Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:13007/16
Secção:CA
Data do Acordão:04/07/2016
Relator:CATARINA JARMELA
Descritores:INTIMAÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES – ARTIGO 11º N.º 5, DA LADA
Sumário:I – De acordo com o disposto no art. 11º n.º 5, da LADA, o acesso aos documentos administrativos não envolve a elaboração de uma listagem de onde conste a informação pretendida, pois tal implicaria que a Administração procedesse à criação de um (novo) documento, concretamente de uma súmula da documentação existente na sua posse, sendo certo que o que é protegido no direito à informação administrativa é o acesso a documentos existentes.
II - De todo o modo, e face ao estatuído no art. 11º n.º 1, als. a) a c), da LADA, a Administração deverá facultar o acesso aos documentos administrativos de onde consta a informação pretendida [in casu data de entrada dos pedidos de passagem à reforma recebidos na CGA relativamente a oficiais das Forças Armadas, entre 1.3.2013 e 12.9.2014, data dos respectivos despachos de reconhecimento do direito à aposentação e data em que os referidos despachos produziram efeitos], através de consulta gratuita, reprodução por fotocópia (ou por qualquer meio técnico) ou certidão, conforme opção do interessado [e, não tendo este exercido tal opção, deverá a Administração, atento o prescrito no art. 13º n.º 4, da LADA, convidá-lo a efectuar tal opção].
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:A. intentou o presente processo de intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões contra a Caixa Geral de Aposentações (CGA), no qual peticionou:
- a intimação da entidade requerida para remeter ao requerente a informação solicitada, ou seja, para informar sobre a data de entrada de todos os pedidos de passagem à reforma recebidos na CGA, relativamente a oficiais das Forças Armadas, entre 1.3.2013 e 12.9.2014, a data dos respectivos despachos de reconhecimento do direito à aposentação, bem como a data em que os mesmos (despachos) produziram efeitos;
- a fixação à entidade requerida de prazo para o cumprimento, sob pena de fixação de adequada sanção pecuniária compulsória, a fixar pelo prudente arbítrio do tribunal, por cada dia de atraso em relação ao prazo que vier a ser fixado para o cumprimento da sentença que recaia sobre o presente pedido.

Por sentença de 31 de Dezembro de 2015 do TAC de Lisboa a presente acção foi julgada procedente e, em consequência, a CGA foi intimada a informar o requerente, em prazo não superior a dez dias, “sobre a data de entrada de todos os pedidos de passagem à reforma recebidos na CGA, relativamente a Oficiais das Forças Armadas, entre 01/03/2013 e 12/09/2014, a data dos respectivos despachos de reconhecimentos do direito à aposentação bem como a data em que os mesmos (despachos) produziram efeitos”.

Inconformada, a Caixa Geral de Aposentações interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul dessa sentença, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões:

A) Entende a Caixa Geral de Aposentações que a decisão recorrida deve ser revogada, por assentar em incorrecta interpretação e aplicação da lei, nomeadamente do disposto no artigo 109.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, por um lado, por outro, por violação do disposto no artigo 11.º, n.º 5, da Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto.

B) O recorrido recebeu desta Caixa os elementos necessários, onde constam todos os actos, diligências e informações solicitadas e essenciais, para que aquele pudesse fazer valer os seus direitos em sede própria, que não esta.

C) Seria muito mais cordial que o recorrido tivesse proposto Acção contra o despacho que lhe reconheceu o direito à pensão, uma vez que parece não concordar com as regras de cálculo que lhe foram aplicadas e não por comparação com as que foram aplicadas a outros aposentados.

D) A transmissão de dados pessoais constantes de ficheiros administrativos encontra-se regulada pela Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro, a qual apenas permite a utilização daqueles para as finalidades que determinaram a sua recolha – princípio da finalidade –, o que impede, em princípio, a sua transmissão a terceiros.

E) De acordo com o disposto no artigo 11.º, n.º 5, da Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto, “A entidade requerida não tem o dever de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido, nem a obrigação de fornecer extractos de documentos, caso isso envolva um esforço desproporcionado que ultrapasse a simples manipulação dos mesmos”.

F) O pedido de informação objecto da presente Acção de intimação envolve um esforço desmesurado, tal como a norma estabelece como paradigma de comparação entre o razoável e o desproporcionado, ultrapassando, inclusive, a simples manipulação dos documentos subjacentes ao acervo global da informação requerida.

G) É manifesto que o pedido formulado pelo recorrido configura toda uma manipulação de dados e a elaboração de um documento, onde teriam de constar, todos os pedidos de passagem à reforma de oficiais das forças armadas que deram entrada na CGA, (identificação dos interessados e data de entrada dos pedidos na CGA), data dos respectivos despachos de reconhecimento do direito à aposentação e data em que os mesmos despachos produziram efeitos.

H) Nesta conformidade, pelos motivos aduzidos, a Sentença posta em causa, que não julgou extinta a instância por impossibilidade da lide, aliás, em conformidade com o disposto no artigo 277.º, alínea e), do Código de Processo Civil, fez incorrecta interpretação das normas aplicáveis à natureza do pedido, pelo que se impõe a procedência do recurso, com as legais consequências.

Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional e revogada a decisão recorrida”.

O recorrido apresentou contra-alegações, onde pugnou pela improcedência do recurso.

O Ministério Público junto deste TCA Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso jurisdicional, posicionamento esse que, objecto de contraditório, não mereceu qualquer resposta.


II - FUNDAMENTAÇÃO
Na sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos:
“A. Por requerimento de 21 de Agosto de 2015, recebido nos serviços da Requerida Caixa Geral de Aposentações em 31 de Agosto de 2015, o ora Requerente solicitou informação sobre a data de entrada de todos os pedidos de passagem à reforma apresentados por oficiais das Forças Armadas entre 01/03/2013 e 10/11/2014, a data dos respectivos despachos de reconhecimento do direito à aposentação e a data em que estes produziram efeitos. (cf. documento junto com o Requerimento Inicial sob o n.º 6, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
B. A Requerida Caixa Geral de Aposentações respondeu ao pedido de informação referido na Alínea anterior pelo Ofício n.º …, de 07 de Setembro de 2015, com o seguinte teor:
«Assunto: Exposição sobre reapreciação de pedido de elementos referentes a terceiros. Queixa apresentada por A., pensionista n.º ….
Reportando-me ao assunto acima referenciado, informo V. Ex.ª de que, não obstante a pertinência dos argumentos aduzidos na exposição de 21 de agosto de 2015, é convicção desta Caixa que, por o pedido de elementos formulado por A. configurar um tratamento de dados pessoais, o deferimento da sua pretensão encontra-se sempre condicionada à apresentação de autorização da Comissão de Protecção de Dados Pessoais.» (cf. documento junto com o Requerimento Inicial sob o n.º 7)”.
*
Presente a factualidade antecedente, cumpre entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.

A questão suscitada pela recorrente resume-se, em suma, em determinar se a decisão recorrida incorreu em erro ao ter julgado procedente o pedido de intimação (cfr. alegações de recurso e respectivas conclusões, supra transcritas).

Antes, porém, cumpre apreciar da admissibilidade da junção aos autos dos documentos apresentados pela recorrente com as alegações e pelo recorrido com as contra-alegações.

Passando à análise da questão relativa à admissibilidade da junção aos autos dos documentos apresentados com as alegações e as contra-alegações

A recorrente apresentou com as alegações de recurso sete documentos e o recorrido juntou dois documentos às contra-alegações de recurso.

Vejamos.

A junção de documentos tem lugar, por regra, na 1ª instância, e deve ocorrer até ao encerramento da discussão, nos termos do art. 423º n.º 3, conjugado com o art. 425º, ambos do CPC de 2013.

Este princípio admite, contudo, algumas excepções, sendo admitida, de acordo com o disposto no art. 651º n.º 1, do CPC de 2013, a junção de documentos às alegações quando a sua apresentação:

a) não tenha sido possível até ao momento do encerramento da discussão em 1ª instância, ou por a parte não ter conhecimento da sua existência ou, conhecendo-a, por lhe não ter sido possível fazer uso deles, ou ainda por os documentos se terem formado ulteriormente;

b) apenas se tornou necessária em virtude do julgamento da causa na instância recorrida, ou seja, é o imprevisto da decisão proferida que faz fundar a junção do documento (v.g. por esta se ter baseado em meio probatório não oferecido pelas partes ou em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação as partes justificadamente não contavam).

Retomando o caso vertente verifica-se que os sete documentos que a recorrente juntou com as alegações foram por si produzidos e têm uma data anterior à instauração da presente acção de intimação, sendo certo que a recorrente nada alegou no sentido de que tal junção só se revelou possível ou necessária em sede recursiva.

Além disso, também se verifica que um dos documentos que o recorrido juntou com as contra-alegações tem uma data anterior à instauração da presente acção de intimação e o outro tem uma data anterior ao despacho que ordena a citação da recorrente, sendo certo que o recorrido nada alegou no sentido de que tal junção só se revelou possível ou necessária em sede recursiva.

Nestes termos, e face ao estatuído no art. 651º n.º 1, conjugado com o art. 443º n.º 1, ambos do CPC de 2013, os referidos documentos não devem ser admitidos – pois, por um lado, nada se provou no sentido da impossibilidade da sua junção até ao encerramento da discussão em 1ª instância e, por outro lado, nada foi demonstrado no sentido de que a sua junção só se revelou necessária em sede recursiva -, razão pela qual deverá ser determinado o seu desentranhamento [mesmo que, assim não se entendesse, e quantos aos documentos n.ºs 5 e 7, apresentados com as alegações, e aos dois documentos juntos com as contra-alegações, sempre seria de determinar o seu desentranhamento, dado que a sua junção seria desnecessária, pois constituem uma mera repetição de documentos já juntos aos autos (cfr. Docs. n.ºs 3 – constante de fls. 14, dos autos em suporte de papel -, 5 - constante de fls. 19 a 24, dos autos em suporte de papel - e 7 - constante de fls. 30, dos autos em suporte de papel -, juntos com o requerimento inicial, documento de fls. 49 a 59, dos autos em suporte de papel, e Doc. n.º 1, junto com a contestação)] e consequente restituição aos apresentantes.

A recorrente e o recorrido, e face ao disposto no art. 443º n.º 1, parte final, do CPC de 2013, conjugado com o art. 27º n.ºs 1 e 4, do RCP, deverão ser condenados na multa de 2 (duas) UC e 1 (uma) UC, respectivamente.


Passando à apreciação da questão relativa ao alegado erro da decisão recorrida ao ter julgado procedente o pedido de intimação

Na sentença recorrida a recorrente foi intimada a informar o recorrido, em prazo não superior a dez dias, “sobre a data de entrada de todos os pedidos de passagem à reforma recebidos na CGA, relativamente a Oficiais das Forças Armadas, entre 01/03/2013 e 12/09/2014, a data dos respectivos despachos de reconhecimentos do direito à aposentação bem como a data em que os mesmos (despachos) produziram efeitos”.

Tal decisão assentou na seguinte fundamentação:

«A intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões visa tutelar o direito à informação administrativa procedimental e o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, consagrados no artigo 268.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, respectivamente.

Enquanto a informação procedimental visa a tutela de interesses e posições subjectivas directas daqueles que intervêm (ou podem intervir) num concreto procedimento administrativo, o acesso aos arquivos e registos administrativos visa proteger o interesse mais objectivo da transparência administrativa, sendo, por isso, também, diversos os regimes jurídicos que lhes correspondem. O direito à informação administrativa procedimental está regulado no Código do Procedimento Administrativo e o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos na Lei n.º 46/07, de 24 de Agosto.

No caso dos autos, o Requerente pretende obter a intimação da Requerida Caixa Geral de Aposentações para prestar informação sobre a data de entrada de todos os pedidos de passagem à reforma apresentados por oficiais das Forças Armadas entre 01/03/2013 e 12/09/2014, a data dos respectivos despachos de reconhecimento do direito à aposentação e a data em que estes produziram efeitos.

Os elementos pretendidos foram solicitados à Administração por requerimento apresentado em 31 de Agosto de 2015 (cf. Alínea A), dos Factos Assentes), ao qual a Autoridade Requerida respondeu pelo Ofício n.º , de 07 de Setembro de 2015, aí referindo que “…não obstante a pertinência dos argumentos aduzidos (…) por o pedido de elementos formulado (...) configurar um tratamento de dados pessoais, o deferimento da (…) pretensão encontra-se sempre condicionada à apresentação de autorização da Comissão de Protecção de Dados Pessoais.” (cf. Alínea B), dos Factos Assentes).

O pedido de acesso a documentos que constitui o fundamento para o pedido de intimação judicial insere-se no direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, consagrado no n.º 2, do artigo 268.º, da Constituição da República Portuguesa, e concretizado na Lei n.º 46/07, de 24 de Agosto - Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (LADA).

Como sublinha a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), no Parecer n.º 400/2015, que o Requerente juntou aos autos, a Lei de Acesso aos Documentos Administrativos e a Lei de Protecção de Dados Pessoais têm objectivos e âmbitos diferentes. Enquanto a primeira visa assegurar, designadamente pelo controlo por parte dos particulares, a maior transparência possível do processo decisório das entidades administrativas públicas e das informações em que estas baseiam as suas decisões, destinando-se, portanto, a facilitar ao máximo o exercício do direito de acesso aos documentos e a promover as boas práticas administrativas (sem, contudo, relegar para plano subalterno os direitos, liberdades e garantias), a segunda tem por objectivo garantir a protecção das liberdades e dos direitos fundamentais das pessoas singulares, nomeadamente da sua vida privada relativamente ao tratamento de dados pessoais. Daí que possa dizer-se que o acesso aos documentos que contêm dados pessoais é abrangido pelo âmbito de aplicação da Lei de Acesso aos Documentos Administrativos, devendo, no entanto, determinados interesses público e privados ser protegidos através de excepções.

A Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto (LADA), no seu artigo 1.º, dispõe que “O acesso e a reutilização dos documentos administrativos são assegurados de acordo com os princípios da publicidade, da transparência, da igualdade, da justiça e da imparcialidade.”.

O artigo 5.º, da LADA, estabelece que “Todos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua existência e conteúdo.”.

Para efeitos da LADA «Documento administrativo» é “qualquer suporte de informação sob forma escrita, visual, sonora, electrónica ou outra forma material, na posse dos órgãos e entidades referidos no artigo seguinte, ou detidos em seu nome” [cfr. artigo 3.º, n.º 1, alínea a)].

A regra da liberdade de acesso aos documentos administrativos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, sofre as restrições previstas no artigo 6.º, da LADA. Uma das restrições identificadas neste preceito legal é a que se refere aos documentos nominativos, aos quais um terceiro só poderá aceder “…se estiver munido de autorização escrita da pessoa a quem os dados digam respeito ou demonstrar interesse directo, pessoal e legítimo suficientemente relevante segundo o princípio da proporcionalidade.”. ” [cfr. artigo 3.º, n.º 1, alínea a)].

Os documentos nominativos “são objecto de comunicação parcial sempre que seja possível expurgar a informação relativa à matéria reservada” [cfr. artigo 6.º, n.º 4, alínea a)].

A definição legal de “documento nominativo» consta da alínea b), do n.º 1, do artigo 3.º: “o documento administrativo que contenha, acerca de pessoa singular, identificada ou identificável, apreciação ou juízo de valor, ou informação abrangida pela reserva da intimidade da vida privada”.

São de classificar como documentos nominativos os que revelam dados do foro íntimo de um indivíduo, como, por exemplo os seus dados genéticos, de saúde ou os que se prendam com a sua vida sexual, os relativos às suas convicções ou filiações filosóficas, políticas, religiosas, partidárias ou sindicais, os que contêm opiniões sobre a pessoa ou outros documentos cujo conhecimento por terceiros possa, em razão do seu teor, traduzir-se numa invasão da reserva da intimidade da vida privada – vd. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 5 de Maio de Maio de 2011, proferido no Processo n.º 07399/11, disponível em www.dgsi.pt; Pareceres da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos n.ºs 171/2006, e 139/2006, disponíveis em www.cada.pt

O direito de acesso aos registos e arquivos administrativos vem sendo considerado como um direito fundamental, de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, cujo sacrifício só se justifica quando confrontado com direitos e valores constitucionais de igual ou maior valia, como são os relativos à segurança interna e externa, à investigação criminal e à reserva da intimidade da vida das pessoas. O poder de a Administração recusar o acesso à sua documentação é um poder vinculado aos princípios e objectivos fixados por lei, a ser exercitado segundo os princípios da transparência e da proporcionalidade, que só deve ser invocado quando o mesmo for indispensável para evitar prejuízos que não poderiam ser evitados doutra forma. – cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 8 de Março de 2012, proferido no Processo n.º 08369/11, disponível em www.dgsi.pt

A informação a que o Requerente pretende aceder – informação sobre a data de entrada na Caixa Geral de Aposentações dos pedidos de passagem à reforma apresentados por oficiais das Forças Armadas entre 01/03/2013 e 12/09/2014, data dos respectivos despachos de reconhecimento do direito à aposentação e a data em que estes produziram efeitos -, não tem carácter nominativo, nem envolve quaisquer elementos sujeitos a restrições de acesso (artigo 6.º, da LADA), sendo, pois, de acesso livre e generalizado nos termos do artigo 5.º, da Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto, não se encontrando, assim, o Requerente obrigado a enunciar qualquer interesse, sendo que alegou – desde logo no requerimento que dirigiu à Requerida Caixa Geral de Aposentações, solicitando os elementos pretendidos – que tais elementos são necessários para aferir do procedimento adoptado pela Caixa Geral de Aposentações relativamente à reforma de outros militares com vista à defesa dos seus direitos à obtenção de tratamento igual.

Não envolvendo o pedido de informação em causa elementos abrangidos pelo segredo que exclui o direito à informação administrativa e considerando que o direito de acesso aos registos e arquivos administrativos abrange todos os documentos na posse dos órgãos e entidades referidas no artigo 4.º, da Lei n.º 46/07, de 24 de Agosto, ou detidos em seu nome, compreendendo os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua existência e conteúdo [artigos 3.º, n.º 1, alínea a) e 5.º, da Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto], a Autoridade Requerida, abrangida pelo âmbito de aplicação subjectivo da Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto [artigo 4.º, n.º 1, alínea c)], estava obrigada a prestar a informação requerida, no prazo de dez dias [artigo 14.º, n.º 1, da Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto, contado nos termos do artigo 87.º, do Código do Procedimento Administrativo.

Assim, a presente intimação deve ser julgada procedente e, em consequência, a Requerida Caixa Geral de Aposentações intimada para, em prazo não superior a dez dias [artigo 108.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos], informar o Requerente “sobre a data de entrada de todos os pedidos de passagem à reforma recebidos na CGA, relativamente a Oficiais das Forças Armadas, entre 01/03/2013 e 12/09/2014, a data dos respectivos despachos de reconhecimento do direito à aposentação bem como a data em que os mesmos (despachos) produziram efeitos.”».

A recorrente defende que a sentença recorrida incorreu em erro ao julgar procedente o pedido de intimação, dado que:

1) Assenta em incorrecta interpretação do disposto no art. 109º n.º 1, do CPTA;

2) A transmissão de dados pessoais constantes de ficheiros administrativos encontra-se regulada pela Lei 67/98, de 26/10, a qual apenas permite a utilização daqueles para as finalidades que determinaram a recolha, o que impede, em princípio, a sua transmissão a terceiros;

3) Violou o disposto no art. 11º n.º 5, da Lei 46/2007, de 24/8 (cfr. conclusões das alegações de recurso).

Passemos, então, à determinação do acerto (ou não) da decisão judicial recorrida, através da análise destes três fundamentos, dado que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artºs. 608º, nº 2, 635º, nºs 4 e 5 e 639º, nº 1, todos do CPC, ex vi artº 140º do CPTA.

1)

Alega a recorrente que a sentença recorrida assenta em incorrecta interpretação do disposto no art. 109º n.º 1, do CPTA, dado que já entregou ao recorrido todos os elementos necessários para que este possa valer os seus direitos, salientando que seria mais adequado que o recorrido tivesse impugnado o despacho que lhe reconheceu o direito à pensão.

Apreciando.

O art. 109º n.º 1, do CPTA, respeita à intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, ou seja, carece de razão de ser a sua invocação no presente processo, o qual se consubstancia num processo de intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões (cfr. arts. 104º a 108º, do CPTA).

Acresce que, face ao estatuído no art. 5º, da Lei 46/2007, de 24 de Agosto - diploma que regula o acesso aos documentos administrativos e sua reutilização, de ora em diante designada como Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (LADA) -, e conforme salientado na sentença recorrida, o recorrido não se encontra obrigado a enunciar qualquer interesse para aceder à informação ora em causa.

Nestes termos, improcede o invocado nas conclusões A) (parte), B) e C), das alegações de recurso.

2)

Argumenta também a recorrente que a transmissão de dados pessoais constantes de ficheiros administrativos encontra-se regulada pela Lei 67/98, de 26/10, a qual apenas permite a utilização daqueles para as finalidades que determinaram a recolha – princípio da finalidade -, o que impede, em princípio, a sua transmissão a terceiros.

Apreciando.

Da factualidade alegada e, por maioria de razão, da factualidade dada como provada nestes autos nada resulta no sentido de que a informação a que o recorrido pretende ter acesso consta de um ficheiro de dados pessoais, para efeitos da Lei 67/98, de 26/10 (Lei da Protecção de Dados Pessoais) [cfr. o respectivo art. 3º, al. c), de acordo com o qual, para efeitos desta lei, ficheiro é qualquer conjunto estruturado de dados pessoais, acessível segundo critérios determinados], o que implica que careça de fundamento a aplicação ao caso sub judice da referida Lei 67/98.

Nestes termos, improcede o invocado na conclusão D), das alegações de recurso.

3)

Invoca ainda a recorrente que a sentença recorrida viola o disposto no art. 11º n.º 5, da LADA, já que o pedido de informação envolve um esforço desmesurado, ultrapassando a simples manipulação dos documentos subjacentes ao acervo global da informação requerida, pois implica a elaboração de um documento.

Vejamos.

No caso dos autos está em causa, tal como se entendeu na sentença recorrida, o exercício do direito à informação extra-procedimental, e, portanto, a aplicação do disposto na LADA, já que a informação requerida respeita a documentos que se encontrarão nos arquivos da recorrente.

Estatui o art. 5º, da LADA, que “Todos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua existência e conteúdo”.

E o art. 11º n.º 1, desse mesmo diploma legal, que:
O acesso aos documentos administrativos exerce-se através dos seguintes meios, conforme opção do requerente:
a) Consulta gratuita, efectuada nos serviços que os detêm;
b) Reprodução por fotocópia ou por qualquer meio técnico, designadamente visual, sonoro ou electrónico;
c) Certidão”.

Do art. 5º, conjugado com o art. 11º n.º 1, als. a) a c), ora transcritos, resulta que o direito à informação materializa-se através da consulta dos documentos, pela reprodução ou declaração autenticada dos mesmos, pela prestação de indicações sobre a sua existência e conteúdo e pela passagem de certidões.

Conforme se salienta no Ac. do STA de 17.1.2008, proc. n.º 896/07, “(…) a postura da Administração perante o direito à informação não pode ser meramente passiva, uma vez que a lei obriga-a não só a facultar o acesso à sua documentação mas também a informar os requerentes da existência e conteúdo desses documentos, a reproduzi-los e a passar as certidões que lhe forem pedidas, sendo certo ainda que o art.º 7.º do CPA(1) lhe impõe “prestar aos particulares as informações e os esclarecimentos de que careçam” (vd. al.ª a) do seu n.º 1, com sublinhado nosso)”.

De todo o modo, prescreve o n.º 5 do art. 11º, da LADA, o seguinte:
A entidade requerida não tem o dever de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido, nem a obrigação de fornecer extractos de documentos, caso isso envolva um esforço desproporcionado que ultrapasse a simples manipulação dos mesmos”.

Deste normativo legal decorre que o acesso aos documentos administrativos não envolve:
- o dever de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido de informação;
- a obrigação de fornecer extractos de documentos, caso isso envolva um esforço desproporcionado que ultrapasse a simples manipulação dos mesmos.

A este propósito sublinha-se no citado Ac. do STA de 17.1.2008 que “É certo que este dever de informação não compreende, como é lógico e evidente, a elaboração de dossiers estruturados ou sínteses da documentação existente e bem assim o seu tratamento ou sistematização, nem a obrigação de produzir uma nova documentação com o propósito de satisfazer o pedido do Requerente porque tais actividades ultrapassam o dever legal de colaboração e de informação (…)” – também neste sentido, Ac. do STA de 4.2.2016, proc. n.º 1370/15.

Retomando o caso vertente verifica-se que a sentença recorrida intimou a recorrente a informar o recorrido sobre:
- a data de entrada de todos os pedidos de passagem à reforma recebidos na CGA relativamente a oficiais das Forças Armadas, entre 1.3.2013 e 12.9.2014;
- a data dos respectivos despachos de reconhecimento do direito à aposentação;
- a data em que os referidos despachos produziram efeitos.

De todo o modo, cabe salientar que a sentença recorrida não concretizou o modo de cumprimento de tal obrigação de informação.

Ora, o cumprimento da sentença recorrida implica, desde logo, que a recorrente informe o recorrido sobre a existência nos seus arquivos de documentos relativos a pedidos de passagem à reforma apresentados por oficiais das Forças Armadas e recebidos entre 1.3.2013 e 12.9.2014 que tenham merecido despacho de deferimento.

Caso a informação seja positiva, e face ao disposto no art. 11º n.º 5, da LADA, a recorrente não terá de elaborar uma listagem de onde conste:

- a data de entrada de cada um desses pedidos;
- a data de cada um dos despachos de reconhecimento do direito à aposentação;
- a data em que cada um dos referidos despachos produziram efeitos,
pois tal implicaria que a recorrente procedesse à criação de um (novo) documento, concretamente de uma súmula da documentação existente na sua posse acerca dos pedidos de passagem à reforma recebidos relativamente a oficiais das Forças Armadas, entre 1.3.2013 e 12.9.2014, que mereceram despacho favorável.

Dito por outras palavras, não tendo a recorrente nos seus arquivos um documento do qual conste toda essa informação, a mesma não é obrigada a criá-lo, a fim de dar satisfação ao pedido de informação do recorrido, atento o estatuído no art. 11º n.º 5, da LADA, dado que o que é protegido no direito à informação administrativa é o acesso a documentos existentes.

De todo o modo, e face ao estatuído no art. 11º n.º 1, als. a) a c), da LADA, acima transcrito, deverá a recorrente facultar ao recorrido o acesso aos documentos administrativos de onde consta a referida informação [data de entrada desses pedidos, data dos respectivos despachos de reconhecimento do direito à aposentação e data em que os referidos despachos produziram efeitos], através de consulta gratuita, reprodução por fotocópia (ou por qualquer meio técnico) ou certidão, conforme opção do recorrido [não tendo o mesmo exercido tal opção até à data, deverá a recorrente, atento o prescrito no art. 13º n.º 4, da LADA, convidá-lo a efectuar tal opção].

Do exposto resulta que o cumprimento do dever de informação, tal como foi configurado na sentença recorrida, não implica a violação do art. 11º n.º 5, da LADA.


Conclui-se, assim, que improcedem as conclusões A) (parte) e E) a H), das alegações de recurso.

Nestes termos, deverá ser julgado improcedente o pedido de revogação da decisão recorrida, a qual deverá ser mantida.

*

Uma vez que a recorrente ficou vencida no presente recurso jurisdicional deverá suportar as custas (cfr. art. 527 n.ºs 1 e 2, do CPC de 2013, ex vi art. 1º, do CPTA).

III - DECISÃO
Pelo exposto, acordam, em conferência, as Juízas Desembargadoras do Tribunal Central Administrativo Sul em:

I – a) Determinar o desentranhamento dos sete documentos apresentados pela recorrente com as alegações de recurso, bem como a sua restituição à apresentante.

b) Determinar o desentranhamento dos dois documentos apresentados pelo recorrido com as contra-alegações, bem como a sua restituição ao apresentante.

c) Negar total provimento ao presente recurso jurisdicional, e assim manter a decisão recorrida.

II – a) Condenar a recorrente na multa de 2 (duas) UC.
b) Condenar o recorrido na multa de 1 (uma) UC.
c) Condenar a recorrente nas custas relativas ao presente recurso jurisdicional.

III – Registe e notifique.

*
Lisboa, 7 de Abril de 2016


_________________________________________
(Catarina Jarmela - relatora)

_________________________________________
(Conceição Silvestre)

_________________________________________
(Cristina dos Santos)

(1)Que corresponde ao art. 11º, do CPA de 2015.