Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 904/12.8BEALM |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 05/04/2023 |
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Relator: | PATRÍCIA MANUEL PIRES |
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Descritores: | EMPRÉSTIMOS PESSOAIS INDISPENSABILIDADE DO CUSTO GRANDES REPARAÇÕES AMORTIZAÇÕES UTILIDADE ESPERADA |
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Sumário: | I- Se a sentença não tomou conhecimento da questão atinente à ilegalidade dos custos respeitantes às obras realizadas no imóvel onde se desenvolve a atividade da Recorrente, e não resultando o conhecimento de tal questão prejudicada pelo conhecimento de outras, procede a arguida nulidade por omissão de pronúncia.
II-O conhecimento em substituição, ao abrigo do disposto no artigo 665.º, nº1 do CPC, sucede sempre que os autos reúnam todos os elementos para o efeito. III-As escrituras públicas como documentos autênticos que são (art.º 371.º do CC) fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respetivo, assim como dos factos que nele são atestados com base nas perceções da entidade documentadora. Tal força probatória não se estende, porém, à veracidade ou verosimilhança das declarações dos outorgantes-intervenientes IV-Um ato de liquidação encontra-se suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal fique ciente das razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do ato ou o acionamento dos meios legais de impugnação aferindo o seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual. V-O requisito da indispensabilidade dos custos comporta uma apreciação casuística, em resultado de uma análise de perspetiva económica-empresarial, na perceção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um custo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objeto societário do ente comercial em causa. VI-Estão vedadas à AT atuações que coloquem em causa o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo. VII-Se não resultou minimamente provado e explicado, antes se tendo avolumado com a prova produzida a certeza de que o crédito contraído foi do domínio pessoal da sócia e não do domínio empresarial, tal legitima as correções assentes na desconsideração dos encargos financeiros contabilizados pela Recorrente e refletidas na liquidação impugnada, não enfermando, assim, de erro nos pressupostos por indemonstrado o requisito da indispensabilidade do custo incorrido com tais encargos, nos termos do artigo 23.° do CIRC. VIII-Se as obras executadas se coadunam com o qualificativo de grandes reparações, consistentes, designadamente, em obras de construção civil por apresentarem características de aderência e de inamovibilidade, tal implica que contribuem para aumentar o seu valor real e para um aumento provável da sua duração, inviabilizando, assim, a dedutibilidade dos custos num só exercício. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO
I-RELATÓRIO
A ………….. – Sociedade Unipessoal, Lda (doravante A …………. ou Recorrente), interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada, que julgou improcedente a impugnação deduzida contra o ato de liquidação de Imposto sobre Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), do exercício de 2009, e respetivos Juros Compensatórios (JC), no montante global de €36.259,46. A Recorrente formulou as conclusões que infra se descrevem: “A - E o seguinte o pedido formulado no presente processo de impugnação: “Nestes termos e nos demais de direito, deve ser anulado o acto impugnado, pois que numa parte a Autoridade Tributária não considerou erradamente os encargos financeiros pagos em 2009 pela impugnante ao B… e relativos ao empréstimo pelo mesmo concedido e noutra parte tão-pouco considerou como custos do exercício as despesas respeitantes ao pagamento dos serviços de carpintaria e serralharia que tiveram por objecto a manutenção e instalação de equipamento do estabelecimento da impugnante”. B - Na petição inicial identificou-se de forma completa e com toda a clareza o acto impugnado, que é a liquidação adicional de IRC relativa ao ano de 2009, no valor de €36.259,46, tendo-se inclusivamente explicado que 33,5% da referida colecta adicional pretendida pela AT, resulta da desconsideração dos encargos financeiros inerentes ao empréstimo do B... e 66,5% da mesma advém de se não terem considerado como custos do exercício as despesas inerentes ao pagamento dos atrás mencionados serviços de carpintaria e serralharia. C - Porém, a sentença recorrida apenas apreciou e decidiu a primeira questão - desconsideração dos encargos financeiros inerentes ao empréstimo do B... - não se tendo pronunciado sobre a segunda questão, que tem a ver com o errado entendimento da AT, considerando imobilizado corpóreo o valor pago pela impugnante no ano de 2009 para pagamento de serviços de carpintaria e serralharia respeitantes à manutenção e instalação de mobiliário do estabelecimento da impugnante; quando deveria ter considerado esse valor como um custo do exercício. D - Ora, é essencial tal questão sobre a qual não se pronunciou a Meritíssima Juíza “a quo”. E - O que acarreta a nulidade da sentença recorrida (art° 125°, n° 1 do C.P.P.T.). F - Que, por isso, tem que ser revogada. G - E porque tal questão é de direito, constando do processo todos os elementos necessários para que da mesma se conheça, deve ela ser decidida no douto Acórdão que revogar a sentença recorrida (art° 665°, n° 2 do C.P.C., aplicável ex vi art° 2o, alínea e) C.P.P.T.) H - E decidida favoravelmente à impugnante, ora recorrente, por força do exposto a esse respeito na petição inicial, que nessa parte aqui se dá por reproduzida. I - Nem no relatório de inspecção, nem no parecer do chefe de equipa nem no despacho superior de concordância que determinaram a prática do acto impugnado se afirma que o produto do empréstimo concedido pelo B... à recorrente, foi utilizado na aquisição das quotas pela actual sócia A ……………… e não no investimento realizado em S. Tomé e Príncipe pela recorrente. J - Apenas se diz que tal empréstimo foi contraído com o objectivo da referida A ……………..adquirir tais quotas, o que é completamente diferente. K - Ou seja, a razão que determinou a correcção da matéria colectável da recorrente, relativamente aos anos de 2007, 2008, 2009 e 2010, foi que o objectivo da contracção do empréstimo junto do B... correspondeu à aquisição das aludidas quotas. L - Ora, uma coisa é o objectivo/destino que foi indicado ao Banco para aí justificar o pedido de empréstimo, outra a aplicação efectivamente dada ao produto do mesmo. M - E só a afirmação de que a utilização desse produto consistiu na aquisição das quotas e não no pagamento de sinais para compra de imóveis, T - Facto não considerado provado na sentença recorrida, que assim julgou incorrectamente este ponto da matéria de facto. U - Como também erradamente decidiu que dos factos constantes da impugnação, “não se provaram os que não constam da factualidade descrita na mesma sentença”. V- E, todavia, dos documentos juntos aos autos e dos depoimentos das testemunhas referidos nestas alegações, resultou provado que: 1- A D. Edviges Antunes Jorge, madrinha e protectora da farmacêutica A ……………. e pessoa com recursos financeiros, adiantou dinheiro próprio por forma a assegurar a compra de dois imóveis em S. Tomé e Príncipe para ali se poder estabelecer uma farmácia e respectivo armazém. 2 - No dia 8 de Abril de 2004, a recorrente reembolsou a referida Senhora da quantia por ela adiantada, nos termos atrás referidos, tendo em vista a aquisição dos mencionados imóveis. 3 - Tal reembolso foi efectuado com o produto do empréstimo concedido pelo B..., que foi integralmente aplicado no pagamento à D. E …………… da aludida importância de € 2.500.000,00, por ela antes adiantada. 4 - A sociedade promitente-vendedora dos imóveis, veio a aceitar transferir a promessa de venda dos mesmos para a ora recorrente, celebrando com esta os respectivos contratos-promessa de compra e venda e dando quitação das quantias de € 1.000.000,00 e € 1.500.000,00, que haviam inicialmente sido pagas pela D. E ………… e a esta reembolsadas pela recorrente fundamentaria devidamente os actos impugnados. Tal afirmação nunca existiu por parte da AT. N - Só a afirmação de que o produto do empréstimo concedido pelo B... e pago pela impugnante, foi efectivamente utilizado na compra pela pessoa singular A ……………. das quotas da sociedade, poderia fundamentar a conclusão, consubstanciada nos actos impugnados, de que os encargos inerentes a tal empréstimo foram verdadeiros rendimentos de capitais da sócia e, como tal, sujeitos a retenção na fonte. O - Essa afirmação em parte alguma dos actos impugnados e do relatório e parecer em que eles se sustentam, surge, pelo que há realmente incongruência entre as premissas e a conclusão. P - Pelo que não se podem considerar fundamentados os actos impugnados, que só por isso têm desde logo que ser anulados. Q - Tem que se considerar provado que as quotas foram cedidas pelo valor nominal e não pelo invocado preço de € 2.500.000,00. R - Não estando provado - antes foi provado o contrário - que as quotas foram adquiridas pelo preço invocado pela AT, cai um pressuposto essencial da tese que determinou a prática dos actos impugnado. S - Dos documentos juntos aos autos e depoimentos das testemunhas inquiridas, resultou provado o seguinte facto: A dívida de € 2.500.000,00 contraída junto do Banco ……………., S.A., num primeiro momento por A ……………. e J o………………., destinou-se a pagar uma dívida que haviam contraído junto de E d……………..com vista à compra pela impugnante de imóveis em São Tomé e Príncipe. X - A sentença recorrida errou, ao considerar que a ora recorrente deveria ter junto aos autos documentos comprovativos dos contratos-promessa de compra e venda inicialmente celebrados entre a T…….., Lda e a D. E ………….. e dos pagamentos dos sinais por esta adiantados àquela. Y - A verdade é que esses documentos eram da D. E …………, não tendo a recorrente neles tido intervenção, pelo que nem sequer tinha qualquer direito a tê-los consigo. Z - Tendo falecido em 2008 a D. E ……….. e não sendo a recorrente nem a sua sócia suas herdeiras, de nada sabem da localização de tais documentos, que poderão até ter-se extraviado. AI - - A circunstância - referida na sentença recorrida - de não ter sido até à data outorgado o contrato definitivo de compra e venda dos imóveis, em nada releva, tanto mais que ficou provado que isso ainda não aconteceu apenas porque a recorrente não tem tido capacidade financeira para tanto. BI - Que, aliás, nunca mais irá ter se o presente recurso for julgado improcedente, pois isso levá-la-à inevitavelmente para a insolvência. Cl - A sentença recorrida violou o art° 23° do CIRC, pois não considerou como gastos os encargos financeiros despendidos pela recorrente e referentes à aquisição de bens para desenvolvimento da sua actividade. Dl - Por tudo isto e ainda pelo que doutamente se suprirá, deve a sentença recorrida ser revogada, anulando-se os actos de liquidação impugnados nos termos referidos na petição inicial.” *** A Recorrida DRFP optou por não apresentar contra-alegações. *** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) teve vista nos termos do artigo 146.º do CPTA e emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso. *** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir. *** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: 1) Em 18/03/2004, foi celebrada escritura pública de “Cessão de Quotas, Unificação e Transformação em Sociedade Unipessoal” da qual consta que M ………….., Mi …………….. e Ma ………………., únicos sócios e gerentes da sociedade comercial por quotas sob a firma “X……., L……. & F…….., Lda.” cedem a totalidade das suas quotas naquela sociedade a A …………., pelo valor nominal das quotas cedidas, sendo que A ……………. unifica as quotas e transforma a sociedade cedida numa sociedade por quotas Unipessoal sob a firma “A ………… – Sociedade Unipessoal, Lda.” (cfr.fls. 39 a 42, frente e verso, dos autos); 2) Em 18/03/2004 foi celebrado entre Banco ……….., S.A., J ……………, A. …………. e E……………um “Contrato de Abertura de crédito a prazo fixo disponibilizado em conta crédito” no montante de € 2.500.000,00, sendo J ……………… e A…………..o designados por clientes e garantes, pela subscrição duma livrança e E ……………….. designada por garante, pela prestação de penhor de banca seguros (cfr. fls. 147 a 149 v. do processo instrutor junto aos autos); 3) Do contrato identificado no ponto anterior consta, na Cláusula 1ª (Modalidade, Montante e Finalidade) o seguinte: “1. O B... concede um financiamento ao Cliente, que o aceita, até ao montante máximo de EUROS 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil euros) sob a forma de abertura de crédito a prazo fixo disponibilizado em conta crédito, conforme o disposto na cláusula com epígrafe “Utilização/Funcionamento”. 2. O financiamento referido no número anterior destina-se a ser utilizado pelo Cliente para aquisição de quotas da Sociedade por Quotas Farmácia X…., L…. & F…….., Lda.” (cfr. idem); 4) Em 18/03/2004 foi celebrado no 13º Cartório Notarial de Lisboa um contrato designado “Penhor de Quota e Procuração” do qual consta que A ……………, na qualidade se única sócia e gerente da Sociedade Por Quotas sob a firma “A …………. – Sociedade Unipessoal, Lda.” constitui a favor do Banco ……….., S.A. um penhor sobre a quota do valor nominal de cinco mil novecentos e oitenta e cinco euros e cinquenta e sete cêntimos, que detém no capital da Sociedade Por Quotas sob a firma “A ………. – Sociedade Unipessoal, Lda.”, constando da Cláusula segunda o seguinte: “a) – O penhor ora constituído destina-se a garantir o bom pagamento das responsabilidades assumidas ou a assumir pela garante em virtude de quaisquer contratos de natureza bancária em direito permitidos celebrados ou a celebrar com o B..., nomeadamente o contrato de abertura de crédito a prazo fixo disponibilizado em conta crédito, celebrado hoje e do qual é acessório, entre a primeira outorgante e o representado da segunda outorgante, o qual se junto como documento anexo que apresentam, que dela fica a fazer parte integrante, e os relacionados com quaisquer garantias, como sejam fianças ou garantias bancárias de qualquer tipo, os relacionados com letras, livranças, bem como com todas e quaisquer formas de financiamento ou concessão de crédito, regulado, ou não, em legislação especial, como sejam, mútuos, aberturas de crédito, descobertos em conta, financiamentos externos bem como as restantes operações financeiras nas quais a garante venha a ser interveniente tudo até ao limite de dois milhões e quinhentos mil euros (…)” (cfr. fls. 143 a 146 v. do processo instrutor junto aos autos); 5) Em 18/03/2004 foi celebrado um contrato designado por “Contrato de assunção cumulativa de dívida” entre Banco ………………., S.A., J ……………. e A ……………., A ……….. – Sociedade Unipessoal, Lda. e E …………, sendo esta última na qualidade de garante (cfr. fls. 132 a 135 v. do processo instrutor junto aos autos); 6) Do contrato identificado no ponto anterior consta o seguinte: “CONSIDERANDO QUE: 1. Os Segundos Contraentes celebraram com o B... o seguinte contrato de financiamento («o contrato de financiamento») «Contrato de abertura de crédito a prazo fixo disponibilizado em conta crédito» número 8460 0012 2008, de 18 de Março de 2004, no montante de € 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil euros), totalmente utilizado, e garantido 1) pela livrança número ………………..247, subscrita por J ………………. e A ………………; 2) pelo Penhor de Quotas (Quota única com o valor nominal de Eur. 5985,75 (cinco mil, novecentos e oitenta e cinco euros e setenta e cinco cêntimos); 3) pelo Penhor de Banca …………., apólice nº ………….. em nome de E …………., conta nº ………… (junta-se cópia do contrato, da livrança e do penhor como Anexos I a III ao presente contrato) 2. Na presente data, os Segundos Contraentes devem ao B..., ao abrigo do contrato identificado acima, o montante global de € 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil euros), do qual se confessam devedores. 3. Os segundos Contraentes solicitaram ao B... aprovação e autorização para que o montante em dívida fosse transferido dos Segundos para a Sociedade Terceira Contraente. 4. Tal solicitação, no dizer dos Segundos Contraentes, deve-se à sua vontade em atingir a optimização fiscal do investimento feito com a aquisição da Terceira Contraente, de que a Segunda Contraente A ……………….. é única titular. 5. Nessa medida, a Gerência do Terceiro Contraente deliberou já a assunção cumulativa do passivo resultante para os Segundos Contraentes do contrato de financiamento.(…) 7. O B... entendeu deferir a pretensão mencionada no considerando 3. Supra, desde que as garantias anteriormente prestadas se mantivessem, e desde que não se verifique a exoneração do primitivo devedor, cuja manutenção nessa condição é essencial para o B..., é ajustado e reciprocamente aceite a celebração do presente contrato de assunção cumulativa de dívida nos termos e condições constantes das cláusulas seguintes: Cláusula Primeira (objecto) 1. Pelo presente contrato, o Terceiro contraente assume cumulativamente a dívida dos Segundos Contraente para com o B..., resultante da celebração do contrato de financiamento, obrigando-se ao respectivo pagamento. 2. O B... ratifica a assunção cumulativa de dívida referida no número anterior. 3. A conta afecta ao pagamento da dívida passa a ser a conta número …………... Cláusula Segunda (regime de simples adjunção) 1. O B... não exonera os Segundos Contraentes da sua dívida. 2. Os Segundos Contraentes respondem solidariamente com o Terceiro Contraente pelo cumprimento de todas as obrigações emergentes do contrato de financiamento. Cláusula Terceira (garantias) 1. As partes reconhecem a plena validade das garantias que, nos termos do contrato de financiamento, tenham sido prestadas a favor do B.... 2. Todos os garantes no contrato de financiamento consentem na presente assunção cumulativa de dívida e reconhecem a manutenção das garantias prestadas. 3. Adicionalmente, e para garantia do bom pagamento de todas as responsabilidades que advêm para os Segundos e Terceiro Contraentes do não cumprimento pontual e integral de qualquer obrigação para ele resultante do presente contrato, nomeadamente, e entre outras, o reembolso de capital, o pagamento de juros remuneratórios e moratórios, despesas judiciais ou extrajudiciais, honorários de advogados e custas, bem como saldos devedores de quaisquer contas bancárias de que o Cliente seja titular ou contitular que tenham como origem obrigações resultantes para este do presente contrato, os Segundos e Terceiro Contraentes entregavam ao B... uma livrança devidamente subscrita, podendo o B... accioná-la ou desconta-la caso se verifique o incumprimento das obrigações assumidas. 4. O B... fica autorizado a preencher a referida livrança nos seguintes termos: a) data de vencimento – posterior ao vencimento de qualquer obrigação ou obrigações que resultem para os Segundos e Terceiro Contraentes da celebração do presente contrato; b) valor – qualquer quantia devida pelos Segundos e Terceiro Contraentes ao abrigo do presente contrato. Cláusula Quarta (Manutenção dos contratos de financiamento) O contrato de financiamento mantém-se plenamente em vigor, alterando-se a parte devedora. (…)” (cfr. idem); 7) Com data de 08/04/2004 é efectuada uma “Declaração” da qual consta o seguinte: “E ………….., viúva, contribuinte ………….., residente na Quinta ………, Lote 76, ……… Quinta …………., declara o seguinte: 1 – A signatária procedeu ao adiantamento da quantia de € 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil euros) à sociedade T………. - Turismo …………, Ldª, com vista à aquisição de um prédio urbano e de um lote de terreno em São Tomé e Príncipe para instalação de farmácia e construção de edifício destinado a armazém, para ali ser exercida a respectiva actividade por sua afilhada A ……………. Neto ou por sociedade a adquirir ou constituir por esta. 2 - Considerando que em dezoito de Março do corrente ano, a A …………. adquiriu o capital da sociedade A …………Sociedade Unipessoal, Ldª, a mencionada aquisição de bens imóveis irá ser efectuada por tal sociedade. 3 Na data de hoje, foi entregue à signatária pela sociedade A ……….. Sociedade Unipessoal, Ldª a atrás mencionada quantia de € 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil euros) correspondente ao adiantamento feito pela signatária, pelo que esta já nada mais tem a receber. Quinta …………, 08 de Abril de 2004” com assinatura ilegível (cfr. fls. 44 dos autos); 8) O documento identificado no ponto anterior é um documento particular sem qualquer reconhecimento de assinatura (cfr. idem); 9) Entre T…… – Turismo …….., Lda. e A…………– Sociedade Unipessoal, Lda. foi assinado um documento particular designado por “Contrato- Promessa de Compra e Venda Recibo de Sinal e Principio de Pagamento”, datado de 16 de Novembro de 2004, do qual consta o seguinte: “Entre: 1ª T……..- Turismo- e ………., Ldª, com sede na cidade de São Tomé, São Tomé e Príncipe, neste acto representada pelo seu sócio gerente, Al ………………, como promitente vendedora e adiante designada por primeira outorgante e; 2ª A ………..- Sociedade Unipessoal, Ldª, pessoa colectiva nº …………., com sede na Rua …………., nº 2 -A, ………., freguesia de …….., concelho do Seixal, Portugal, neste acto representada pela sua sócia gerente, A ……………, como promitente-compradora e adiante designada por segunda Outorgante; é acordado o seguinte: Considerando que: A - A segunda outorgante é uma sociedade com sede e estabelecimento em Portugal, no concelho do Seixal, tendo por objecto a exploração da actividade de farmácia; B - A segunda outorgante pretende exercer a sua actividade no território da República Democrática de São Tomé e Príncipe, pelas seguintes razões: I - Escassez naquele território de estabelecimentos de farmácia; II - Facilidades de funcionamento e implantação por ser São Tomé e Príncipe um pais de língua oficial portuguesa, com forte influência portuguesa e segurança interna; C - Se toma necessário que a segunda outorgante, para prosseguir aquele objectivo, comece por adquirir imóveis onde possa vir a instalar estabelecimento e armazém de apoio; D - A primeira outorgante é proprietária de bens imóveis em São Tomé e Príncipe, que tem interesse em alienar; Celebram primeira e segunda outorgantes o contrato-promessa integrado pelas cláusulas seguintes: Primeira: A primeira outorgante é proprietária do prédio urbano sito na Avenida ……………., Distrito ………………, cidade de São Tomé, descrito na Direcção dos Registos sob o n° 11.512, a fls. 105 vº do Livro B- 54. Segunda: Através do presente instrumento, a primeira Outorgante Promete vender à segunda outorgante e esta promete comprar o prédio mencionado na cláusula primeira. Terceira: O prédio ora prometido será vendido pelo preço de € 1.200.000 (um milhão e duzentos mil euros), a pagar da seguinte forma; a) Neste acto, a segunda outorgante paga à primeira outorgante; como sinal e princípio de pagamento, a quantia de € 1.000.000 (um milhão de euros), da qual a primeira outorgante dá a respectiva quitação; b) A parte restante do preço, ou seja, € 200.000 (duzentos mil euros), será paga no acto de celebração da escritura de compra e venda prometida. Quarta: A escritura de compra e venda Prometida, será celebrada até ao dia 31 de Agosto de 2006; para tal efeito, a primeira outorgante comunicará à segunda outorgante, através de carta registada com aviso de recepção e com uma antecedência não inferior a trinta dias, a data e cartório notarial em que tal escritura deve ter lugar. Quinta: O imóvel prometido, será vendido livre de quaisquer ónus ou encargos. Sexta: Por acordo das partes e atendendo aos interesses e necessidades de instalação da segunda outorgante, esta poderá vir a ocupar e deter o imóvel prometido, antes da data de outorgada respectiva escritura de Compra e venda. Sétima: Para dirimir qualquer litígio decorrente da interpretação e aplicação do presente contrato, será competente o Tribunal de São Tomé e Príncipe, com exclusão de qualquer outro.---------- Lisboa, 16 de Novembro de 2004. A primeira outorgante (carimbo da sociedade com assinatura aposta por cima do mesmo) A segunda outorgante (carimbo da sociedade com assinatura aposta por cima do mesmo)” (cfr. fls. 45 e 46, frente e verso, dos autos); 10) Entre T…………..– Turismo e …………., Lda. e A…………..– Sociedade Unipessoal, Ldª foi assinado um documento particular designado por “Contrato-Promessa de Compra e Venda Recibo de Sinal e Principio de Pagamento”, datado de 07 de Dezembro de 2004, do qual consta o seguinte: “Entre: 1ª T………… - Turismo- e …………, Ldª, com sede na cidade de São Tomé, São Tomé e Príncipe, neste acto representada pelo seu sócio gerente, Al ………………, como promitente vendedora e adiante designada por primeira outorgante e; 2ª A ……..- Sociedade Unipessoal, Ldª, pessoa colectiva nº ……….., com sede na …………., nº 2 - A, ……., freguesia de ……., concelho do Seixal, Portugal, neste acto representada pela sua sócia gerente, A ………………., como promitente-compradora e adiante designada por segunda Outorgante; é acordado o seguinte: Considerando que: A - A segunda outorgante é uma sociedade com sede e estabelecimento em Portugal, no concelho do Seixal, tendo por objecto a exploração da actividade de farmácia; B - A segunda outorgante pretende exercer a sua actividade no território da República Democrática de São Tomé e Príncipe, pelas seguintes razões: I - Escassez naquele território de estabelecimentos de farmácia; II - Facilidades de funcionamento e implantação por ser São Tomé e Príncipe um pais de língua oficial portuguesa, com forte influência portuguesa e segurança interna; C - Se toma necessário que a segunda outorgante, para prosseguir aquele objectivo, comece por adquirir imóveis onde possa vir a instalar estabelecimento e armazém de apoio; D - A primeira outorgante é proprietária de bens imóveis em São Tomé e Príncipe, que tem interesse em alienar; Celebram primeira e segunda outorgantes o contrato-promessa integrado pelas cláusulas seguintes: Primeira: A primeira outorgante é proprietária do lote de terreno sito em Diogo Nunes, ilha de São Tomé, com a área de 0,91 hectares, confrontando a Norte com o Oceano Atlântico, a Sul, Este e Oeste com terrenos do Estado. Segunda: Através do presente instrumento, a primeira outorgante promete vender à segunda outorgante e esta promete comprar o prédio mencionado na cláusula primeira. Terceira: O prédio prometido será vendido pelo preço de € 1.900.000 (um milhão e novecentos miI euros), a pagar da seguinte forma: a) Neste acto, a segunda outorgante paga à primeira outorgante, como sinal e princípio de pagamento, a quantia de € 1.500.000 (um milhão e quinhentos mil euros), da qual a primeira outorgante dá a respectiva quitação; b) A parte restante do preço, ou seja € 400.000 (quatrocentos mil euros), será paga no acto de celebração da escritura de compra e venda prometida. Quarta: A escritura de compra e venda prometida, será celebrada até ao dia 31 de Agosto de 2006; para tal efeito, a Primeira outorgante comunicará à segunda outorgante, através de carta registada com aviso de recepção e com uma antecedência não inferior a trinta dias, a data e cartório notarial em que tal escritura deve ter lugar. Quinta: O imóvel prometido, será vendido livre de quaisquer ónus ou encargos. Sexta: Por acordo das partes e atendendo aos interesses e necessidades de instalação da segunda outorgante, esta poderá vir a ocupar e deter o imóvel prometido, antes da data de outorga da respectiva escritura de compra e venda; se antes desta escritura, a segunda outorgante pretender dar início a qualquer construção, a primeira outorgante realizará todas as diligências necessárias à obtenção das adequadas autorizações administrativas e outras, designadamente assinando todos os documentos para tanto necessários ou convenientes. Sétima: Para dirimir qualquer litígio decorrente da interpretação e aplicação do presente contrato, será competente o Tribunal de São Tomé e Príncipe, com exclusão de qualquer outro. Lisboa, 7 de Dezembro de 2004 A primeira outorgante (carimbo da sociedade com assinatura aposta por cima do mesmo) A segunda outorgante (carimbo da sociedade com assinatura aposta por cima do mesmo) (cfr. fls. 47 e 48, frente e verso, dos autos); 11) Em 25/05/2012 foi elaborado o Relatório Final da Inspecção levada a efeito à escrita da Impugnante a qual teve como objecto a actividade da mesma nos exercícios de 2007 a 2010 do qual resultaram correcções em sede de IRC, quanto ao exercício de 2009, no montante total de €142.491,65, decorrentes de várias correcções efectuadas pela Inspecção Tributária (cfr. Relatório Inspectivo junto aos autos a fls. 24v. a 38); 12) Do relatório inspectivo e para fundamentar as correcções efectuadas consta, designadamente, o seguinte: “(…)II.3.1 CARACTERlZAÇÃO DO SUJEITO PASSIVO 14) Sobre o Relatório Inspectivo identificado nos pontos anteriores recaiu o seguinte despacho: “Concordo com os fundamentos de facto e de direito expressos no relatório da acção inspectiva e parecer elaborados para o efeito. Notifique-se o sujeito passivo conforme dispõe o art. 62º do RCPIT e art. 77º da Lei Geral Tributária. 15) Em face das correcções efectuadas com base no Relatório Inspectivo identificado nos pontos anteriores foi efectuada a liquidação adicional de IRC nº ………………864, datada de 31/05/2012, e referente ao exercício de 2009, no montante de € 29.033,44, bem como as liquidações dos respectivos juros compensatórios, nº …………….112 e ……………..113, nos montantes respectivamente de € 517,89 e de € 2.098,86 (cfr. fls. 21 a 23 dos autos). *** A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte: A) A dívida de € 2.500.000,00 contraída junto do Banco …………., S.A., num primeiro momento por A ………….. e J ……………, destinou-se a pagar uma dívida que haviam contraído junto de E ……………. com vista à compra pela Impugnante de imóveis em São Tomé e Príncipe. *** A motivação da matéria de facto assentou no seguinte: “A convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos, e, em concreto, no teor dos documentos indicados em cada um dos pontos supra. No que se refere ao facto não provado, não logrou a Impugnante, sobre a qual recaía o ónus da prova respectivo, fazer prova do mesmo. Na realidade, nenhum documento foi junto aos autos que comprove que a Impugnante ou A ……………. tenham utilizado a quantia do empréstimo contraído por esta última junto do B... para efectuar qualquer pagamento a E …………….. Aos autos nenhum documento foi junto a comprovar os pagamentos feitos nos dias 16/11/2004 e 07/12/2007 pela Impugnante das quantias referentes ao pagamento dos sinais e princípios de pagamento referidos nos documentos particulares, e não reconhecidos notarialmente. Também não foi junto aos autos nenhum documento comprovativo do destino dado aos € 2.500.000,00, objecto de contrato de empréstimo com o B... e que foram, segundo o contrato, recebidos pela sócia da Impugnante e seu marido. Nenhum documento foi junto aos autos comprovativo da existência de um contrato de mútuo ente E…………….e a sócia da Impugnante, A ……………. Nenhum documento foi junto aos autos comprovativo de que E ………………. havia pago a título de sinal e princípio de pagamento a quantia de €2.500.000,00 à sociedade T……..- Turismo e ………., Ldª dos imóveis identificados nos contratos-promessa identificados nos pontos 9 e 10 do probatório supra, nem que com ela teria sido celebrado um contrato-promessa para compra de dois imóveis em São Tomé e Príncipe. Quanto à prova testemunhal, a circunstância de a primeira testemunha, S ……………….., ter afirmado que intermediou um negócio, entre a D. E ………… e a T ………. - Turismo e ……, Ldª, não constitui prova bastante da efectiva existência desses ou desse contrato. A verdade é que tratando-se de um contrato-promessa de compra e venda de um imóvel teria de ter sido reduzido a escrito (art. 410, nº 2 e 3 do Código Civil) e aos autos nenhum documento foi junto comprovativo desse facto. Por outro lado, o facto de todas as três primeiras testemunhas confirmarem que a E …………. pretendia ajudar a sua afilhada, A …….., não tem igualmente a virtualidade de provar a existência de contratos-promessa de compra e venda entre aquela primeira e a T………… – Turismo ………….., Ldª, nem o pagamento de quaisquer quantias à promitente-vendedora por parte da mesma E ………... Nenhum documento foi junto aos autos que comprove a compra dos imóveis identificados nos pontos 9 e 10 deste probatório pela Impugnante. Dos factos constantes da impugnação, todos objectos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.” *** Por se entender relevante à decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada adita-se ao probatório, ao abrigo do preceituado no artigo 662.º, nº 1, do CPC, ex vi artigo 281.º do CPPT, a seguinte factualidade: 16) Do Relatório de Inspeção Tributário referido em , consta no item epigrafado de “Fornecimentos e Serviços Externos”, designadamente, o seguinte: “III.1.5
(cfr. fls. 17 e 18 do RIT junto ao PA apenso e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido); 17) No ano de 2009, foram emitidas faturas respeitantes a obras de remodelação tendentes à adequação das instalações às exigências legais do I……….., e exercício da atividade de farmácia, cujo valor global ascendeu a €116.332,74, respeitando €104.438,67 a custo das obras e €11.894,07 a imobilizado, conforme infra se descrevem:
(cfr. anexo 19 junto ao RIT e integrante do PAT apenso, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido). *** III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRC, e respetivos JC, do exercício de 2009. Importa, desde logo, ter presente que, em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se o Tribunal a quo: ¾ Incorreu na nulidade consignada no artigo 615.º, nº1, alínea d), do CPC, por omissão de pronúncia; ¾ Valorou erradamente a factualidade vertida no probatório, mormente no atinente à prova testemunhal, importando aferir do cumprimento dos pressupostos contemplados no artigo 640.º do CPC; ¾ Incorreu em erro de julgamento na medida em que a correção referente aos encargos financeiros referentes ao empréstimo concedido pelo Banco ……….. (B...), padece de falta de fundamentação formal e bem assim de errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito; ¾ Respondendo-se, afirmativamente, à omissão de pronúncia, julgar em substituição, no respeitante à correção concernente aos custos com a realização de obras de remodelação aferindo, assim, se procede o arguido vício de violação de lei atinente à dedução integral do custo no exercício de 2009, porquanto insuscetível de qualificação como grande reparação, donde, de aumentar o período de vida útil do bem imóvel visado. Vejamos, então. A Recorrente começa por arguir a nulidade por omissão de pronúncia. A propósito da omissão de pronúncia dispõe o artigo 125.º do CPPT, nº1, do CPPT que constitui nulidade a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar. Preceituando, por seu turno, a primeira parte da alínea d), do nº 1, do artigo 615.º do CPC, que a decisão é nula, quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. Na verdade, a nulidade da decisão por omissão de pronúncia sucede apenas quando a mesma deixe de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra questão submetida apreciação do Tribunal. Dir-se-á, neste particular e em abono da verdade que, as questões submetidas a apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio. De notar para o efeito que, as questões não são passíveis de qualquer confusão conceptual com as razões jurídicas invocadas pelas partes em defesa do seu juízo de valoração, porquanto as mesmas correspondem a simples argumentos e não constituem questões na dimensão valorativa preceituada no citado normativo 615.º, nº 1, alínea d), do CPC. Conforme doutrinado por ALBERTO DOS REIS (1) “[s]ão, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” . Apreciando. A Recorrente começa por sustentar que a decisão recorrida padece da aludida nulidade, porquanto não apreciou a questão referente aos custos do exercício respeitantes ao pagamento dos serviços de carpintaria e serralharia que tiveram por objecto a manutenção e instalação de equipamento do estabelecimento da Impugnante, ora Recorrente, a qual foi, expressamente, arguida na petição inicial e requerida a sua anulação. Ora, atentando na petição inicial constata-se, inequivocamente, que a Recorrente arguiu, expressamente, no seu articulado inicial, concretamente, nos artigos 61.º a 66.º que a correção padece de erro sobre os pressupostos de facto e de direito porquanto as obras em questão não aumentaram a vida útil dos equipamentos, limitando-se a regular o normal funcionamento do estabelecimento, assumindo-se, portanto, como custos do exercício subsumíveis no artigo 23.º do CIRC. Resulta, portanto, perentório que a Recorrente arguiu o erro sobre os pressupostos de facto e de direito, sendo que analisando a decisão recorrida verifica-se, efetivamente, que inexiste pronúncia sobre o alegado, a qual representa uma questão autónoma e não se encontrava prejudicada pela solução dada a outras. Assim, face a todo o exposto, não tendo, como visto, a sentença tomado conhecimento da questão atinente à ilegalidade dos custos respeitantes às obras realizadas no imóvel onde se desenvolve a atividade da Recorrente, e não resultando o conhecimento de tal questão prejudicada pelo conhecimento de outras, procede a arguida nulidade por omissão de pronúncia, impondo-se, por isso, dela conhecer, em substituição, ao abrigo do disposto no artigo 665.º, nº1 do CPC, uma vez que os autos reúnem todos os elementos para o efeito, relegando-se o seu conhecimento para fase ulterior. Prosseguindo. A Recorrente convoca erro de julgamento de facto requerendo aditamentos por complementação, mediante convocação de prova testemunhal e documental que identifica, e bem assim a supressão de factualidade não provada face ao teor de depoimentos que individualiza e da interpretação da prova documental carreada aos autos. Ora, se o que está em causa é o erro de julgamento de facto, importa, desde já, convocar o disposto no artigo 640.º do CPC e aferir do cumprimento dos requisitos legais. Preceitua o aludido normativo que: “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.” Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida (2). Sendo que quanto à prova testemunhal tem de existir uma indicação exata das passagens de gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, porquanto além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova. In casu, estabelecendo uma interpretação conjugada das alegações com as respetivas conclusões, extrai-se que a Recorrente cumpriu o ónus a que estava adstrita-relativamente aos aditamentos e supressões que infra se descrevem-porquanto convoca o depoimento das testemunhas inquiridas, com a devida particularização no competente registo áudio, corporizando a alteração e a supressão que pretende ver concretizada no respetivo acervo probatório, avançando com a respetiva redação do correspondente facto. E por assim ser atentemos, então, na concreta impugnação da matéria de facto. A Recorrente requer o aditamento dos seguintes factos: 1. As quotas integrantes do capital social da Recorrente não foram adquiridas pelo valor de €2.500.000,00, mas sim pelo valor nominal. 2. A D. E ………….., madrinha e protetora da farmacêutica A …………. e pessoa com recursos financeiros, adiantou dinheiro próprio por forma a assegurar a compra de dois imóveis em S. Tomé e Príncipe para ali se poder estabelecer uma farmácia e respetivo armazém. 3. No dia 8 de Abril de 2004, a recorrente reembolsou a referida Senhora da quantia por ela adiantada, nos termos atrás referidos, tendo em vista a aquisição dos mencionados imóveis. 4. Tal reembolso foi efetuado com o produto do empréstimo concedido pelo B..., que foi integralmente aplicado no pagamento à D. Edviges Jorge da aludida importância de € 2.500.000,00, por ela antes adiantada. 5. A sociedade promitente-vendedora dos imóveis, veio a aceitar transferir a promessa de venda dos mesmos para a ora recorrente, celebrando com esta os respetivos contratos-promessa de compra e venda e dando quitação das quantias de € 1.000.000,00 e € 1.500.000,00, que haviam inicialmente sido pagas pela D. E ………… e a esta reembolsadas pela recorrente. Mais requer a supressão da factualidade não provada, devendo a mesma passar a constar como factualidade provada. Vejamos, então, cada um de per se. No atinente ao ponto 1 supra, concatenado com a prova do preço do pagamento das quotas, concretamente, que as mesmas não foram cedidas pelo preço de €2.500.000,00 mas sim pelo seu valor nominal, a Recorrente convoca, expressamente, a escritura de cessão de quotas a qual sendo um documento autêntico faz prova plena dos factos aí referidos e contidos, e bem assim dos depoimentos das testemunhas, concretamente, A ………… e, J …………. Todavia, não procede o supra expendido, desde logo, porque o facto da cessão das quotas ter sido realizada por escritura pública, constituindo, assim, um documento autêntico, não tem o alcance que é sufragado pela Recorrente, porquanto “as escrituras públicas como documentos autênticos que são (art.º 371.º do CC) fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respetivo, assim como dos factos que nele são atestados com base nas perceções da entidade documentadora. Tal força probatória não se estende, porém, à veracidade ou verosimilhança das declarações dos outorgantes-intervenientes (3).” Como evidenciado no Aresto do STJ, prolatado no processo nº 28252/10, datado de 09 de julho de 2014, “No documento autêntico, o documentador garante, pela fé pública de que está revestido, que os factos, que documenta, se passaram; mas não garante, nem pode garantir, que tais factos correspondem à verdade.” Como doutrinam Pires de Lima e Antunes Varela (4) “O valor probatório pleno do documento autêntico não respeita a tudo o que se diz ou se contém no documento, mas somente aos factos que se referem como praticados pela autoridade ou oficial público respetivo (ex.: procedi a este ou àquele exame), e quanto aos factos que são referidos no documento com base nas percepções da entidade documentadora. Se, no documento, o notário afirma que, perante ele, o outorgante disse isto ou aquilo, fica plenamente provado que o outorgante o disse, mas não fica provado que seja verdadeira a afirmação do outorgante, ou que esta não tenha sido viciada por erro, dolo ou coacção, ou que o ato não seja simulado.” Logo, sem a junção de qualquer documento que ateste o pagamento pelo qual as quotas foram cedidas não é possível asseverar-se tal factualidade como provada, sendo insuficiente, para o efeito, o declarado na aludida escritura pública. E naturalmente que o depoimento das testemunhas não pode granjear tal assunção como facto provado, desde logo, porque o Tribunal procedeu à audição integral dos aludidos depoimentos e os mesmos afiguraram-se genéricos e conclusivos, encontram-se, como visto, totalmente apartados de prova documental idónea, a qual se afigura indispensável para efeitos de asserção fática atinente ao pagamento. Ademais, há, outrossim, que salientar que tal realidade carece do relevo que lhe é imprimido pela Recorrente, em sede de demonstração do erro sobre os pressupostos de facto e de direito, na medida em que, conforme veremos em sede própria, o que importa provar, nesse e para esse efeito, é o desiderato do empréstimo, e a sua conexão com o escopo empresarial, justificando e arredando, para o efeito, a circunstância do mesmo ter sido contraído em nome pessoal, concretamente, de A …... Como evidenciado na decisão recorrida e que ora se secunda, mesmo que as quotas tenham sido adquiridas pelo seu valor nominal, a verdade é que fica por explicar as razões atinentes à assunção de um empréstimo de € 2.500.000,00, pela sua única sócia e em nome pessoal. E por assim ser improcede o aludido aditamento. Atentemos, ora, nos factos evidenciados nos pontos 2) a 5). De relevar, desde logo, que o facto elencado no ponto 5), não tem a roupagem de um facto, representando um juízo opinativo e conclusivo, sendo certo que os contratos de promessa de compra e venda a que nele se fazem alusão já se encontram contemplados no probatório, carecendo, assim, de aditamento adicional nos moldes peticionados. De resto, não assumem, de todo, o relevo almejado pela Recorrente, o que se aferirá adiante. No concernente aos factos 2) a 4), os mesmos concatenam-se, como visto, com o adiantamento de dinheiro próprio de E ……….. a A ……….., o seu intuito, ulterior reembolso e bem assim os fundos donde dimanam esse mesmo reembolso, avançando a Recorrente como suporte probatório atinente ao efeito a declaração escrita de E ………….., a qual não foi impugnada, e os depoimentos de S ……… e J ……….. Contudo, para além dos factos não se encontrarem devidamente substanciados, sendo genéricos e de cariz conclusivo, a verdade é que tal realidade não pode ser sustentada com base numa mera declaração particular, sem qualquer prova documental atinente à subscrição desse mesmo adiantamento, do fito inerente ao mesmo e do correspondente circuito financeiro e mais ainda quanto ao reembolso das quantias visadas. Por outro lado, é manifestamente insuficiente para o efeito, como é bom de ver, os depoimentos avançados, desde logo, porque a razão de ciência de S ………. advém de “ouvir dizer”, representando, assim, um conhecimento indireto e, por outro lado, há que ter presente e valorar em conformidade que J ………. é o cônjuge de A ……., não podendo, naturalmente, o Tribunal bastar-se para efeitos de assunção da aludida factualidade de que se lembra “perfeitamente disso”. Subsiste, então, por aferir se deve ser suprimida a factualidade não provada e consigná-la, inversamente, como factualidade provada. Mais uma vez improcede a aduzida impugnação. Conforme já evidenciado anteriormente, a aludida realidade carecia de suporte documental fidedigno, sendo certo que os pagamentos efetuados sempre estariam suportados em cheques ou transferências bancárias ou qualquer outro documento de natureza bancária, os quais, não obstante terem sido requeridos a sua junção aos autos, não foram, de todo, carreados. De reiterar, mais uma vez que a declaração de E …………. para além de não lograr o efeito pretendido pela Recorrente, conforme já evidenciado anteriormente, a verdade é que do seu teor o que resulta plasmado é que foi a sociedade Impugnante que lhe entregou o montante de €2.500.000,00 por ela adiantado à sociedade T……….., Lda. Logo, como é bom de ver, tais meios de pagamento teriam de integrar a escrita e contabilidade da Recorrente, em nada podendo relevar, neste e para este efeito, o aduzido a propósito do prazo legal de conservação da documentação (cfr. artigo 123.°, n.°5 do CIRC, anterior 115.° do mesmo diploma legal). Ter-se-á, assim, de concluir que o supra aludido não pode proceder porquanto suportado, desde logo, numa declaração formalizada por documento particular e no depoimento vago e genérico de duas testemunhas, uma das quais o cônjuge da sócia da Impugnante e a outra de “ouvir dizer” à declarante. Face a todo o supra expendido, improcede, na íntegra, o arguido erro de julgamento de facto, mantendo-se, por conseguinte, a factualidade inalterada, ressalvado o aditamento realizado por este Tribunal e ao abrigo dos seus poderes de cognição. *** Aqui chegados, uma vez estabilizada a matéria de facto, atentemos, então, se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento relativamente aos juros respeitantes ao empréstimo contraído junto do B.... Neste particular, sindica a Recorrente a sentenciada improcedência do vício formal da falta de fundamentação e bem assim de uma errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito. Vejamos, então. Comecemos pela falta de fundamentação formal. Aduz a Recorrente que, por um lado, não se percecionam os motivos da desconsideração dos encargos financeiros, e por outro lado, no Relatório de Inspeção Tributária não se afirma que o produto do empréstimo de €2.500.000,00 foi, efetivamente, utilizado na aquisição por A………das quotas da sociedade impugnante e não no investimento em São Tomé e Príncipe, sendo que para fundamentar a correção tal conclusão teria de constar, expressa e claramente, do respetivo Relatório Inspetivo. Apreciando. Ao nível dos atos tributários, encontra-se, especificamente, previsto no artigo 77.º, da LGT, cujos n.ºs 1 e 2 determinam que: “1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária. 2 - A fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”. Como salientam DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES E JORGE LOPES DE SOUSA, “(…) a fundamentação deve proporcionar ao destinatário do ato a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que praticou o ato, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente” (5). Assim, a fundamentação terá de ser expressa, clara e congruente (6). “[C]omo é consensual na jurisprudência, as exigências de fundamentação não são rígidas, variando de acordo com o tipo de acto e as circunstâncias concretas em que este foi proferido: o acto estará suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na posição de destinatário normal – o bonus pater familiae de que fala o art. 487º nº 2 do C.Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo do seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual. Significa isto que a fundamentação, ainda que feita por remissão ou de forma muito sintética, não pode deixar de ser clara, congruente e encerrar os aspectos, de facto e de direito, que permitam conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela Administração para a determinação do acto (7)”. É entendimento unânime jurisprudencial que a exigência legal e constitucional de fundamentação visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a impugnação contenciosa do ato e a sua conformação. Daí que abranja, quer o dever de motivação, ou seja, a concreta exposição das razões ou motivos justificativos da decisão, quer o dever de justificação, concretamente, a enumeração dos pressupostos de facto e de direito que suportam o sentido decisório do ato. Logo, a fundamentação só é suficiente na medida em que se revele perfeitamente cognoscível para um destinatário normal, habilitando-o a reagir contra o ato, implicando, por isso, uma análise casuística. Com efeito, se “[a] fundamentação formal não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr. art. 125.º, n.º 2, do C.P. Administrativo). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Por outras palavras, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final (cfr. Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol. I, Almedina, 1991, pág. 477 e seg.; Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. II, Almedina, 2001, pág. 352 e seg.; Diogo Leite de Campos e outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 2003, pág. 381 e seg.; ac. T.C.A.Sul-2.ª Secção, 2/12/2008, proc. 2606/08; ac. T.C.A.Sul-2.ª Secção, 10/11/2009, proc. 3510/09; ac. T.C.A.Sul-2.ª Secção, 19/6/2012, proc. 3096/09) (8)” (destaques nossos). Feitos estes considerandos apliquemos ao caso vertente. In casu, não é controvertido que dimanando o ato de liquidação de ação inspetiva os fundamentos que legitimaram as correções meramente aritméticas se tenham de aquilatar por reporte e referência ao respetivo Relatório Inspetivo, com o efeito o que é propugnado, como visto, pela Recorrente, é que atentando no seu teor não se percecionam as razões atinentes ao acréscimo dos juros, sendo que é manifestamente insuficiente para legitimar o aludido acréscimo, a mera alegação do objetivo do empréstimo. Porém, assim o não entendemos, tendo o Tribunal a quo interpretado adequada e acertadamente o respetivo regime jurídico à realidade fática em apreço, na medida em que de uma leitura atenta do respetivo Relatório Inspetivo se retira o elenco dos fundamentos de facto e de direito que fundaram a correção. Com efeito, atentando na fundamentação contemporânea do ato, verifica-se que o mesmo começa por identificar a contabilização dos juros, convocando depois a prova documental junta aos autos, concretamente, contrato de assunção cumulativa de dívida, contratos de promessa de compra e venda, penhor de quota da sociedade e contrato de abertura de crédito, interpretando, para o efeito, os seus considerandos e clausulados, para depois concluir pela insusceptibilidade de dedução fiscal dos encargos financeiros na medida em que o referido empréstimo foi contraído pela sócia e teve como objetivo a aquisição, por esta, das quotas da sociedade aos anteriores proprietários. Assim, estando o ato de liquidação suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal – o bonus pater familiae (artigo 487.º nº 2 do Código Civil) possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do ato ou o acionamento dos meios legais de impugnação-e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efetivo controle da legalidade do ato- aferindo o seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual, ter-se-á de concluir, face a todo o exposto que, in casu, inexiste a arguida falta de fundamentação. De relevar, neste particular, se as razões permitem ou não fundar a correção, se estão corretas ou incorretas, ou se radicam numa premissa que não permite validar a correção atinente aos encargos financeiros, tal já não redunda em falta de fundamentação formal, mas falta de fundamentação substancial, consubstanciando, por isso, erro sobre os pressupostos de facto e de direito. E por assim improcede o aludido erro de julgamento concernente ao aludido vício formal. Atentemos, ora, se procede o erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito. A Recorrente advoga, para o efeito, que não resulta demonstrado pela AT que o produto do empréstimo concedido pelo B... à Recorrente, foi utilizado na aquisição das quotas pela atual sócia A……………e não no investimento realizado em S. Tomé e Príncipe, apenas se fundado no seu objetivo e nexo. Sublinhando, para o efeito, que são realidades díspares o objetivo/destino que foi indicado ao Banco para aí justificar o pedido de empréstimo, e a aplicação, efetivamente, dada ao produto do mesmo, sendo que apenas esta permitiria justificar a correção. Atentando no respetivo Relatório de Inspeção resultam, designadamente, os seguintes fundamentos para legitimar a correção em contenda: ü O contrato foi celebrado em 18.03.2004, entre o Banco ………, S.A. e A ………… e J ……….; Concluindo, assim, que a contabilização como custos da atividade, dos juros e outros encargos incorridos, resultantes da assunção da dívida de €2.500.000,00, originalmente contratada pela sócia gerente, a título individual, e que teve por objetivo a aquisição das quotas da própria sociedade, não correspondem a custos da sociedade, constituindo desta forma infração ao disposto no artigo 23.º, nº1, do CIRC. O Tribunal a quo, validou este entendimento tendo esteado a procedência relevando mediante convocação do probatório que “[n]ão logrou a Impugnante provar que a dívida de €2.500.000,00 contraída junto do Banco ………, S.A., num primeiro momento por A …………… e J …………….., se destinou à compra, ou melhor, promessa de compra, de imóveis em São Tomé e Príncipe. Por outro lado, não logrou a Impugnante provar que a quantia de € 2.500.000,00 foi contraída para pagar uma dívida que haviam contraído junto de E ……………..” Adensando, neste particular, que “nenhum documento foi junto a comprovar os pagamentos feitos nos dias 16/11/2004 e 07/12/2007 pela Impugnante das quantias referentes ao pagamento dos sinais e princípios de pagamento referidos nos documentos particulares, e não reconhecidos notarialmente. Mas também nenhum documento foi junto aos autos comprovativo da existência de um contrato de mútuo ente a E ………. e a sócia da Impugnante, A …………., nem que a E ………… havia pago a título de sinal e princípio de pagamento a quantia de € 2.500.000,00 à sociedade T……… - Turismo ………….., Ldª dos imóveis identificados nos contratos-promessa identificados nos pontos 9 e 10 do probatório supra, nem que com ela (E ………) teria sido celebrado um contrato-promessa para compra de dois imóveis em São Tomé e Príncipe.” Apartando, depois, o depoimento das testemunhas face à insuficiência dos mesmos e à inexistência de qualquer prova documental atinente ao efeito, relevando, expressamente, que “tratando-se de um contrato de mútuo no valor de € 2.500.000,00, este teria de ter sido celebrado por escritura pública (art. 1143º do Código Civil). A falta deste documento não pode ser suprida por prova testemunhal.” Adensando, ainda, que “[a] questão fulcral destes autos é a inexistência na contabilidade da Impugnante, e que não foi suprida nos presentes autos, de documentos comprovativos das várias transacções. Não tendo sido a dívida contraída pela Impugnante, como já se afirmou acima, esta teria de possuir na sua contabilidade todos os documentos de suporte que comprovavam que tinha sido contraída no seu interesse e para seu benefício.” Salientando, in fine, que “a simples circunstância de ter assumido uma dívida não a torna fiscalmente dedutível. É necessário que a Impugnante prove que a mesma era indispensável à realização dos seus proveitos ou para a manutenção da fonte produtora. Ora, como se afirmou acima, tais custos não foram considerados pela AT como passíveis de enquadramento no referido art. 23º do CIRC porque a Impugnante não apresentou qualquer elemento que comprove que o montante de € 2.500.000,00, e que consta dos contratos promessa como tendo sido entregues a título de sinal e princípio de pagamento, tenha sido efectuado pela Impugnante ou por qualquer outra pessoa, pois aos autos, nem ao processo de fiscalização foi junto qualquer documento comprovativo de tais pagamentos. Acresce ainda que, sendo afirmado no contrato de empréstimo inicialmente celebrado entre o Banco ………….., S.A. e a sócia única da Impugnante e seu marido, que o mesmo se destinava ao pagamento da aquisição das quotas, para afastar essa declaração, teriam de ter sido juntos documentos comprovativos desses factos.(…)” Concluindo, assim, pela legalidade da correção porquanto não se subsume no artigo 23.º do CIRC. E a verdade é que, atentando na fundamentação supra não se vislumbra que o Tribunal a quo tenha incorrido no arguido erro de julgamento, na medida em que interpretou adequadamente o regime normativo com a devida transposição para o caso vertente. Senão vejamos. Importa, relevar, ab initio, que, em regra, todos os custos contraídos por um sujeito passivo serão relevados negativamente na determinação do seu lucro tributável, conforme dimana expressamente do artigo 17.º, nº1, do CIRC. De resto, por imperativo constitucional, estatuído no artigo 104.º, n.º 2, da CRP, a tributação das empresas deve incidir sobre o rendimento real. Contudo, conforme dimana da letra do artigo 23.º do CIRC, o legislador não estabeleceu uma correspondência absoluta entre os custos contabilísticos e os custos fiscais, porquanto só devem relevar negativamente no apuramento do lucro tributável os custos ou perdas que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. Com efeito, dispunha o artigo 23.º do CIRC, à data da prática dos factos tributários, sob a epígrafe de “custos ou perdas” que: “Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora nomeadamente os seguintes: a) Encargos relativos à produção ou aquisição de quaisquer bens ou serviços, tais como matérias utilizadas, mão-de-obra, energia e outros gastos gerais de fabricação, conservação e reparação; b) Encargos de distribuição e venda, abrangendo os de transportes, publicidade e colocação de mercadorias; c) Encargos de natureza financeira, como juros de capitais alheios aplicados na exploração, descontos, ágios, transferências, diferenças de câmbio, gastos com operações de crédito, cobrança de dívidas e emissão de acções, obrigações e outros títulos e prémios de reembolso; d) Encargos de natureza administrativa, tais como remunerações, ajudas de custo, pensões ou complementos de reforma, material de consumo corrente, transportes e comunicações, rendas, contencioso, seguros, incluindo os de vida e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de poupança-reforma, contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares da segurança social; e) Encargos com análises, racionalização, investigação e consulta; f) Encargos fiscais e parafiscais; g) Reintegrações e amortizações; h) Provisões; i) Menos-valias realizadas; j) Indemnizações resultantes de eventos cujo risco não seja segurável. (…)” A lei, de facto, não recorta o conceito objetivo de custo, podendo, no entanto, aferir-se a existência de diversos requisitos. Como predicado essencial, tem que existir um gasto económico como contraprestação da aquisição de um fator de produção, em segundo lugar, mostra-se necessário que a componente negativa da base contabilística no âmbito da atividade da empresa não esteja precludida por uma qualquer previsão legal expressa, numa terceira esteira, surgem as exigências formais que determinam a imprescindibilidade de uma idónea comprovação das componentes negativas do rendimento e por último, tem de existir um nexo de indispensabilidade entre os encargos e os proveitos para a obtenção de proveitos e/ou para a manutenção da fonte produtora. Sendo que indispensabilidade não é sinónimo de razoabilidade. “A noção legal de indispensabilidade recorta-se, portanto, sobre uma perspectiva económico-empresarial, por preenchimento, directo ou indirecto, da motivação última de contribuição para a obtenção do lucro (...) o Fisco filtra as decisões da empresa em face do escopo da organização, quer sobre o crivo imediatístico (subsunção dos actos ao ramo ou ramos de actividade estatutariamente definida) quer, sobretudo, em função do fim mediato (obtenção de lucros através dessa actividade, com vista à sua posterior repartição entre os sócios). (...) «Reprime os actos desconformes com o escopo da sociedade, não inseríveis no interesse social, sobretudo porque não visam o lucro, mediante a preclusão da dedutibilidade fiscal dos inerentes custos (9)”. O requisito da indispensabilidade tem sido jurisprudencialmente entendido como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspetiva económica-empresarial, na perceção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um custo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objeto societário do ente comercial em causa. E nessa medida, tem sido entendido pela Jurisprudência que estão vedadas à AT atuações que coloquem em causa o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo (10). Em termos de ónus probatório, importa, ainda, relevar que impende, a montante, sobre a AT pôr em causa a indispensabilidade dos custos, competindo ao sujeito passivo, após essa sindicância, demonstrar que os custos cumprem, efetivamente, esse desiderato. Uma vez convocado o regime jurídico e tecidos os considerandos de direito que para os autos relevam, conforme já deixámos antever anteriormente, não ajuizamos que a decisão recorrida mereça a censura que lhe foi endereçada, porquanto, inversamente ao propugnado pela Recorrente, a AT cumpriu o ónus probatório que sobre si impendia, tendo sindicado o respetivo nexo e a indispensabilidade dos visados encargos financeiros à luz do respetivo escopo empresarial, não tendo, por seu turno, a Recorrente logrado demonstrar a realidade que se impunha para efeitos de comprovação do desiderato, âmbito, e ligação intrínseca ao exercício da atividade societária, conforme assim o evidencia, de forma clara, a matéria de facto não provada. Com efeito, nos presentes autos não resultou provado que os custos tenham sido realizados no interesse da empresa, visando direta ou indiretamente, a obtenção de lucros, tendo presente o seu objecto societário, desde logo, porque inicialmente contraídos em nome pessoal da sócia, e com o desiderato, expressamente, reconhecido no contrato de abertura de crédito de aquisição das quotas da sociedade. De relevar, neste âmbito, que carece de relevância, para o efeito, a aplicação efetivamente dada ao produto do mesmo, porquanto, in casu, tendo sido sindicada, de forma fundamentada, a dedutibilidade fiscal dos aludidos encargos financeiros pela AT, competia à Recorrente demonstrar a realidade que alega, e que não logrou demonstrar-conforme dimana da factualidade não provada- de que a dívida de € 2.500.000,00 contraída junto do Banco ……………, S.A., num primeiro momento por A …. e J ……….., destinou-se a pagar uma dívida que haviam contraído junto de E ………….. com vista à compra pela Impugnante de imóveis em São Tomé e Príncipe. Acresce realçar que, a AT não se demitiu do seu dever inquisitório, na medida em que realizou diversos pedidos de esclarecimentos, devidamente patenteados no Relatório de Inspeção Tributária, quer na esfera societária, quer na esfera pessoal da sócia, não tendo a Recorrente carreado aos autos documentação capaz de demonstrar a realidade que arroga, escudando-se, inclusive, em documentos que não tinham de estar na sua posse, e que, como visto, não podem lograr provimento. No mesmo sentido, e num contexto fático similar (alterações ao nível do tributo, dos exercícios, e pontualmente de fixação da matéria de facto, mas sem relevo digno de registo) e a convocar o mesmo quadro legal, este Tribunal já se pronunciou, com nota de trânsito em julgado, no âmbito dos processos nºs 9929/16, datado de 15 de dezembro de 2016, 9073/15, de 24 de novembro de 2016 e 09154/15, de 18 de abril de 2018, extratando-se, para o efeito, o expendido nos último dos Arestos citados e cuja fundamentação jurídica se secunda e adere, desde logo, tendo em vista a desejável uniformização de jurisprudência consagrada no artigo 8.º do Código Civil. Transcreve-se, assim, no que para os autos releva, designadamente o seguinte: “Ora, a operação de crédito que está na base dos encargos financeiros contabilizados pela impugnante foi realizada num contexto factual que legitima o juízo probatório formado pela AT quanto à falta de relação daquela operação de crédito com o interesse societário, apontando antes os elementos fácticos do processo que o interesse subjacente a tal operação radicou no domínio pessoal da única sócia da impugnante, A ………………… e não no domínio empresarial. Assim, para além de o crédito bancário ter sido contraído por A …………….. e marido, com o propósito declarado da aquisição das quotas da sociedade “Farmácia X…………., L………. & F …….., Lda.”, que na mesma data de 18/03/2004 viria a ser transformada na sociedade “A ……….. — Sociedade Unipessoal, Lda.” (ora impugnante), de que a A ………… se tornou a única sócia e gerente, foi ainda celebrado um contrato designado de “Penhor de Quota e Procuração”, dando de garantia a quota adquirida na nova sociedade. Por outro lado, como também relata a AT (cf. RIT, fls.22 do apenso), no âmbito do procedimento inspectivo a impugnante, apesar de notificada para tanto, não apresentou quaisquer documentos, nomeadamente, os meios de pagamento envolvidos na transacção dos dois imóveis de S. Tomé e Príncipe cujo valor os contratos-promessa referem já ter sido entregue a título de sinal e princípio de pagamento, nem documentos que permitam confirmar quem foi o destinatário dos 2.500.000,006 de crédito contraído e utilizado. Este quadro factual é fortemente indiciador de que a operação de crédito na base dos encargos financeiros contabilizados pela impugnante não foi do seu domínio empresarial, isto é, destinada à aquisição dos dois imóveis de S. Tomé e Príncipe para desenvolvimento da sua actividade, antes se destinava a ser utilizado na aquisição das quotas da sociedade. Tendo a AT cumprido o ónus probatório que lhe incumbia na demonstração de factos que legitimam o juízo formado de que a operação de crédito geradora dos encargos contabilizados não respeita ao desenvolvimento da actividade própria da impugnante, passa a recair sobre a impugnante o ónus de demonstrar factos que permitam formar um juízo conclusivo quanto à indispensabilidade de tais encargos financeiros para a sociedade impugnante, na medida em que se arroga o direito de ver reflectidos tais encargos como componente negativa do lucro tributável - artigos 74.°, n.°l da LGT e 342.°, n.°l, do Código Civil. Ora, a verdade é que a Recorrente nada prova de relevante e conclusivo quanto ao interesse societário da operação de crédito geradora dos encargos contabilizados. Alega que a sentença fez errónea leitura do RIT pois dele não consta a utilização efectiva do crédito de 2.500.000,006 na aquisição das quotas, apenas que esse foi o objectivo contratualmente declarado do empréstimo. Mas salvo o devido respeito, o destino do montante de crédito contraído é irrelevante para se aferir da indispensabilidade dos encargos associados, pois o que verdadeiramente interessava era fazer prova de que o empréstimo contraído pela sócia o fora no interesse da sociedade e se destinava a ser utilizado na aquisição de dois imóveis em S. Tomé e Príncipe para o desenvolvimento da actividade empresarial, bem como explicar, credivelmente, por que razão não foram afinal os imóveis prometidos adquirir em S. Tomé e Príncipe utilizados na actividade da impugnante, como projectado. Ora, isso não resultou minimamente provado e explicado, antes se tendo avolumado com a prova produzida a certeza de que o crédito contraído foi do domínio pessoal da sócia e não do domínio empresarial e, nessa medida, as correcções assentes na desconsideração dos encargos financeiros contabilizados pela impugnante e reflectidas na liquidação impugnada de IRC de 2007, não enfermam de erro nos pressupostos por indemonstrado o requisito da indispensabilidade do custo incorrido com tais encargos, nos termos do art.°23.° do CIRC.” Ora, face a todo o expendido anteriormente, à factualidade vertida no probatório e à fundamentação jurídica constante nos aludidos Arestos citados, não se vislumbra que o Tribunal a quo tenha incorrido no aludido erro de julgamento, razão pela qual improcede a sua pretensão. Aqui chegados, subsiste, ora, por analisar a questão omitida do vício de violação de lei atinente aos custos respeitantes às obras realizadas no imóvel visado no valor de €104.438,67 e que este Tribunal realiza, em substituição, e por dispor de todos os elementos atinentes ao efeito. Vejamos, então. A Recorrente alega que os serviços prestados de carpintaria e serralharia não reúnem os requisitos para que possam ser qualificados como grandes reparações, nem tais serviços aumentaram a vida útil dos bens móveis instalados e objeto dos trabalhos de instalação e manutenção. Adensa, neste âmbito, que as despesas em causa foram necessárias ao regular funcionamento do estabelecimento da Recorrente, e como tal, inquestionavelmente, custos do exercício em que foram efetuadas. Comecemos por convocar as razões de facto e de direito que estão na génese da correção, tendo presente, naturalmente, a fundamentação constante do Relatório de Inspeção Tributária: - O sujeito passivo efetuou diversas obras de remodelação nas instalações onde exerce a sua atividade, de forma a adequar as instalações às disposições legais previstas pelo I………, plasmadas nas faturas elencadas no Anexo 19. - As obras efetuadas no estabelecimento permitem a utilização durante um determinado período de tempo, não se esgotando a sua utilidade apenas no exercício em que foram efetuadas, ou seja, pressupõe uma vida útil , durante a qual se esperam que possam ser utilizados em condições de funcionamento económico. - Os custos incorridos com as obras devem ser imputados a vários exercícios em que foram efetuados, proporcionando a repartição do custo incorrido com as obras efetuadas, pelos exercícios abrangidos pela sua vida útil, devendo ser relevado contabilisticamente através de amortizações. - De acordo com o artigo 31.º, nº5 do CIRC (anterior artigo 30.º), concatenado com o artigo 5.º, nº2, alínea b), do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de janeiro, as taxas de depreciação ou amortização a aplicar às visadas obras são calculadas com base no período de utilidade esperada, e que no caso se ajuizou em 10 anos (10%), na medida em que as obras efetuadas não pressupõem um período de utilidade inferior ao computado para o mobiliário, sendo que foi o próprio sujeito passivo que considerou contabilisticamente o mesmo como integrando o conjunto referente a Edifícios e Outras Construções. - Concluindo, assim, que uma vez que o custo total das obras no ano de 2009 se cifrou em 104.438,67, aplicando a aludida taxa de 10%, a amortização a considerar no exercício visado ascende a €10.443,87, devendo, nessa medida, ser realizada uma correção no valor de €93.994,80. Ora, atentando na aludida fundamentação de facto e de direito, e alocando às obras, efetivamente, realizadas pela Recorrente e descritas nas faturas descritas no ponto 17) da matéria de facto, ora aditada, não se vislumbra que o raciocínio da AT esteja eivado de ilegalidade nos moldes peticionados pela Recorrente. Mas expliquemos porque assim o entendemos, começando por convocar o quadro normativo que releva para o caso vertente. Ab initio, importa ter presente que a amortização consiste em repartir o custo do ativo imobilizado pelos exercícios que beneficiam do seu uso, imputando a cada um dos mesmos a parte que lhes cabe no gasto total efetuado aquando da aquisição do bem (quota de amortização). Como doutrina Freitas Pereira, “as amortizações e reintegrações são o processo contabilístico de distribuir, de forma racional e sistemática, o custo de um activo que se deprecia pelos diferentes exercícios abrangidos pela vida útil (11).” Mais importando ter presente que o ativo imobilizado compreende “[t]odos os elementos que, em condições normais, não são susceptíveis de realização a curto prazo por razões de natureza administrativa”. Integra, portanto, os elementos patrimoniais ativos, corpóreos e incorpóreos, não destinados à venda, cuja utilidade se não esgota total e imediatamente na primeira operação em que intervém, antes perdura por prazos mais ou menos longos (12).” Sendo certo que no domínio das imobilizações são de distinguir as corpóreas ou fixas, ou ainda as tangíveis, e as incorpóreas ou intangíveis. No concernente às imobilizações corpóreas, ou, numa denominação mais atualizada, os ativos fixos tangíveis, como “[m]eios de produção ou bens de uso duradouro, “(...) trata-se, pois, de coisas concretas ou materiais que, não sendo objeto direto das operações da empresa, lhe servem de condições ou de “ferramentas de trabalho.”, enquanto as imobilizações incorpóreas, ou ativos intangíveis, são coisas imateriais, “[r]es quae tangi non possunt. Carecem de existência física e não são, por conseguinte, apreensíveis ou perceptíveis pelos sentidos (13).” No concernente ao quadro normativo que releva para efeitos de dilucidação da questão em contenda, importa, novamente ter presente o artigo 23.º, do CIRC, o qual dispunha que: “1 - Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes: (…) g) Reintegrações e amortizações”. Dimanando, por seu turno, do artigo 28.º, nº1, do CIRC, que: “[s]ão aceites como custos as reintegrações e amortizações de elementos do ativo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais os elementos do ativo imobilizado que, com caráter repetitivo, sofrerem perdas de valor resultantes da sua utilização, do decurso do tempo, do progresso técnico ou de quaisquer outras causas”. Mais preceituando o artigo 29.º, nº1 do CIRC que: “O cálculo das reintegrações e amortizações do exercício deve fazer-se, em regra, pelo método das quotas constantes.” No concernente às quotas de amortização dispunha o artigo 30.º do mesmo diploma legal que: Neste particular, importa, outrossim, convocar o Diploma que veio regulamentar o desenvolvimento técnico do respetivo regime das amortizações, concretamente o Decreto-Regulamentar nº 2/90, o qual no seu artigo 1.º estatui que: “… [p]odem ser objeto de reintegração e amortização os elementos do ativo imobilizado sujeitos a deperecimento”. Preceituando quanto ao período de vida útil, o artigo 3.º do aludido diploma que: De chamar ainda à colação, neste âmbito, o artigo 5.º o qual a propósito do método das quotas constantes consagra que: Tecidos os considerandos de direito e visto o quadro legal, regressemos ao caso dos autos. Como visto, a Recorrente entende que contrariamente ao aduzido pela AT os custos visados deveriam ser, integralmente, dedutíveis no período em que são incorridos, porquanto são meras obras de carpintaria e serralharia, logo insuscetíveis de qualificação como grandes reparações, e nessa medida, sem aumentar o período de vida útil do edifício onde são realizadas. Mas assim o não entendemos, desde logo, porque a Recorrente não substancia -com o devido rigor e como legalmente se impunha- as obras que realizou e que permitam apartar a qualificação afirmada pela AT e patenteada por reporte ao descritivo contemplado nas faturas e bem assim porque mediante cotejo das mesmas a sua alegação retrata, singela e redutoramente, a realidade nelas contemplada. Senão vejamos. Com efeito, nas faturas descritas no ponto 17 do probatório retira-se que as obras realizadas se coadunaram, maioritária e de forma marcadamente expressiva, com rede de eletricidade, serviços de construção civil, rede de iluminação e estruturada, rede e bastidor de cablagem, logo realidades que se incorporam -contrariamente ao por si, conclusivamente, alegado- no edifício em questão. É certo que, existe uma evidência nas visadas faturas a carpintarias e serralharias, mas para além da sua reduzida expressão a verdade é que da sua mera alegação -sem qualquer realidade fática que permite inferir em sentido contrário- o que se conclui é que se integram nos próprios imóveis e contribuem de forma clara para um provável aumento da sua vida útil. Como doutrinado em Aresto do STA, proferido no processo nº 0917/04, de 02 de fevereiro de 2005, cujo sumário se extrata: In casu, face ao teor do probatório, ter-se-á de concluir que as obras executadas, inversamente ao aduzido pela Recorrente, se coadunam com o qualificativo de grandes reparações, consistentes, designadamente, em obras de construção civil por apresentarem características de aderência e de inamovibilidade, logo contribuem para aumentar o seu valor real e para um aumento provável da sua duração. Aliás, a adensar o supra exposto, está, desde logo, a faturação atinente a projeto de arquitetura e projetos de especialidades, o que permite inferir, justamente, no sentido de grandes reparações e não de meras obras de reparação conforme a Recorrente alega na sua petição inicial. Destarte, não logra provimento o seu entendimento no sentido da assunção integral do custo no exercício de 2009, e por assim ser, nada tendo sido sindicado e contestado quanto à concreta aplicação da taxa de amortização aplicada pela AT, improcede o vício de violação de lei arguido pela Recorrente no atinente à subsunção normativa e integral dedutibilidade fiscal do valor dos custos de €104.438,67, mantendo-se, assim, a correção realizada no valor de €93.994,80. *** IV. DECISÃO Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em: Julgar parcialmente nula, a sentença por omissão de pronúncia, no atinente ao vício de violação de lei arguido quanto à correção dos custos com as obras realizadas no imóvel e, em substituição, julgar improcedente a aludida arguição, no mais NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica. Lisboa, 04 de maio de 2023 (Patrícia Manuel Pires) (Jorge Cortês) (Luísa Soares) (1)Código de Processo Civil anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), pág. 143. (2)António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª edição, pp 165 e 166; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, CPC anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; Vide, designadamente, Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº 6505/13, de 2 de julho de 2013. (3) In Aresto do STJ, prolatado no processo nº 05B1417, datado de 09.06.2005. (4) In Código Civil Anotado, Volume I, 1987, 4ª edição, Coimbra Editora, pág, 327. (5) cfr. Lei Geral Tributária, Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.º edição, 2012, página 675. (6) neste sentido vide Acórdãos do STA, de 17.03.2011, proc. n.º 0964/10, de 12.03.2014, proc. n.º 01674/13, de 09.09.2015, proc. n.º 01173/14, integralmente disponíveis para consulta em www.dgsi.pt. (7) Vide Acórdão do STA, proferido no processo nº 01674/13, de 12 de março de 2014, disponível para consulta em www.dgsi.pt. (8)Vide Acórdão deste TCA, proferido no processo n.º 06134/12, de 04.12.2012 (9) TOMÁS TAVARES, «Da Relação de Dependência Parcial entre a Contabilidade e o Direito Fiscal na Determinação do Rendimento Tributável das Pessoas Colectivas: Algumas Reflexões ao Nível dos Custos», C.T.F. n.º 396, página 135 (10) Neste sentido, vide, designadamente, os Acórdão do STA, proferidos nos processos 0627/16, 1236/05, datados de 28.06.2017 e de 29.03.2006, respetivamente. (11) A Periodização do Lucro Tributável, CTF, 1988, p. 157. (12) F.V. Gonçalves da Silva, Imobilizações e Amortizações, 2ª Edição revista, Lisboa, Livraria Sá da Costa Editora, 1972, p.2. (13) F.V. Gonçalves da Silva, Ob. cit, pp. 20 e 21. (14) Vide, também, neste sentido, designadamente, os Acórdãos do STA, proferidos nos processos nº 0123/06, de 17.05.2006; 323/05, de 06.07.2005; 917704, de 22.05.2004, e deste TCAS proferidos nos processos nº 401/10, de 15.04.2021 e 07134/02, de 04.11.2003. |