepção, baseada no facto do pedido de constituição do Tribunal arbitral ter sido deduzido no prazo de noventa dias a que alude o artº.10, nº.1, al.a), do dec.lei 10/2011, de 20/1 (RJAT), assim sendo inquestionável a sua tempestividade.
Concluindo, improcede a excepção de intempestividade da presente impugnação aduzida pela entidade impugnada.
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Os impugnantes dissentem do julgado alegando, em síntese e conforme aludido supra, que pretendem a anulação dos actos de liquidação adicional com fundamento na insuficiente e errónea fundamentação dos mesmos. Que a fundamentação apresentada pela Administração Fiscal Estadual, nos actos de liquidação adicional omite a forma como, em concreto, chegaram ao apuramento dos valores liquidados. Que os impugnantes não se conformam, porque, sabem que não é possível aceitar que a fundamentação do valor apurado e liquidado seja resultado da aplicação automática dos factores indicados na Portaria nº.1337/03, de 5/12, fazendo-se tábua rasa do valor constante do contrato de permuta. Que a Fazenda Nacional ignora os princípios da segurança jurídica, da tipicidade tributária e da capacidade contributiva, cumpre relembrar a Constituição, a Lei Geral Tributária e o Código do I.M.T. e Código do I.S. nos quais os aludidos princípios são limite dos poderes tributários independentemente destes incidirem sobre o rendimento, consumo ou património. Que não existem na fundamentação apresentada pelos serviços, quaisquer elementos concretos sobre os critérios que conduziram ao valor decorrente da avaliação. Que os elementos de facto e direito que serviram de base à douta decisão do tribunal arbitral apresentam uma contradição insanável entre si. Que o douto acórdão do tribunal arbitral reconhece que a Autoridade Tributária e Aduaneira não fundamentou os actos de liquidação adicional, isto é reconhece a violação do dever de fundamentação por parte desta, contudo decide ao arrepio da Constituição e da Lei Geral Tributária reiterando a violação do Estado de Direito e a negação dos mais elementares direitos e garantias dos contribuintes na relação que estes têm com Estado, “in casu”, com a Autoridade Tributária e Aduaneira, que infelizmente exerce o poder tributário de forma cega e arbitrária, contrariando a Constituição, a L.G.T. e no fundo Estado de Direito (cfr.conclusões 1 a 43 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo assacar à decisão arbitral recorrida vício que enquadra no artº.28, nº.1, al.b), do RJAT.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal pecha.
A possibilidade de existência de Tribunais arbitrais surgiu na Constituição da República a partir da sua revisão em 1982 (cfr.artº.211, nº.2, da C.R.P.), actualmente estando consagrada no artº.209, nº.2, do diploma fundamental (cfr.J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.550 e seg.).
A arbitragem encontra, assim, um espaço próprio por onde pode começar a irradiar. Com efeito, face aos crescentes níveis de litigação, que se tornam absolutamente incomportáveis para o sistema de justiça tradicional, os Tribunais arbitrais voluntários têm vindo a assumir-se como uma verdadeira alternativa para os cidadãos resolverem os seus litígios.
O regime da arbitragem voluntária em direito tributário foi introduzido pelo RJAT, sendo que os Tribunais arbitrais têm competência para apreciar um conjunto vasto de pretensões, as quais vêm taxativamente elencadas na enumeração constante do artº.2, nº.1, do citado diploma. Mais se dirá que o Tribunal arbitral tem a obrigação de decidir em conformidade com o direito constituído e não com recurso à equidade (cfr.artº.2, nº.2, do RJAT).
Os princípios processuais inerentes ao processo arbitral vêm referidos e elencados no artº.16, do RJAT, e, genericamente, são os mesmos princípios que se aplicam a um processo de partes, de que é exemplo o processo civil.
No que toca à possibilidade de recorrer de uma decisão proferida por um Tribunal arbitral pode, desde logo, referir-se que esta é muito limitada.
Assim, quando se tiver em vista controlar o mérito da decisão arbitral, isto é, o seu conteúdo decisório, o meio mais adequado para colocar em crise a decisão arbitral será o recurso.
Com efeito, em conformidade com o que se dispõe no artº.25, nº.1, do RJAT, é possível recorrer directamente para o Tribunal Constitucional da parte da decisão arbitral que ponha termo ao processo e que recuse a aplicação de qualquer norma com fundamento na sua inconstitucionalidade, bem como nos casos em que aplique uma qualquer norma jurídica cuja inconstitucionalidade seja levantada no decurso do processo.
Por outro lado, admite-se ainda a possibilidade de recurso com fundamento em oposição de acórdãos, isto nos termos do que determinam os nºs.2 e 3, do artigo em apreço. Este recurso é endereçado à Secção Tributária do Supremo Tribunal Administrativo, sempre que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida estiver em oposição, relativamente à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido ou pelo Tribunal Central Administrativo ou Supremo Tribunal Administrativo. Neste caso, os trâmites do recurso a observar são os do regime dos recursos para uniformização de jurisprudência, aplicando-se o disposto no artº.152, do C.P.T.A.
Note-se que, em termos práticos, só há uma via de recurso: ou directamente para o Tribunal Constitucional, com fundamento em (in)constitucionalidade, ou directamente para o Supremo Tribunal Administrativo, em caso de oposição de acórdãos.
Pelo contrário, quando se pretenda controlar a decisão arbitral em si, nos seus aspectos de competência, procedimentais e formais, o meio adequado será já a impugnação da decisão arbitral (cfr.artºs.27 e 28, do RJAT).
Nos termos da lei, a regra é que é possível que a decisão do Tribunal arbitral seja anulada pelo Tribunal Central Administrativo competente. Esta impugnação - que em bom rigor se trata de um recurso - deve ser deduzida, sob pena de não admissão por intempestividade, no prazo de quinze dias contados da notificação da decisão arbitral, ou da notificação referida no artº.23, do diploma em apreço. Porém, neste último caso, a decisão arbitral terá que ter sido proferida por Tribunal colectivo, cuja constituição tenha sido requerida nos termos do artº.6, nº.2, al.b), do RJAT.
Já no que toca aos fundamentos da impugnação da decisão arbitral, vêm estes elencados no texto do artº.28, nº.1, do RJAT. São eles, taxativamente, os seguintes:
1-Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
2-Oposição dos fundamentos com a decisão;
3-Pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia;
4-Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artº.16, do diploma.
Ou seja, os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reacção da decisão dos Tribunais arbitrais para os T. C. Administrativos, consistem na impugnação de tal decisão, consagrada no artº.27, com os fundamentos que se ancorem nos vícios de forma expressamente tipificados no artº.28, nº.1, e atrás elencados, correspondendo os três primeiros aos vícios das sentenças dos Tribunais tributários, nos termos do plasmado no artº.125, nº.1, do C.P.P.T., com correspondência ao estatuído nas alíneas b), c) e d), do artº.668, nº.1, do CPCivil.
E se algumas dúvidas pudessem subsistir sobre o que se vem de afirmar, elas dissipar-se-iam por força dos elementos sistemático, teleológico e histórico, considerando, por um lado, o regime jurídico dos vícios em causa, tal como disciplinado pelo C.P.P.T., e, por outro, a intenção do legislador expressamente manifestada na parte preambular do diploma em causa, quando e ao que aqui releva, refere que “(…) A decisão arbitral poderá ainda ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo com fundamento na não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, na oposição dos fundamentos com a decisão, na pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia ou na violação dos princípios do contraditório e da igualdade de partes (…)”. Assim manifestando o legislador, de forma inequívoca, uma enumeração taxativa dos fundamentos de impugnação das decisões arbitrais para os T. C. Administrativos (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/2/2013, proc.5203/11; Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, 2013, pág.234 e seg.).
Voltando ao caso concreto, o impugnante fundamenta o seu apelo para este Tribunal no citado artº.28, nº.1, al.b), do RJAT, alegando que a decisão arbitral recorrida padece do vício de oposição dos fundamentos com a decisão.
Nos termos do preceituado no citado artº.668, nº.1, al.c), do C. P. Civil, é nula a sentença (ou acórdão) quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artº.158, nº.1, do C.P.Civil. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.141 e 142; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.689 e 690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36 e 37).
No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.361 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 18/2/2010, rec.1158/09; ac.S.T.A-2ª.Secção, 4/5/2011, rec.66/11).
No caso “sub judice”, não vislumbramos que a decisão do Tribunal Arbitral objecto do presente incidente padeça da nulidade em análise. Os impugnantes também não concretizam em que consista a nulidade sob apreciação.
Examinando a decisão do Tribunal Arbitral objecto da presente impugnação, cuja cópia certificada se encontra a fls.347 a 430 do processo administrativo apenso, considera a mesma que os actos tributários objecto dos presentes autos não padecem do vício de falta de fundamentação formal, tal como não violam as normas substantivas de liquidação de I.M.T. e I. Selo, em consequência do que, no dispositivo, julga totalmente improcedente a impugnação e absolve a Autoridade Tributária e Aduaneira do pedido.
Atento o acabado de mencionar, conclui-se pela inexistência da alegada nulidade de oposição dos fundamentos com a decisão, por parte da deliberação arbitral impugnada.
Quanto a tudo o restante aduzido pelos apelantes nas conclusões da impugnação não constitui fundamento legal da mesma, assim não sendo de conhecer por este Tribunal, tudo conforme mencionado supra para onde se remete.
Finalizando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente a presente impugnação e, em consequência, confirma-se a decisão arbitral recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em JULGAR IMPROCEDENTE A PRESENTE IMPUGNAÇÃO E CONFIRMAR A DECISÃO ARBITRAL que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o impugnante em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 21 de Maio de 2013



(Joaquim Condesso - Relator)

(Eugénio Sequeira - 1º. Adjunto)


(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)