Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09985/13
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:04/16/2015
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:POSTO DE ABASTECIMENTO DE COMBUSTÍVEIS; ESTRADA NACIONAL; FISCALIZAÇÃO; LICENCIAMENTO; PUBLICIDADE.
Sumário:i) Nos termos do disposto no art. 668.º, n.º 1, al. c), do CPC (o art. 615.º, n.º 1, al. b), na actual versão do CPC), é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão, ou seja, quando exista uma contradição formal entre os fundamentos de facto ou de direito e o segmento decisório da sentença.

ii) Constituindo a sentença um silogismo lógico-jurídico, de tal forma que a decisão seja a conclusão lógica dos factos apurados, aquela nulidade só se verifica quando das premissas de facto e de direito se extrair uma consequência oposta à que logicamente se deveria ter extraído.

iii) A fiscalização das condições de funcionamento regular e seguro dos postos de abastecimento de combustíveis em estradas concessionadas à EP-Estradas de Portugal, S.A cabe a esta entidade, que continua a deter as atribuições previstas no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro (com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de Janeiro), para a autorização ou licenciamento de estabelecimentos ou ampliação de postos de combustível, instalados na sua área de jurisdição.

iv) Por força, primeiro do Decreto-Lei nº 637/76, de 29 de Junho, e, posteriormente, da Lei nº 97/88, de 17 de Agosto (art. 2º, nº 2) o inciso “aprovação ou licença” da Junta Autónoma das Estradas, constante do art. 10.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, foi derrogado e desgraduado na emissão de parecer.

v) Passando o licenciamento da afixação e inscrição de mensagens de publicidade a ser atribuído de forma universal às câmaras municipais, na área do respectivo concelho, sem prejuízo da intervenção obrigatória, mas não vinculativa, através da emissão do respectivo parecer, de entidades terceiras com jurisdição exclusiva para defesa de interesse públicos específicos que têm de ser tidos em conta na emissão de licença final pelo respectivo município.

vi) Depois da entrada em vigor da Lei n.º 97/88, a EP – Estradas de Portugal, S.A., deixou de ter competência para licenciar a afixação de mensagens publicitárias, carecendo de igual modo de competência para iniciar o respectivo procedimento
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

C........... Portuguesa..............., SA (C......) e EP-Estradas de Portugal, SA (EP), respectivamente Autora e Entidade Demandada na acção administrativa especial com o n.º 1206/10.0BEALM que correu termos no TAF de Almada, vieram, na parte em que decaíram, interpor recurso jurisdicional do acórdão proferido naquele TAF que julgou a acção parcialmente procedente por provada e anulou o acto impugnado, através do qual a EP determinou à C.......... a apresentação de um projecto de publicidade afixada no Posto de Abastecimento de Combustíveis, localizado na EN 103, Km 232+700, em Vinhais, por vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito com as demais consequências legais.

No primeiro dos recursos, a Recorrente C.............., terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

a) A sentença Recorrida deve ser anulada por erro de julgamento atenta a errónea aplicação do direito aos factos;

b) O Tribunal Recorrido negou provimento ao pedido de declaração de nulidade ou anulação do acto impugnado, mas não pode a Recorrente conformar-se com tal decisão e muito menos com os fundamentos nela contidos;

c) No que respeita ao licenciamento das obras sobre que o acto impugnado incide, o Tribunal Recorrido não procedeu a uma análise correcta dos diversos regimes legais e das leis que se têm sucedido no tempo, desde o Decreto-Lei 13/71 de 23 de Janeiro em diante, fazendo tábua rasa de todo o argumentário alegado e devidamente sustentado pela ora Recorrente;

d) De facto, a ora Recorrente demonstrou cabalmente a ausência de legitimidade e incompetência da EP para instaurar um procedimento de licenciamento de obras;

e) Com efeito, e tal como decorre da p.i. da ora Recorrente, a legislação aplicável é muito clara no sentido de que a competência o licenciamento de obras e de postos de abastecimento de combustíveis é das Câmaras Municipais e das Direcções Regionais do Ministério da Economia, conforme os casos;

f) Tal conclusão resulta evidente de uma mera análise do Decreto-Lei nº 246/92, de 30 Outubro, do Decreto-Lei n.º 302/2001, do Decreto-Lei nº 260/2002, do Decreto-Lei n.º 260/2002, do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de Novembro, e do Decreto-Lei n.º 195/2008, de 6 de Outubro;

g) Vigora actualmente nesta matéria o Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de Novembro – revisto pelo Decreto-Lei n.º 195/2008, de 6 de Outubro;

h) Deste diploma resulta claramente que a competência para proceder ao licenciamento de postos de abastecimento de combustível passou a ser atribuída ou às Direcções Regionais do Ministério da Economia, ou às Câmaras Municipais, consoante os postos estivessem, ou não, localizadps nas redes viárias nacional ou regional; senão vejamos.

i) No art. 1.º, alínea a) refere-se que o diploma estabelece os procedimentos e define as competências para efeitos de licenciamento e fiscalização, designadamente, de posto de combustíveis;

j) No art. 3.º, alínea f) define-se como sendo a 2entidade licenciadora e fiscalizadora, a entidade da administração central ou local competente para coordenação do processo de licenciamento ou de controlo prévio e para a fiscalização do cumprimento do disposto no presente diploma e dos regulamentos relativos às instalações por ele abrangidas”;

k) No art. 3.º, alínea h) refere-se que a expressão instalações de abastecimento de combustíveis é equivalente a postos de abastecimento de combustíveis;

l) No art. 3.º, alínea k) determina-se que o licenciamento é o conjunto de procedimentos e diligências necessário à tomada de decisão sobre um pedido de instalação para armazenamento ou para abastecimento de combustíveis, centralizados pela entidade licenciadora, e com a participação do requerente e de todas as entidades que, em virtude de competências próprias ou da natureza do projecto, devam ser consultadas;

m) De acordo com o artigo 4.º n.º 1 a construção, exploração, alteração de capacidade, renovação de licença e outras alterações que, de qualquer forma afectem as condições de segurança da instalação ficam sujeitas a licenciamento nos termos do diploma em apreço;

n) Já a competência para o licenciamento de postos de abastecimento combustível é atribuída às Câmaras Municipais nos casos em que os postos de abastecimento não se encontram localizados nas redes viárias regional e nacional - cfr. o artigo 5°, nº 1. alínea b), enquanto que no caso dos postos de abastecimento de combustíveis situados na rede viária regional e nacional a competência para o respectivo licenciamento é das Direcções Regionais do Ministério da Economia – cfr o artigo 6º, n.º 3, alínea a);

o) A sentença recorrida considera que o regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 267/2002 deveria coexistir com Decreto-Lei nº 13/71 na matéria da competência para licenciar obras nos postos de combustível, visto que têm como objecto prosseguir fins diferentes;

p) Mas não tem qualquer razão, no que ao tema dos autos respeita, visto que, se assim fosse, acabaríamos numa situação extraordinária de competências alternativas ou excludentes - consoante a entidade que prevenisse a jurisdição -, em que tanto as entidades referidas no Decreto-Lei nº 267/2002, como a então JAE - hoje EP -, teriam competência para a prática do mesmo acto, a saber para licenciar obras em postos de combustível – o que é um absurdo.

q) Com efeito, o facto de se assumir que cada entidade tem a seu cargo a prossecução de um fim específico - o que é uma conclusão elementar, dado o consabido princípio da especificidade dos fins das pessoas colectivas -, não significa que de aí se possa extrair a conclusão que uma norma de competência que, em 2002, atribui a uma entidade o poder para o licenciamento das obras nos postos de combustível, tenha que ser interpretada no sentido de o seu comando ter excepcionado de modo totalmente incompreensível um preceito anterior, que, logicamente revogou;

r) Caso assim não fosse e se as EP aprovarem, contra o disposto no Decreto-Lei nº 267/2002 o licenciamento de um posto de abastecimento de combustível, fica prejudicada a competência das entidades referidas nesse diploma?

s) E se for ao contrário, i.e., se forem uma das entidades a referidas no Decreto-Lei nº 267/2002 a licenciar as obras, ficam as EP impedidas de o fazer? ...

t) É que uma coisa é a prossecução dos fins das pessoas colectivas, outra coisa totalmente diferente é a distribuição, pela lei, da competência para a prática de certos actos por essas pessoas colectivas, sendo que a competência só em casos excepcionais - o que não ocorre claramente na matéria dos autos - pode ser partilhada;

u) Em suma, o facto da conclusão de que cada entidade prossegue os seus fins específicos não permite inferir que a norma de competência aprovada pelo Decreto­Lei nº 267/2002 deva coexistir com uma outra norma aprovada vinte anos antes e que com ela é contraditória;

v) Termos em que é forçoso concluir, de acordo com as regras da interpretação da lei e da sua aplicação no tempo, que a norma posterior revoga a norma anterior e que, por essa razão, a competência para o licenciamento das obras nos postos de combustível é hoje, já não da então JAE/EP, mas sim das câmara municipais ou das Direcções Regionais do Ministério da Economia;

w) São devidas taxas pela apreciação dos pedidos de aprovação dos projectos de construção ou de alteração, a definir em portaria conjunta dos membros do governo responsáveis pelas áreas das finanças e da economia consoante a entidade licenciadora seja o município ou as Direcções Regionais do Ministério da Economia –cfr. o artigo 22.º;

x) Resulta ainda do diploma que o pedido de licenciamento é apresentado à entidade competente a quem incumbe a instrução do processo, a qual deve consultar as entidades que, nos termos da lei devam dar parecer;

y) Cm efeito, procedimento de licenciamento é regulado nos artigos 7° e ss. sendo de realçar os seguintes aspectos: (i) a entidade instrutora do procedimento é a entidade competente para aprovar o projecto e conceder a licença de exploração do posto de combustível – cfr. os artigos 7º, n.º 1, 13º e 14º, ii) De acordo com os artigos 9º a 11º são consultadas as entidades cujos pareceres sejam legalmente exigidos;

z) Resulta finalmente, que a fiscalização do cumprimento das regras previstas no diploma é da competência das Câmaras Municipais ou das Direcções Regionais do Ministério da Economia, conforme a entidade licenciadora seja o município ou o Estado - cfr. os artigos 25° e ss.;

aa) E que a competência para aplicar as coimas pertence ao presidente da câmara ou ao director regional do ministério da Economia;

bb) Resulta, pois, claro da legislação aplicável que a competência para proceder ao licenciamento da construção, exploração, alteração da capacidade renovação de licença e outras alterações que de qualquer forma afectem as condições de segurança das instalações é das Câmaras Municipais ou das Direcções Regionais do Ministério da Economia, e não das EP;

cc) Assim como resulta claro que as EP não são competentes para ordenar a realização dessas obras, nem de impor a apresentação de projectos nem, finalmente, de aplicar sanções pelas alegadas infracções que invoca no despacho em crise nos autos, visto que competência necessária à prática desses actos é de órgãos de outras pessoas colectivas: dos municípios e do Estado

dd) Por todas as razões supra expostas, é ilegal o acto administrativo que ora se impugna, removido da ordem jurídica nos termos do artigo 133.º do CPA, ou, caso assim não se entenda, nos termos do artigo 135.º do CPA;

ee) Incorreu assim a sentença Recorrida em erro de julgamento por errónea aplicação do direito aos factos, ao conferir legitimidade à EP para ordenar a realização de obras no PAC de Vinhais.

ff) Deve, pois, a sentença Recorrida ser anulada por esse Douto Tribunal Central Administrativo e a respectiva decisão substituída por uma que dê provimento ao presente Recurso.

gg) Além do mais, no tocante ao InIR, sempre será de referir que este Instituto sucedeu nas competências das então Estradas de Portugal, E.P.E. na supervisão das infra-estruturas rodoviárias.

hh) Semelhante circunstancialismo resulta claro do disposto nos artigos 12°, alínea d) e 23° do Decreto-Lei nº 148/2007, de 27 de Abril e bem assim do regime jurídico das Estradas de Portugal aprovado pelo Decreto-Lei nº 347/2007, de 7 de Novembro, designadamente o artigo 4°, bem como com as Bases da Concessão Rodoviária Nacional atribuída à Recorrida, aprovadas pelo Decreto-Lei nº 380/2007, de 13 de Novembro, e do contrato de concessão aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 174-A/2007, de 23 de Novembro.

ii) É, pois, lícito concluir que o InIR sempre terá sucedido à Recorrida na competência prevista no artigo 15° do Decreto-Lei nº 13/71, pelo que o acto impugnado padece, nesta linha de argumentação, dos vícios de incompetência absoluta e de violação de lei, aplicando assim normas jurídicas a factos que não se lhe subsumem, pelo que é também por esta razão ilegal e anulável.

jj) Por todas as razões supra expostas, é ilegal o acto administrativo em causa, devendo o mesmo ser declarado parcialmente nulo, nos termos do artigo 133.º do CPA, ou, caso assim não se entenda, ser parcialmente anulado de acordo com o disposto no artigo 135.º do CPA.

Termos em que se deve dar provimento ao presente recurso e revogada a sentença recorrida, atento o erro de julgamento, tudo com as consequências legais que daí são emergentes.


A Recorrida, Estradas de Portugal, contra-alegou, advogando que a sentença recorrida, no segmento que julga improcedente o alegado vício de incompetência da EP, S.A., para a decisão que determinou a apresentação de projecto de obras por referência quer às competências das Direcções Regionais do Ministério da Economia, quer por referência às competências do InIR, IP, deve manter-se porque fez a melhor aplicação do Direito aos factos, não incorrendo em nenhum dos erros invocados pela Recorrente.



No segundo recurso, a Recorrente, Estradas de Portugal, terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

I. O acórdão proferido pelo Tribunal a quo deve ser declarado nulo, ao abrigo da al. c) do nº1 do art.º 668° do CPC, ou se não, revogado porque desconforme com o direito, ao abrigo do art. 685°-A, nº1, al. b) do CPC, na parte em que declara a anulabilidade do ato por vício de violação de lei por erro nos pressupostos direito, ao considerar que pese embora a EP tenha competência para determinar à Recorrida a apresentação de um projeto para legalização da afixação da publicidade à margem da EN 103, devia ter indicado que o referido projeto deveria ser presente pela Recorrida à CM.

II. Os fundamentos estão em oposição com a decisão, porquanto o Tribunal ao considerar, e bem, que a Lei nº 97/88 não revogou as disposições do DL nº13/71, com a natureza de lei especial; que os valores tutelados num e noutro regime são distintos; e que a EP mantém a competência para o licenciamento ou autorização para a afixação da publicidade à margem das estradas sob sua jurisdição, aponta para decisão diferente, no sentido de que o ato não padece do vício de violação de lei.

III. É contrário ao direito afirmar que a EP tem competência para licenciar e intimar à prática de um determinado comportamento, atenta a violação ao disposto no DL n.º 13/71, por afixação de publicidade sem a sua permissão, e concluir que a referida reposição da legalidade deveria correr termos junto da CM.

IV. Na sequência da sua atividade de fiscalização, e constatada que seja a afixação de publicidade sem que a EP a tenha permitido (por meio de ato administrativo), esta tem competência para intimar à reposição da legalidade perante si, por ser esta a entidade com competência exclusiva para o fazer.

V. Existem dois regimes de licenciamento da publicidade, que coexistem e se complementam (v. Acórdãos proferidos pelo STA, nos processos 0243/09, 0244/09, e 0140/11), não existindo nada na lei que permita concluir que o licenciamento municipal é prévio ao licenciamento da EP e que este deve ser concedido no âmbito do licenciamento que corre na câmara municipal.

VI. O regime jurídico a que se refere a Lei nº 97/88, não obsta à prática dos atos a que se refere o DL nº13/71, independentemente de os referidos atos serem praticados em fase prévia ao procedimento camarário, no seu decurso ou posteriormente.

VII. Em questão em tudo semelhante à dos presentes autos pronunciou-se recentemente esse Venerando Tribunal Administrativo Sul nos processos nº 09256/12 e 09389/12.

VIII. O Tribunal a quo ao decidir como decidiu fez errada interpretação e aplicação do disposto no art.º 10º, nº 1, al. b) do DL 13/71, de 23/01 e art.º 1º e 2º da Lei nº 97/88, de 17/08.

Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. mui doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida, por ser de JUSTIÇA

A Recorrida C.......... apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido nesta parte, entendendo, em síntese, que a EP apenas intervém no procedimento de licenciamento que corre os seus termos junto das Câmaras Municipais, não podendo exigir que este procedimento corra os seus termos, ab initio, junto de si.



Neste Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se pronunciou pela improcedência dos recursos.

Com dispensa de vistos (considerando a jurisprudência reiterada sobre cuja matéria versa o recurso), vem o processo submetido à Secção do Contencioso Administrativo para julgamento do recurso.



I. 1. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar:

i) Se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar que o acto praticado pela EP, SA, que ordenou a apresentação de projecto para a realização de obras, não padece de vício de incompetência por referência ao regime do licenciamento de instalações, em concreto em relação às Direcções Regionais do Ministério da Economia (1.ª recurso); e se

ii) A sentença recorrida é nula, por oposição entre os fundamentos e a decisão, ao considerar que pese embora a EP, SA tenha competência para determinar à C.......... a apresentação de um projecto para legalização da afixação da publicidade à margem da EN 103, devia ter indicado que o referido projecto deveria ser presente por esta junto da Câmara Municipal respectiva (2.º recurso).



II. Fundamentação

II.1. De facto

A matéria de facto pertinente é a constante da sentença recorrida, a qual se dá aqui por reproduzida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 713.º, n.º 6, do CPC (actualmente o art. 663.º, n.º 6) ex vi do art. 1.º do CPTA.



II.2. De direito

Em causa nos autos está o acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou parcialmente procedente a acção administrativa especial deduzida pela C.........., SA, Recorrente no 1.º recurso, contra a Estradas de Portugal, SA, através da qual pedia a declaração de nulidade ou a anulação do acto administrativo constante do ofício datado de 6.07.2010, nos termos do qual havia sido notificada para apresentar os projectos respeitantes à realização de obras e à legalização de publicidade no Posto de Abastecimento de Combustíveis sito em Vinhais na EN 103, ao Km 232+700.

Entendeu-se no Tribunal a quo, por um lado, que o acto impugnado não padecia do vício de incompetência em relação às competências das Câmaras Municipais porque a Estradas Portugal, SA apenas se limitava a solicitar o projecto, não praticando qualquer acto de licenciamento. Por outro lado, considerou-se que apesar de caber à entidade fiscalizadora – a EP, SA – ordenar o início do procedimento de legalização junto da Câmara Municipal respectiva, não lhe cabia solicitar directamente o projecto de legalização como aconteceu no caso dos autos.

A primeira questão a resolver, considerando o catálogo das questões objecto dos recursos, prende-se com a suscitada nulidade por contradição entre os fundamentos e a conclusão decisória contida na douta sentença recorrida, sendo esta, por isso, nula (2.º recurso). Começaremos então por aqui.

II.2.1. Da nulidade da sentença suscitada no 2.º recurso

Alega a Recorrente, Estradas de Portugal, SA, para fundar a assinalada nulidade que a admitir-se a solução preconizada na sentença recorrida de que a EP tinha competência para licenciar e intimar à prática de determinado comportamento, para depois concluir que a referida reposição da legalidade deveria correr junto da Câmara municipal respectiva (conclusão III do 2.º recurso).

Vejamos então.

Nos termos do disposto no art. 668.º, n.º 1, al. c) do CPC (o art. 615.º, n.º 1, al. c), do CPC na redacção da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho), é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que exista um vício de contradição formal entre os fundamentos de facto ou de direito e o segmento decisório da sentença. Constituindo a sentença um silogismo lógico-jurídico, de tal forma que a decisão seja a conclusão lógica dos factos apurados, aquela nulidade só se verifica quando das premissas de facto e de direito se extrair uma consequência oposta à que logicamente se deveria ter extraído. Nesta conformidade, importa ter presente que não ocorre a nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão se o julgador errou na subsunção que fez dos factos à norma jurídica aplicável ou se, porventura, errou na indagação de tal norma ou na sua interpretação.

Diga-se, ainda em jeito de intróito, que sobre este vício, escreveu Jorge Lopes de Sousa, ensinando que: “A oposição entre fundamentos e decisão também não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se” (cfr. Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, vol. II, 6.ª ed., p. 362).

No caso dos autos, interpretando o raciocínio plasmado na sentença recorrida temos que o Tribunal a quo fixou uma primeira premissa de base, que deixou expressa, que se consubstancia na clara separações de atribuições e de competências entre a EP, SA e as Câmaras Municipais. Ou seja, concluiu que o processo de licenciamento tem o seu curso junto das câmaras municipais, sem prejuízo, porém, da competência própria das EP, SA para emissão de parecer.

Nessa sequência, o Tribunal a quo concluiu que à EP, SA não era lícito solicitar directamente ao interessado o projecto de legalização, como aconteceu no caso dos autos, de acordo com a interpretação que fez do art. 2.º da Lei n.º 97/88. Caberia, quando muito, ordenar o início do procedimento de legalização junto da Câmara Municipal respectiva.

Temos para nós que o silogismo que se pretendia apresentar – independentemente de este estar certo ou errado –, considerando as demais premissas que deixou expressas, designadamente a identificação do quadro legal de referência, era a seguinte: a competência para licenciar a publicidade em posto de abastecimento de combustível é das Câmaras Municipais e não da Estradas de Portugal, SA; sem prejuízo, porém, da sua intervenção no âmbito do procedimento de licenciamento através da emissão de parecer prévio, competência que, no entendimento vertido na decisão recorrida, permitiria a esta última, enquanto entidade fiscalizadora, ordenar o inicio do procedimento de legalização junto da Câmara Municipal respectiva. Ora, saber se tal interpretação é ou não autorizada em face das normas jurídicas de referência, escapa já ao âmbito da nulidade em causa, podendo sim consubstanciar erro de julgamento; os erros ou inexactidões intelectuais que ocorram no processo de formação da vontade expressa na decisão serão erros de julgamento.

Deste modo, aceita-se a conclusão lógica alcançada pelo Tribunal a quo, a qual está, pois, em perfeita sintonia com o dispositivo da sentença.

Assim, após a presente clarificação do raciocínio lógico adoptado pelo Tribunal a quo, cremos não subsistirem dúvidas sobre a inexistência de uma relação de exclusão formal entre a fundamentação de facto e/ou de direito e a decisão proferida.

Improcede, pois, a arguida nulidade.

Posto isto, cabe entrar no imputado erro de julgamento acerca da (in)competência da EP, SA para o licenciamento de obras a realizar no posto de abastecimento de combustível em questão (ampliação do posto), na sequência da acção de fiscalização. O que é o objecto do 1.º recurso.

II.2.2. Do 1.º recurso: da competência da EP, SA para ordenar a realização de obras no PAC de Vinhais

Entende a Recorrente, C.........., SA, que no que respeita ao licenciamento das obras sobre que o acto impugnado incide, o Tribunal recorrido não procedeu a uma análise correcta dos diversos regimes legais e das leis que se têm sucedido no tempo, do que resultaria a ausência de legitimidade e incompetência da EP, SA, aqui Recorrida, para instaurar um procedimento de licenciamento de obras.

Neste ponto, sobre a alegada incompetência da EP, SA para licenciar as obras em postos de abastecimento de combustíveis, respondeu o Tribunal a quo que na circunstância concreta pertence à EP, SA. E, a nosso ver, acertadamente.

Com efeito, esta concreta questão foi tratada já por este TCAS no acórdão de 21-11-2013, proc. n.º 10058/13, pelo que, havendo coincidência nos seus termos e aderindo ao seu discurso fundamentador, limitar-nos-emos a transcrever o citado acórdão na parte aqui relevante:

“(…) vejamos que o DL 267/2002 (que estabelece os procedimentos e define as competências para efeitos de licenciamento e fiscalização de instalações de armazenamento de produtos de petróleo e instalações de postos de abastecimento de combustíveis), alterado pelos DL 389/2007, DL 31/2008, DL 195/2008 e DL 217/2012, diz o seguinte nos seus arts. 5º e 6º:

Art. 5º - Licenciamento municipal

1 - É da competência das câmaras municipais:

a) …;

b) O licenciamento de postos de abastecimento de combustíveis não localizados nas redes viárias regional e nacional.

c) A autorização para a execução e entrada em funcionamento das redes de distribuição, objecto do Decreto-Lei n.º 125/97, de 23 de Maio, quando associadas a reservatórios de GPL com capacidade global inferior a 50 m3.

2 - Os procedimentos administrativos de instalação, construção, reconstrução, ampliação, alteração, conservação e exploração das instalações de armazenamento e dos postos de abastecimento de combustíveis seguem a tramitação aplicável à respectiva operação urbanística nos termos dos n.os 1, 2 e 3 do artigo 4.º e do n.º 3 do artigo 6.º do regime jurídico da urbanização e da edificação.

3 - Além da conformidade da operação urbanística com instrumentos de gestão territorial e outras normas legais e regulamentares vigentes, no âmbito do procedimento de controlo prévio é verificada a conformidade das instalações a que se refere o n.º 1 com os requisitos definidos na portaria referida no n.º 2 do artigo anterior e a existência dos seguros de responsabilidade civil referidos nos artigos 13.º e 14.º, sem prejuízo da aplicação das normas não procedimentais previstas no presente decreto-lei e da possibilidade de colaboração das entidades referidas no n.º 4 do artigo 7.º

4 - O alvará de autorização de utilização, a que se refere o n.º 3 do artigo 74.º do regime jurídico da urbanização e da edificação, emitido no âmbito do procedimento de controlo prévio e nos termos do artigo 62.º e seguintes do mesmo regime, constitui título bastante de exploração das instalações a que se refere o n.º 1.

Artigo 6.º - Licenciamento pela administração central

1 - Exceptua-se do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior o licenciamento das instalações de armazenamento de combustíveis identificadas no anexo I e no anexo II a este diploma, do qual fazem parte integrante.

2 - São competentes para efeitos de licenciamento das instalações de armazenamento referidas no número anterior:

a) A Direcção-Geral da Energia (DGE), para as instalações referidas no anexo I;

b) As direcções regionais do Ministério da Economia (DRE), para as instalações identificadas no anexo II.

3 - É da competência das DRE o licenciamento de postos de abastecimento de combustíveis localizados nas redes viárias regional e nacional.

4 - Os procedimentos administrativos previstos nos números anteriores seguem a tramitação prevista nos artigos 7.º a 14.º

Contra tais regras prevista não vai logicamente o DL 13/71 na parte vigente (alt. pelos DL 219/72, DL 570/80, DL 260/2002, DL 25/2004, DL 215-B/2004, DL 175/2006 e DL 242/2006).

Portanto (cf. arts. 5º,1,b),2,3,4 e 6º,3,4, cits.), a competência para licenciar a construção e obras, segundo o RJUE, nos postos de abastecimento é das câmaras municipais sempre que elas forem em estradas não regionais ou não nacionais. A competência para licenciar a construção e obras, segundo o RJUE, nos postos de abastecimento em estradas regionais e nacionais cabe às direcções regionais do Ministério da Economia.

Mas, aqui, o caso é outro: trata-se de determinar à A. certas condutas relativas ao bom e seguro funcionamento dum posto pré-existente, como se vê do facto provado em D.[no caso dos autos, os factos A. e D.].

A autora considera que a ré não tem poderes legais para determinar o que determinou em sede de bom e seguro funcionamento dum seu posto.

Quanto a isto, rege o art. 10º do DL 374/2007, alt. pelo DL 110/2009 (que transforma a E. P. - Estradas de Portugal, E. P. E., em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, passando a designar-se por EP - Estradas de Portugal, S. A.):

Artigo 10.º - Poderes de autoridade

1 - Compete à EP - Estradas de Portugal, S. A., relativamente às infra-estruturas rodoviárias nacionais que integrem o objecto da concessão a que se refere o n.º 1 do artigo 4.º, zelar pela manutenção permanente de condições de infra-estruturação e conservação e de salvaguarda do estatuto da estrada que permitam a livre e segura circulação.

2 - Para o desenvolvimento da sua actividade, a EP - Estradas de Portugal, S. A., detém os poderes, prerrogativas e obrigações conferidos ao Estado pelas disposições legais e regulamentares aplicáveis no que respeita:

a) A processos de expropriação, nos termos previstos no respectivo código;

b) Ao embargo administrativo e demolição de construções efectuadas em zonas non aedificandi e zonas de protecção estabelecidas por lei;

c) À liquidação e cobrança, voluntária ou coerciva, de taxas e rendimentos provenientes das suas actividades;

d) À execução coerciva das demais decisões de autoridade;

e) Ao uso público dos serviços e à sua fiscalização;

f) À protecção das suas instalações e do seu pessoal;

g) À regulamentação e fiscalização dos serviços prestados no âmbito das suas actividades e à aplicação das correspondentes sanções, nos termos da lei;

h) À responsabilidade civil extracontratual, nos domínios dos actos de gestão pública;

i) À instrução e aplicação de sanções em processo contra-ordenacional.

3 - São conferidos à EP - Estradas de Portugal, S. A., nos termos da lei, os seguintes poderes de autoridade necessários a garantir a livre e segura circulação:

a) Determinar, a título preventivo e com efeitos imediatos, mediante ordem escrita devidamente fundamentada, a suspensão ou cessação de actividades ou o encerramento de instalações que ponham em risco a circulação rodoviária, causem dano ou ameacem causá-lo à estrada;

b) Identificar as pessoas ou entidades que promovam quaisquer actividades em violação das disposições legais e regulamentares de protecção à estrada, ou ao património público afecto à sua exploração, em especial à segurança rodoviária, procedendo à imediata denúncia perante as autoridades competentes, se tais actos forem susceptíveis de integrar um tipo legal de crime ou um tipo de ilícito contra-ordenacional;

c) Solicitar a colaboração das autoridades administrativas e policiais para impor o cumprimento de normas e determinações que, por razões de segurança ou de garantia de inviolabilidade dos bens públicos, devam ter execução imediata no âmbito dos actos de gestão pública;

d) Determinar a imediata remoção de ocupações indevidas de bens de domínio público administrados pela EP - Estradas de Portugal, S. A., ou afectos à sua actividade, recorrendo, se necessário, à colaboração das autoridades policiais;

e) Embargar e ordenar a demolição de construções efectuadas em zonas non aedificandi ou em zonas de protecção estabelecidas por lei.

Dali resulta que a lei, de acordo aliás com o art. 14º do DL 558/99, confere expressa e claramente à “E.P.,SA” os poderes ora exercidos quanto bom e seguro funcionamento dos postos de abastecimento de combustíveis nas estradas sob jurisdição daquela empresa concessionária.

Improcede, assim, o recurso da A.(1)

Impõe-se assim concluir que, muito embora a competência para licenciar obras no posto de abastecimento de combustível aqui em causa pertença à respectiva Direcção Regional do Ministério da Economia, visto situar-se numa EN e não em estrada municipal, certo é que a competência exercida pela EP, SA, neste caso, não foi essa, mas sim a de zelar pela segurança do funcionamento do posto. De certo modo foi isso que se afirmou na decisão recorrida quando se referiu que “as competências para o licenciamento das instalações dos combustíveis não se confundem com as competências atribuídas à JAE pelo Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro que visam garantir a segurança rodoviária em toda a sua plenitude e, reconduzem-se, no que aqui interessa ao caso sub judice, à determinação da suspensão ou cessação de actividades ou ao encerramento de instalações que ponham em risco a circulação rodoviária e causem dano ou ameacem causá-lo à estrada”. Donde, considerando o citado n.º 1 do art. 10.º do Decreto-lei n.º 374/2007, de 7 de Novembro, o acto impugnado e na parte aqui recorrida não padece do vício de incompetência, sendo válido, como decidido no Tribunal a quo.

Deste modo tem o recurso que improceder.

II.2.2. Do 2.º recurso: competência da EP, S.A., para licenciar a afixação de mensagens publicitárias

Vem a Recorrente, Estradas de Portugal, SA, no recurso que interpôs criticar a sentença recorrida por nesta se ter concluído que a publicidade exterior está sujeita a licenciamento municipal prévio, em todos os casos, cabendo à entidade fiscalizadora, na situação detectada, ordenar o início do procedimento de legalização junto da Câmara Municipal respectiva e não solicitar directamente à aqui Recorrida o projecto de legalização como aconteceu nos autos. Sendo que por nós foi já apreciada a nulidade suscitada no recurso, no sentido de esta não se verificar (v. supra, II.2.1.)

A questão a resolver, prende-se, assim, com o imputado erro de julgamento sobre a incompetência da ora Recorrida para o licenciamento de tabuletas ou objectos de publicidade, concretamente na denominada zona de protecção à estrada e consequências que daí se podem extrair, concretamente ao nível do procedimento de licenciamento. É esta a questão nuclear e cuja resposta determinará a sorte do recurso interposto.

Vejamos então.

Ora, precisamente sobre esta questão existe hoje jurisprudência reiterada do STA, pelo que nos limitaremos a transcrever, nos termos permitidos pela lei processual, o discurso fundamentador do Acórdão do STA de 20.11.2014, no processo n.º 852/14, tirado em sede de recurso de revista, cujos pressupostos de base se aplicam inteiramente ao caso que nos ocupa. Escreveu-se no referido Acórdão:

A presente revista dirige-se contra a decisão do TCAS que, revogando a sentença proferida no TAF de Almada, julgou improcedente a acção que Petróleos de Portugal – Petrogal, S.A. intentou contra Estradas de Portugal S.A. pedindo a anulação do despacho proferido pelo Director da Delegação Regional da Ré acima identificado, que lhe ordenou a apresentação de projectos de legalização da publicidade já instalada no Posto de Abastecimento de Combustíveis referido no probatório.

Decisão essa que assentou nas razões desenvolvidas nos Acórdãos do mesmo Tribunal, que identificou.

É contra este julgamento que se dirige a presente revista a qual foi admitida por ter sido entendido que existia abundante jurisprudência deste Supremo Tribunal no sentido oposto à decisão recorrida e que, por isso, a sua admissão visando uma melhor aplicação do direito.

A questão cuja resolução se nos pede é, pois, a de saber a quem cabe a competência para exercer poderes de autoridade sobre zona de protecção às estradas, maxime, a de saber a quem está atribuída a competência para licenciar a sua utilização para publicidade.[sublinhado nosso]

Esta questão foi recentemente apreciada e decidida por este Supremo Tribunal – Acórdão de 20/02/2014, proc. 1418/13 – pelo que, concordando com a solução que lhe foi dada, nos limitaremos a acompanhar o que aí se disse.

Escreveu-se nesse Aresto:

“2-2- Como vimos, alega a recorrente que, ao contrário da matéria assente, o posto de abastecimento de combustíveis objecto do acto impugnado não faz parte da infra-estrutura rodoviária concessionada e encontra-se implantado em propriedade privada.

A presente revista limita-se a aplicar o direito aos factos fixados pelo tribunal recorrido, não lhe competindo, determinar se o posto de abastecimento em causa se encontra ou não em propriedade privada, já que a situação também não cabe no estabelecido no nº 4 do art. 150º do CPTA.

Sempre se dirá, porém, que, ao contrário do decidido no Acórdão recorrido, o facto aditado não assume relevância para a resposta à questão essencial de direito que vem posta.

Senão vejamos.

Tendo em conta o regime de protecção às estradas nacionais, o Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, distingue, como melhor será analisado mais adiante, os conceitos de “zona de estrada” e “zona de protecção à estrada” (art. 1º).

Na zona de estrada, a qual integra o domínio público rodoviário do Estado, abrange o terreno por ela ocupado, a faixa de rodagem, bermas e quando existam as valetas, passeios, banquetas, taludes, e ainda, as pontes e viadutos nela incorporados e os terrenos adquiridos por expropriação ou qualquer para alargamento da plataforma da estrada ou acessórios, tais como parques de estacionamento e miradouros (cfr. o art. 2º do DL nº 13/71), está sujeita às proibições do art. 4º.

Na zona de protecção à estrada, constituída pelos terrenos limítrofes, a lei, no art. 3º do mesmo diploma, prevê: i) Proibições (faixas designadamente com servidão non aedificandi; ii) Ou permissões condicionadas à aprovação, autorização ou licença da Junta Autónoma de Estradas (faixas de respeito).

Por sua vez, no art. 10.º, daquele diploma, sob a epígrafe “Permissões em zonas de aprovação ou licenciamento normal”, estabelece-se que depende de aprovação ou licença da Junta Autónoma de Estradas, entre o mais, a implantação de tabuletas ou objectos de publicidade, comercial ou não, numa faixa de 100 m para além da zona non aedificandi respectiva.

O que significa que cabia àquela entidade competência para licenciar a publicidade afixada dentro das faixas de respeito, a que se refere o art. 1º, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, ou seja, nos terrenos particulares, que marginam a estrada nacional e até 100 metros para além da respectiva zona non aedificandi.

Por conseguinte, o que determina a convocação deste preceito é a afixação de mensagens de publicidade dentro das faixas de respeito, sendo para o efeito irrelevante que a estada nacional seja abrangida ou não pela concessão (A questão poderia ter contornos diferentes se no acórdão recorrido se tivesse fixado que o Posto de Abastecimento de Combustível em causa estava integrado na concessão. De qualquer modo, realce-se que, nos termos do nº 2 da Base 33, da Concessão somente fazem parte da mesma as áreas de serviço já existentes nas vias e que se encontram identificadas no quadro III do Anexo I ao Decreto-Lei nº 380/2007, de 13 de Novembro de 2011, que aprovou as Bases da Concessão conferida celebrada entre o Estado e B……….., SA.) .

Para o caso que nos ocupa, a questão centra-se na apreciação da legalidade do despacho da EP, SA., que ordenou à ora recorrente a apresentação, no prazo de 10 dias úteis, de um projecto com os elementos publicitários relativos ao Posto de Abastecimento de Combustíveis, localizado na EN 108 ao Km 38,230-E Entre os Rios, com vista à legalização da publicidade.

Da análise do PA, resulta que, por ofício de 10/12/2009 (fls. 19 a 21), no âmbito de uma acção de fiscalização promovida pela EP, S.A., Direcção Regional do Porto, foi notificada a ora Recorrente de um ofício, onde se pode ler, entre o mais, que:

“(…) verificou-se a afixação de publicidade, e que é visível da estrada, sem que tal afixação tenha sido autorizada por parte da EP nos termos legais, pelo que fica V. Ex.ª notificada a apresentar, num prazo de 10 (dez) dias úteis, um projecto que contemple memória descritiva, o alçado, corte e perfil transversal cotado relativamente ao eixo da estrada e sua implantação na respectiva infra-estrutura, descritiva dos elementos publicitários, dando cumprimento ao disposto na Lei nº 97/88, de 17 de Agosto e Decreto-Lei nº 105/98, de 24 de Abril, com a redacção dada pelo Decreto-Lei nº 166/99, de 13 de Maio. (…)”.

No ofício final, datado de 25/1/2010, pode ler-se que “Relativamente à dúvida suscitada sobre a competência da cobrança de taxas devidas pela implantação de publicidade, não obstante competir às autarquias licenciar a publicidade nos PAC de acordo com o artigo 2º da Lei nº 97/98, de 17 de Agosto, deve a emissão da licença ser precedida de autorização da EP quando se trate de um posto instalado à margem de uma estrada sob a sua jurisdição”(cfr. PA fls. 23).

Não oferece dúvida que a Recorrida fundamenta o pedido dirigido à ora recorrente no facto de se tratar de afixação de publicidade que carece de autorização ou licença da EP, SA., nos termos do disposto no art. 10º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, segundo a redacção que lhe foi dada pelo art. 2º, nº 2, da Lei nº 97/88, de 17 de Agosto.

Por conseguinte, o que determina a convocação deste preceito é a afixação de mensagens de publicidade dentro da faixa de respeito, encontrando-se as partes e as instâncias recorridas divididas precisamente quanto ao sentido e alcance deste preceito, sobretudo após as alterações introduzidas pela entrada em vigor da Lei nº 97/88.

Na 1ª instância decidiu-se que o preceito atrás mencionado foi implicitamente revogado com a entrada em vigor da Lei nº 97/88, de 17 de Agosto, concluindo-se que, de acordo com o enquadramento legal, a publicidade exterior está sujeita a licenciamento municipal prévio, em todos os casos, mesmo os abrangidos pelo art. 10º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, pelo que o procedimento deve ser iniciado junto das Câmaras Municipais respectivas.

Por sua vez, como ficou dito, no Acórdão recorrido, conclui-se que aquele preceito não foi revogado e que se mantém a competência agora da EP, SA. para proceder ao licenciamento da afixação ou inscrição de mensagens publicitárias juntamente com as câmaras municipais originando, desta forma, um licenciamento cumulativo.

Assim sendo, a questão central a decidir, na presente revista, é tão só a de saber se a Recorrida tem, ou não, competência para iniciar o procedimento do licenciamento com vista à “implantação de tabuletas ou objectos de publicidade” (na terminologia do Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro de 1971), nos termos do estatuído no 10º, nº 1, alínea b), daquele Diploma, questão considerada relevante em termos de justificar esta revista.

3. Sentido e alcance art. 10º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, em especial depois da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 637/76, 29 de Julho, e da Lei nº 97/88, de 17 de Agosto.

Assim recortada a questão, verifica-se que a mesma já foi objecto de análise no Acórdão deste Supremo Tribunal, Secção do Contencioso Tributário, de 26/6/2013, proc nº 232/13, tendo-se concluído no sentido da tese defendida pelo Provedor de Justiça na Recomendação nº 5º-A/2012.

Não obstante este aresto ter incidido sobre a apreciação da competência da EP, SA, para liquidar taxas pelo licenciamento de afixação de mensagens publicitárias, a jurisprudência ali fixada vale igualmente para a situação dos autos, uma vez que a competência para a liquidação de taxas está intrinsecamente ligada à competência para o respectivo licenciamento, razão pela qual seguiremos de perto aquele Acórdão.

O art. 1º do Decreto-Lei nº 13/71, de 23/01, que veio regulamentar a jurisdição da Junta Autónoma das Estradas em relação às estradas nacionais, estabeleceu que tal área de jurisdição abrangia, para além da “zona da estrada” (englobando a faixa de rodagem, as bermas, as valetas, os passeios, as banquetas ou taludes, pontes e viadutos), a denominada “zona de protecção à estrada” (constituída pelas faixas com servidão non aedificandi e pelas faixas de respeito) – art.ºs 1º a 3º.

Diz expressamente o art. 3º do Decreto-Lei nº 13/71 que a zona de protecção à estrada nacional é constituída pelos terrenos limítrofes em relação aos quais se verificam:

“a) Proibições (faixa designadamente com servidão non aedificandi);

b) Ou permissões condicionadas à aprovação, autorização ou licença da Junta Autónoma de Estradas (faixas de respeito)”.

O art. 8º, sob a epígrafe, “Proibições em terrenos limítrofes da estrada”, dispõe que é proibida a construção, estabelecimento, implantação ou produção de “Tabuletas, anúncios ou quaisquer objectos de publicidade, com ou sem carácter comercial, a menos de 50 m do limite da plataforma da estrada ou dentro da zona de visibilidade, salvo no que se refere a objectos de publicidade colocados em construções existentes no interior de aglomerados populacionais e, bem assim, quando os mesmos se destinem a identificar instalações públicas ou particulares.”

Por sua vez, segundo o disposto no art. 10.º, n.º 1, alínea b), depende da aprovação ou licença da Junta Autónoma da Estrada, a “Implantação de tabuletas ou objectos de publicidade, comercial ou não, numa faixa de 100 m para além da zona non aedificandi respectiva”. Nesta sequência, o art. 15º, sob a epígrafe “Taxas”, prevê o montante a pagar pelo licenciamento relativo à implantação de tabuletas ou objectos de publicidade”.

Esta matéria veio a ser regulada, entre outros diplomas, pelo Decreto-Lei nº 637/76, de 29 de Junho e pela Lei nº 97/88, de 17 de Agosto.

O Decreto-Lei nº 637/76, depois de no seu preâmbulo indicar claramente que a razão da sua publicação era combater a proliferação de publicidade ao longo das estradas nacionais, estabeleceu, no seu art. 1º, o seguinte: “A afixação de publicidade nas áreas urbanas, em lugares públicos ou destes perceptível, de carácter comercial, através de inscrições, tabuletas, anúncios, cartazes ou outros objectos ou da emissão por meios mecânicos ou eléctricos de sons e imagens destinados a chamar a atenção, só poderá efectuar-se com observância das disposições do presente diploma.”

Por sua vez, art. 2.º do mesmo diploma, sob a epígrafe “Publicidade fora das áreas urbanas”, veio proibir a produção de publicidade a que se refere o artigo anterior fora das áreas urbanas, tenha ou não carácter comercial e através dos mesmos objectos e meios”, com algumas excepções que não interessam ao caso.

Sobre o regime de licenciamento e de aprovação, o art. 3º do mesmo diploma veio estabelecer que nos casos em que pudesse efectuar-se, a produção de publicidade dependia de licença da câmara municipal do local em que fosse produzida.

O art. 4º, sob a epígrafe “Processo de autorização”, estabelecia o seguinte:

“1. O pedido de licenciamento ou de aprovação será dirigido ao presidente da câmara.

2. (…);

3. A licença ou aprovação não poderá ser concedida sem prévio parecer favorável das entidades com jurisdição nos locais onde a publicidade for perceptível, nomeadamente da Junta Autónoma de Estradas, da Direcção-Geral dos Serviços Florestais, da Direcção-Geral dos Transportes Terrestres e da Direcção-Geral do Turismo.

4. O parecer referido no número anterior, caso não seja emitido no prazo máximo de quinze dias, será tido como favorável.”

A este diploma sucedeu a Lei nº 97/88, de 17/08, que veio definir o enquadramento geral da publicidade exterior, sujeitando-a a licenciamento municipal prévio das autoridades competentes e remetendo para as câmaras municipais a tarefa de definir, à luz de certos objectivos fixados na lei, os critérios que devem nortear os licenciamentos a conceder na área respectiva (art. 1º, nºs 1 e 2).

Embora este diploma, tal como o anterior, não revogue expressamente o Decreto-Lei nº 13/71 nem sequer algumas das suas normas, a verdade é que veio universalizar a licença municipal de afixação ou instalação de publicidade no espaço exterior, para salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental.

É o seguinte, o teor do art. 1º, nº 2: “Sem prejuízo de intervenção necessária de outras entidades, compete às câmaras municipais, para salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental, a definição dos critérios de licenciamento aplicáveis na área do respectivo concelho”.

No preceito seguinte (art. 2º), sob a epígrafe “Regime de licenciamento”, refere no seu nº 1 que o pedido de licenciamento é dirigido ao presidente da Câmara Municipal da respectiva área, devendo, nos termos do estatuído no nº 2, “A deliberação da câmara municipal deve ser precedida de parecer das entidades com jurisdição sobre os locais onde a publicidade for afixada, nomeadamente do Instituto Português do Património Cultural, da Junta Autónoma das Estradas, da Direcção-Geral de Transportes Terrestres, da Direcção de Turismo e do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza.”

Não obstante o art. 1º dizer em termos genéricos que o licenciamento da publicidade depende do licenciamento prévio das autoridades competentes, a verdade é que da conjugação da redacção dada quer ao nº 2 do art. 1º quer ao art. 2º não oferece dúvida que o legislador reiterou, neste diploma, a vontade de revogar as disposições que cometiam à Junta Autónoma competência em matéria de publicidade dentro dos 100 metros para além da zona non aedificandi.

Confrontando o teor dos preceitos mencionados no Decreto-Lei nº 637/76 e dos constantes da Lei nº 97/88 com o expressamente consagrado no art. 10º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, facilmente se conclui que os preceitos estão em contradição na parte em que este último comete à recorrente, na área de jurisdição correspondente a 100 metros para além da zona «non aedificandi», a competência para a aprovação ou licença. Por força do estatuído nos mencionados diplomas, a intervenção da Junta autónoma foi sendo sucessivamente degradada e limitada, reconduzindo-se, através do último, à mera emissão de parecer.

O que significa que o legislador quis sujeitar a afixação de publicidade a um acto de licenciamento dos municípios e não a mera autorização, acto que tem de ser instruído com o parecer das autoridades com jurisdição nos locais de afixação da publicidade. Por esta via, o legislador consegue harmonizar os interesses visados pelos municípios, consistentes na salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental e, ao mesmo tempo, a segurança do trânsito das estradas nacionais. Todavia, segundo este modo de ver as coisas, existe apenas uma única entidade competente para o licenciamento e não duas como pretende a recorrente.

O facto de quer o Decreto-Lei nº 637/76, entretanto revogado pela Lei nº 30/2006, de 11/07, quer a Lei nº 97/88, constituírem normas gerais, em face do Decreto-Lei nº 13/71, não afasta a possibilidade de este, embora revestindo natureza de norma especial, ser revogado por aqueles diplomas, por ser essa a intenção inequívoca do legislador.

Com efeito, afigura-se que os diplomas mencionados pretendem “de forma inequívoca regular a afixação e inscrição de mensagens de publicidade e propaganda atribuindo o licenciamento de forma universal às câmaras municipais, na área do respectivo concelho, sem prejuízo da intervenção obrigatória, através da emissão do respectivo parecer, por parte de entidades com jurisdição exclusiva para defesa de interesses públicos específicos que têm de ser tidos em conta na emissão de licença final pelo respectivo município” (cfr. o citado Acórdão).

Cumpre realçar que esta tese não é posta em causa pelo Decreto-Lei nº 105/98, de 24/04, cujo preâmbulo refere-se expressamente à manutenção do regime geral da Lei nº 97/88, de 17/08, e que teve como objectivo dar tratamento especial ao problema particular suscitado pela publicidade exterior na área de vizinhança das estradas nacionais fora dos aglomerados urbanos, com vista a salvaguardar o ambiente e a paisagem.

O art.º 1º daquele diploma proíbe a afixação ou inscrição de mensagens de publicidade nas proximidades das estradas nacionais constantes do plano rodoviário nacional fora dos aglomerados urbanos, em quaisquer locais onde a mesma seja visível das estradas nacionais (art. 3º, nº 1), mas entre as excepções previstas no art. 4º conta-se, entre o mais, os meios de publicidade que se destinem a identificar edifícios ou estabelecimentos, públicos ou particulares, desde que tal publicidade seja afixada ou inscrita nesses mesmos edifícios ou estabelecimentos.

Afigura-se que o mesmo se pode dizer em relação ao estabelecido no Decreto-Lei nº 25/2004, de 24/01. Este diploma refere-se à actualização anual do montante das taxas a pagar por cada autorização ou licença emitida pela Junta Autónoma das Estradas, modificando o art. 15º do Decreto-Lei nº 13/71. O facto de na alínea j) se continuar a prever “o pagamento de taxas pelo licenciamento de implantação de tabuletas ou objectos de publicidade”, a que se referia o art. 10º, nº 1, alínea b), daquele diploma, não tem a virtualidade de fazer renascer a competência daquela entidade para o respectivo licenciamento.

Por outro lado, não faria sentido que o legislador, no seguimento do estabelecido no Decreto-Lei nº 637/76 e na Lei nº 97/88, viesse, através do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de Abril, introduzir alterações relevantes na Lei nº 97/88, que insistem na natureza consultiva da intervenção da EP, SA., determinada pela “jurisdição sobre os locais onde a publicidade for afixada”, mantendo a redacção originária (cfr. o art. 2º, nº 2, da Lei nº 97/88, de 17 de Agosto, na sua nova redacção).

Importa realçar que esta é, aliás, também nestes autos, a tese da recorrida EP, SA., que, em vários pontos das conclusões, designadamente, nos 10º, 14º, 15º, e 22º, defende expressamente que a “aprovação ou licença concedida pela EP, E.P.E., para afixação de publicidade constante da alínea b) do n.º 1 do artigo 10º do DL 13/71, de 23/01, corresponde ao parecer mencionado no n.º 2 do art.º 2° do DL 97/88, de 17/08, sendo de carácter vinculativo e obrigatório” (ponto 15 das conclusões).

Ou seja, a recorrida admite que a sua intervenção foi desgraduada da competência para a emissão de “licença”, para a mera emissão de parecer. No entanto, continua a defender de forma inexplicável que mantém os mesmos poderes, sem ter em conta a verdadeira natureza das figuras jurídicas envolvidas tal como foi objecto de análise no Acórdão deste STA 26/6/2013, proc nº 232/13.

Como ficou consignado no Acórdão deste STA, que estamos a seguir, a tese da recorrente e seguida no Acórdão recorrido conduziria “ao absurdo de sobre a mesma situação recair simultaneamente uma autorização e uma licença que, embora da autoria de entidades diferentes, visaria o mesmo resultado: permitir (ou conferir o direito) à afixação ou inscrição de mensagens de publicidade comercial. O que conduziria a que duas entidades públicas tivessem competência para liquidar taxas sobre a mesma realidade fáctica, situação muito próxima da duplicação de colecta, proibida no art. 205º do CPPT”.

Também não se acompanha o Acórdão recorrido quando, tendo em conta os poderes de conservação ou administração conferidos à recorrida nas zonas non aedificandi e zonas de protecção [arts. 10º, nº 2, alínea b), nº 3, alíneas a), b), d) e e) do Decreto-Lei nº 374/2007, de 7 de Novembro], podendo proceder ao embargo administrativo e à demolição de construções efectuadas nestas zonas, à suspensão ou cessação de actividades ou ao encerramento de instalações, concluiu que, por maioria de razão, deverá incluir-se nesses poderes “as competências para conceder as permissões para o exercício dessas mesmas obras, construções e actividades, quando relativamente proibidas ou condicionadas, à prévia apreciação e aprovação ou licença da EP.”

Ora, uma coisa são os poderes de fiscalização e de repressão conferidos à EP, SA., com vista a poder agir em prevenção e defesa da livre e segura circulação rodoviária, outra bem diferente são os poderes para atribuir licenças em matéria de publicidade, tanto assim que a tendência no mundo da regulação é para a não concentração de ambos os poderes na mesma entidade. De qualquer modo, estamos a falar de poderes de autoridade tipicamente dominais que são individualmente consagrados e atribuídos à EP, S.A., no art. 10º do Decreto-Lei nº 374/2007, que obedecem ao princípio geral de direito administrativo segundo o qual, a competência é de ordem pública e não se presume. Da análise das normas citadas não se recortam competências individualizadas para licenciar ou iniciar o respectivo procedimento sobre a inscrição ou afixação de mensagens publicitárias. [sublinhados nossos]

Em suma, de acordo com o enquadramento legal explicitado, mesmo admitindo que o Decreto-Lei nº 13/71, de 23/01, se mantém em vigor, a verdade é que não oferece dúvidas que, por força, primeiro do Decreto-Lei nº 637/76 e, posteriormente, da Lei nº 97/88, o inciso “aprovação ou licença” constante do art. 10º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, foi derrogado e desgraduado na emissão de “parecer” das entidades com jurisdição sobre os locais onde a publicidade for afixada.

Deve, assim, o procedimento ser iniciado junto das câmaras municipais que procederão à consulta das entidades competentes para a emissão do respectivo parecer.

Limitando-se a competência da recorrida à emissão de parecer, no âmbito do procedimento de licenciamento, da autoria das câmaras municipais, nos termos do disposto no art. 2º, nº 2, da Lei nº 97/88, afigura-se claro que também não lhe compete a iniciativa do mesmo como pretende a recorrida no caso dos autos.[sublinhado e carregado nosso].

(…)

Com a resposta dada a esta questão, fica prejudicada a análise da segunda abordada no Acórdão recorrido e respeitante ao problema de saber se as indicadas competências da Junta Autónoma de Estradas se encontram hoje transferidas para o INIR, ou se pertencem à B……., SA., por esta questão só se colocar num futuro e eventual procedimento.”

Assim, o que se conclui é que, depois da entrada em vigor da Lei n.º 97/88, a EP – Estradas de Portugal, S.A., deixou de ter competência para licenciar a afixação de mensagens publicitárias, uma vez que a sua intervenção se limita à emissão de parecer, no âmbito do procedimento de licenciamento, da autoria das câmaras municipais, nos termos dos disposto no art. 2.º, n.º 2, da Lei n.º 97/88.

Daí que, aderindo sem dissensão aos fundamentos explanados na jurisprudência citada, impõe-se, nos termos acima expostos, que não são exactamente coincidentes com os constantes da sentença recorrida (que parece admitir no procedimento de licenciamento legitimidade à EP, SA para a iniciativa do mesmo), julgar o recurso interposto pela Estradas de Portugal, SA improcedente.

De igual modo, o acto impugnado não enferma de incompetência absoluta, geradora da sua nulidade (art. 133.º, n.º 2, al. b), do CPA), mas está ferido de incompetência relativa, causal da sua anulação – aliás a sanção-regra –, considerando que à Estradas de Portugal, SA são ainda conferidos poderes para a emissão de parecer no âmbito do procedimento de licenciamento em causa, conforme se concluiu no Acórdão do STA de 15.05.2014, proc. n.º 140/14 (Revista).



III. Conclusões

Sumariando:

i) Nos termos do disposto no art. 668.º, n.º 1, al. c), do CPC (o art. 615.º, n.º 1, al. b), na actual versão do CPC), é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão, ou seja, quando exista uma contradição formal entre os fundamentos de facto ou de direito e o segmento decisório da sentença.

ii) Constituindo a sentença um silogismo lógico-jurídico, de tal forma que a decisão seja a conclusão lógica dos factos apurados, aquela nulidade só se verifica quando das premissas de facto e de direito se extrair uma consequência oposta à que logicamente se deveria ter extraído.

iii) A fiscalização das condições de funcionamento regular e seguro dos postos de abastecimento de combustíveis em estradas concessionadas à EP-Estradas de Portugal, S.A cabe a esta entidade, que continua a deter as atribuições previstas no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro (com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de Janeiro), para a autorização ou licenciamento de estabelecimentos ou ampliação de postos de combustível, instalados na sua área de jurisdição.

iv) Por força, primeiro do Decreto-Lei nº 637/76, de 29 de Junho, e, posteriormente, da Lei nº 97/88, de 17 de Agosto (art. 2º, nº 2) o inciso “aprovação ou licença” da Junta Autónoma das Estradas, constante do art. 10.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, foi derrogado e desgraduado na emissão de parecer.

v) Passando o licenciamento da afixação e inscrição de mensagens de publicidade a ser atribuído de forma universal às câmaras municipais, na área do respectivo concelho, sem prejuízo da intervenção obrigatória, mas não vinculativa, através da emissão do respectivo parecer, de entidades terceiras com jurisdição exclusiva para defesa de interesse públicos específicos que têm de ser tidos em conta na emissão de licença final pelo respectivo município.

vi) Depois da entrada em vigor da Lei n.º 97/88, a EP – Estradas de Portugal, S.A., deixou de ter competência para licenciar a afixação de mensagens publicitárias, carecendo de igual modo de competência para iniciar o respectivo procedimento.


IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

- Negar provimento ao recurso interposto pela C.........., SA e manter, nessa parte, a sentença recorrida;

- Negar provimento ao recurso interposto pela Estradas de Portugal, SA e, com a presente fundamentação, manter a decisão recorrida.

Custas de cada recurso a cargo de cada recorrente.

Lisboa, 16 de Abril de 2015
Pedro Marchão Marques
Conceição Silvestre
Cristina Santos

(1) Importa também referir que o acórdão acabado de transcrever, precisamente quanto ao ponto aqui em questão, foi sujeito a revista do STA, no recentíssimo acórdão de 5.03.2015, proc. n.º 231/14, que, veio a decidir que a mesma carecia de objecto útil.