Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05133/11
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:05/22/2012
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. IRC. REAVALIAÇÃO. OFERTAS. CUSTO ESTIMADO. INDEMNIZAÇÃO.
Sumário:Doutrina que dimana da decisão:
1. É legal o expurgo da reavaliação que havia sido efectuada pela contribuinte de um terreno destinado a construção urbana em que o havia transferido indevidamente para o seu activo imobilizado (desta forma permitindo-lhe reavaliá-lo), mas que sempre esteve afecto ao exercício da sua actividade comercial e industrial;
2. Os montantes incorridos pela contribuinte em gastos com artigos ofertados a clientes e fornecedores não podem constituir custos fiscais quando, pela ausência de identificação destes, não é possível aferir da sua relação com os proveitos ou ganhos ou com a manutenção da fonte produtora;
3. Deve ser desconsiderado como custo fiscal um custo que foi estimado pela contribuinte quando existe a possibilidade de conhecer a sua real dimensão, de acordo com o número de fogos construídos e entregues ao Município nesse exercício;
4. O valor da indemnização paga pelo promitente vendedor pela resolução de um contrato promessa de compra e venda, por acordo entre os promitentes, constitui um custo fiscal, inserindo-se num normal critério de gestão do que considera ser mais vantajoso para o prosseguimento da sua actividade comercial, que a AT não pode afastar.


O Relator
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. A...– Gestão Imobiliária Industrial, SA, identificada nos autos e a Exma Representante da Fazenda Pública (RFP), dizendo-se inconformados com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, na parte em que, respectivamente, para cada uma delas a impugnação judicial foi julgada improcedente e procedente, vieram da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


A) Da recorrente A...- Gestão Imobiliária Industrial, S.A.:

A. O presente recurso jurisdicional vem interposto da parte da douta sentença de fls. …, proferida nos autos referidos em epígrafe, que negou provimento à impugnação judicial deduzida pela ora recorrente contra a liquidação adicional de IRC e de juros compensatórios, efectuada pela Administração fiscal, relativamente ao exercício de 1999.
B. A questão objecto dos autos de impugnação judicial consistia, entre outras coisas, em saber se é ou não legítimo o método de correcção utilizado pela Administração fiscal para desconsiderar o efeito da reavaliação verificada ao nível da Obra Jardins da Parede, no montante de € 2.297.389,55 e, bem assim, se é ou não legal a correcção proposta pela Administração fiscal ao nível dos custos incorridos pela impugnante com ofertas, no valor de € 43.279,70.
C. A estas questões respondeu o Tribunal a quo no sentido de manter as correcções propostas pela Administração fiscal.
D. Na formulação desta decisão, contudo, teve o Tribunal a quo por base meras apreciações de natureza não técnica e puros juízos de aproximação aos princípios exaustivamente defendidos pela impugnante quer na petição inicial quer nas alegações finais de impugnação, tudo levando a crer que às matérias em causa, designadamente à primeira delas, não terá sido dada a atenção e realizado o trabalho de verificação contabilístico-aritmética que as mesmas impunham.
E. Na realidade, nem percebe a aqui recorrente como, relativamente à primeira das matérias assinaladas – desconsideração do efeito da reavaliação verificada ao nível da Obra Jardins da Parede, no montante de € 2.297.389,55 –, consegue o Tribunal a quo proferir sobre ela uma decisão sem que em um único momento revele ter procedido a um teste matemático das demonstrações numéricas apresentadas pela impugnante ou a uma análise ponderada e circunstanciada dos vícios das correcções realizadas a este nível pela Administração fiscal indicados quer pelos senhores técnica oficial de contas e revisor oficial de contas, inquiridos como testemunhas em sessão contraditória ocorrida no âmbito dos presentes autos, quer por um perito e auditor de contas, autor de um parecer – nunca referenciado ou citado na decisão de que se recorre – relativo a esta temática.
F. Sobretudo não se percebe como é que ao menos não é tida em conta ao nível desta correcção – para além da questão do método correctivo e de todos os outros vícios de cálculo suscitados – a sua própria decisão de anulação da correcção, também imposta pela Administração fiscal, e que se reflectia numa desconsideração do custo contabilizado na mesma Obra “Jardins da Parede”, no montante de 1.150.000.000 PTE – quando é óbvio que o deveria ter feito, dado ambas as correcções se encontrarem numa nítida relação de dependência mútua.
G. Ora, ao manter a correcção ao cálculo do resultado da referida obra, no exercício de 1999, tal qual a pretende a Administração fiscal, o Tribunal a quo acede, entre outros intoleráveis efeitos, a que nele se projectem as consequências da desconsideração fiscal do custo dos 1.150.000.000 PTE, desconsideração esta que reconheceu – e bem – ilegal.
H. Por outro lado, em relação à segunda das matérias assinaladas – a correcção proposta pela Administração fiscal ao nível dos custos incorridos pela impugnante com ofertas, no valor de € 43.279,70 –, defende o Tribunal recorrido que é absolutamente imprescindível à formação do juízo sobre a indispensabilidade da despesa o conhecimento concreto dos destinatários das despesas.
I. Contra este entendimento revelam-se, contudo, incongruências graves com a factualidade que assume como provada e, além disso, deficiências óbvias de aplicação do direito – designadamente, daquele conceito (indispensabilidade), ínsito na norma do artigo 23º do CIRC mobilizada.
J. Com efeito, e salvo o devido respeito, o reconhecimento do vício de falta de especificação dos fundamentos de facto em que assenta é obrigatório.
K. É que, para decidir como decidiu, o Tribunal a quo tem que se ter apoiado num fundamento de facto que não especificou – e que, de resto, de modo algum se consegue retirar dos autos.
L. Se é verdade que o Tribunal a quo não se apoiou nos factos que especificamente indicou no capítulo III da sentença de que se recorre, então outra deve ter sido a base de que se serviu para a fundamentar.
M. Ou o Tribunal a quo se serve, como alegada matéria de facto, das conclusões do relatório de inspecção fiscal para fundamentar factualmente a sua decisão de mérito (no que diz respeito, claro está, às duas correcções relativamente às quais assenta o presente recurso) – vício que sempre se invoca por implicar necessariamente a anulabilidade da sentença recorrida –, ou não há dúvida de que o Tribunal a quo não identifica o probatório (matéria factual) de que se serve para fundamentar o direito que empresta à decisão.
N. Quer num quer no outro caso, o Tribunal a quo erra na mobilização da base de facto com que (sempre se exigiria) deveria ter fundamentado uma decisão de direito tão absolutamente dependente do probatório como aquela que se impunha no que diz respeito à questão da desconsideração do efeito da reavaliação verificada ao nível da Obra Jardins da Parece, no montante de € 2.297.389,55 – sobre tudo a esta –: no primeiro caso, ao apoiar-se, como se de factos se tratasse, em puras conclusões especulativas exclusivamente assentes num relatório produzido por uma das partes em litígio, o Tribunal a quo feriu de anulabilidade a sentença que proferiu, por erro no julgamento de matéria que nitidamente não poderia ter sido qualificada como factualidade ou probatório; no segundo caso, ao não especificar os fundamentos de facto em que fez assentar a sua decisão, o Tribunal a quo feriu de nulidade a sentença que proferiu, nos termos da al. b) do nº 1 do artigo 668º do CPC e do nº 1 do artigo 125º do CPPT.
O. Seja como for, ainda que os vícios invocados não procedam, o que apenas por mera cautela de patrocínio se admite, sempre será de reconhecer que a sentença a quo padece de um outro vício – ilegalidade – na medida em que faz um errado julgamento da matéria de facto e uma errada aplicação do direito, designadamente dos artigos 18º, 19º e 23º do CIRC.
P. Com efeito, o julgamento da matéria de direito no que diz respeito à matéria da desconsideração do efeito da reavaliação verificada ao nível da Obra “Jardins da Parede”, implicava necessariamente que o Tribunal a quo tivesse tomado em devida conta toda a prova (documental e testemunhal) a seu respeito produzida.
Q. Além disso, implicava ainda que o Tribunal a quo tivesse, pelo menos, analisado de forma critica e descomplexada o parecer, relativo justamente a esta matéria, elaborado pelo perito Dr. Rui Lemos Pereira, junto pela impugnante com as alegações finais, e do qual é possível retirar, em termos técnicos, todos os vícios identificados na sequência de uma auditoria técnica levada a cabo por técnicos independentes à contabilidade da A...aquando da recepção do acto de liquidação em crise.
R. Não o tendo feito, o Tribunal a quo prescindiu de conhecer – e de inequivocamente se tornar portador de todos os elementos factuais e de apreciação técnica imprescindíveis à boa decisão de direito das questões decidendas – todas as envolventes fácticas e técnicas implicadas na boa análise da questão em apreço, precipitando-se numa tomada de posição que mais não se traduziu do que numa adesão incensurada a uma proposta de correcção obviamente usurária – conforme, de resto, (bem poderia tê-lo constatado o Tribunal) facilmente se percebe pela mera soma aritmética das correcções que dão origem a liquidações adicionais, nos exercícios que se sucedem ao de 1999, em confronto com o erro da consideração fiscal da reavaliação dos terrenos (identificado e imputado pela Administração fiscal à impugnante), erro este que, como é sabido, constitui a origem e ponto de partida daquelas correcções.
S. A sentença recorrida reflecte, pois, um desinteresse perturbador pela fundamentação legal e aritmética invocada pela impugnante, a qual, bem vistas as coisas, é de molde a contrariar a legalidade da correcção em apreciação, mais não seja parcialmente, na parte relativa a um custo – o dos até 20% ou dos 1.150.000.000 PTE – que o Tribunal vem a reconhecer como fiscalmente dedutível: a conclusão relativa à dedutibilidade fiscal deste custo deveria ter sido forçosamente considerada no cálculo do apuramento da nova variação de produção da Obra “Jardins da Parece”, a qual, naturalmente, contempla esta como uma variável (quer ao nível do orçamento de obra quer ao nível dos custos efectivamente incorridos ou custos reais) incontornável do seu cálculo.
T. O Tribunal a quo precipita-se, pois, numa primeira conclusão de foro legal que, não só desrespeita o bom julgamento das normas mobilizadas, como despreza uma lógica aritmética de correcção dos resultados de obras plurianuais devidamente consagrada na fundamentação de direito expendida pela impugnante, fazendo reflectir a adopção de uma postura de adesão imediata e irreflectida a uma posição – a da Administração fiscal – que, apesar de acompanhada pelo Tribunal recorrido, não encontra o menor acolhimento legal.
U. Em concreto, a Administração fiscal concluiu pela necessidade de proceder a uma correcção ao lucro tributável declarado, no exercício em análise, pela impugnante, propondo, contudo, que a mesma se processasse com recurso a um método, tal como já antes se explicitou, baseado na relevação do excesso de custo decorrente da reavaliação livre não anulada pela impugnante, em razão da proporção das vendas realizadas no exercício.
V. Ora, apesar de assistir razão à Administração fiscal em matéria de não aceitação do resultado fiscal da reavaliação – o que terá influenciado, suspeita-se, a predisposição do Tribunal a quo para a sua decisão no que diz respeito a esta matéria –, a correcção efectuada está, contudo, ferida de ilegalidade, na medida em que viola as regras de determinação de resultados das obras plurianuais plasmadas no artigo 19º do Código do IRC.
W. Com efeito, o Tribunal recorrido não terá compreendido as razões invocadas pela impugnante para sustentar esta arguição: o Tribunal a quo não teve o mérito de se deter sobre os argumentos de direito desenvolvidos pela impugnante, tendo sido antes influenciado pela convicção – reconhecida/não contestada pela impugnante – de que esta realmente reavaliou o prédio em causa e de que tal reavaliação, sendo livre, concorreria apenas para o incremento do valor contabilístico dos bens em causa, mas não do seu valor fiscal.
X. No entanto, a sentença proferida deveria ter testado a legitimidade dos efeitos fiscais associados a tal convicção e, de certa forma, deveria ter contrariado legalmente a arguição de ausência de previsão legal e desadequação do método correctivo apontado pelos serviços de inspecção tributária, invocado pela A....
Y. É que, conforme teve a recorrente oportunidade de demonstrar na sede própria – até aritmeticamente –, a contabilização das obras plurianuais e o seu tratamento para efeitos de IRC filia-se no princípio da especialização dos exercícios – mediante o qual só é custo ou proveito aquilo que corresponder a obra efectivamente realizada e não a meras receitas ou despesas, e, bem assim, no carácter uno desse tipo de obras, que se estendem por mais de um ano, mas que têm um resultado global que há-de sempre corresponder, agregadamente, a um mesmo valor, seja ele gerado em dois, três ou mais anos.
Z. Dito de outro modo, o problema fiscal das obras plurianuais não releva tanto da mensuração, para fins de IRC, dos respectivos resultados, porquanto, globalmente considerada (nos vários anos pelos quais se estende), a obra terá sempre, a final, o mesmo resultado, mas sim da periodização desse resultado, na medida em que os métodos legalmente consagrados de imputação de custos e proveitos aos anos de duração da obra podem ditar resultados díspares em cada um desses anos, consoante seja mais ou menos acelerado e assíncrono o reconhecimento desses custos e proveitos decorrentes daqueles métodos.
AA. Neste contexto, cumpre, por um lado, alinhar a contabilização das obras, na perspectiva do IRC, com directrizes de “contabilização fiscal” das obras plurianuais instituídas no respectivo Código, e, por outro, assegurar que este iter normativo para a relevação fiscal dos custos de obra é a única via de reconhecimento dos custos e proveitos da obra, expurgando-se da contabilidade, para fins do IRC, qualquer resultado que se apure à luz de um qualquer outro critério, sob pena de tal sobreposição de critérios redundar numa duplicação de resultados tributáveis, frontalmente violadora dos axiomas fundamentais do IRC, mormente os princípios da capacidade contributiva e do rendimento-acréscimo.
BB. Ora, do teor do relatório, no concernente a esta correcção, é possível depreender sem esforço que a correcção preconizada pela Administração fiscal assenta – ao contrário do que refere o Tribunal que proferiu a decisão de que se recorre – num método de apuramento dos custos imputáveis aos lotes em referência diverso do prescrito no artigo 19º do Código do IRC para este tipo de obras.
CC. Tal método, inequivocamente contra legem, como se demonstrou, estriba-se no reconhecimento de resultados com base na relação entre, por um lado, a permilagem, em termos de área, das fracções dos edifícios construídos sobre os lotes em questão e vendidos no exercício de 1999 e, por outro lado, a área total dos mesmos edifícios.
DD. A correcção das inexactidões relativas à consideração fiscal da reavaliação livre realizada pela impugnante imporia à Administração fiscal que atendesse ao contexto contabilístico dos valores a corrigir e que, observando o disposto no artigo19º do CIRC e na Circular 5/90, recalculasse o grau de acabamento da obra uma vez expurgado o efeito da reavaliação, tudo de forma a, posteriormente, poder combinar os valores daí resultantes com a percentagem de facturação.
EE. E uma vez efectuados estes cálculos para toda a obra a partir do primeiro ano em que a mesma começou a gerar custos, devem os mesmos ser mantidos e aplicados até à sua conclusão, ou seja, até que a empresa deixe de incorrer em custos e de auferir receitas decorrentes da mesma obra. As próprias estimativas de custos e proveitos iniciais não devem ser objecto de modificação durante a execução da obra, salvo se baseadas em índices oficiais relativos a custos de mão-de-obra e preços dos materiais que tenham sido já publicados ou motivadas por trabalhos adicionais resultantes de novos contratos (cfr. nºs 3 e 9, Circular nº 5/90).
FF. É por isso que se diz, na petição inicial e nas alegações finais da impugnação judicial sobre que recai a sentença recorrida que, para sustentar a correcção em apreço, deveria a Administração fiscal ter elaborado um mapa de cálculo para os custos da obra em apreço desde o seu início até ao seu termo, incorporando as correcções resultantes da desconsideração dos valores de excesso de reavaliação atrás quantificados, correcções essas que revestiriam impacto ao nível de (i) custos de aquisição dos terrenos afectos às obras e (ii) dos custos estimados para essas mesmas obras, com influência, neste último caso, nas percentagens de acabamento computadas para cada um dos exercícios em questão.
GG. A inobservância desta metodologia no apuramento dos resultados das obras plurianuais conduz, fatalmente, a uma inconsistência de resultados e à sua distorção nos vários anos em apreço.
HH. É, com efeito, indubitável que, se a Administração fiscal calcula, à margem do dito cômputo das obras plurianuais previsto legalmente, custos não aceites baseados num método de cálculo fruto de, com o devido respeito, mera auto-recreação e seleccionado de modo ad hoc para a liquidação aqui posta em crise, e depois vem recalcular os resultados das obras nos termos do método da percentagem de acabamento – esse sim em conformidade com a lei – no sentido do seu acréscimo em função do excesso de custo decorrente da reavaliação que temos vindo a fazer referência, o resultado que daí fluirá não pode deixar de distorcer a realidade sujeita a tributação que é quantificada, em cada exercício, mediante a aplicação da percentagem de acabamento (relação custos incorridos vs. custos orçamentados) ou, se menor, de facturação (relação entre facturação emitida vs. facturação prevista).
II. Por conseguinte, o caminho seguido pela Administração fiscal de aplicação parcelar do método da percentagem de acabamento não é uma opção, à luz do disposto no artigo 19º do CIRC, sendo, nesse sentido, ilegal. Ao decidir de modo a corroborar a utilização deste critério ilegal de correcção, a sentença recorrida incorre num erro de julgamento da matéria de direito, o que se invoca.
JJ. O erro no julgamento da matéria de facto e de direito incorrido na sentença recorrida não é exclusivo da matéria relativa à correcção ao nível do resultado da Obra “Jardins da Parece”. Na perspectiva da ora recorrente, o mesmo erro é ainda cometido em relação à correcção proposta pela Administração fiscal ao nível dos custos incorridos pela impugnante com ofertas a clientes.
KK. Relativamente a esta última correcção, o Tribunal a quo faz total tábua rasa da factualidade provada pela impugnante e das razões de direito arguidas.
LL. O Tribunal a quo não pôs em causa a efectividade dos custos incorridos ou que os mesmos se destinassem abstractamente a clientes da impugnante, antes entendeu que o desconhecimento da identidade do seu beneficiário é susceptível de inviabilizar um juízo de indispensabilidade da despesa inultrapassável na apreciação da sua dedutibilidade fiscal.
MM. Com todo o respeito, a argumentação usada pelo Mmo Juiz a quo revela uma apreciável confusão sobre qual seja o exacto alcance do artigo 23º do CIRC, a justificar, por isso, alguns desenvolvimentos: no entendimento da impugnante, os preceitos que mais à frente definem o que se deve entender por “rendimentos” (o artigo 20º, n.º 1) e por “gastos” (o artigo 23º, n.º 1) têm um propósito meramente exemplificativo das parcelas que contam positiva e negativamente para a determinação do resultado líquido do período “com base na contabilidade”, não o de consagrar conceitos de “rendimentos” e de “gastos” mais restritivos do que os que são aceites pela contabilidade.
NN. O efeito delimitador do artigo 23º, n.º 1, do CIRC, na parte em que se refere à indispensabilidade dos gastos para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, é tão somente o que já resulta do artigo 17º, n.º 3, al. b), impondo a desconsideração dos gastos que advenham das operações não sujeitas ao regime geral de IRC. Assim, por ex., em se tratando de empresários em nome individual (cujo IRS é apurado, na parte correspondente à respectiva actividade comercial ou industrial, a partir das regras de cálculo do lucro tributável em IRC), não cobram relevo fiscal os custos alheios à empresa e antes relativos à sua vida privada.
OO. Quanto às sociedades comerciais, tal disposição poderá aplicar-se (quando muito) apenas pela forma que seguidamente se aventa. Grosso modo, o IRC, pelo que toca às sociedades comerciais, visa tributar o lucro gerado pela respectiva empresa, encarado como o acréscimo patrimonial experimentado durante o período tributário. Logo se verá, porém, que a medida fiscal desse acréscimo comporta algumas correcções: não poderão, por exemplo, ser tidas em conta as entradas dos sócios, por isso que esses incrementos patrimoniais não são produzidos pela empresa, tal como não poderá atender se ao que, por similitude, poderemos designar de retiradas, isto é, as diminuições patrimoniais operadas em benefício dos sócios causa societatis, agora pela razão inversa de que não representam custos ocasionados pela actividade da empresa.
PP. Os custos serão então “indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora” sempre que sejam ocasionados pela actividade da empresa societária, apresentando uma conexão fáctica ou económica com essa empresa — na medida em que não consubstanciem, pois, uma diminuição patrimonial ditada pela existência de uma participação social da parte do seu beneficiário directo ou indirecto (isto é, como se disse, uma atribuição efectuada causa societatis).
QQ. Disto se tira que o artigo 23º do CIRC, ao contrário do que patentemente se assume no relatório de fiscalização e na decisão recorrida, de modo algum legitima a inferência de que o contribuinte deve satisfações à Administração Fiscal quanto à identidade dos beneficiários das ofertas que realiza – demonstrado que foi (mais não seja, por expresso reconhecimento quer da Fazenda Pública quer do Tribunal a quo) que as mesmas se destinam a clientes (embora também tenha ficado provado que as ofertas são também pontualmente destinadas a fornecedores e trabalhadores da sociedade) –, a não ser na estrita medida em que sobre elas impenda a suspeita de que se não inspiram em razões empresariais, mas no propósito de proporcionar uma vantagem a um terceiro (normalmente um sócio, tratando-se de sociedades comerciais), o que não se infere da fundamentação legal administrativa e judicial, que expressamente reconhece que as ofertas se dirigem “a clientes”.
RR. Desta forma, os efeitos fiscais que, para uma sociedade, decorrem da aquisição para oferta de artigos destinados a clientes, fornecedores ou trabalhadores – numa política de reconhecimento e reforço das relações comerciais e laborais –, nunca podem ser questionados pela Administração Fiscal ao abrigo do artigo 23º do CIRC (ou de qualquer outro preceito que seja).
SS. A relevância fiscal de um custo — note se — não pressupõe sequer que ele seja necessário, ou adequado, ou usual, ou conforme ao fim prosseguido, tal como não depende de que o resultado buscado se produza: estamos aqui num espaço de liberdade empresarial irrestrita — quando muito, a falta dessas características poderá gerar a dúvida sobre se a causação é de facto meramente empresarial ou se se pretende por alguma via beneficiar certo sócio.
TT. Vale isto por dizer que ao fazer depender a aceitação fiscal do custo incorrido pela impugnante com a aquisição de artigos que atribuiu, a título de oferta, aos seus clientes – facto que quer a Administração fiscal quer o Tribunal a quo assumem como indesmentível e de que inequivocamente partem –, da identificação dos seus concretos beneficiários (cliente X, cliente Y, cliente Z), o Mmo Juiz a quo incorre num erro de julgamento da matéria de direito e numa viciada interpretação do exacto alcance do artigo 23º do CIRC, norma mobilizada para fundamentar legalmente a correcção em referência.

Deve assim o presente recurso proceder nos termos expostos, com todas as Consequências legais.


B) Da Fazenda Pública:

a) No que respeita à primeira questão, salvo o devido respeito, entendemos que a decisão recorrida fez uma errada interpretação dos factos, nomeadamente ao não atender a todos os factos invocados pelas partes e com relevância para a descoberta da verdade material incorrendo assim, em erro de julgamento, o que por sua vez conduziu a uma errada interpretação do direito aplicável;
b) Conforme, factos alegados pela Impugnante na sua p.i. e não impugnados pela ora recorrente na sua contestação, em 9 de Fevereiro de 1996, foi celebrado um Protocolo entre a Câmara Municipal de Cascais (CMC), por um lado, e a impugnante e a B... por outro, para a construção das habitações sociais;
c) Em 2002, com a mudança da titularidade da Presidência da CMC, o novo presidente rescindiu unilateralmente o Protocolo, ficando imediatamente suspensa a execução de quaisquer outras obras para a CMC;
d) Assim, na sequência, dos factos dados como provados na al. Q) do probatório, a decisão recorrida deveria ter dado como provado que: Em 2002, com a mudança da titularidade da Presidência da CMC, o novo presidente rescindiu unilateralmente o Protocolo, ficando imediatamente suspensa a execução de quaisquer outras obras para a CMC;
e) Verificando-se assim, contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida que em 23.09.2003 não havia mais obras a realizar em virtude do referido acordo ter sido rescindido pela Câmara Municipal de Cascais;
f) Pelo que, o critério utilizado pela Administração Fiscal para o apuramento dos montantes que deveriam ser pagos pela Impugnante por conta dos 20%, não merece qualquer censura;
g) Face ao exposto, a decisão recorrida enferma do vício de nulidade por violação do disposto no artº 125º, do CPPT.
h) Como bem refere a douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo” o principio da “Tributação do Rendimento Real”, é um principio constitucionalmente consagrado e que deve ser observado por todos;
i) Foi com base em tal princípio que a Administração Fiscal procedeu à correcção dos custos contabilizados na obra “Jardins da Parede” pelo pagamento de 1.150.000.000$00 à B..., SA.;
j) Contrariamente à interpretação efectuada pela douta decisão recorrida, a Administração Fiscal não procedeu à correcção dos referidos custos com base no disposto no artº 23ºdo CIRC, mas sim com base no disposto no artº 26, do mesmo diploma legal, conforme resulta do Relatório da Inspecção Tributária nomeadamente ao imputar os proveitos e custos aos diversos exercícios, nos termos daquele dispositivo legal;
k) O custo em apreço não foi aceite em termos fiscais, ao abrigo do art. 17º e actual art.º 26, ambos do CIRC, pelo facto de serem custos estimados, e não reais;
l) De acordo com a al. a) do n.º 1 do artigo 26.º do CIRC, os valores das existências a considerar nos proveitos e custos a ter em conta na determinação do resultado do exercício são os que resultarem da aplicação dos critérios que utilizem custos efectivos de aquisição ou de produção;
m) Tendo subjacente a natureza do custo e o disposto nos artigos 17º e 26º do CIRC, a correcção foi correctamente efectuada;
n) Pelo que, a douta decisão recorrida ao decidir como decidiu violou o disposto nos artº 17º e 26º do CIRC.
o) Conforme resulta dos factos constantes das al. F), G), e H) do probatório, a rescisão do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre a Impugnante e a C...foi proposta por esta última em virtude de não conseguir cumprir com as clausulas do contrato;
p) A rescisão do contrato-promessa referido foi efectuada por acordo das partes, no interesse de ambas, mas por iniciativa do promitente-comprador;
q) Não sendo imputável à impugnante.
r) Nos termos do disposto nos artºs. 440º e ss. do Código Civil no caso em apreço não havia lugar ao pagamento de qualquer indemnização;
s) Assim sendo, a indemnização paga pela impugnante pela rescisão do contrato não constituiu um custo indispensável para a realização de proveitos;
t) Pelo que, a douta sentença recorrida violou o disposto no artº 23º do CIRC.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente Recurso ser provido e, consequentemente ser revogada a sentença proferida pelo Douto Tribunal “a quo”, na parte ora recorrida, assim se fazendo a costumada Justiça.


Foram admitidos ambos recursos para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.


A recorrente A...- Gestão Imobiliária Industrial, S.A., veio ainda a apresentar as contra-alegações quanto ao recurso interposto pela parte contrária, cujas conclusões igualmente na íntegra se reproduzem:

a) O presente recurso vem interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou parcialmente procedente a impugnação.
b) Em tal decisão reconheceu-se que foi produzida prova susceptível de permitir a conclusão segundo a qual assiste razão à impugnante no que diz respeito à correcção dos custos contabilizados na obra “Jardins da Parede” pelo pagamento de 1.150.000.000$00 à B..., S.A. e à não aceitação como custo fiscal de uma indemnização.
c) No que diz respeito à correcção dos custos contabilizados na obra “Jardins da Parede” pelo pagamento de 1.150.000.000$00 à B..., S.A., considerou o Tribunal a quo que a mesma carece de fundamento fáctico e legal.
d) De acordo com o tribunal a quo,no caso trazido a juízo, tratando-se de despesa suportada no âmbito e por força da actividade da Impugnante, tal despesa considera-se em princípio, como despesas indispensáveis para a obtenção dos proveitos”.
e) O tribunal recorrido conclui que, in casu, “quer em sede de procedimento de inspecção quer em sede contenciosa a AT não cumpriu o ónus de prova da verificação dos pressupostos de facto e de direito (vinculativos) que a determinaram a efectuar correcções técnicas constantes do relatório de fiscalização”.
f) Em relação à não aceitação como custo fiscal de uma indemnização, pode ler-se na sentença recorrida que “não vindo questionado que o custo aqui em causa está comprovado documentalmente, ninguém questionará que a indemnização paga pela Impugnante pela rescisão do contrato constitui um custo indispensável para a realização dos proveitos”.
g) Contra os fundamentos aduzidos pelo tribunal a quo relativamente a uma e outra questões veio agora a digníssima Representante da Fazenda Pública interpor, contudo, competente recurso.
h) A Fazenda Pública é da opinião de que, no que diz respeito à primeira questão – a referente à correcção dos custos contabilizados na obra “Jardins da Parede” pelo pagamento de correcção dos custos contabilizados na obra “Jardins da Parede” pelo pagamento de 1.150.000.000$00 à B..., S.A.à B..., S.A., “na sequência dos factos dados como provados na al. Q do probatório, a decisão recorrida deveria ter dado como provado que: em 2002, com a mudança da titularidade da Presidência da CMC, o novo presidente rescindiu unilateralmente o Protocolo, ficando imediatamente suspensa a execução de quaisquer outras obras para a CMC”.
i) Sem referir de onde retira este facto – se o mesmo resulta de um depoimento de uma testemunha, de um documento dos autos ou de uma pura alegação da impugnante –, a Administração Tributária, que pela primeira vez invoca este como um argumento com susceptibilidade para sustentar a sua tese de que o pagamento de 1.150.000.000$00 corresponde a um custo estimado e não real, conclui que “contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, no ponto 2 do Mérito dos autos, em 23 de Setembro de 2003, embora não estivessem realizadas todas as obras que a impugnante estava obrigada a entregar por força do Acordo celebrado e pelas quais pagou 1.150.000.000$00, não havia mais obras a realizar em virtude do referido acordo ter sido rescindido pela Câmara Municipal de Cascais”.
j) Partindo desta alusão, a Administração fiscal imputa à decisão recorrida um vício de nulidade por violação do disposto no artigo 125º do CPPT.
k) Além deste vício, porém, a Fazenda Pública invoca um outro de violação do direito, designadamente da norma dos artigos 17º e 26º do CIRC.
l) Para a recorrente era à luz destas disposições legais e não da norma do artigo 23º do CIRC que a questão em análise deveria ter sido decidida: na verdade, esclarece, “contrariamente à interpretação efectuada pela douta decisão recorrida, a Administração Fiscal não procedeu à correcção dos referidos custos com base no disposto no art. 23º do CIRC, mas sim com base no disposto no art. 26º, do mesmo diploma legal, conforme resulta do Relatório de Inspecção Tributária nomeadamente ao imputar os proveitos e custos aos diversos exercícios, nos termos daquele dispositivo legal”.
m) No que respeita à não aceitação como custo fiscal de uma indemnização, a Administração fiscal entende “que a decisão recorrida fez uma errada interpretação dos factos dados como provados e consequentemente do Direito aplicável”.
n) Para o digno Representante da Fazenda Pública, “conforme resulta dos factos constantes das al. F), G) e H) do probatório, a rescisão do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre a Impugnante e a C...foi proposta por esta última em virtude de não conseguir cumprir com as cláusulas do contrato. Sendo certo que a Impugnante aceitou tal rescisão, até porque, tinha um terceiro interessado em comprar o imóvel prometido vender por um preço superior. Ou seja, a rescisão do contrato-promessa referido foi efectuada por acordo das partes, no interesse de ambas, mas por iniciativa do promitente-comprador, pelo que, tal facto não era imputável à Impugnante”, termos em que conclui, de acordo com o disposto no artigo 23º do CIRC, “a indemnização paga pela impugnante pela rescisão do contrato não constitui um custo indispensável para a realização dos proveitos, mostrando-se a mesma atentos os factos dados como provados e face ao direito aplicável ao caso concreto dispensável”.
o) Entende a recorrida que a decisão de que vem interposto o presente recurso não merece qualquer censura, não lhe sendo imputável qualquer erro de julgamento de facto ou de direito, por a mesma se encontrar em conformidade com as exigências de fundamentação impostas pelo artigo 123º do CPPT e pelos nº 2 e 3 do artigo 659º do CPC, ou, bem assim, qualquer nulidade das previstas no artigo 125º do CPPT e no artigo 668º do CPC.
p) Na verdade, não pode deixar de reconhecer-se que, não só a sentença, na parte recorrida pela Fazenda Pública, é eximia no modo como identifica os factos objecto de litígio, sintetiza a pretensão da impugnante e a posição do representante da Fazenda Pública, bem como os respectivos fundamentos, como o é no modo como fixa as questões que ao tribunal cumpre solucionar e no modo como descrimina a matéria provada e fundamenta – de facto e de direito – as suas decisões.
q) Percebe-se que o tribunal procede a um exame detido das provas testemunhal e documental que se lhe são apresentadas, apreciando-as, censurando-as e valorando-as ao ponto de as estabilizar e de com elas consubstanciar as suas opções de direito.
r) A motivação da decisão proferida pelo tribunal a quo existe e é suficiente, na medida em que através dela é possível conhecer em rigor as razões do decisor.
s) Pelo contrário, a recorrente limitou-se a uma vez mais reiterar aquele que é o seu posicionamento originário – impugnado – face às questões jurídicas suscitadas, fazendo tábua rasa de toda a matéria de facto de que foi feita prova – quer testemunhal quer documental – nas instâncias próprias. A Fazenda Pública limitou-se, enfim, a repetir as mesmas razões que já tinha tornado públicas no relatório que fundamenta o acto tributário impugnado, basicamente assentes em falsos pressupostos de sujeição, e bem assim no seu articulado de contestação, num incompreensível desconhecimento da matéria de facto e numa profunda ignorância em matéria de fontes de direito.
t) Sucede, todavia, que o entendimento subjacente àquelas razões e às liquidações em que as mesmas se projectaram, assenta numa errada percepção da matéria factual e errónea aplicação do direito – o que nos propomos agora demonstrar cabalmente.
u) No que diz respeito à questão relativa à correcção dos custos contabilizados na obra “Jardins da Parede” pelo pagamento de 1.150.000.000$00 à B..., S.A., deve ressalvar-se, antes de mais, a fortíssima inconsistência da argumentação utilizada pela Administração fiscal para sustentar o recurso da decisão do tribunal a quo:
v) O custo de 1.150.000.000$00 não é um custo estimado, mas efectivo; a impugnante pagou de facto aquela quantia à B...; existem documentos idóneos que suportam aquele pagamento – os mesmos foram exibidos em sede inspectiva aos serviços competentes, que os não contestaram ou questionaram.
w) A Administração fiscal não contesta a indispensabilidade quer do custo quer do acordo celebrado entre a impugnante e aquela empresa para a formação dos proveitos da primeira. A Administração fiscal, ao invés, parece apenas discordar do montante da contrapartida paga pela impugnante nos termos do referido acordo, considerando-a excessiva tendo em conta as prestações que supõe terem sido incorridas pela B... junto da CMC.
x) Sucede, porém, que as condições negociais estabelecidas nos acordos celebrados entre privados encontram-se, de forma irredutível e inquestionável, apenas sujeitos à discricionariedade dos contraentes, encontrando-se completamente vedado à Administração fiscal sindicar as opções de gestão privada das empresas, sob pena de violação dos princípios constitucionais do Estado de Direito Democrático e de Direito de Iniciativa e Propriedade Privada.
y) As empresas são perfeitamente livres de contratarem as aquisições de bens ou serviços pelo preço e condições que muito bem entenderem, não assistindo à Administração fiscal a faculdade/direito, ou sequer o dever, de aferir se tal negociação terá constituído um bom ou mau negócio para a empresa.
z) Muito menos quando faz esse juízo depois de serem conhecidos factos que apenas se vieram a tornar conhecidos ou mesmo a concretizar muito tempo depois de realizado o negócio. Juízos de oportunidade, lógica, sentido e conveniência não poderão nunca fundamentar correcções de índole fiscal.
aa) Nestes termos, conforme o exposto supra, não havendo dúvidas quanto à concretização do pagamento, como sucede no caso concreto, a Administração fiscal apenas poderia intervir, desconsiderando o negócio ou reduzindo o valor do negócio, se fizesse prova de que o mesmo teria sido realizado através de meios artificiosos e fraudulentos e com abuso de formas jurídicas – para o que sempre teria que invocar o n.º 2 do artigo 38.º da LGT – ou se fizesse prova de que o mesmo não foi realizado a preços de mercado – a para o que sempre teria que invocar a norma relativa a preços de transferência ou as disposições que lhe permitiriam lançar mão da aplicação de métodos indirectos de determinação da matéria colectável.
bb) No que diz respeito à questão relativa à não aceitação como custo fiscal de uma indemnização, também não assiste qualquer razão à entidade recorrente.
cc) Apesar de reconhecer que a impugnante efectuou de facto aquele pagamento (a título de indemnização), a Fazenda Pública considerou que tal custo não seria, ainda assim, fiscalmente aceite, porquanto estaria o mesmo relacionado com uma rescisão contratual que não lhe seria imputável.
dd) A este respeito interessa, antes de mais, esclarecer que, ainda que assistisse razão à Administração fiscal e a rescisão contratual se tivesse ficado a dever ao promitente comprador e já não à impugnante – o que não sucede conforme resulta da matéria probatória constante dos autos –, ainda assim o referido encargo teria de ser aceite como custo fiscal da impugnante, na medida em que o mesmo, não só constituiu um encargo efectivo desta, como foi realizado no exercício e âmbito da sua actividade e para efeitos (e com vista) à obtenção de proveitos.
ee) Seja como for, a verdade é que, conforme ficou claramente demonstrado através, designadamente, da diligência de inquirição testemunhal realizada nos presentes autos, a rescisão não ficou a dever-se a um facto imputável à promitente compradora – no caso, à sociedade C...–, como defende a Administração fiscal, mas antes a factos inequivocamente imputáveis à impugnante.
ff) De resto, no acordo de rescisão não é feita, ao contrário do que alega a recorrente, qualquer referência à entidade sobre a qual terá recaído a responsabilidade pelo facto que lhe deu origem. Não se refere, em momento algum, que a rescisão do acordo ter-se-á ficado a dever a um facto imputável à promitente compradora – C...– ou à promitente vendedora. Do acordo de rescisão consta apenas – como bem sublinha o tribunal a quo – que ela foi proposta pela C...à impugnante e que esta última a aceitou (cfr. Doc. nº 3 junto com a p.i., Anexo nº 12).
gg) O facto de a rescisão ter sido proposta pela promitente compradora, não faz com que a mesma lhe seja imputável.
hh) Aliás, conforme decorre da matéria probatória, não impugnada pela recorrente, quem deu causa à rescisão foi a impugnante e não a promitente compradora: a rescisão teve na sua origem uma proposta de compra do lote de terreno prometido vender à C...por um valor consideravelmente superior ao acordado com aquela empresa. O preço convencionado da venda com a C...ascendia a 77.500.000$00, tendo uma outra sociedade – a D..., LDA. – apresentado à impugnante uma proposta de compra pelo valor de 94.000.000$00.
ii) Atraída pela possibilidade de conseguir um preço de venda superior, a impugnante entrou de imediato em contacto com a C...no sentido de conseguir a rescisão do contrato que ambas haviam celebrado, sob o pagamento (de resto, contratualmente estipulado) de uma indemnização.
jj) O pagamento da indemnização ter-se-á, pois, assumido como perfeitamente indispensável para a realização do proveito da venda do imóvel, devendo o referido custo ser fiscalmente aceite nos termos do artigo 23º do CIRC.
kk) Além disso, o acto de rescisão que suscita a correcção fiscal em apreço corresponde a um acto de gestão corrente da empresa, perfeitamente normal, aceitável e justificável, encontrando-se vedada à Administração fiscal a sua sindicância numa atitude de pura ingerência na vida e opções empresariais.

Termos em que o presente Recurso deve ser julgado improcedente, por não provado, e a douta sentença recorrida integralmente mantida.


O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, devendo a sentença recorrida manter-se na ordem jurídica.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se a sentença recorrida padece dos vícios formais de falta de fundamentação e de vício inominado conducente à declaração da sua nulidade; E não padecendo, se ocorre errado julgamento da sua matéria de facto; Se foi ilegal a expurgação do valor do terreno enquanto custo imputável ao exercício, em que a contribuinte havia procedido à sua reavaliação; Se os montantes pagos por ofertas para clientes e fornecedores, em que se desconhecem quem são os seus verdadeiros beneficiários, podem constituir verdadeiros custos fiscais; Se deve ser desconsiderado como custo fiscal um montante que foi estimado pela contribuinte quando existia a possibilidade de conhecer a sua real dimensão, de acordo com os fogos já construídos e entregues ao Município; E se o valor da indemnização pago pela resolução de um contrato promessa de compra e venda, decidida por acordo com o promitente comprador, não pode constituir um custo fiscal do exercício.


3. Matéria de facto.
Em sede de probatório a Mmª Juíza do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A) A Impugnante no âmbito da sua actividade “ Construção de Edifícios” pratica operações de promoção urbanística; adquire os terrenos, manda elaborar o plano de urbanização, diligencia a sua aprovação pelas entidades competentes, executa as infraestruturas respectivas, elabora os projectos de arquitectura e de estabilidade, obtêm a sua aprovação camarária, oferece ao mercado os lotes de terreno em condições de ser iniciada a construção aprovada nos mesmos - CAE 045211.
B) A Impugnante pela actividade exercida encontra-se colectada em IRC pelo regime geral.
C) A Impugnante trabalhou em parceria com a B...S.A. por não ser titular de Alvará de Construção. (Depoimento 1ª, 2ª e 3ª testemunhas)
D) Em 9 de Fevereiro de 1996, entre a Câmara Municipal de Cascais e Impugnante e B..., S.A. foi celebrado um Protocolo designado “ Protocolo sobre a Quinta das Taínhas e Quintas das Marianas” cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (Doc.n.º7 junto á p.i.)
E) Em 20.11.1997, o Protocolo a que alude a al.D) foi objecto de alteração, nos seguintes termos:
“1.1. Em execução do previstos na cláusula 6.2 do protocolo supra referido, a segundas contraentes deverão entregara ao Município uma quantia de 20% do preço da compra e venda dos fogos referidos no ponto 6.1. do mesmo protocolo.
1.2. Pelo recebimento da quantia referida no numero anterior, o município conferirá às segundas contraentes o competente recibo de quitação, devendo nesse documento discriminar-se que o pagamento desse montante é feito em execução do disposto na clausula 6.2 do protocolo PER, sendo considerado custos das urbanizações aprovadas ou aprovar no âmbito do referido protocolo.
1.3. A prestação aludida em 1.1 poderá, se nisso as partes acordarem, ser satisfeita mediante a dação de bens ou obras de construção civil, designadamente as condutas de água e depósitos de Trajouce e Caparide ou outras obras a indicar pela Câmara Municipal.” (Doc. fls. 228/230 do processo administrativo tributário apenso)
F) Em 09.12.1997, foi celebrado entre a Impugnante (na qualidade de promitente vendedora) e “C..., Sociedade de Construção, Lda” (na qualidade de promitente compradora) o contrato de promessa tendo por objecto um lote de terreno destinado a construção, designados pelos lote n.ºs 22, sito em S.Pedro do Estoril. 8 Doc. fls. 94/97 dos autos).
G) O convénio a que alude a al. F) do probatório foi objecto de rescisão, em 19.05.1999,conforme se extrai do doc. fls 93, e do qual se extrai:
“SEGUNDO: Nesta data a Segunda Contraente e Promitente Compradora, propôs à Primeira Contraente Vendedora a rescisão do contrato sendo-lhe atribuído uma verba de Esc. 150.000$00, pela evolução que se tem vindo a verificar nos últimos meses, em virtude de no momento lhe ser um pouco difícil cumprir com as clausulas do contrato.” (Doc. fls. 386/verso do processo administrativo tributário apenso).
H) Perante as dificuldades levantadas pela “C..., Sociedade de Construção, Lda” na realização do contrato definitivo, a Impugnante optou por aceitar a rescisão do contrato de promessa, e procedeu á posterior venda a um terceiro por um valor superior, aquele que constava no contrato promessa a que alude a al. F) do probatório. (Depoimento testemunha 3ª).
I) Em 22.02.1999, a Impugnante celebrou um Protocolo com a B...Empreendimentos Industriais e Turísticos, S.A, do qual se respiga:
CONSIDERANDO QUE:
a) A PRIMEIRA E SEGUNDA CONTRAENTES, celebraram com o MUNICIPIO DE CASCAIS, um protocolo, aprovado pela Assembleia Municipal em 26/01/96, pelo qual acordaram promover conjuntamente, a favor do referido Município, a construção de 1.000 (mil) fogos, ao abrigo do PROGRAMA ESPECIAL DE REALOJAMENTO – PER.
b) (…)
c) As partes contraentes pretendem com o presente acordo regular a atribuição das respectivas obrigações decorrentes da assinatura do supra identificado protocolo bem como a repartição entre si dos custos e despesas inerentes à referida construção social.
FOI LIVREMENTE AJUSTADO E RECIPROCAMENTE ACEITE O ACORDO CONSTANTE DOS PRESSUPOSTOS SUPRA REFERIDOS E DAS CLÁUSULAS SEGUINTES:
A B..., S.A. e a A..., S.A , promoverão, conjuntamente a construção , por fases de 1.000 ( mil) fogos, destinados a realojamento social, praticando em conjunto todos os actos e diligências necessárias ou convenientes a tal construção;
A elaboração dos competentes projectos de loteamento é a execução das obras de urbanização dos referidos fogos é a da responsabilidade da B..., S.A. e a da A..., S.A. AB..., S.A. e a A..., S.A., suportarão os custos correspondentes ao montante máximo de 20% do valor de venda dos referidos 1.000 fogos entregando tal valor ao Município de Cascais, o qual em contrapartida aprovará os loteamentos promovidos nos prédios denominados Quinta das Tainhas e Quinta das Marianas, sitos na freguesia da Parede e propriedades da ora Outorgantes.
SEGUNDA
Até à presente data foram entregues ao Município de Cascais 148 fogos, sendo o valor médio da venda de esc: 9.213.200$00, tendo a B...S.A. e a A..., S.A., suportado as duas o montante correspondente à cláusula dos “ até 20%”.
TERCEIRA
3.1. – Pelo presente Acordo as ora Outorgantes estipulam que:
a) B..., S.A construirá directamente os restantes 852 fogos sob s sua única e exclusiva responsabilidade;
b) A B..., S.A. suportará todos os custos administrativos e todos os custos de gestão das habilitações sociais objecto do referido Protocolo;
c) B... assume directamente perante o Município de Cascais dos “ até 20%”, pagamento esse que até à presente data era da responsabilidade das duas outorgantes.
3.2. – Tendo em consideração o estipulado no número anterior, as PARTES OUTORGANTES acordam em fixar que a parte dos “ 20%” imputável à A..., S.A e que se estipula e, 1.150.000.000$00 (um bilião cento cinquenta milhões de escudos) será liquidado por esta à B..., S.A.. (…)”. ( Doc. fls. 409/411 dos autos).
J) A Impugnante procedeu ao pagamento da quantia de 1.150.000.000$00 á B...Empreendimentos Industriais e Turísticos, S.A. ( Doc.n.ºs 1 e 2 junto ao req. de fls. 405 dos autos.)
L) Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 81183 de 31.10.2002, com despacho de 07.02.2003, foi efectuada uma acção externa á Impugnante incidindo sobre o exercício de 1999, de cujo Relatório Final se extrai:
2 - Correcções
2.1. - Custos incorporados na obra dos "Jardins da Parede" onde os terrenos foram contabilizados por mais 3 893 221,46 Eur ou 780.520.824$00 do que o seu custo de aquisição, como se pode concluir dos seguintes factos:
Em 1989, a A...- Gestão Imobiliária e Industrial S. A. adquiriu com isenção de sisa nos termos do n° 3 do art° . 11° do CS.I.S. D. um prédio para revenda, constituído por uma faixa de terreno que se estende desde a linha de caminho de ferro até ao alto da Parede a Este da Estação de S. Pedro do Estoril, correspondendo a três parcelas de terreno, inscritos na matriz predial sob os artigos 187°; 286° e 287°, com a área total de 110 052 m2, pelo valor de 1.820.612,32 Eur ou 365 000 000$00.
Em 1990, requereu o pagamento da Sisa, por em Assembleia do Conselho de Administração, ter sido decidido, dar outro destino aos terrenos que inicialmente tinham sido adquiridos para revenda. - Anexo 3.
Em 1991, os citados terrenos constavam já do Imobilizado - Investimentos Financeiros para onde foram transferidos pelo montante de 1 991 823, 65 Eur ou ( Preço de Compra + Gastos acessórios de Compra) - Anexo 3-A
Segundo o POC, a conta Investimentos Financeiros - Investimentos em Imóveis, engloba 399.324.790$00, as edificações urbanas e propriedades rústicas que não estejam afectas à actividade operacional da empresa; portanto nos investimentos financeiros registam-se os terrenos e os edifícios que a empresa não utiliza na sua actividade comercial ou industrial; porém no caso em apreço, constatou-se que os terrenos em causa, foram desde o início, utilizados na sua actividade comercial e industrial; assim, a sua transferência para o Imobilizado, com o argumento de que outro destino iria ser dado aos mesmos, não se concretizou, concluindo­ se que a A...com esse procedimento, teve a oportunidade de reavaliar os citados terrenos e quando em Novembro de 1996 os transferiu de novo para Existências por 5 885 045,11 Eur ou 1 179845 614$00 com o objectivo de os revender, o custo de aquisição incluía já o valor da reavaliação, que totalizou 3893 221,46 Eur ou 780.520.824$00 - Anexo 3-B.
Como se pode concluir do que ficou exposto, o critério adoptado pelo contribuinte para valorizar as existências, não obedeceu ao estipulado no n01 do artigo 26° do CIRC_ designadamente porque na sequência da reavaliação, ficou o mesmo sobreavaliado, pelo que em nossa opinião o mesmo deverá ser corrigido.
2.1.1 - Para os devidos efeitos, foi elaborado o mapa Anexo 4, onde se apurou em que medida aquele valor: 3 893 221, 46 Eur ou 780.520.824$00, onerou indevidamente os exercícios a partir dos quais ocorreram vendas de fracções reavaliadas, tendo-se apurado que o custo da área objecto de reavaliação, vendida em 1999, se encontra sobre avaliado em 2.297.389,55 Eur ou 460 585 252$00 procedendo-se pelos factos atrás descritos, à respectiva correcção.
2.1.2 - A não aceitação da reavaliação de existências como custo fiscal, implica que o resultado apurado na obra dos "Jardins da Parede" face ao disposto no artigo 19° do CICC terá de ser ajustado em conformidade com os cálculos efectuados no Anexo 5. deduzindo aos custos orçamentados o valor total da reavaliação : 780 520 824$00 e aos custos efectivos acumulados até 31-12-99, o valor da reavaliação não aceite no exercício de 1999, que foi 460.585.252$00.
2.2. - Custos contabilizados em Fevereiro de 1999 através do doc. de Operações Diversas n° 81290005 de 22/02/99 pelo montante de 1.150.000.000$00 ou 5.736.175,82 Eur, em resultado dos seguintes factos:
Para concretização do Programa Especial de Realojamento (PER) levado a efeito no Município de Cascais, foi estabelecido um acordo Geral de Adesão, celebrado em 7 de Janeiro de 1994 entre o Município, o Instituto Nacional de Habitação (INH) e o Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado (IGAPHE), através do qual seriam obtidos 2 051 fogos, implicando um investimento global de 15 669 640 contos, cabendo à Autarquia, a afectação de recursos próprios no montante global de 2 566 440 contos, correspondente a 20%.
Em Fevereiro de 1996, pelo Acordo Geral de Adesão, o município de Cascais celebrou com as empresas B...- Empreendimentos Industriais e Turísticos, S.A. e A...-Gestão Imobiliária e Industrial S.A. doravante designadas apenas por B...S.A. e A...S.A. , através do seu representante na qualidade de presidente do Conselho de Administração das duas empresas: Sr. Américo Santo, três protocolos tendo por objecto, para além da permuta de vários lotes de parcelas de terrenos, a aquisição de um total de 1350 fogos, por parte do Município como se discrimina no mapa a seguir elaborado:
Designação N° de fogos PER
Do Protocolo Promotor Data do Data dos Alvará a Adquirir
Protocolo de Loteamento (CMC)
T ainhas e Marianas ASantoSAlA...SA 09/02/1996 05/08/1997 1000 fogos
(10241025/1026)
Saint Dominics I A...S.AlBig Fast 24/07/2000 200 fogos
S.A
Drive ln B... S.A 18/05/2001 150 fogos
a) No presente caso e relativamente ao exercício objecto de análise: 1999, teceremos comentários apenas ao protocolo da Quinta das Tainhas e Marianas onde se msere a urbanização dos Jardins da Parede (os restantes reportam-se a exercícios posteriores), e que tinha por objectivo principal assegurar o realojamento das populações abrangidas pelo PER, situadas nos núcleos de barracas designados de Quinta das Tainhas e Marianas e continha um conjunto de direitos e obrigações para as partes envolvidas, que constam do esquemas a seguir elaborados:
Obrigações da Câmara Municipal de Cascais
Realojar 1014 Agregados familiares habitantes de barracas da Quinta das Tainhas e das
Marianas, que eram propriedade do B.... S.A. e da A...S.A.
Permutar com as empresas um conjunto de terrenos da Autarquia para a construção, de
11 0.000 m2 de área bruta de construção, correspondentes a 1000 fogos para realojamento
das famílias PER das Tainhas e Marianas e 200 fogos afectos ao regime de venda livre.
Aprovar uma operação de loteamento para a Quinta das Tainhas e Marianas
Aprovar uma operação de loteamento para o remanescente dos Terrenos que iria ser cedido
à C.M.Cascais , com vista à instalação de um hospital, sito em Tires tendo por base
parâmetros urbanisticos de média densidade fixados no P.D .M.
Isentar do pagamento de taxas municipais pela realização de infra-estruturas urbanisticas ,
compensações ou outras que pudessem recaír sobre os alvarás de loteamento e de
construção relativos às urbanizações das Tainhas , Marianas e Tires , para além das
quantias que viessem a ser suportadas pelos promotores com a construção do Parque
Urbano da Quinta das Tainhas
a) Pelo supracitado protocolo, celebrado em 22 Fevereiro de 1996 entre o Município de Cascais - 1 a contraente - e as empresas B... S.A -Empreendimentos Industriais e Turísticos, S.A e A...- Gestão Imobiliária e Industrial S. A - 2as contraentes - ficou acordado que conjuntamente iriam promover a favor do referido Município, a construção de 1200 fogos ao abrigo do Programa Especial de Realojamento - PER, destinando-se 200 à venda livre e 1000 à habitação social, comprometendo-se este Município , a aprovar o loteamento dos terrenos necessários à construção dos referidos fogos, e aprovar as obras de urbanização e a emitir os competentes alvarás de loteamento. De referir que o alvará para a construção dos citados fogos, foi concedido à B... S.A cabendo a esta a responsabilidade da entrega dos mesmos ao Município.
As contraentes acordaram em recorrer a financiamento no âmbito dos programas de habitações sociais, suportando as segundas outorgantes: A...S.A e B...S.A. como custo das suas urbanizações, no âmbito do referido protocolo, a parte não financiável pelo poder central, do preço final da compra e venda dos 1000 fogos, que serão adquiridos pela primeira contraente (C.M.C.) e até ao valor de 20% desse preço.
Em execução do previsto no parágrafo anterior, as segundas contraentes devem entregar ao Município uma quantia correspondente a 20% do preço da compra e venda dos referidos 1000 fogos.
Pelo recebimento da citada quantia, o Município conferirá às segundas contraentes o competente recibo de quitação, sendo esse valor considerado como custo das suas urbanizações, aprovadas ou a aprovar no âmbito do referido protocolo.
b) A 20 de Novembro de 1997 , através de um acordo de adesão ao protocolo de Fevereiro de 1996, foi alterada a clausula 6a do ponto 2, pela qual, aquela quantia "Pagamentos ao Município dos até 20% do valor de venda dos fogos PER " podia ser satisfeita "mediante a dação de bens ou obras de construção civil, designadamente, as condutas adutoras de Trajouce e Caparide ou outras obras a indicar pela Câmara Municipal de Cascais" - obras estas, realizadas pela B...S.A no âmbito do protocolo das Tainhas e Marianas e que ascenderam a 660 727 794$00 - Vidé Anexo 6 - elementos facultados pela B...SA ; no entanto, até 14/05/03, "os pagamentos ao Município dos ate 20% " foram efectuados em numerário pelas duas empresas, no montante global de 117.429.400$00 ( A...75 154816$00 e B...42274584$00)
Assim sendo, em conjunto: A...S.A e B...S.A pagaram até 23-09-03, ao Município por conta dos "até 20% do preço final da compra e venda dos fogos PER" em numerário e obras o montante global de 778 157 194$00, que se poderá entender como o correspondente ao valor a suportar por estas, como custo das suas urbanizações na Quinta das Tainhas e Marianas, conforme estipula o na 2 da 6a cláusula do protocolo de Fevereiro de 1996 e alteração introduzida ao mesmo, em 20 de Novembro de 1997.
c) A 22 de Fevereiro de 1999, quando as duas empresas A...S.A e B...S.A. haviam já entregue ao Município 148 dos 1000 fogos do Programa Especial de Realojamento (PER) ; terem já pago em numerário por conta "dos até 20% .... " 117 .429 .400$00 e ter ocorrido a alteração referida na alínea b) de que o pagamento "dos até 20% ... ", passaria a ser efectuado mediante a dação de bens ou obras de construção civil, acordaram entre si através de protocolo, que a B...S.A assumiria construir directamente sob sua única e exclusiva responsabilidade os restantes 852 fogos, suportando todos os custos administrativos e todos os custos de gestão das habitações sociais objecto do referido protocolo, inclusivé o pagamento dos valores correspondentes à cláusula dos "até 20% ..... ", pagamento esse que até à presente data, era da responsabilidade elas duas outorgantes (A...e B... S.A.).
Face ao exposto, as partes fixaram que a parte dos "até 20%" imputável à A...S.A seria de 1.150.000.000$00 e seria liquidada por esta à B... S.A. ; porém o documento suporte deste lançamento contabilistico, é apenas o protocolo celebrado entre ambas, não indicando os cálculos que estiveram na base daquele apuramento - Vidé , Anexo 7 -pelo que no âmbito da ordem de Serviço n° 86 337 de 06/08/2003, foi solicitado à B... S.A. que justificasse o referido valor.
Esta exibiu o documento contabilizado em Fevereiro de 1999 com o n° 81290039, juntando-se cópia como Anexo 8, onde estimou que o custo dos "até 20% do valor de venda dos 1000 fogos PER" seria de 1.795.000.000$00 - e imputou à A...S.A 64% deste valor: 1 150 000 000$00, o correspondente à percentagem de construção que esta detinha na urbanização dos Jardins da Parede.
d) Assim sendo, o custo contabilizado na conta 316 - Compras de Matérias Primas ­Terrenos para Construção por 1.150.000.000$00, relevado no documento de Operações Diversas n° 81290005 de 22/02/99 - anexo 7, deverá ser corrigido porque:
Trata-se de um valor estimado, que não foi apurado em conformidade com o disposto na cláusula 6a n° 2 do citado protocolo que estipula:
As 2as contraentes (A...e B... ) suportarão como custo das suas urbanizações, no âmbito do referido protocolo, a parte não financiáve1 pelo poder central, do preço final da compra e venda dos 1000 fogos PER, que serão adquiridos pela primeira contraente (C.M.C.) e "até ao valor de 20% desse preço."
Se o valor das vendas dos fogos Per efectuadas ao Município, vai sendo conhecido à medida que os mesmos vão sendo entregues, não se justifica que o cálculo tenha incidido sobre uma estimativa.
Os custos de gestão das habitações sociais, referidos no acordo estabelecido entre as duas empresas, se devidos, deveriam ser quantificados e debitadosà medida que fossem suportados, o que não se verificou
A estimativa sobre os 1000 fogos não nos parece correcta. Se fosse aceite aquele critério, apenas deveriam ser considerados os restantes 852 fogos, dado que à data do referido acordo, já haviam sido entregues 148 e consequentemente contabilizados os respectivos custos dos "até 20%"
Como se relatou na alin.b) a A...S.A e B...S.A pagaram ao Municipio, por conta dos "até 20% do valor de venda dos Fogos PER" em numerário e obras, até ao dia 23 de Setembro de 2003, o montante global de 778 157 194$00, que deverá ser considerado o custo efectivamente a suportar por estas, nas urbanizações da Quinta das Tainhas e Marianas e não o valor contabilizado, no montante de 1.795.000.000$00, com base em estimativas.
2.2.1 - Face aos argumentos atrás relatados, é nosso entendimento que o valor dos" até 20% da venda dos fogos PER" imputável à A...S.A, a considerar para o exercício de 1999, face ao disposto cláusula 6a n° 2 do protocolo sobre a Quinta das Tainhas e Marianas, será de 152 697980$00 ou 761 654,31 Euros assim apurado:
1192 952 968$00 x 20% = 238 590 594$00
238590594$00 x 64% = 152 697 980$00
sendo:
1192 952968$00 = valor das vendas Per em 1999
238590594$00 = Valor dos até 20% da venda dos fogos PER alienados no exercício de 1999 à C. M. de Cascais, em execução do protocolo de cooperação no âmbito do projecto Especial de Realojamento (PER) celebrado em 09/02/96 entre a C. M. de Cascais e as empresas atrás referidas.
152 697 980$00 = Valor que cabe à A..., de acordo com a percentagem da área de construção que esta detinha na urbanização aprovada.
A não aceitação daquele valor estimado como custo fiscal, implica que seja feita uma correcção ao abrigo dos artigos 17° do CIRC , no montante de 997.302.020$00 ou 4.974.521,5 Eur correspondente à diferença entre o valor contabilizado: 1.150000000 $00 e o valor apurado no ponto anterior: 152697 980$00.
2. 2. 2. - Face ao disposto no artigo 19° do CIRC, a correcção referida em 2.2.1. implicará que o apuramento do resultado fiscal da obra 11001- Urbanização dos Jardins da Parede terá de ser ajustado em conformidade com os cálculos efectuados no Anexo 5 - deduzindo aos custos orçamentados e aos custos efectivos acumulados até de 31-12-99, o montante de respectivamente 997.302.020$00 ou 4974521,5 Eur.
2. 3. - Custos não dedutíveis para efeitos fiscais ao abrigo da alínea c) do artigo lOdo CIRC, por respeitarem a encargos que incidem sobre terceiros.
Relativamente ao assunto em epígrafe, constatou-se que as facturas abaixo discriminadas no montante global de 60 153 351$00 (1998 e 1999), respeitam à empreitada efectuada pela empresa Guedol - Engenharia Lda com o n° E.04/98 "Conduta de Abastecimento de Água ao Loteamento dos Jardins da Parede".
De acordo com o auto de medição n° 4 anexo à factura 0405 de 99/03/31 da qual se junta cópia como Anexo 9, aquele custo deveria ser imputado como custo da empresa , B...Lda , sendo que, o nome desta empresa é o que figura como cliente no citado documento; tal procedimento implicaria que as facturas abaixo discriminadas, fossem emitidas em seu nome e não em nome da A...S.A.
Facturas da Guedol
1988 1999
N° - Data Valor c/lva incl. Data-N° Valor c/lva incl. (1998+1999)
316-18/07/98 16,162,855 Esc. 405-31/03/99 7,378,479 Esc.
317-18/07/98 13,396,599 Esc. 406-31/03/99 3,380,575 Esc.
328-24/08/98 18,068,857 Esc. 407-31/03/99 400,140 Esc.
408-31/03/99 1,365,846 Esc.
Total 47,628,311 Esc. Total 12,525,040 Esc. 60,153,351 Esc.
2.3. 1 - Pelo exposto no ponto anterior, afigura - se - nos que o referido valor onerou indevidamente a obra 11001 - Jardins da Parede (propriedade da A...) onde não foi quantificado nem contabilizado qualquer proveito, considerando-se o referido valor, um custo alheio à empresa, não dedutível para efeitos fiscais, face ao disposto no n° 1 do artigo 41° do CIRC
Assim sendo, ir-se-á proceder à correcção aos custos contabilizados em 1999 pelo montante de 12 525 040$00 ou 62474,64 Eur.
2.3.2. - A não aceitação daquele valor como custo fiscal, implica que o resultado apurado pela empresa, na obra dos "Jardins da Parede" face ao disposto no artigo 19° do CIRC terá de ser ajustado, na medida em que o mesmo foi indevidamente influenciado pelo valor das facturas emitidas pela Guedol, em conformidade com os cálculos efectuados no Anexo 5 - deduzindo aos custos orçamentados o valor total das mesmas :
60.153.351$00 ou 300.043,65 Eur (facturas de 1998 e 1999) e aos custos efectivos acumulados até à data, o valor da correcção a efectuar ao exercício de 1999 no montante de 12 525 040$00 ou 62.474,64 Eur.
2. 4 - Aplicação do artigo 19° do CIRC à obra dos "Jardins da Parede" em resultado das correcções propostas nos pontos: 2.1.2.; 2.2.2. e 2.3.2. da presente informação, com cálculos efectuados no mapa de trabalho - Anexo 5.
Como se pode observar mapa - anexo 5, face às correcções propostas e comentadas nos pontos supra referidos, o Grau de Acabamento (GA) da obra 11001- Urbanização dos Jardins da Parede no exercício de 1999, apurado foi de 80,50%, quando a percentagem apurada pela empresa para o mesmo exercício, foi de 80,31 % - anexo 10
A percentagem de facturação a considerar , será a apurada pela empresa e que foi de 82,71 %.
Por aplicação do disposto no artigo 19° do CIRC, e instruções à aplicação do mesmo, através da Circular na 5/90, na situação em que a % de Facturação ( 82,71 %) é superior ao Grau de Acabamento da Obra (80,50%): Diferem-se os proveitos resultantes do produto do valor resultante entre a diferença dos dois rácios (2,21 %) , pelo Orçamento de Vendas: 5 706 050 000$00, concluindo-se assim que, os proveitos a diferir deveriam ter sido de 126381 172$00.
Tal facto, origina que os proveitos diferidos pela empresa no valor de 136 991 245$00, vão ser corrigidos no montante de 10.610.073$00 ou 52 922,82 Euros, aos resultados líquidos apresentados na mod 22 de IRC de 1999.
2.5. - Numa breve análise aos custos registados na modo 22 IRC deste exercício , verificou-se ainda que o sujeito passivo, contabilizou custos não dedutíveis para efeitos fiscais, não os acrescendo no quadro 07 , no montante global de 25 412 192$00 ou 126 755,47 Euros designadamente:
a) Juros compensatórios, no montante de 322 442$00 ou 1 608,33 Euros, contabilizados como custo através do documento do qual se junta cópia como anexo 11, não aceite como dedutível para efeitos fiscais ao abrigo do artigo 41 ° do CIRC..
b) Artigos adquiridos para ofertas através do documento 11D90044, contabilizado em 22-12-1999 por 8 676 800$00 ou 43 279,70 Euros, que não indica o nome da(s) entidade(s) que deles beneficiaram, não estando provada assim, a indispensabilidade de tais custos para a obtenção de proveitos sujeitos a imposto, nos termos do 23° do CIRC .
c) Deslocações efectuadas ao Brasil no montante global de 1 412 950$00 ou 7 047,76 Euros por pessoal da empresa, através dos documentos 2159.003 de 05/05/99 e 21N 9002 de 15/11799, nos valores de respectivamente 970.000.$00 e 442 950$00, onde não é indicado qual o objectivo das mesmas, nem a relação que as mesmas tiveram com a actividade desenvolvida.
Como não ficou provada a indispensabilidade de tais custos para a obtenção de proveitos sujeitos a imposto nos termos do 23° do CIRC , os mesmos não serão de aceitar para efeitos fiscais.
d) Indemnização no valor de 15 000 000$00 ou 74 819,68 Euros paga a um promitente comprador por esta empresa, por rescisão do contrato de promessa de compra e venda, por facto imputável ao primeiro, como se conclui da leitura do documento 1159006 contabilizado em 19-05-99, do qual se junta cópia como Anexo 12.
A empresa contabilizou o referido valor em custos, que se afiguram como encargo de conta de terceiros - cliente em causa- não aceite fiscalmente , nos termos do art° 41 ° do CIRC. (Doc. fls.
M) Em 02.12.2003, a Administração Tributária emitiu a liquidação adicional de IRC n.º 8310020274, no montante de € 3.493.114,58, na qual se mostra aposta o dia 14.01.2004 como data limite de pagamento voluntário. (Cfr. Doc. n.º 1 junto à p.i.)
N) Em 3. 03.1999, a Guedol - Engenharia, Lda emitiu à Impugnante a factura n.º 405, no montante de 7.378.479$00 (IVA incluído à taxa de 17%) relativa ao valor dos Trabalhos referentes ao Auto de Medição n.º 4, executados na Empreitada “Conduta de Abastecimento de Agua ao Loteamento dos Jardins da Parede”, na qual pode ainda retirar-se: “ Nota: o reforço para caução definitiva é substituído por garantia bancária”. (Doc. n.º 2- anexo12 junto á p.i.)
O) No ano de 1999, a Guedol - Engenharia, Lda prestou vários serviços de construção civil à Impugnante e à A.SANTO, S.A. e por mero lapso indicou como dono da obra “Conduta de Abastecimento de Agua ao Loteamento dos Jardins da Parede”, a A.SANTO, Empreendimentos Industriais e Turísticos, S.A. quando deveria ter indicado a Impugnante. (Depoimento 3ª testemunha)
P) A Guedol, Guedol - Engenharia, Lda. prestou à Impugnante os serviços constantes no Auto de Medição n.º 4. (Depoimento 3ª testemunha)
Q) No ano de 1999, as obras da Urbanização “ Jardins da Parede” não estavam todas concluídas. (Depoimento 3ª testemunha)
R) A Impugnante tem por prática oferecer a clientes, funcionários e fornecedores amêndoas, vinhos, canetas e azeite. (Depoimento 2ª testemunha)
S) Em 07.04.2004, a Impugnante deduziu reclamação graciosa contra a liquidação adicional de IRC a que alude a al. M) do probatório. (Doc. fls. 2/40 do processo administrativo tributário apenso)
T) Por despacho proferido em 27.06.2005, pelo Director de Finanças de Lisboa, foi a reclamação a que alude a al. S) do probatório indeferida. (Doc. fls. 237/258 do processo administrativo tributário apenso)
U) Objectivando a notificação do despacho a que alude a al. T) do probatório, foi enviado ofício n.º 40078 com data de 27.06.2005, registado com A/R, dirigido à Impugnante, mostrando-se este assinado. (Docs. fls. 259/261 do processo administrativo tributário apenso)
V) A Impugnante foi notificada do despacho a que alude a al. T) do probatório em 28.06.2005. (cfr. art. 7º do req. Fls. 332/333 dos autos)
X) A presente petição inicial deu entrada em Tribunal em 14.07.2005, tendo sido remetida por correio registado no dia 13.07.2005. (cfr. carimbo aposto sobre a PI de fls. 2 e doc. junto a fls.334/336 dos autos).


A decisão da matéria de facto efectuou-se com base com base no exame dos documentos não impugnados, que constam dos autos e depoimentos prestados em sede de produção de prova testemunhal, referenciados em cada uma das alíneas do probatório.

Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir.


4. Na matéria das suas conclusões D. a N. veio a ora recorrente A...imputar à sentença recorrida o vício formal de falta da sua fundamentação de facto, a existir, conducente à declaração da sua nulidade (que não só à sua anulabilidade, como indistintamente lhe imputa) – ainda que, a final, não tenha chegado a formular o pedido correspondente - porque o mesmo a ocorrer gerar, na realidade, a nulidade desta, nos termos do disposto nos art.ºs 668.º n.º1 alínea b), do Código de Processo Civil (CPC), 143.º e 144.º do Código de Processo Tributário (CPT), e hoje dos art.ºs 124.º e 125.º do CPT, importa por isso conhecer em primeiro lugar, desta invocada nulidade.

A apontada falta de fundamentação da sentença recorrida no que à matéria de facto tange, nas duas vertentes assacadas à sentença recorrida, quer por se apoiar em puras conclusões especulativas exclusivamente assentes num relatório, quer por não ter especificado os factos em que fundou a decisão que proferiu – cfr. matéria das suas conclusões J. e N. das suas alegações do recurso – no tocante, à desconsideração da verba de € 2.297.389,55, derivada da reavaliação da obra Jardins das Parede, a qual se encontra em conexão com a verba de 1.150.000$00, que justamente foi anulada, as quais se encontram numa relação de mútua dependência, desde logo se pode constatar, que esta crítica nem sequer é verdadeira na sua essencialidade, já que a sentença recorrida não deixou de, em sede de análise crítica, em geral, de analisar a prova oferecida, especialmente a testemunhal produzida, não tendo deixado de fundamentar e em conclusão ... A decisão da matéria de facto efectuou-se com base com base no exame dos documentos não impugnados, que constam dos autos e depoimentos prestados em sede de produção de prova testemunhal, referenciados em cada uma das alíneas do probatório, que a ora recorrente não fez colocar em reexame por este Tribunal, de forma válida, ao abrigo do disposto no art.º 690.º-A do CPC (redacção de então e a aplicável).

É certo que quanto à verba de € 2.297.389,55, a sentença recorrida entendeu que os únicos fundamentos a considerar e relevantes para esta apreciação, consistiam nos trazidos pelo Relatório da Inspecção Tributária, que depois desenvolveu ao longo de mais de uma página porque tal desconsideração não merecia a apontada censura efectuada pela A..., pelo que não se alcança como poderá tal fundamentação do julgado, ocorrida ao arrimo destes termos factuais, possa conduzir a tal vício formal, tanto mais que a mesma nem invoca quais os concretos (outros) meios probatórios existentes nos autos e que tenham sido dados como provados e que a sentença tenha menosprezado nessa fundamentação, bem como, na mesma sentença, em sede do desenvolvimento dessa fundamentação, não deixou a M. Juiz do de trazer à colação diversos aspectos que conduziram à conclusão por si alcançada, designadamente invocando a matéria do art.º 187.º da petição de impugnação, diversas normas legais e princípios jurídicos, pelo que a sentença recorrida que julgou improcedente a liquidação adicional atinente a tal correcção não pode padecer de tal vício formal.

Também aqui é certo, que tal improcedência da impugnação nesta parte, não foi correlacionada com a procedência da liquidação atinente à citada verba de 1.150.000$00, o que não pode implicar a sua nulidade, porque com a extensão dessa fundamentação se prende e com o não seguimento do critério propugnado pela ora recorrente para o efeito, que esta parece não querer aceitar, o que já constitui questão diversa da falta de fundamentação formal em que nos encontramos, pelo que a sentença com a decisão que encerra, nesta parte, se encontra perfeitamente ancorada, quer na factualidade relevante que deu por provada, quer no direito que entendeu aplicável, como o esteio donde emerge, não podendo padecer do invocado vício formal.

Tal vício de falta de fundamentação da sentença, causa da sua nulidade, constante nas normas dos art.ºs 668.º n.º1 b) do CPC e 125.º n.º1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), apenas tem lugar quando lhe faltem os seus fundamentos de facto e de direito da concreta solução alcançada, não quando a mesma não fundamente aspectos, razões ou raciocínios expendidos pela recorrente que, no seu contexto, se apresentem irrelevantes para essa mesma solução, ou que não se mostram provados, como constituíam vários desses argumentos ou razões trazidos à liça pela ora recorrente.

Por outro lado, tal falta de fundamentação da sentença conducente à declaração da sua nulidade só pode ocorrer quando a mesma seja total ou absoluta; não quando a mesma seja deficiente, errada ou obscura, que pode afectar o seu valor doutrinal mas não produz nulidade, como já ensinava o Prof. José Alberto dos Reis(1)... Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto...

E no mesmo caminho trilha a jurisprudência dos nossos tribunais superiores como se pode ver em, entre muitos outros, pelo acórdão do STJ de 22.4.2204, Proc. 04B1072 e acórdão do STA de 29.6.2005, recurso n.º 117/05.


Improcede assim, o invocado vício formal assacado à sentença recorrida, de falta da sua fundamentação.


4.1. Na matéria das conclusões da recorrente Fazenda Pública (FP), também esta se vem a insurgir com a sentença recorrida imputando-lhe o vício da sua nulidade – cfr. matéria da sua conclusão g) – onde em jeito conclusivo, remata com a existência de tal vício formal, sem que contudo se consiga apreender, da matéria das anteriores conclusões, que logicamente a deveriam encerrar, onde a mesma se ancora, donde tal falta de substanciação não pode deixar de levar à improcedência do recurso por este fundamento, sabido que estes, nos termos do disposto no art.º 690.º, n.º1 do CPC, devem precisar as concretas razões para que se reflicta a decisão recorrida em ordem a sobre ela ser emitido um juízo de censura conducente à declaração da sua nulidade, no caso, e quando o não façam, como no caso, são inidóneas para com base nelas estribar a sua alteração, como constitui jurisprudência corrente (a menos que existisse questão de conhecimento oficioso que a tal conduzisse, que no caso se não vislumbra).

Antes, na matéria das anteriores conclusões invoca a FP, que tal decisão enferma de erro de julgamento – conclusão a) – e de errado julgamento da matéria de facto – suas conclusões c) e d) – mas de nenhum vício que possa ser subsumível aos vícios formais contidos na norma do art.º 125.º do CPPT, a qual invoca, pelo que o recurso não pode deixar de improceder enquanto abrigado em tal vício formal de nulidade da decisão.


4.2. Na matéria das citadas conclusões recursivas c) e d) da mesma FP, vem a mesma pugnar pelo errado julgamento da matéria de facto, pugnando que a redacção da alínea Q) do probatório deve ser alterada no sentido que propugna, sem que tenha dado cumprimento à norma do n.º1 do mesmo art.º 690.º-A do CPC, nas suas alíneas a) e b), ao que a impugnante (e nesta parte, recorrida), contrapõe, exactamente, tal falta de especificação dos concretos meios probatórios, constantes dos autos, que impunham decisão sobre tal ponto da matéria de facto impugnada, diversa da recorrida – cfr. matéria das conclusões i), j) e o) das suas contra-alegações – pelo que também se não vislumbrando dos autos qualquer documento com a virtualidade de levar este Tribunal a dar como provada, oficiosamente, tal factualidade, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º1 do art.º 712.º do CPC, não é de alterar a redacção da matéria de facto contida em tal alínea (ainda que a mesma pudesse ter relevo para a decisão do mérito das questões decidendas, do que ora se não aquilata), pelo que igualmente improcede o recurso enquanto tendo por objecto a citada alteração da matéria de facto.


5. Tendo sido interpostos dois recursos da mesma decisão, mas sobre partes autónomas da mesma, é indiferente para a economia do presente recurso, que se conheça primeiro de um ou do outro, já que entre si nenhuma prejudicialidade existe, pelo que passaremos a conhecer de seguida, do recurso interposto pela impugnante, por ter sido o primeiro a ser interposto.


5.1. Para julgar improcedente a impugnação judicial quanto à liquidação adicional de IRC relativa ao exercício do ano de 1999, relativa às duas verbas desconsideradas como custos (pontos 1. e 4. da mesma sentença), considerou a M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que quanto ao primeiro, relativo à verba de € 2.297.389,55, relativas à reavaliação da área de 110.052 m2, afecto à obra “Urbanização Jardins da Parede”, reavaliada no exercício no total de € 3.893.211,46, como da mesma foi alienada 29155 m2, pelo que tal reavaliação onerou o custo da obra, na proporção da área vendida no mesmo exercício, naquela importância, montante que assim foi desconsiderado como custo fiscal deste exercício, por a AT ter procedido à determinação do valor da reavaliação por m2, que fez aplicar a tal área então vendida, o que não ofende o princípio da especialização dos exercícios, sendo pois legal tal correcção, bem como ter sido legal a desconsideração da verba de € 43.279,70 relativa a “ofertas” que embora como tal contabilizadas, os respectivos documentos de suporte não identificam os respectivos destinatários, desta forma não sendo possível aferir da sua incorrência para a obtenção dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora, indicando, a propósito, um acórdão deste Tribunal que no mesmo sentido decidiu.

Para a impugnante e ora recorrente é contra esta fundamentação (e muita outra) que vem a esgrimir argumentos tendentes a este Tribunal formular um juízo de censura sobre esta parte do decidido conducente à sua revogação, desde logo invocando uma indevida não tomada em conta de toda a prova produzida (documental, testemunhal e o parecer junto), tendo-se limitado à adesão incensurada à proposta da AT, tanto mais que aceitou o custo relativo a 20% do montante de 1.150.000.000 PTE, que deveria ter sido considerado no cálculo do apuramento da variação de produção da citada obra, embora reconhecendo razão à AT no tocante à não aceitação do resultado fiscal da reavaliação, contudo, a que veio a ser efectuada, viola as regras de determinação de resultados das obras plurianuais, contidas no art.º 19.º do CIRC, devendo tal reavaliação apenas ter efeitos no incremento do valor contabilístico dos bens em causa que não do seu valor fiscal, só podendo ser custo ou proveito aquilo que corresponder à parte da obra efectivamente realizada e não a receitas ou despesas, onde a final o resultado global da mesma será apurado, sob pena de duplicação de resultados tributáveis, tendo sido obtido um resultado que não respeita o regime do art.º19.º do mesmo CIRC, em suma, pugna a recorrente que o único critério legal consistiria que tivesse sido recalculado o valor de acabamento da obra antes da sua reavaliação, para depois poder combinar os valores daqui resultantes com a percentagem de facturação – cfr. matéria da sua alínea DD. – e quanto à verba desconsiderada e relativa a ofertas aos seus clientes vem, igualmente, assacar ao tribunal a não tomada em conta da matéria de facto provada, devendo tal norma do art.º 23.º do CIRC ser conjugada com a do seu art. 17.º, n.º1, alínea b), nada lhe acrescentando, não cabendo à AT intrometer-se na identificação dos clientes para quem tais ofertas foram destinadas, não lhe sendo admitido questionar as opções de gestão da contribuinte, encontrando-nos aqui, num espaço de liberdade empresarial irrestrita, podendo, quando muito, colocar em causa se tais ofertas o não pudessem ter sido a certo sócio e sem causação empresarial.

Vejamos então.
Como já acima se frisou, designadamente no ponto 4.2., relativo ao recurso da FP, a matéria de facto sobre que o presente recurso irá incidir reporta-se à contida no probatório fixado na sentença recorrida, nas sua alíneas A) a X), com eventual tomada em consideração de alguma outra matéria contida no relatório da escrita e que apenas na matéria da sua alínea L), do mesmo, que ali foi fixada a título exemplificativo, nos termos do disposto no art.º 659.º, n.º3, ex vi do art.º 713.º, n.º2, ambos do CPC, se e na medida que a mesma se venha a revelar necessária/útil para a fundamentação do presente julgado, de molde a estear o decidido na mais ampla base factual possível, que dos autos emirja.

Assim, e começando por conhecer da desconsideração da verba de 460.585.252$00 como custo do exercício e sobre que versa a presente parte do recurso, daquela matéria se pode colher que a mesma consistiu na parte dos custos de reavaliação do terreno onde foi implantado a obra “Jardins da Parede”, que havia sido adquirido por 365.000.000$00 e que veio a ser contabilizado por 1.179.845.614$, mercê dessa reavaliação de 780.520.824$00, tendo onerado os custos dos exercícios a partir dos quais ocorreram a venda das fracções reavaliadas, sendo que em 1999, a parte dessa reavaliação, foi daquele montante percentual – cfr. pontos 2 a 2.1.2 daquele relatório, contido na matéria daquela alínea do probatório – invocando a AT, para tanto, que a mesma viola o disposto no art.º 26.º, n.º1 do CIRC.

A sentença recorrida, na mesma senda, fundamentou que tendo a AT apurado o total de área de venda ocorrida em 1999, foi legal ter desconsiderado a reavaliação na proporção dessa mesma área vendida,...”o critério da área vendida como critério de imputação de um custo indirecto ao correspondente exercício, não se mostra ofendido o princípio da especialização de exercício”, ...”já que havia lugar à dedução do montante da reavaliação para determinar de novo o valor de custos global da obra, para efeitos da aplicação do art.º 19.º do CIRC” ..., ao que a ora recorrente continua a pugnar que tal desconsideração de custos não respeita o princípio contido no art.º 19.º do CIRC, devendo ter recalculado o grau de acabamento da obra, expurgado do efeito da reavaliação levado a cabo [que contudo, aceita que deva ter lugar, cfr. sua conclusão V)], tudo de forma a, posteriormente, poder combinar os valores daí resultantes com a percentagem de facturação – cfr. sua conclusão DD).

Como a ora recorrente, nesta parte não dissente, por efeito da alteração do destino que deu aos terrenos adquiridos para construção, em que no imobilizado os inscreveu por montantes onerados com tal reavaliação, ao utilizá-los na sua actividade comercial e industrial de construção civil, havia lugar à desconsideração dessa mesma reavaliação nos custos da obra em causa, concretamente no exercício aqui em causa, de 1999, havendo lugar ao seu expurgo, o qual a AT apurou em função da percentagem da área vendida neste exercício, critério que nesta medida e neste ponto, respeita o princípio da especialização dos exercícios contido no art.º 18.º do mesmo CIRC, como bem se pronuncia a M. Juiz do Tribunal “a quo”, na sentença recorrida.

Por outro lado, como se pode colher do ponto 2.1.2. do mesmo relatório do exame à escrita e dos seus anexos 4 e 5, não infirmado por qualquer outra prova constante dos autos, deste custo dos terrenos, na parte cujas fracções foram vendidas em 1999, expurgado da dita reavaliação, bem como aos custos efectivos acumulados até então, foram considerados na proporção do grau de acabamento da obra em causa de construção de fogos, tendo sido através do mesmo que tal valor dos terrenos por m2 que o mesmo montante foi alcançado, como dos mesmos anexos constam, ou sejam de acordo com um dos critérios constantes no art.º 19.º do mesmo CIRC, o qual no seu n.º1 dispõe:
A determinação de resultados em relação a obras cujo ciclo de produção ou tempo de construção seja superior a um ano poderá ser efectuada segundo o critério do encerramento da obra ou segundo o critério da percentagem de acabamento.
...
4 – O grau de acabamento de uma obra, para efeitos do disposto nos números anteriores, é dado pela relação entre o total dos custos já incorporados na obra e o total dos custos estimados para execução completa da mesma.
...
E o grau de acabamento, no caso, fê-lo a AT extrair do total dos custos incorridos nas fracções vendidas, raciocínio que se nos afigura adequado para o efeito, pois se tais fracções já obtiveram os correspondentes proveitos devem considerar-se acabadas ou concluídas, logo podendo servir de parâmetro para estabelecer a relação entre o total dos custos já incorporados na obra assim concluída e o total dos custos estimados, que aquele n.º4 estabelece, como critério de encontrar o grau de acabamento de uma obra cujo execução dure por mais de um ano.

Aliás, é neste mesmo sentido a anotação constante no Código do IRC, Comentado e Anotado, da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, 1990, onde se pode ler, na sua pág. 150:
4 – São de um modo geral apontadas as inspecções que meçam o trabalho executado e que no âmbito das empreitadas de obras públicas dão origem aos designados autos de medição, bem como a relação entre os custos incorridos e os custos totais estimados do contrato.
Foi este último processo acolhido pelo legislador devendo ser relevados resultados sempre que as obras tenham atingido um grau de acabamento já facturado.
...

Tendo a liquidação adicional nesta parte da desconsideração deste montante seguido o critério supra, o qual assim se não vê que possa ser ilegal, não pode deixar de improceder a matéria relativa às conclusões das alegações do recurso respectivas, sendo de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


Passemos agora a conhecer da desconsideração da verba de € 43.279,70 relativa a “ofertas” que embora como tal contabilizada, os respectivos documentos de suporte não identificam os respectivos destinatários, desta forma não sendo possível aferir da sua incorrência para a obtenção dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora, não podendo por isso ser qualificada como de um custo fiscal, ao que a recorrente, nesta parte, pugna por tal consideração, como de um custo, defendendo que estando provando que tal montante se reporta a ofertas a clientes, fornecedores ou trabalhadores, nunca podem ser questionadas pela AT, por nesta área existir liberdade empresarial irrestrita, não tendo que identificar os concretos destinatários das mesmas – cfr. matéria das conclusões KK) e segs. da suas alegações de recurso.

Nos termos do disposto no art.º 23.º do CIRC, consideram-se custos os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes, cujas alíneas, a título exemplificativo, enumeram diversos gastos das empresas que como tal devem qualificados, para além de outros não expressamente elencados e que sejam subsumíveis no corpo do mesmo artigo.

Porém, em todos os casos, tem de existir uma relação entre esses gastos e os respectivos proveitos ou ganhos, ainda que não do tipo de causalidade adequada, de molde a que se possa estabelecer a ligação entre os mesmos e a actividade empresarial prosseguida pela mesma, já que a lei exige que uns sejam comprovadamente indispensáveis para a obtenção ou alcance destes outros.

E não seria necessário ir mais longe, para concluirmos no caso, que a tese defendida pela recorrente, nesta matéria, não permite alcançar tal desiderato, já que desconhecendo-se quem foram os efectivos destinatários de tais artigos ofertados, impossível será estabelecer ou aferir tal ligação da sua indispensabilidade para com os ganhos ou proveitos ou para a manutenção da fonte produtora, cuja matéria constante na matéria R) do probatório da sentença recorrida, apenas permite dar como provada tal prática de ofertas pela recorrente, pelo que sem conhecer, em concreto, quais os reais beneficiários das mesmas, não podem os correspondentes custos ou gastos serem qualificados como de custos fiscais, como bem se decidiu na sentença recorrida, a qual assim, não é passível da censura que a mesma lhe formula.

Este entendimento constitui, de resto, uma linha de interpretação seguida pela generalidade da nossa jurisprudência, como se pode ver para além do acórdão deste TCAS citado, a propósito, pela M. Juiz do tribunal “a quo” – acórdão de 18-10-2005, recurso n.º 695/05 -, também os acórdãos do STA de 5-7-2000 e de 19-12-2001, recursos n.ºs 24.632 e 26.176, respectivamente, que a recorrente não veio colocar em causa com novos argumentos e nem outros se nos afiguram existir.


Nestes termos, improcede na totalidade, o recurso interposto pela impugnante, relativo à parte em que a impugnação judicial foi julgada improcedente.


6. Passemos agora a conhecer da parte restante do recurso interposto pela Exma RFP, relativo a duas das verbas em que a impugnação foi julgada procedente, quais sejam as de 1.150.000.000$00 e a de € 74.819,19, cuja anulação da liquidação, na parte respectiva, anulou.

Aquela primeira verba foi inscrita pela impugnante como custo do exercício, relativa à mesma obra “Jardins da Parede”, por montante pago à empresa B..., SA, o qual não foi aceite na sua totalidade e antes foi corrigida pela AT por se tratar de custo estimado, que não fora apurado de acordo com o estabelecido no Protocolo celebrado com a Câmara Municipal de Cascais e que se baseava na construção de 1000 fogos, quando ainda lhe faltavam construir 852, em que a M. Juiz do tribunal “a quo”, na fundamentação da sentença recorrida, depois de discorrer sobre a tributação das empresas, fundamentalmente, pelo critério do lucro real, esteou a sua decisão em a AT não ter questionado a realização da despesa, mas tão somente o seu montante, por o considerar excessivo, face às prestações que a B... incorreu perante a Câmara Municipal de Cascais, na assunção de obrigações que originariamente caberiam à impugnante, na construção dos referidos fogos na citada obra “Jardins da Parede”, em que a AT não logrou provar concretos factos que descredibilizassem tal importância como de um custo fiscal, regularmente apoiado em documentos de suporte, cuja presunção de veracidade não foi abalada, para além de que o próprio discurso fundamentador da desconsideração dessa verba enfermava de défice de pressupostos, não tendo atendido ao que ao tempo, ainda se não encontravam construídas todas as obras que a impugnante se obrigara a entregar à Câmara e pelas quais havia pago tal verba (1.150.000.000$00).

A recorrente FP, na matéria das conclusões i) a n) das suas alegações do recurso, vem pugnar que tal correcção teve lugar ao abrigo do disposto no art.º 26.º do CIRC que não do art.º 23.º do mesmo Código, como foi entendido na sentença recorrida, para além de que tal custo ter sido um custo estimado que não um custo real, e só estes podem, nestes termos, serem custos do exercício.

A liquidação impugnada, em causa, recorde-se, reporta-se ao exercício do ano de 1999, sendo-lhe por isso aplicável a lei substantiva então vigente do CIRC, na redacção então vigente e numeração primitiva do mesmo Código.

Como consta da matéria de facto fixada no probatório da sentença recorrida e não infirmada por qualquer uma outra, tal verba de pagamento à B..., foi desconsiderada pela AT como custo do exercício por ...”Face ao exposto, as partes fixaram que a parte dos "até 20%" imputável à A...S.A seria de 1.150.000.000$00 e seria liquidada por esta à B... S.A.; porém o documento suporte deste lançamento contabilístico, é apenas o protocolo celebrado entre ambas, não indicando os cálculos que estiveram na base daquele apuramento - Vidé , Anexo 7 -pelo que no âmbito da ordem de Serviço n° 86 337 de 06/08/2003, foi solicitado à B...S.A. que justificasse o referido valor.
Esta exibiu o documento contabilizado em Fevereiro de 1999 com o n° 81290039, juntando-se cópia como Anexo 8, onde estimou que o custo dos "até 20% do valor de venda dos 1000 fogos PER" seria de 1.795.000.000$00 - e imputou à A...S.A 64% deste valor: 1 150 000 000$00, o correspondente à percentagem de construção que esta detinha na urbanização dos Jardins da Parede.
d) Assim sendo, o custo contabilizado na conta 316 - Compras de Matérias Primas ­Terrenos para Construção por 1.150.000.000$00, relevado no documento de Operações Diversas n° 81290005 de 22/02/99 - anexo 7, deverá ser corrigido porque:
Trata-se de um valor estimado, que não foi apurado em conformidade com o disposto na cláusula 6a n° 2 do citado protocolo que estipula:
As 2as contraentes (A...e B...) suportarão como custo das suas urbanizações, no âmbito do referido protocolo, a parte não financiáve1 pelo poder central, do preço final da compra e venda dos 1000 fogos PER, que serão adquiridos pela primeira contraente (C.M.C.) e "até ao valor de 20% desse preço."
Se o valor das vendas dos fogos Per efectuadas ao Município, vai sendo conhecido à medida que os mesmos vão sendo entregues, não se justifica que o cálculo tenha incidido sobre uma estimativa.
Os custos de gestão das habitações sociais, referidos no acordo estabelecido entre as duas empresas, se devidos, deveriam ser quantificados e debitados à medida que fossem suportados, o que não se verificou
A estimativa sobre os 1000 fogos não nos parece correcta. Se fosse aceite aquele critério, apenas deveriam ser considerados os restantes 852 fogos, dado que à data do referido acordo, já haviam sido entregues 148 e consequentemente contabilizados os respectivos custos dos "até 20%"
Como se relatou na alín. b) a A...S.A e B...S.A pagaram ao Município, por conta dos "até 20% do valor de venda dos Fogos PER" em numerário e obras, até ao dia 23 de Setembro de 2003, o montante global de 778 157 194$00, que deverá ser considerado o custo efectivamente a suportar por estas, nas urbanizações da Quinta das Tainhas e Marianas e não o valor contabilizado, no montante de 1.795.000.000$00, com base em estimativas.
2.2.1 - Face aos argumentos atrás relatados, é nosso entendimento que o valor dos "até 20% da venda dos fogos PER" imputável à A...S.A, a considerar para o exercício de 1999, face ao disposto cláusula 6a n° 2 do protocolo sobre a Quinta das Tainhas e Marianas, será de 152 697980$00 ou 761 654,31 Euros assim apurado:
1192 952 968$00 x 20% = 238 590 594$00
238590594$00 x 64% = 152 697 980$00
sendo:
1192 952968$00 = valor das vendas Per em 1999
238590594$00 = Valor dos até 20% da venda dos fogos PER alienados no exercício de 1999 à C. M. de Cascais, em execução do protocolo de cooperação no âmbito do projecto Especial de Realojamento (PER) celebrado em 09/02/96 entre a C. M. de Cascais e as empresas atrás referidas.
152 697 980$00 = Valor que cabe à A..., de acordo com a percentagem da área de construção que esta detinha na urbanização aprovada.
A não aceitação daquele valor estimado como custo fiscal, implica que seja feita uma correcção ao abrigo dos artigos 17° do CIRC, no montante de 997.302.020$00 ou 4.974.521,5 Eur correspondente à diferença entre o valor contabilizado: 1.150000000$00 e o valor apurado no ponto anterior: 152.697.980$00.
...”, onde a única norma invocada foi a do então art.º 17.º do CIRC, como acima se pode colher (que hoje não corresponde à do art.º 26.º, na redacção do Dec-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho, como invoca a recorrente, mas sim à do mesmo art.º 17.º, tendo ambas por epígrafe, Determinação do lucro tributável), desde logo não sendo totalmente verdadeira que a AT tenha invocado a citada norma do art.º 26.º, para efectuar tal correcção, que de resto, ao tempo vigente, até nem seria tal norma, mas a do art.º 25.º do mesmo Código, que tratava de tal matéria da valorimetria das existências, a considerar no apuramento do lucro tributável, que só na actual redacção veio a ter acento no citado art.º 26.º.

Seja como for, a dita verba de 1.150.000.000$, desconsiderada em parte como um custo do exercício de 1999, ainda que apoiada no respectivo documento de suporte, como se não encontra em causa, cremos que a AT carreou para os autos elementos precisos e concretos, aptos a afastar a presunção de veracidade dos dados e lançamentos de uma escrita regularmente organizada, como lhe cabia, em ordem à correspondente liquidação adicional, nos termos do disposto nos art.ºs 74.º, n.º1 e 75.º, n.ºs 1 e 2 da LGT.

Senão vejamos:
Tal valor acima descrito (1.150.000.000$), corresponde a uma estimativa desse custo efectuada pela impugnante para com a B..., como nem as partes dissentem, quando em 1999 já haviam sido construídos e entregues ao Município 148 fogos, pelo que os respectivos proveitos e os custos inerentes poderiam/deveriam ter sido balanceados no apuramento do resultado do exercício, não podendo ser aceite como custo fiscal, a totalidade dessa importância que só nos exercícios futuros veio a ter reflexos nos proveitos respectivos ou até nos anteriores exercícios, como continua a pretender a impugnante, pelo que tendo sido este o critério exactamente seguido pela AT, ao aplicar os citados 20% desse preço previsto no acordo escrito celebrado com o Município de Cascais, a que aplicou a percentagem de 64% que era a correspondente à responsabilidade da mesma impugnante na área de construção nesse projecto, apenas tendo aceite como custo fiscal o montante assim alcançado – 152.697.980$00 – e desconsiderado o restante, quer a referida argumentação se nos afigura idónea para colocar em causa tal custo pela sua totalidade, quer o critério seguido se nos afigura adequado em ordem ao apuramento do lucro tributável, de acordo com as disposições dos art.ºs 17.º e segs do CIRC, com prevalência da substância sobre a forma (valor dos fogos já construídos versus valor estimado pela impugnante), princípio este aliás, que tem mesmo expressa guarida no princípio contabilístico constante na sua alínea f), Da substância sobre a forma, em que as operações devem ser contabilizadas atendendo à sua substância e à realidade financeira e não apenas à sua forma legal, constante no POC.

Assim, nesta parte, o recurso interposto pela Fazenda Pública tem de proceder, ainda que por fundamentação jurídica não totalmente coincidente com a avançada pela mesma.

Passemos agora a conhecer da última questão do recurso da Fazenda Pública e que tem por objecto a verba de € 74.819,19, desconsiderada como custo fiscal pela AT e que a sentença recorrida igualmente anulou por ter entendido que a rescisão do contrato que importou no pagamento dessa verba a terceiro se enquadrou numa avaliação dos riscos da sua não execução pela impugnante, em que a AT não cabe intrometer-se, enquanto medida de gestão na sua esfera e disponibilidade, sendo um verdadeiro custo fiscal, já que também nem foi questionada a substância ou a forma dessa indemnização.

A esta argumentação estriba a recorrente que tal indemnização teve lugar por incumprimento de um contrato promessa, por iniciativa do promitente comprador a que a impugnante anuiu, mas em que não havia lugar ao pagamento de qualquer indemnização ao abrigo do disposto no art.º 440.º e segs do Código Civil, pelo que não sendo um pagamento obrigatório, não pode o mesmo constituir um custo fiscal.

Face à matéria constante nas alíneas F) a H) do probatório fixado na sentença recorrida, a impugnante aceitou a proposta da promitente compradora para rescindir o contrato de promessa de compra e venda e aceitou pagar-lhe a citada verba, por à promitente compradora, no momento lhe ser um pouco difícil cumprir com as cláusulas do contrato, tendo a impugnante, posteriormente, vendido esse lote n.º 22, a um terceiro, por montante superior àquele que constava do contrato promessa, donde a recorrente entende que, legalmente, nada lhe tendo a pagar para tal rescisão desse contrato, tal importância não pode ser subsumível à noção de custo fiscal contida no art.º 23.º do CIRC.

Nos termos do disposto nos art.ºs 442.º e 830.º do Código Civil (redacção do Dec-Lei n.º 379/86, de 11 de Novembro), a parte que não deu causa ao incumprimento do contrato promessa, em princípio, nada tem de prestar à contraparte, tendo mesmo o direito de fazer seu o sinal entregue pelo promitente comprador, caso tenha havido.

Porém, no caso, desde logo, não se encontra provado que a promitente compradora chegou a incumprir com as cláusulas de tal contrato promessa, mas apenas que a mesma, no momento lhe ser um pouco difícil cumprir com as cláusulas do contrato, bem como o facto de tal resolução não ser automática, bem podendo a promitente compradora opor-se a esta resolução, em que a impugnante teria de a demandar nos tribunais comuns para ver reconhecido esse direito, sendo perfeitamente lícito à mesma, sopesar o que lhe era mais vantajoso, enquanto medida de gestão perfeitamente inserida no âmbito do prosseguimento do seu escopo social, em obediência ao disposto nos art.ºs 160.º do Código Civil e 6.º do CSC, e sobre o que a AT se não pode imiscuir, pelo que a assunção de tal indemnização foi, comprovadamente indispensável, para a impugnante voltar a ter no seu activo o tal lote de terreno livre e desembaraçado, nas condições em que o teve e que depois veio a alienar, a um terceiro, por valor superior, pelo que tal montante não pode deixar de constituir um verdadeiro custo fiscal à luz da norma do art.º 23.º do CIRC, como nesta parte igualmente se pronuncia a sentença recorrida, pelo que o recurso nesta parte, não pode deixar de improceder.


Nestes termos, improcede o recurso da Fazenda Pública, nesta parte e procede quanto à primeira verba desconsiderada como custo.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso interposto pela impugnante e em conceder parcial provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública, revogando-se a sentença recorrida quanto à anulação da liquidação relativa à verba de 1.150.000.000$00, e mantendo-se no demais.


Custas pela recorrente quanto ao recurso por si interposto e em que decaiu e custas na proporção do decaimento das partes, quanto ao recurso interposto pela Fazenda Pública.


Lisboa, 22/05/2012

EUGÉNIO SEQUEIRA
PEDRO VERGUEIRO
ANÍBAL FERRAZ, declarando não subscrever o constante do ponto 4.2. (fls. 167)

1- Código de Processo Civil, anotado, Vol. V, Reimpressão, Coimbra 1981, pág. 140, ao cimo.