Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02477/08
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:06/28/2011
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:PRINCÍPIO DA ESPECIALIZAÇÃO DOS EXERCÍCIOS.
DIREITO PORTUGUÊS SEGUE O MODELO DO RECURSO DE REVISÃO OU REPONDERAÇÃO.
QUESTÕES NOVAS.
I.R.C. MÉTODOS INDIRECTOS.
ARTºS.87, AL.B), E 88, AL.D), DA L. G. TRIBUTÁRIA.
ARTº.117, DO C.P.P.T.
ARTº.74, Nº.3, DA L.G.T.
Sumário:1. Princípio da especialização ou do acréscimo encontra-se consagrado no artº.18, do C.I.R.C. (cfr.artº.22, do anterior C.C.I.), o qual determina que os proveitos e os custos devem ser imputados ao período a que respeitam, independentemente do seu recebimento ou pagamento. Por outra palavras, em determinado exercício, devem ser contabilizados os proveitos, e também os custos, que nele efectivamente tenham sido realizados.
2. O direito português segue o modelo do recurso de revisão ou reponderação (modelo que tem as suas raízes no Código Austríaco de 1895). Daí que o Tribunal “ad quem” deva produzir um novo julgamento sobre o já decidido pelo Tribunal “a quo”, baseado nos factos alegados e nas provas produzidas perante este. Os juízes do Tribunal de 2ª. Instância, ao proferirem a sua decisão, encontram-se numa situação idêntica à do juiz da 1ª. Instância no momento de editar a sua sentença, assim valendo para o Tribunal “ad quem” as preclusões ocorridas no Tribunal “a quo”.
3. A nossa jurisprudência, repetidamente, vem afirmando que os recursos são meios de obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos Tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do Tribunal de que se recorre, visto implicar a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição.
4. Apesar disso, o Tribunal “ad quem” pode conhecer de questões novas, ou seja, não suscitadas no Tribunal recorrido, desde que de conhecimento oficioso e ainda não decididas com trânsito em julgado. E essas questões podem referir-se, quer à relação processual (v.g.excepções dilatórias, atento o disposto no artº.495, do C.P.Civil), quer à relação material controvertida (v.g.prescrição e duplicação de colecta - cfr.artº.175, do C.P.P.Tributário).
5. O recurso ao método de tributação indirecta funda-se na dupla vertente, preventiva e repressiva, potenciando-se a dissuasão de comportamentos de evasão fiscal, incutindo nos contribuintes um maior rigor e verdade declarativos, e, na esfera do prevaricador, a determinação de uma matéria tributável presumida mais próxima da efectivamente tida e não declarada. Esta metodologia de tributação não comporta a mesma precisão de apuramento de imposto da resultante do método declarativo, sendo alcançada mediante índices que só por coincidência concordarão com a realidade, subsistindo sempre um concreto grau de dúvida sobre a quantificação, a qual só constituirá dúvida fundada quando o contribuinte, positivamente, prove que a quantificação em causa é errada.
6. Tendo a Fazenda Pública adoptado o recurso a métodos indiciários para determinar o lucro tributável do contribuinte, compete-lhe demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação com recurso a tais métodos e, feita essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação.
7. O artº.87, al.b), da L. G. Tributária, cuja redacção foi estabelecida pela Lei n.º 30-G/2000, de 29/12, prevê a possibilidade de avaliação indirecta da matéria tributável quando se verifica a falta dos elementos necessários para comprovar e quantificar directa e exactamente a matéria tributável, pelo que a avaliação directa é impossível. Esta impossibilidade, porém, só pode resultar das anomalias e incorrecções taxativamente indicadas nas várias alíneas do artº.88, da L. G. Tributária (cfr.artº.81, nº.1, da L.G.Tributária). Nestes casos, a avaliação da matéria tributável é feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a Administração Tributária dispuser, de entre os taxativamente indicados no artº.90, nº.1, do mesmo diploma.
8. O artº.88, al.d), da L. G. Tributária, cuja redacção foi igualmente introduzida pela Lei n.º 30-G/2000, de 29/12, consagra um dos casos em que pode ser impossível a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável. O que releva para determinar o impedimento não é uma impossibilidade absoluta de avaliação directa da matéria tributável, mas sim a impossibilidade de tal avaliação no momento em que ela deve ser efectuada (impossibilidade relativa). A alínea sob exame permite que o recurso à tributação por métodos indirectos possa assentar, autonomamente, em duas situações que não resultam, ao menos directamente, de uma falta de colaboração manifestada do sujeito passivo.
9. Poderá aqui falar-se de uma falta de colaboração presumida, no sentido de que é ela própria extraída indirectamente desses indicadores externos, que não derivam da mera análise dos elementos declarativos, avaliativos ou organizativos em que se concretiza esse dever de colaboração. As duas situações previstas e que poderão levar, de acordo com esta alínea d), do artº.88, da L. G. Tributária, à presunção de falta de colaboração são as seguintes:
a) discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços;
b) factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva superior à declarada.
10. Face ao quadro factual existente no processo, relembre-se que a recorrente não utilizou a prova por parecer pericial, consagrada na norma do artº.117, do C.P.P.T., para o caso de impugnação com base em erro na quantificação da matéria tributável ou nos pressupostos por métodos indirectos, dado que tais pareceres se revelam indispensáveis para o sujeito passivo, com êxito, lograr infirmar a matéria constante do relatório da fiscalização tributária, pareceres esses que devem assentar na recolha directa de prova da contabilidade do contribuinte por técnico para o efeito credenciado, que a mera produção de depoimento por testemunhas, em princípio, dificilmente ousará destruir, assim não se desonerando do ónus da prova que nesta matéria do excesso de quantificação sobre si impendia, em ordem à anulação da liquidação em causa, nos termos do artº.74, nº.3, da L.G.T.


O relator
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
“A...- CONSTRUÇÕES E PROJECTOS, L.DA.”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal visando sentença proferida pela Mma. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.185 a 218 do presente processo, cujo dispositivo foi matéria de rectificação oficiosa com o despacho exarado a fls.261 e 262 dos autos, através da qual julgou parcialmente procedente a impugnação intentada tendo por objecto liquidações de I.R.C. e juros compensatórios, relativas ao ano de 2001 e no montante total de € 1.305.065,98.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.233 a 258 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-A Mma. Juíza “a quo”, na douta sentença recorrida, decidiu julgar improcedente a impugnação relativamente à aplicação de métodos indirectos, por interpretar que se encontravam reunidos os pressupostos legalmente exigidos para o recurso aos mesmos;
2-Na verdade, face aos pontos 6 e 7 do probatório e da conjugação do artº.87, al.a), e artº.88, al.b), da L.G.Tributária, decorre, claramente, que tais pressupostos não se encontravam verificados;
3-Quis o legislador que o recurso à avaliação indirecta tivesse um carácter excepcional e fosse sujeito a uma regra de tipicidade, só podendo fazer-se nos casos e condições previstos na lei, associados geralmente a uma imensa violação pelo contribuinte dos seus deveres de cooperação;
4-Ora, para além de o contribuinte, ora recorrente, ter prestado toda a colaboração solicitada, verificou-se, pelo contrário, que a motivação da Administração Tributária não era própria e necessariamente a da procura da verdade material e proceder à quantificação exacta da matéria tributável, procedendo às correcções que se mostrassem necessárias, mas tão só, encontrar forma para a inversão do ónus da prova;
5-Prova essa que lhe é exigida pelo artº.74, da Lei Geral Tributária, para a adopção do método da avaliação indirecta;
6-Que, não obstante, não se verificarem comprovados todos os requisitos foi o meio eleito desde início, como é referido, no respectivo relatório e dado como provado no ponto 7 do probatório;
7-Porque, como ficou sobejamente demonstrado, a contabilidade encontrava-se organizada de forma a controlar todos os factos patrimoniais e, permitia que se procedesse às correcções adequadas para a exacta quantificação da matéria tributável, verificaram-se preterições de formalidades legais que levaram à errónea quantificação;
8-Excesso de quantificação que está evidenciado pela proporção que assume a rentabilidade das vendas, só possível em algumas actividades ilícitas;
9-Independentemente de tudo o que vem de ser dito, o certo é que o acto tributário impugnado é ilegal por errónea quantificação da matéria tributável;
10-E, contrariamente ao sentido da douta sentença recorrida, a impugnante forneceu escrituras de compra e venda de fracções alienadas no exercício de 2000, cujo facto foi dado como provado (fracções “C”, “D”, “H” e “I”), tendo, porém, concorrido para a formação do lucro tributável fixado relativamente ao exercício de 2001, pelo que se verificou violação aos artºs.1, 7, nº.1, e 18, do C.I.R.C., ao determinarem o procedimento previsto no princípio da especialização dos exercícios;
11-Efectivamente, para além de constar do relatório e anexos, a impugnante, nas suas alegações alertou objectivamente para esta situação, para além de que consta do probatório;
12-Decidindo como decidiu a Mma. Juíza violou, além do mais, os artºs. citados (1, 7, nº.1 e 18, do C.I.R.C.);
13-Termina, pugnando por que deva ser concedido provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, como é de Justiça.
X
Não foram apresentadas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da total procedência do presente recurso, dado que o acto tributário impugnado padece de vícios de forma e de violação de lei (cfr.fls.279 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.282 e 284 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.187 a 199 dos autos):
1-Em 28/6/2005, foi emitida a Ordem de Serviço nº.OI200503504, pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, de acordo com a qual foi ordenada a fiscalização à ora impugnante (cfr.documento junto a fls.28 do processo instrutor apenso aos presentes autos);
2-A impugnante teve conhecimento desta ordem de serviço em 4/7/2005 (cfr. documento junto a fls.28 do processo instrutor apenso aos presentes autos);
3-Em 4/7/2005, foi iniciada a fiscalização à impugnante (cfr.documento junto a fls.29 do processo instrutor apenso aos presentes autos);
4-Em 10/10/2005, foi elaborado o relatório da Inspecção Tributária, de acordo com o qual foram efectuadas correcções à matéria tributável da impugnante no montante de € 1.532.285,56 com recurso a métodos indirectos, pelo que o lucro tributável foi fixado em € 1.678.675,65 (cfr.cópia do relatório junta a fls.1 a 27 do processo instrutor apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
5-Em 27/10/2005, foi a impugnante notificada do relatório final da inspecção tributária (cfr.documento junto a fls.30 do processo instrutor apenso);
6-No relatório final da Inspecção Tributária, identificado no nº.4, é afirmado o seguinte:
“(...)
2. - Diligências efectuadas Foram enviadas notificações para todos os adquirentes de fracções que foram contabilizadas como proveitos na empresa em 2001, excepto para os do lote 16 (vendidas 3 fracções) dado não ter sido possível a identificação dos mesmos. A empresa não possui todas as escrituras de compra e venda das fracções transaccionadas, sendo que para o lote 16 não possui nenhuma. Também não foi possível através da consulta do sistema informático, agora disponível - património - a identificação da matriz do lote 16, o que impossibilitou a notificação dos mesmos. (...)
3. Correcções
3.1. Proveitos
3.1.1. Fracção autónoma designada pela letra "L" do lote 11 Esta fracção foi adquirida por B..., através de escritura pública lavrada no 19º. Cartório Notarial de Lisboa em 7/6/2001. O valor de transacção declarado pelos outorgantes constante deste contrato cifrou-se em 16.000.000$00/€ 79.809,66, no entanto e conforme já descrito no ponto 2 do Capitulo II anterior, o valor real da transacção foi de 25.900.000$00/€129.188,66, conforme fotocópia do respectivo processo que se junta em Anexo 2. A venda desta fracção foi contabilizada pelo contribuinte como proveito na conta 71245 pelo montante de € 84 795,64/17.000.000$00 (e não 16.000.000$00 conforme consta na escritura C-0 compra e venda). Deste modo o contribuinte omitiu o valor de 8 900.000$00 (€ 44.393,01), resultante da diferença entre os 25.900.000$00 e os 17.000.000$00 que será acrescido ao resultado declarado pelo contribuinte, tendo deste modo infringido o disposto no artº.20, do CIRC, sendo esta infracção punida pelo nº.1, do artº.103, do RGIT, pelo facto dos intervenientes desta transacção terem simulado o valor do negócio.
Junta-se em Anexo 3 os respectivos comprovativos.
3.1.2. - Variação da Produção - Existências Finais
O contribuinte contabilizou como existência final de produtos acabados (conta 33) o valor de € 685.405,40, fraccionado da seguinte forma (conforme Anexo 4, facultado pelo contribuinte).
Lote Fracção Preço de Custo (€)
10 B
114.058,74
10 J
82.692,59
11 A
70.796,74
11 B
73.706,19
25 B
85.410,10
25 F
87.518,99
25 K
87.518,99
30 B
83.703,07
Total
685.405,40
Analisados os documentos contabilísticos, verificou-se que relativamente à fracção "J" correspondente ao 4.° Esq., do Lote 10, a mesma consta nas existências finais e nas vendas (contabilizado o correspondente proveito) pelo que o inventário final apresenta irregularidades, que se vão reflectir no resultado fiscal declarado, infringindo assim o disposto na alínea b), do nº.3, do artº.17, do CIRC.
Nas existências finais de Produtos Acabados deverá pois considerar-se o montante de € 602.712,81 (685.405,40 - 82.692,59).
Junta-se em Anexo 5, os documentos comprovativos da contabilização da venda desta fracção.
Há então que corrigir o valor da Variação da Produção de Prod. Acabados e consequentemente da Var. Prod. Total, do seguinte modo:
O valor da Variação da Produção Total declarada pelo contribuinte foi negativo de € 2 626 345,39.
O valor da Variação da Produção de Produtos e Trabalhos em Curso declarada pelo contribuinte foi negativo de € 3.102.506,83.
O valor da Variação da Produção de Prod. Acabados Corrigido é de € 393.468,85 (EF Corrigida 602.712,81- El declarada 209.243,96).
A Variação da Produção Total Corrigida é assim negativa de € 2.709.037,98.
No Quadro do apuramento do lucro tributável há que efectuar uma correcção negativa (a favor do contribuinte) de € 82.692,59 (€ 2.626.345,39 - € 2.709.037,98).
3.1.3. - Contabilização em Duplicado da Venda de algumas Fracções
O contribuinte contabilizou em duplicado a venda das fracções "G", "H" e "l", todas do lote 25, como a seguir se descreve: (...) No Quadro do Apuramento do Lucro Tributável há que efectuar uma correcção negativa (a favor do contribuinte) de € 296 784,75.
Junta-se em anexo 6, fotocópia dos documentos comprovativos.
IV - MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS
Não obstante o sujeito passivo possuir os livros de escrituração obrigatórios nos termos do nº1, do artº.115, do CIRC, e do artº.31, do Código Comercial, verificaram-se as seguintes situações que revelam que contabilidade não reflecte todas as operações realizadas pelo sujeito passivo:
1 - Irregularidades na Contabilização de Proveitos
Para além das já descritas no ponto 3.1. do capítulo III anterior, enumeram-se ainda as seguintes: - O contribuinte apenas declarou em 2001 a venda de determinadas fracções, cujas escrituras de compra e venda foram celebradas em 2000, conforme se descreve no quadro seguinte: (...)
- O contribuinte contabilizou fracções por montante diferente (tanto inferior como superior) daquele que consta na respectiva escritura de compra e venda, como a seguir se enumera: (quadro com os respectivos valores de escritura e declarados, por lotes e fracções)
Junta-se em anexo 12, fotocópia dos extractos das contas 71.2.4.3/4/5/6.
2 - Valores de Aquisição (escritura) /Valores de Empréstimos
Dos elementos constantes, das escrituras em posse do contribuinte, dos documentos entregues pelos adquirentes em resposta à notificação e ainda recorrendo aos resumos das escrituras enviados pelos Cartórios Notariais para os nossos serviços, verifica-se que muitos compradores que recorreram ao crédito para adquirir as respectivas fracções, contraíram empréstimos de valor igual ou muito superior ao valor de compra declarado na respectiva escritura de compra e venda, o que constitui um indício muito forte de que o valor declarado não corresponde ao realmente pago o que por outro lado significa que na “Genialves”, as vendas destas fracções não foram pelo valor declarado como proveitos (valor de escritura ou outro), mas por valores superiores, como a seguir se exemplifica: (quadro com identificação do lote e fracção, valor de escritura e valor dos empréstimos contraídos).
3 - Valores de Aquisição (escritura) / Valores Patrimoniais
Se confrontarmos os valores de compra e venda declarados nas escrituras com os valores atribuídos na respectiva avaliação - Valor Patrimonial - verifica-se que na maioria das situações os valores atribuídos na avaliação são semelhantes ou superiores aos valores declarados nas respectivas escrituras de compra e venda.
4 - Valor de Custo das Fracções / Valores de Venda
Elaboram-se de forma sucinta os quadros seguintes por lote, onde aparece o proveito contabilizado e o respectivo preço de custo por fracção.
São perfeitamente visíveis as incongruências que os mesmos mostram, pois algumas fracções foram transaccionadas por valor inferior ao preço de custo (produção), contrariando o objectivo/fim de qualquer sociedade comercial, que é a obtenção de lucro através do desenvolvimento da respectiva actividade económica.

    Lote 10
Letra Preço de custo V.V. Decl. em 2001 (€)
A133.068,5299.759,58
D 91.246,98 104.747,56
E 82.692,59 99.759,58
F 82.692,59 98.761,98
G 95.048,95 99.759,58
H 95.048.95 99.759.58
I 82.692,59 104.747,56
J 82.692,59 104.747,56
Total 836.430,74 916.790,54
Lote 11
C
D
E
F 103.770,56 106.680,02 94.072,38 59.158.92 97.764,39 82.301,65 92.277,61 82.301.65
G 96.981.83 92.277,61
H 75.645,83 82.301,65
I 76.615,65 97.265,59
J
K
L 76.615,65 76.615,65 59.158.92 82.301,65 98.761,98 84.795.64
Total 825.315,41 892.349,42

Lote 16
D13.679.233$€ 68.231.7382.301.65
E13.223.258$€ 65.957,3374.819,68
N15.047.156$€ 75.054,9074.819,68
Lote 25

A 87.518,99
C 92.791,22
D 92.791,22
79.807,66
89.783,62
92.277,61
E 87.518,99
94.771,60
G 85.410,10
99.759,58
H 85.410,10
99.759,58
I 87.518,99
89.783,62
J 87.518,99
97.265,59
L 87.518,99
99.759,58
Total 793.997,59
842.968,44
Lote 30
A 92.332,25
99.759,58
C 81.114,31
89.783,62
D 91.469,33
99.759,58
E 81.114,31
82.301,65
F 89.743,50
99.759,58
G 81.114,31
77.812,47
H 91.469,33
98.761,98
I 81.114.31
74.819,68
J 89.743,50
98.263,19
Total 779.215,15
821.021,33

Encontram-se em anexo 4 fotocópias dos inventários finais onde constam os valores de custo das fracções.
5 - Notificação aos compradores
Conforme já referido no ponto 2, do capítulo III anterior, foram remetidas notificações para os adquirentes de fracções dos lotes 10, 11, 25 e 30, com o conteúdo também ia descrito.
Devido ao seu elevado nº. (36) foram elaborados os mapas que se juntam em Anexo 13, dos quais se resume o seguinte:
Vieram devolvidas 5 notificações;
Responderam à notificação por escrito 16 adquirentes;
Foram ouvidos em declarações 15 adquirentes;
Dos 15 adquirentes que foram ouvidos em Termo de Declarações, 7 (sete) declararam valor de transacção diferente (para mais) do que consta, da correspondente escritura de compra e venda. Junta-se em anexo 14, 15, 16, 17, 18,19 e 20 os respectivos documentos. As restantes respostas dos adquirentes, devido ao avultado volume não se juntam em anexo, irão sim, dentro da capa do processo.
6 - Auto denúncia do adquirente da fracção "L" do lote 11
Conforme já descrito no ponto 3.1.1., do capítulo III anterior, o adquirente desta fracção declarou e fez prova de ter adquirido a respectiva fracção por 25.900.000$00/ € 129 188,66 constando na escritura de compra e venda o valor de 16.000.000$00/ € 79.807,66.
7- Conclusão
Conforme anteriormente demonstrado, nos pontos 1. a 6. deste capítulo e 3. do Capítulo III anterior, a contabilidade não reflecte ou impede o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo sendo também vários os elementos relatados que descredibilizam os valores de venda declarados nas Escrituras de Compra e Venda e contabilizados pela “Genialves”, tornando-se assim impossível a quantificação directa e exacta da matéria tributável.
Ainda, relativamente às escrituras convém salientar que, a força probatória dessas Escrituras como documentos autênticos, limita-se apenas aos factos verificados directamente pelo Notário, incluindo as afirmações das partes, não abrangendo factos que estas declaram ter-se verificado, mas que o Notário não pôde atestar. Sobre esta matéria, pronunciou-se o Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão de 24 de Novembro de 1999 (recurso número 24.124), tendo entendido que, por, na escritura de Compra e Venda, as partes afirmarem que o preço foi de determinado montante, não fica demonstrado tal preço, mas apenas que tal foi afirmado pelos contraentes perante Notário, pelo que a Administração Fiscal pode, sem prévia declaração judicial de simulação, proceder às necessárias correcções para efeitos de l.R.S. ou I.R.C. (para efeitos de SISA essa declaração está condicionada ao prazo do artº.57, do C.I.MS.I.S.D.). As situações detectadas e descritas anteriormente, enquadram-se nos pressupostos dos artºs.87, al.b), e 88, al.d), ambos da Lei Geral Tributária, e artº.52, do C.I.R.C., isto é, a determinação do resultado tributável, no exercício de 2001, deverá ser efectuada por métodos indirectos…”.;
7-Do mesmo relatório final e para fundamentar o apuramento da matéria colectável, é afirmado o seguinte:
“(...)
V.2. - Nos termos das alíneas d), h) e i), do nº.1, do artº.90, da Lei Geral Tributária, para o cálculo do valor de venda por métodos indirectos das fracções, dos lotes-10, 11, 25, 30 e 16, tomou-se em consideração o seguinte:
Logo no início da acção inspectiva a este exercício, foi solicitado ao contribuinte as telas finais (plantas) respeitantes aos diversos lotes, as quais nos foram entregues, não se juntando as mesmas como anexo ao relatório, devido ao formato de algumas, mas irão dentro do processo.
Estas telas são necessárias de forma a conhecer-se a área útil de cada fracção, sendo estas últimas, uma das nossas bases de cálculo na determinação do valor de venda por fracção por métodos indirectos. A área útil que pretendíamos é a que se encontra definida pelo artº.67, do REGEU (Regulamento Geral de Edificações Urbanas) e que é, a soma das áreas de todos os compartimentos da habitação, incluindo vestíbulos, circulações interiores, instalações sanitárias, arrumos, outros compartimentos de função similar e armários de paredes e mede-se pelo perímetro interior das paredes. Dado o elevado nº. de fracções, era para nós muito difícil efectuar este cálculo, dada a sua morosidade, complexidade e instrumento de trabalho que seria uma régua de desenhador. Em conversa com o contribuinte e voluntariamente, o mesmo predispôs-se a colaborar, prometendo calcular e facultar essas áreas. Posteriormente, e dentro das nossas possibilidades e capacidades, foram as mesmas revistas em conjunto, tendo-se corrigido os casos que estariam incorrectos ou “menos bem”. Os mapas onde constam essas áreas úteis, encontram-se em anexo 21 e estão assinadas pelo Sr. Engº. João Carlos Lima, gerente da empresa.
Os valores reais (auto denunciados) por que foram transaccionadas algumas fracções.
1.1.- Correcções no lote 10
Foram tornadas em consideração as seguintes situações:
No exercício de 2001 foi contabilizada a venda de todas as fracções destinadas a habitação (8) e uma loja.
A área útil de todas as fracções de habitação é de 117 m2.
Algumas fracções possuem varandas e terraços, tais como:
- O 1ª andar, Dtº e Esqº, têm um terraço e uma varanda cada;
- O 3º andar, Dtº e Esqº, têm duas varandas cada;
O adquirente do 3° Dtº declarou como valor real de transacção o montante de 32.500.000$00 (€ 162 109,32). Como só possuímos esta auto-denúncia, dividimos este valor, 32.500.000$00, por 117 m2, e ficamos com o valor de venda por m2 presumido, ou seja 277.000$00/m2 (arredondado para as unidades de milhar inferior, isto é a favor do contribuinte) - em €, 381,67/m2. Mas como neste lote todas as fracções têm a mesma área útil o valor a considerar para todas elas é de 32.500.000$00 (€ 162 109,32).
Dado não existir nenhuma auto-denúncia para o valor de transacção das lojas, e também não serem em nº. significativo, no conjunto dos lotes, não faremos correcções ao valor declarado pelo contribuinte. No quadro seguinte apuramos assim o valor de venda por métodos indirectos e o respectivo acréscimo de proveitos em relação ao valor declarado, o qual será acrescido ao resultado tributável declarado pelo contribuinte.
1.2. - Correcções no lote 11
Foram tomadas em consideração as seguintes situações:
No exercício de 2001 foi contabilizada a venda de todas as fracções destinadas a habitação-10.
Neste lote as fracções destinadas a habitação são de 4 e 5 assoalhadas com a área útil, respectivamente de 114 e 119 m2.
Algumas fracções possuem varandas, terraços e parqueamentos, tais como:
O 1.0 andar, Dtº e Esqº, 3º andar, Dtº e Esqº e 4° andar Dtº, têm um parqueamento; O 2° andar dtº tem 2 parqueamentos;
Restantes andares não têm parqueamento;
As fracções do 1º e 3º andar têm, cada uma, 1 varanda;
As fracções do 1º andar têm um terraço cada;
Os adquirentes do 1º Dtº e 5º Esqº, declararam respectivamente 30.500.000$00 e 25.900.000$00, como sendo os valores reais da transacção, pelo que se calculou o valor da transacção por m2 de área útil: (Mapa com a identificação da fracção, nº de assoalhadas, Valores declarados, área útil, valor m2($) e valor m2 (€).)
Analisados estes elementos verifica-se que o m2 de área útil do 1º andar foi comercializado por valor superior ao 5°andar. O 1º andar, possui no entanto beneficiações que não têm outros andares nomeadamente parqueamento, varanda e terraço. Assim sendo considerou-se para o 1º andar o valor de € 1 276,92 por m2 de área útil e para os restantes andares o valor de € 1 132,27 por m2 de área útil. No quadro seguinte apuramos assim o valor da venda por métodos indirectos e o respectivo acréscimo de proveitos em relação ao valor declarado, (quadro com a letra de cada fracção, andar, proveito declarado, área útil, valor m2 presumido, valor presumido e diferença a acrescer).
1.3. - Correcções no lote 25
Foram tomadas em consideração as seguintes situações:
No exercício de 2001 foi contabilizada a venda de 8 fracções destinadas a habitação e uma loja.
A área útil de todas as fracções de habitação é de 117 m2.
Algumas fracções possuem varandas e terraços, tais como:
O 1º andar, Dtº e Esqº, têm um terraço e uma varanda cada;
O 3º andar, Dtº e Esqº, têm duas varandas cada;
O adquirente do 2° Dtº declarou como valor real de transacção o montante de 32.000.000$00 l € 159615,32.
Como só possuímos esta auto-denúncia, dividimos este valor, 32.000.000$00, por 117 m2, e ficamos com o valor de venda por m2 presumido, ou seja 273.000$00/m2 (arredondado para as unidades de milhar inferior, isto é a favor do contribuinte) - em €, 1 361, 721m2
Mas como neste lote todas as fracções têm a mesma área útil o valor a considerar para todas elas é de 32.000.000$00 (€ 159615,32).
Dado não existir nenhuma auto-denúncia para o valor de transacção das lojas, e também não serem em nº. significativo, no conjunto dos lotes, não faremos correcções ao valor declarado pelo contribuinte para a loja vendida deste lote.
No quadro seguinte apuramos assim o valor de venda por métodos indirectos e o respectivo acréscimo de proveitos em relação ao valor declarado (quadro identificativo igual ao anterior).
1.4. - Correcções no lote 30
Foram tomadas em consideração as seguintes situações:
No exercício de 2001 foi contabilizada a venda de 9, das dez fracções destinadas a habitação que compõem este lote.
A tipologia destas fracções é 3 e 4 assoalhadas, tendo respectivamente 90 e 111 m2, excepto para as fracções do RIC que embora possuam o mesmo nº de assoalhadas têm respectivamente 85 e 101 m2.
Existem algumas diferenças entre o nº de parqueamentos que cada fracção possui, sendo que as habitações do RIC, possuem ainda um terraço cada.
Neste lote os adquirentes do RIC Dtº, 3º Dtº, 3º Esqº e 4º Esqº, declararam respectivamente 30.000.000$00, 26.300.000$99, 29.750.000$00 e 29.000.000$00, como sendo os valores reais da transacção, pelo que se calculou o valor da transacção por m2 (valor arredondado para as unidades de milhar inferior) de área útil para cada uma destas fracções.
Em face destes valores diferentes estabeleceu-­se a seguinte metodologia: Com base nos valores denunciados para o 3º. Dtº e 3º e 4ºEsqºs. calculou-se o valor médio ponderado por m2 (excluiu-se o valor do R/C Dtº, uma vez que tem terraço e as outras fracções não) - 272.596$00 - arredondado para 272.000$00 (30.000.000$ + 26.300.000$ + 29.750.000$ + 29.000.000$) / (90 m2 + 111 m2 + 111 m2).
Este valor 272.000$00 / € 1 356,73 - multiplicado pela área útil de cada fracção vendida (excepto para o valor das 4 fracções denunciadas) dar-nos-á o valor de venda presumido para as restantes fracções, como a seguir se indica: (quadro idêntico aos anteriores)
1.5 - Correcções no lote 16
A localização do lote 16 é diferente da dos lotes 10, 11, 25 ou 30, isto é, foi construído em concelho diferente. Conforme já referido no ponto 2, do capítulo III anterior não foi possível a identificação das adquirentes das três fracções deste lote, que foram contabilizadas como proveito em 2001.
Assim sendo, não se conhece o possível valor real por que foram efectuadas estas transacções. Sabemos, no entanto, que nos outros lotes foram denunciadas divergências de valor entre o constante da escritura de compra e venda e o valor pelo que a transacção se efectuou, o que nos leva a concluir pela sua existência, também neste lote. À falta de outros elementos, recorremos aos valores que constam do Banco de Dados de Valores de Oferta do Mercado Imobiliário da publicação "Confidencial Imobiliário", que para o concelho de V. F. Xira, apresenta o valor médio de venda de 214.000$00/ € 1 067,43 por m2 de área útil, para qualquer mês do exercício de 2001.
Conhecendo a área útil de cada fracção que nos foi disponibilizada pelo contribuinte, calculámos por métodos indirectos o presumível valor de venda destas fracções e consequentemente o respectivo valor que há a acrescer ao rendimento declarado pelo contribuinte, como a seguir se indica: (quadro com a indicação das três fracções, o valor declarado, a área útil, o valor m2, o valor de venda presumido e o valor a acrescer)
(...)”.
8-Em 25/11/2005, a impugnante entregou no Serviço de Finanças de Loures um pedido de Revisão da Matéria Colectável (cfr.documento junto a fls.37 a 43 do processo instrutor apenso aos presentes autos);
9-Em 30/11/2005, foi efectuada a liquidação adicional de I.R.C., do exercício de 2001 nº.2005 8310122192, no montante total de € 652.532,99, sendo € 535.181,01 referente a imposto, € 51.031,74 referente a derrama e € 90.985,99 referente a juros compensatórios (cfr.documento junto a fls.10 dos presentes autos);
10-Em 23/12/2005, foi lavrada a Acta da Comissão de Revisão nº.77/05, de acordo com a qual não houve acordo entre os peritos nomeados e manteve a correcção inicialmente proposta pela Inspecção Tributária (cfr.documentos juntos a fls.44 a 58 do processo instrutor apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
11-Em 2/1/2006, foi efectuada a liquidação adicional de I.R.C. referente ao exercício de 2001 nº.2006 8310000039, no montante total de € 652.532,99, sendo € 535.181,01 referente a imposto, € 51.031,74 referente a derrama e € 90.985,99 referente a juros compensatórios (cfr.documento junto a fls.47 dos presentes autos);
12-A impugnante recebeu a liquidação adicional identificada no ponto anterior em 11/01/2006 (cfr.documentos juntos a fls.47 e 48 dos presentes autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte “…Dos factos constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte “…A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório…”.
X
Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.712, nº.1, al.a), do C. P. Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
13-No ano de 2001, a empresa impugnante, “A...- Construções e Projectos, L.da.”, com o n.i.p.c. 503 979 740, era sujeito passivo de I.R.C. no regime geral de tributação, devido ao exercício da actividade de construção de edifícios, CAE 45 211, sendo colectada pelo 1º. Serviço de Finanças de Loures (cfr.informação exarada a fls.62 a 70 do processo instrutor apenso; cópia do relatório junta a fls.1 a 27 do processo instrutor apenso);
14-A fiscalização a que se faz referência no nº.1 supra consistiu numa inspecção externa, a qual se iniciou no pretérito dia 4/7/2005, tendo-se concluído em 16/9/2005 (cfr. cópia do relatório junta a fls.1 a 27 do processo instrutor apenso; documento junto a fls.29 do processo instrutor apenso);
15-Em 11/4/2006, deu entrada no 1º. Serviço de Finanças de Loures a p.i. de impugnação apresentada por “A...- Construções e Projectos, L.da.”, a qual originou o presente processo (cfr.carimbo de entrada aposto a fls.2 dos presentes autos);
16-A p.i. reconhecida no número anterior tinha como esteios a falta de notificação da fundamentação da liquidação adicional de I.R.C., do exercício de 2001 e nº.2005 8310122192, identificada no nº.9 supra, a caducidade do direito à liquidação reportada ao acto tributário nº.2006 8310000039, identificado no nº.11 supra, tal como a errónea quantificação da matéria colectável com recurso a métodos indirectos (cfr.documento junto a fls.2 a 6 dos presentes autos);
17-Em 28/5/2008, a Mma. Juíza do Tribunal “a quo” exarou despacho a fls.261 e 262 dos autos, no qual, além do mais, rectifica a parte dispositiva da sentença objecto do presente recurso, ao abrigo do artº.667, nº.1, do C. P. Civil, nos termos seguintes:
“…Donde consta:
“Em face de tudo o anteriormente exposto julga-se procedente a presente impugnação relativamente à liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2001 nº.2005 8310122192, por a mesma se encontrar ferida do vício de violação de lei, e improcedente a presente impugnação, relativamente à questão da falta de notificação da fundamentação das liquidações impugnadas, bem como à aplicação de métodos indirectos, dado que se encontravam reunidos os pressupostos legalmente exigidos para o recurso aos mesmos, não se encontrando razão para considerar os valores apurados pela Administração Tributária como excessivos.”
Passa a constar:
“Em face de tudo o anteriormente exposto julga-se procedente a presente impugnação relativamente à liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2001 nº.2005 8310122192, por a mesma se encontrar ferida do vício de violação de lei, e improcedente a presente impugnação, relativamente à questão da falta de notificação da fundamentação das liquidações impugnadas, alegada caducidade do direito à liquidação, bem como à aplicação de métodos indirectos, dado que se encontravam reunidos os pressupostos legalmente exigidos para o recurso aos mesmos, não se encontrando razão para considerar os valores apurados pela Administração Tributária como excessivos.”.
X
Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos e informações oficiais referidos em cada uma das alíneas do probatório.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou parcialmente procedente a impugnação que originou o presente processo, no que respeita à liquidação de I.R.C., relativa ao ano de 2001, nº.2005 8310122192 e identificada no nº.9 supra, a qual foi anulada devido a vício de violação de lei. Já quanto à liquidação de I.R.C., referente ao ano de 2001, nº.2006 8310000039 e identificada no nº.11 supra, a impugnação foi julgada improcedente, tudo conforme mencionado no nº.17 da matéria de facto acima exposta.
X
Antes de mais, refere-se que são as conclusões das alegações do recurso que, como é sabido, definem o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.684 e 690, do C.P.Civil, então em vigor; António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.89 e seg.; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.41).
A recorrente discorda do decidido sustentando desde logo, como supra se alude, que, contrariamente ao sentido da douta sentença recorrida, a impugnante forneceu escrituras de compra e venda de fracções alienadas no exercício de 2000, cujo facto foi dado como provado (fracções “C”, “D”, “H” e “I”), tendo, porém, concorrido para a formação do lucro tributável fixado relativamente ao exercício de 2001, pelo que se verificou violação aos artºs.1, 7, nº.1, e 18, do C.I.R.C., e, por consequência, do princípio da especialização dos exercícios (cfr.conclusões 10 a 12 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
A vida de uma unidade económica não possui, em regra, qualquer limitação temporal, caracterizando-se pelo desenvolvimento de uma actividade de duração ilimitada, facto, aliás, que suporta a previsão, em sede do direito contabilístico, do princípio da continuidade da exploração. Porém, a actividade da unidade económica evolui em diversas fases, temporalizadas por exercícios económicos, genericamente coincidentes com o ano civil, realidade que alicerça, em termos de contabilização e de tributação, a previsão do princípio da especialização ou do acréscimo, ínsito no artº.18, do C.I.R.C. (cfr.artº.22, do anterior C.C.I.), o qual determina que os proveitos e os custos devem ser imputados ao período a que respeitam, independentemente do seu recebimento ou pagamento. Por outra palavras, em determinado exercício, devem ser contabilizados os proveitos, e também os custos, que nele efectivamente tenham sido realizados (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/4/2008, rec.807/07; J.L.Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Deveres de Cooperação, Autoavaliação e Avaliação Administrativa, 2ª. Edição, Lex, 2000, pág.224 e seg.;António Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pág.172 e seg.).
A parte dispositiva da sentença pode ser singular ou plural (o recurso cabe das decisões judiciais e não dos seus fundamentos), consoante contenha um ou vários julgados. Destes, só são susceptíveis de impugnação os que forem desfavoráveis ao recorrente, dado só se poder recorrer daquilo em que se ficou vencido, portanto da parte da decisão que lhe causa prejuízo (cfr.artº.680, nº.1, do C.P.Civil; Professor Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora, 1984, vol.V, pág.265 e 266).
O direito português segue o modelo do recurso de revisão ou reponderação (modelo que tem as suas raízes no Código Austríaco de 1895). Daí que o Tribunal “ad quem” deva produzir um novo julgamento sobre o já decidido pelo Tribunal “a quo”, baseado nos factos alegados e nas provas produzidas perante este. Os juízes do Tribunal de 2ª. Instância, ao proferirem a sua decisão, encontram-se numa situação idêntica à do juiz da 1ª. Instância no momento de editar a sua sentença, assim valendo para o Tribunal “ad quem” as preclusões ocorridas no Tribunal “a quo”. Nesta linha, vem a nossa jurisprudência repetidamente afirmando que os recursos são meios de obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos Tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do Tribunal de que se recorre, visto implicar a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/1/1992, rec.13331; ac.S.T.J., 25/2/1993, proc.83552; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 1/3/2011, proc.2442/08). Não vale, contudo, também entre nós, em toda a sua pureza, o modelo de recurso de reponderação. Além de outras excepções (v.g.as partes podem acordar, em 2ª. Instância, a alteração ou ampliação do pedido - cfr.artº.272, do C.P.Civil), o Tribunal “ad quem” pode conhecer de questões novas, ou seja, não suscitadas no Tribunal recorrido, desde que de conhecimento oficioso e ainda não decididas com trânsito em julgado. E essas questões podem referir-se, quer à relação processual (v.g.excepções dilatórias, atento o disposto no artº.495, do C.P.Civil), quer à relação material controvertida (v.g.prescrição e duplicação de colecta - cfr.artº.175, do C.P.P.Tributário). No que respeita à matéria de direito, são os Tribunais de recurso inteiramente livres quanto à determinação, interpretação e aplicação das normas jurídicas ao caso ajuizado, devendo, mesmo, tomar em consideração as modificações da lei sobrevindas após o julgamento ocorrido na instância inferior, caso elas abranjam a relação jurídica litigiosa (cfr.António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.92 e seg.; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.153 e seg.; Armindo Ribeiro Mendes, Direito Processual Civil III, Recursos, AAFDL, 1982, pág.174).
No caso “sub judice”, conforme se retira do exame da matéria de facto provada (cfr.nº.16 da matéria de facto provada supra exarada), deve concluir-se que o fundamento de recurso ora sob apreciação (a eventual violação do princípio da especialização dos exercícios por parte da A. Fiscal no âmbito da sua actividade de quantificação da matéria colectável que originou as liquidações objecto do presente processo), constitui questão que não foi invocada na petição inicial pelo que não pode ser agora apreciada, já que também não é de conhecimento oficioso. Na verdade, não se alcança da p.i. que a matéria vertida nas conclusões que se deixaram expostas haja sido alegada em 1ª. Instância, pelo que não poderia ser objecto de conhecimento e correcção pelo Tribunal “a quo”, sendo nesta sede de recurso pela primeira vez suscitada.
Concluindo, a recorrente pretende a emissão de pronúncia sobre questão nova, o que o mesmo é dizer que o tema suscitado nas conclusões apelatórias em análise excede o objecto do recurso, implicando a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição, pelo que dela se não conhece.
X
O recorrente dissente do julgado alegando igualmente, como supra se alude, que face aos pontos 6 e 7 do probatório e da conjugação do artº.87, al.a), e artº.88, al.b), da L.G.Tributária, decorre, claramente, que os pressupostos de recurso aos métodos indirectos não se encontravam verificados no caso dos autos. Porque, como ficou sobejamente demonstrado, a contabilidade encontrava-se organizada de forma a controlar todos os factos patrimoniais e permitia que se procedesse às correcções adequadas para a exacta quantificação da matéria tributável, pelo que se verificaram preterições de formalidades legais que levaram à errónea quantificação. Excesso de quantificação esse que está evidenciado pela proporção que assume a rentabilidade das vendas, só possível em algumas actividades ilícitas. Independentemente de tudo o que vem de ser dito, o certo é que o acto tributário impugnado é ilegal por errónea quantificação da matéria tributável (cfr.conclusões 1 a 9 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de direito da sentença recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
O Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (I.R.C.), introduzido no sistema tributário português pelo dec.lei 442-B/88, de 30/11, pode definir-se como um imposto directo, tanto de um ponto de vista jurídico (como tal é classificado no Orçamento do Estado), como de um ponto de vista económico, dado que incide sobre manifestações directas ou imediatas da capacidade contributiva como é o rendimento real (em geral lucros) das empresas com sede ou direcção efectiva em Portugal. É um imposto de características reais, visto não levar em consideração os sinais pessoais que se verificam na pessoa do contribuinte, antes se dirigindo objectivamente à tributação da riqueza. É, igualmente, um tributo de características unitárias, no sentido de abranger tendencialmente todos os rendimentos das pessoas colectivas. Encontramo-nos perante um imposto proporcional, dado a sua taxa ser fixa qualquer que seja o montante da matéria colectável e assentando, em princípio, na tributação do rendimento real ou efectivo, embora admita presunções de rendimento, assim como a sua fixação através de métodos indiciários. Por último, encontramo-nos perante um tributo periódico, visto que a obrigação de imposto se renova nos sucessivos períodos anuais de tributação, dando origem, consequentemente, a sucessivas obrigações tributárias anuais e independentes umas das outras (cfr.artºs.1, 2, 3, 7, 51 e 69, todos do C.I.R.C.; Nuno de Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, I, Editora Rei dos Livros, 1996, pág.215 e seg.; Soares Martínez, Direito Fiscal, 8ª.edição, Livraria Almedina, 1996, pág.573 e seg.).
A base de incidência do I.R.C. encontra-se consagrada no artº.3, do C.I.R.C., sendo, nos termos do seu nº.2, definido o lucro tributável como o resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.
Por outro lado, é no artº.17 e seg. do mesmo diploma que se consagram as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no artº.23 quais os custos que, como tal, devem ser considerados pela lei.
Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que inevitavelmente daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para fins fiscais (cfr.J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Lex Lisboa 2000, 2ª. Edição, pág.237 e seg.).
Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico (cfr.F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.206 e seg.).
Refira-se, ainda, que as empresas são obrigadas a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal, a qual permita o controlo do lucro tributável (cfr.artº.98, do C.I.R.C., na versão em vigor no ano de 2001, actual artº.115, do C.I.R.C.; artºs.29 e 31, do C.Comercial).
O acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto. Essa situação factual e concreta define-se como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal. As normas tributárias que contemplam o facto tributário são as relativas à incidência real, as quais definem os seus elementos objectivos (cfr.Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág.324; Nuno de Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 1996, pág.57; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.269). Só com a prática do facto tributário nasce a obrigação de imposto. A existência do facto tributário constitui, pois, uma condição “sine qua non” da fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada.
Observemos, então, se a A. Fiscal fez prova dos pressupostos para recurso ao método de avaliação indirecta da matéria colectável da sociedade impugnante.
“In casu”, dir-se-á que o regime de apuramento da matéria tributável aplicável é o previsto na L. G. Tributária (“ex vi” do artº.52, nº.1, do C.I.R.C.), levando em consideração a data em que se iniciou a inspecção externa que originou a liquidação objecto do presente processo (cfr.nº.14 da matéria de facto provada) e o disposto nos artºs.3, nº.1, do dec.lei 398/98, de 17/12, e 12, da Lei 15/2001, de 5/6 (cfr.Diogo Leite de Campos e outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 2003, págs.32 e 34; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 23/11/2004, rec.657/04; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/4/2005, rec.368/04).
A tributação por métodos indirectos não só não constitui o meio normal, como a possibilidade do seu uso está restringida aos casos em que a lei expressamente a admite, verificados que estejam determinados pressupostos (cfr.artºs.81, nº.1, 87 e 88, da L. G. Tributária). O que vale por dizer que nem a Fazenda Pública, nem o contribuinte, podem, de seu livre alvedrio, optar pela tributação indiciária, ainda que aquela cuide assim arrecadar receita maior, ou este acredite furtar-se a uma tributação mais pesada. Por outras palavras, o apuramento alternativo pela A. Fiscal deve ser feito, sempre que possível, com recurso a métodos directos ou correcções técnicas, isto é, pela determinação da matéria colectável através dos elementos da própria contabilidade do sujeito passivo, e só pode haver recurso a métodos presuntivos quando aquele apuramento directo se mostre de todo inviável, não gozando a Fazenda Pública de qualquer margem de discricionariedade relativamente à opção do método (directo ou indirecto) de avaliação da matéria tributável. Em suma, o recurso aos métodos indiciários só é legalmente possível quando o apuramento da matéria colectável através de correcções técnicas se revele, de todo, impraticável, pois que a fixação da matéria tributável por tais métodos deve revestir a natureza de “ultima ratio fisci” e exigir uma cuidada fundamentação quanto à opção pela sua utilização (cfr.artº.81, nº.1, da L.G.Tributária; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, 2ª.edição, Lex, 2000, pág.303; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/2/2006, rec.1011/05; ac.T.C.A.-2ª. Secção, 4/11/2003, proc.282/03). As situações em que a matéria colectável é fixada por métodos indirectos são as taxativamente indicadas no actual artº.87, da L. G. Tributária. Subjacente a todas elas encontra-se uma de duas situações: ou a inexistência de elementos de escrituração ou a sua não idoneidade para comprovarem o lucro revelado pela escrita do contribuinte. De notar a preocupação do legislador em objectivar as aludidas situações, por forma a evitar valorações subjectivas por parte da A. Fiscal.
O recurso ao método indirecto está legitimado por força do princípio da capacidade contributiva que só se respeita fielmente quando se mede directamente a matéria tributável e sendo, por isso, uma faculdade da A. Fiscal no exercício do seu poder/dever de liquidar impostos quando, comprovadamente, demonstre não poder, por via directa, calcular o rendimento tributável do sujeito passivo em causa.
Mais se dirá que o recurso a este método de tributação se funda na dupla vertente preventiva e repressiva, potenciando-se a dissuasão de comportamentos de evasão fiscal, incutindo nos contribuintes um maior rigor e verdade declarativos, e, na esfera do prevaricador, a determinação de uma matéria tributável presumida mais próxima da efectivamente tida e não declarada. Esta metodologia de tributação não comporta a mesma precisão de apuramento de imposto da resultante do método declarativo, sendo alcançada mediante índices que só por coincidência concordarão com a realidade, subsistindo sempre um concreto grau de dúvida sobre a quantificação, a qual só constituirá dúvida fundada quando o contribuinte, positivamente, prove que a quantificação em causa é errada (cfr.ac.T.C.A.Sul-2º.Juízo, 7/3/2006, proc.993/06; ac.T.C.A.Sul-2º.Juízo, 30/6/2009, proc.2694/08).
Voltando ao caso “sub judice”, também da matéria de facto provada se retira (cfr.nº.6, “in fine”, da matéria de facto provada), que a determinação do resultado tributável da sociedade impugnante, no exercício de 2001, foi efectuada por métodos indirectos ao abrigo dos vectores constantes dos artºs.87, al.b), e 88, al.d), ambos da Lei Geral Tributária, “ex vi” do artº.52, do C.I.R.C.
O artº.87, al.b), da L. G. Tributária, cuja redacção foi estabelecida pela Lei n.º 30-G/2000, de 29/12, prevê a possibilidade de avaliação indirecta da matéria tributável quando se verifica a falta dos elementos necessários para comprovar e quantificar directa e exactamente a matéria tributável, pelo que a avaliação directa é impossível. Esta impossibilidade, porém, só pode resultar das anomalias e incorrecções taxativamente indicadas nas várias alíneas do artº.88, da L. G. Tributária (cfr.artº.81, nº.1, da L.G.Tributária). Nestes casos, a avaliação da matéria tributável é feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a Administração Tributária dispuser, de entre os taxativamente indicados no artº.90, nº.1, do mesmo diploma. Já o artº.88, al.d), da L. G. Tributária, cuja redacção foi igualmente introduzida pela Lei n.º 30-G/2000, de 29/12, consagra um dos casos em que pode ser impossível a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável.
Como se constata pelas situações descritas no preceito, o que releva para determinar o impedimento não é uma impossibilidade absoluta de avaliação directa da matéria tributável, mas sim a impossibilidade de tal avaliação no momento em que ela deve ser efectuada (impossibilidade relativa). A alínea sob exame permite que o recurso à tributação por métodos indirectos possa assentar, autonomamente, em duas situações que não resultam, ao menos directamente, de uma falta de colaboração manifestada do sujeito passivo. Este normativo veio introduzir a possibilidade de recorrer a indícios fundados de que as declarações, contabilidade ou escrita, não reflectem o conhecimento da matéria tributável real para legitimar o recurso à tributação indirecta sem necessidade de confirmar a falta de colaboração do contribuinte. A qual passará a deduzir-se de outros factos externos que manifestem ou patenteiem uma capacidade contributiva superior à declarada. Poderá aqui falar-se de uma falta de colaboração presumida, no sentido de que é ela própria extraída indirectamente desses indicadores externos, que não derivam da mera análise dos elementos declarativos, avaliativos ou organizativos em que se concretiza esse dever de colaboração.
As duas situações previstas e que poderão levar, de acordo com esta alínea d), à presunção de falta de colaboração são as seguintes:
a) discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços;
b) factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva superior à declarada (cfr.Diogo Leite de Campos e outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 3ª. Edição, 2003, pág.438; José Guilherme Xavier Basto, IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, pág.363 e seg.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pág.179 e seg.).
“In casu”, mais uma vez voltando à matéria de facto provada (cfr.nº.6 da matéria de facto provada), pode concluir-se que os factores que levaram a A. Fiscal a considerar que era impossível a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável da impugnante/recorrente, no que diz respeito ao ano de 2001 e em sede de I.R.C., foram os seguintes:
1-O inventário final da sociedade recorrente apresenta irregularidades, que se vão reflectir no resultado fiscal declarado, em virtude da incorrecta contabilização da venda de, pelo menos, uma fracção autónoma, dado que a mesma consta nas existências finais e nas vendas (neste sendo contabilizado o correspondente proveito);
2-A recorrente contabilizou em duplicado a venda das fracções "G", "H" e "l", todas do lote 25;
3-A recorrente contabilizou fracções por montante diferente (tanto inferior como superior) daquele que consta na respectiva escritura de compra e venda, assim se constatando irregularidades na contabilização de proveitos;
4-De acordo com os dados da contabilidade da sociedade recorrente algumas fracções foram transaccionadas por valor inferior ao preço de custo (produção);
5-Não foram juntos os elementos de suporte da contabilização de alguns dos proveitos havidos pela recorrente no ano de 2001, dado que não se encontravam juntas à contabilidade todas as escrituras de compra e venda dos imóveis transaccionados no mesmo ano;
6-Em algumas situações, descritas no relatório, o preço que consta da escritura de compra e venda é um, o valor que se encontra contabilizado é outro e, por fim, o valor real da transacção ainda foi outro, sendo certo que muitas vezes não foi possível determinar o valor exacto das transacções efectuadas.
Concluindo, a Administração Tributária faz prova de que a contabilidade da recorrente contém irregularidades e omissões tais que impossibilitam o apuramento do lucro tributável através de correcções meramente técnicas, tal implicando o recurso a métodos indirectos de apuramento do mesmo (cfr.artº.52, nº.1, do C.I.R.C.; artºs.87, al.b) e 88, al.d), da L.G.Tributária). Mais se dirá que, face às obrigações da impugnante em manter uma escrita organizada de molde a através dela se pudesse apurar e controlar o lucro tributável, sobretudo quanto aos proveitos devido a sub-avaliação das vendas realizadas, em relação às quais não se conhece o seu volume, bem como dos movimentos contabilísticos que não se encontravam realizados de acordo com a lei, deve concluir-se que o desiderato de apuramento do lucro tributável da sociedade recorrente não era passível de alcançar através de meras correcções técnicas, sempre condicionadas pela própria contabilidade da recorrente e quando o que se encontra em causa é uma falta generalizada de credibilidade da sua escrita comercial ao nível dos proveitos.
Por consequência se impõe concluir que, no caso vertente, se encontravam verificados os necessários pressupostos legais para que a A. Fiscal lançasse mão da metodologia indirecta com base na factualidade constante do probatório, assim naufragando, nessa precisa medida, as conclusões de recurso sob análise.
Passemos ao exame da alegada errónea quantificação da matéria tributável, a qual a recorrente considera verificar-se, conforme defende, dado que haverá um excesso de quantificação que está evidenciado pela proporção que assume a rentabilidade das vendas, só possível em algumas actividades ilícitas.
No caso “sub judice”, nesta parte, está em causa apenas o critério ou os critérios com que a Administração Fiscal operou para determinar o lucro tributável tenham gerado um excesso de matéria tributável. Não se questionam os pressupostos, que se têm por verificados, de aplicação ao caso de métodos indiciários da apuramento desse valor.
Conforme se retira do probatório (cfr.nº.7 da matéria de facto provada), a Administração Fiscal, para a determinação do lucro tributável, no caso, operou com o montante de aquisição das fracções de que teve conhecimento do preço real de venda através dos respectivos compradores, tendo sido apurada a percentagem de omissão que depois foi aplicada a cada lote/fracções vendidas no exercício, que assim extrapolou para estes casos (igualmente levando em consideração a área útil das fracções em causa), donde apurou a totalidade dos montantes das vendas dessas fracções no exercício ora em causa. Desta forma tendo encontrado o lucro tributável para o respectivo exercício - 2001 - assim efectuando um acréscimo de proveitos através de métodos indirectos e fixando o lucro tributável em € 1.678.675,65 (cfr.nº.4 da matéria de facto provada), valor este mantido em sede de Comissão de Revisão, por despacho do Director Distrital de Finanças, na falta de acordo dos vogais, donde veio a resultar a liquidação adicional de I.R.C. objecto dos presentes autos.
Ora, face a este quadro factual relembre-se que a recorrente não utilizou a prova por parecer pericial, consagrada na norma do artº.117, do C.P.P.T., no caso de impugnação com base em erro na quantificação da matéria tributável ou nos pressupostos por métodos indirectos, dado que tais pareceres se revelam indispensáveis para o sujeito passivo, com êxito, lograr infirmar a matéria constante do relatório da fiscalização tributária, pareceres esses que devem assentar na recolha directa de prova da contabilidade do contribuinte por técnico para o efeito credenciado, que a mera produção de depoimento por testemunhas, em princípio, dificilmente ousará destruir (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.843; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 30/6/2009, proc.2694/08; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 26/10/2010, proc.4207/10).
E, assim, a impugnante e ora recorrente, apesar de contestar o critério que serviu de base à quantificação administrativa da matéria tributável, não disponibilizou outro ou outros que fossem mais credíveis, por coerentes e adequados à quantificação exacta e justa, propiciando uma certeza (exigível) como meio de prova, revelando-se por isso incapaz de, justificadamente, se desonerar do ónus da prova que nesta matéria do excesso de quantificação sobre si impendia, em ordem à anulação da liquidação em causa, nos termos do artº.74, nº.3, da L.G.T.
Face ao exposto, não vislumbra o Tribunal qualquer ilegalidade na actuação da A. Fiscal e enquanto utilizou o método de avaliação indirecta da matéria colectável da impugnante/recorrente, pelo que deve julgar-se improcedente o vício assacado à sentença objecto de recurso e sob apreciação.
Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, não se concede provimento ao recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se procederá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
Ofício junto a fls.281 dos autos: após trânsito, remeta cópia certificada do presente acórdão.
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Lisboa, 28 de Junho de 2011


(Joaquim Condesso - Relator)


(Lucas Martins - 1º. Adjunto)


(Magda Geraldes - 2º. Adjunto)