Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:220/08.0BELLE
Secção:CT
Data do Acordão:02/11/2021
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:IRS
HONORÁRIOS
ÓNUS DA PROVA
Sumário:
I. Tendo sido efetuadas transferências de valores para a conta bancária do Impugnante por parte de um cliente seu e não resultando demonstrado o por si alegado, no sentido de se tratar de despesas e não honorários, o mesmo não cumpriu o seu ónus probatório.

II. Resultando da conta corrente de duas das clientes do Impugnante a existência de transferências para as quais não foi apresentado qualquer elemento demonstrativo de que se tratou de despesas e não tendo sido provado que tais contas correntes não correspondiam à realidade, o Impugnante não cumpriu o ónus da prova que sobre si impendia.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acórdão

I. RELATÓRIO

O….. (doravante 1.º Recorrente ou Impugnante) e a Fazenda Pública (doravante 2.ª Recorrente ou FP) vieram apresentar recursos da sentença proferida a 30.03.2012, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Loulé, na qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação apresentada pelo primeiro, que teve por objeto a liquidação adicional de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), referente ao ano de 2003.

Os recursos foram admitidos, com subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo.

Nesse seguimento, o 1.º Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

“a) A sentença proferida de que ora se recorre atribui ao ora recorrente, a título de rendimento, o montante de € 101.564,24 correspondente ao valor atribuído pela Inspecção Tributária à transferência efectuada por J….., não tomando em conta o valor efectivamente creditado, no montante de € 99.878,18, nem os pagamentos efectuados pelo Impugnante, através de dois cheques visados, em nome e por conta de J….., para aquisição de um imóvel a que se reporta a escritura de compra e venda de 28/02/2003, respectivamente nos montantes de € 57.200,00 a favor da Q….., Lda. e € 38.200,00 a favor da Dr.a M….., emitidos ambos em 28/02/2003, nem os pagamentos da Sisa e dos emolumentos notariais em nome de J….., efectuados pelo Impugnante, ora recorrente, respectivamente nos montantes de € 1.698,08 e€ 921,00;

b) Assim como a sentença ora recorrida não especifica quais os pontos de contradição do depoimento da testemunha E….. sobre tal matéria que depôs com conhecimento dos factos, porque acompanhou a transacção da aquisição efectuada por J….. e respectivos valores pagos através do S.P., ora recorrente, tendo, por via disso, sido desvirtuado tais factos e ignorada a verdade dos mesmos;

c) Existe contradição entre os fundamentos da sentença e a decisão do Ministério Público no âmbito do Processo de inquérito n.° 3/08.7TALLE da 1.a Secção, do Tribunal Judicial de Loulé, na medida em que o que consta do § 4 da página 557 dos autos no âmbito da sentença, onde foi considerado que o dinheiro transferido por J….. tinha sido dividido em três pagamentos, respectivamente, o primeiro no valor de € 31.800,00, em 06/12/2002, o segundo no valor de € 57.200,00 em 28/02/2003 e o terceiro no valor de € 38.200,00, na mesma data de 28/02/2003, conforme consta dos docs. n.°s 20 e 21, a fls. 93 dos autos, e da respectiva escritura de compra e venda junta a fls. 203 dos autos, da mesma data de 28/02/2003, que não foram conhecidos, nem considerados na decisão final, e a decisão do M.° P.° em que dá como provados os pagamentos efectuados pelo S.P. (ora recorrente) supra referidos;

d) A decisão a que se reporta a sentença que ora se recorre e que atribuiu ao Impugnante um rendimento acrescido de € 101.564,24 no ano de 2003, correspondente ao valor atribuído por J….. em 2003, para pagamento do preço com a aquisição de um imóvel a que se reporta a escritura de compra e venda de 28/02/2003, corresponde à condenação do S.P., ora recorrente, no pagamento de um tributo que no seu conjunto [IRS 42% = € 42.656,98 e I.V.A. 19% = € 19.297,21, que acrescido de juros desde o ano de 2004 até hoje, à taxa de 12%/ano perfaz (€ 42.656,98 + € 19.297,21 = € 61.954,19 x 12% = € 7.434,50 x 8 anos = € 59.476,02 + € 61.954,19 = € 121.430,21) é manifestamente superior ao valor do rendimento que lhe é atribuído, o que é manifestamente iníquo;

e) Do extracto bancário de fls. 271 e 272 dos autos consta que do crédito de € 99.878,18 em 26/02/2003 foram debitados os cheques visados nos montantes de € 57.200,00 e de € 38.200,00 e respectivas comissões bancárias em 28/02/2003, correspondente à data da escritura de compra e venda a favor de J…...

Termos em que a decisão proferida na sentença de que ora se recorre é manifestamente iníqua porque penaliza o Impugnante, ora recorrente, com impostos sobre valores de terceiros utilizados em nome, por conta e no interesse dos mesmos (nomeadamente quanto a J…..) e, por via disso, a decisão proferida na sentença de que ora se recorre, atribui ao Impugnante, ora recorrente, valores que este não auferiu e cuja prova documental e testemunhal desses factos constam dos autos e não foi tomada em consideração, conforme resulta do supra referido.

Devendo, por via disso, ser concedido provimento ao recurso com vista a ser eliminado o valor de € 101.564,24 atribuído a título de rendimentos pela Inspecção Tributária ao recorrente, ou substituído pelo remanescente do valor resultante da dedução das despesas efectuadas pelo ora recorrente em nome, por conta e no interesse J….., respectivamente de € 57.200,00 + € 38.200,00 + € 1.698,08 + € 921,00 = € 98.019,08 sobre o valor de € 99.878,18 correspondente à transferência remetida pelo beneficiário J….., de onde resulta como remanescente o valor de € 1.859,10 incluindo no mesmo as comissões bancárias cobradas pelos pagamentos efectuados.

Para tanto, requer a Vs. Ex.as se dignem conceder efeito suspensivo ao presente recurso e seja notificada a Fazenda Pública para contra-alegar, querendo, no prazo e sob cominação legal”.

A FP não contra-alegou.

Por seu turno, a 2.ª Recorrente, nas alegações apresentadas, formulou as seguintes conclusões:

“a) No decurso da acção inspectiva efectuada à escrita do impugnante, verificou-se que não tinha contas correntes em nome dos clientes (vide declarações do TOC R…..) nem conta bancária exclusivamente destinada à sua actividade de Advogado;

b) E, que foram por si recebidas, quantias em dinheiro ou por transferências bancárias, algumas de elevado valor, das quais não existia qualquer registo nem eram emitidos quaisquer recibos quer relativos a “adiantamentos para pagamento de despesas por conta e em nome dos clientes” quer relativos a “honorários”;

c) Verificando-se, que tinha uma avença mensal (prestação de serviços jurídicos) com a “B….., Lda” e a “C….., Lda”, foram solicitados pedidos de esclarecimentos/elementos a estas;

d) Dos extractos de contas e respectivos documentos de suporte enviados por aquelas empresas, constatou-se que as contas apresentavam saldos devedores, tanto no início como no fim do ano de 2002 (Cfr. Anexo 9 e 10 do RIT);

e) Os saldos devedores, na conta 267 POC, significa que foram efectuadas transferências bancárias das contas das empresas para contas em nome do impugnante em valor superior às despesas efectuadas ou apresentadas por conta e em nome daquelas (Cfr. art. 7o das alegações);

f) Notificado do projecto de relatório da inspecção, o impugnante apenas exibiu um cheque para prova de pagamento de despesas por conta e em nome dos clientes mas não o fez para as restantes situações detectadas em falta (Vide Anexo 9 e 10 do RIT);

g) Como tal, os saldos devedores encontrados no extracto de contas daquelas empresas, e não justificados pelo impugnante como relativos a despesas por si pagas por conta e em nome das mesmas, foram consideradas como receita do exercício de 2003, de acordo com a al. b) do n.° 4 do Art. 116.° do CIRS;

h) Em sede de impugnação, atribuiu a culpa da existência de saldos devedores à “B…..” e a “C…..” porque não efectuaram atempadamente os seus lançamentos na contabilidade, então se assim foi na realidade, questiona-se porque não apresentou os comprovativos das despesas por si pagas por conta e em nome daquelas empresas aquando da notificação do projecto de relatório da inspecção?

i) Se efectivamente pagou despesas por conta e em nome dos clientes tinha que ter os comprovativos desse pagamento, pois, apenas tinham decorrido 5 anos, entre o alegado pagamento e a acção inspectiva;

j) Acresce que, juntou aos presentes autos, uma conta corrente com a “B…..” com disparidade de valores a crédito e a débito, referentes ao ano de 2003, por comparação com a mesma conta corrente por si apresentada em sede de processo crime (Proc. 4/08.5TALLE), o que só por si é indiciador, seguramente, da falta de veracidade da sua escrita. Estranhamente, nem sequer foi devidamente valorado na douta sentença.

k) Um ano depois, de ter sido alvo de acção inspectiva, foram homologadas transacções judiciais entre o impugnante e estas duas empresas (Proc. 942/08.5TBLLE e Proc. 943/08.3TBLLE), onde se decidiu julgar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, devido a acordo extrajudicial entre as partes, onde estabeleceram que o impugnante é credor da “C…..” em € 3 596,35 e devedor da “B…..” em € 2 763,40;

l) Dissentimos do sentido julgado pela douta sentença recorrida, porque resulta do seu entendimento, que as partes podem estabelecer os acordos que quiserem, e depois virem negar a base tributária encontrada pela Administração Tributária, aquando do decurso da acção inspectiva;

m) O disposto no n.º 1 do Art.° 663.° do CPC, tido em conta na douta sentença, não pode ser aplicado sem mais nos presentes autos, porquanto ainda que o diferendo entre as partes tenha ficado sanado no seu decurso, ficaram por explicar questões relevantes para uma boa decisão da causa, como seja, como foram apurados estes saldos resultantes do acordo estabelecido entre as partes, nomeadamente, onde está a prova da existência de documentos de suporte que comprovem o pagamento de despesas efectuadas pelo impugnante como adiantamento por conta e em nome destas duas empresas, no ano de 2002?;

n) Tal prova não foi apresentada nestes autos, pelo que consideramos que não basta o reconhecimento pelas partes que as contas correntes estão regularizadas, e que em vez de saldos devedores com ambas as empresas apenas há um saldo credor com a “CC…..”, para “deitar por terra” tudo aquilo que foi detectado pela Inspecção Tributária, porquanto;

o) O que releva são as irregularidades de escrita que foram encontradas pela Inspecção Tributária, no ano de 2007, pois, o impugnante não registou nem exibiu recibos dessas despesas efectuadas por conta e em nome das citadas empresas, no ano de 2002, pelo que a AT actuou de conformidade com a lei, considerando tais montantes como receita do ano de 2003;

p) A actuação da AT não pode “cair por terra” somente porque as empresas e o impugnante decidiram fazer correcções às suas contas correntes, no ano de 2008, um ano depois da acção inspectiva levada a cabo, porque não há prova, nos autos, que esses montantes considerados como receitas correspondem efectivamente a despesas pagas pelo impugnante por conta e em nome dessas empresas, no ano de 2002, porque não foram apresentados esses mesmos documentos de suporte;

q) E, por outro lado, do acordo efectuado entre as partes não se retira como foram apurados os saldos credores/devedores e com base em que documentos de suporte, esses saldos passaram para esses valores;

r) O depoimento da testemunha C….. não coloca em causa as correcções efectuadas pela Administração Tributária, porque as suas afirmações são óbvias quanto ao acordo ocorrido entre as partes, mas não quanto ao seu conteúdo e respectivos documentos de suporte que estiveram na sua base e incorrectas quanto à existência de saldos credores com ambas as empresas;

s) Não resulta da prova documental/testemunhal que as despesas consideradas pela Administração como receitas foram despesas efectivamente pagas pelo impugnante, por conta e em nome das avençantes;

t) Assim, a douta sentença recorrida, apreciou erradamente a matéria factual e jurídica, daí resultando, em consequência, erro de julgamento, por violação do disposto na al. b) do n.° 4 do Art.° 116.° do CIRS e n.° 1 do Art.° 74.° da LGT.

Pelo exposto e pelo muito que V. Ex.as doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a sentença recorrida, na parte que decidiu anular as liquidações adicionais aqui em causa, só assim se fará

JUSTIÇA”.

O Impugnante contra-alegou, tendo concluído nos seguintes termos:

“A) A relação profissional entre o ora recorrente e as sociedades B….., Lda. e C….., Lda. estava pré-fixada em contrato de avença mensal, em montante certo e determinado, que incluía investimentos pré-determinados, com pagamentos e transferências dos respetivos valores para esse efeito.

B) Os valores transferidos pelas referidas sociedade, além do valor da avença mensal, destinavam-se a pagamentos de aquisições de imóveis e impostos em nome e por conta das referidas sociedades.

C) Tais valores não constituíam, nem podiam constituir, rendimentos do ora recorrente, porque os mesmos se encontravam pré-fixados em regime de avença mensal, certos e determinados.

D) A contabilidade do ora recorrente era em regime simplificado, em prática isolada de advogado.

E) Entre o recorrente e as referidas sociedades foram instaurados os respetivos processos de prestação de contas, cujas sentenças foram juntas aos autos, comprovativas de que o Sujeito Passivo não teve quaisquer outros rendimentos, além dos honorários das suas avenças mensais, pelos quais emitiu os respetivos recibos.

F) A Fazenda Nacional não tem poder para alterar os honorários do ora recorrente previamente estabelecidos em contrato de avença entre este e as referidas sociedades.

G) Os documentos de suporte das prestações de contas foram juntas aos respetivos processos e o ora recorrente não teve quaisquer outros rendimentos além daqueles que constam do contrato de avença, nem a tal tinha direito.

H) No âmbito do recurso da sentença interposto pelo Sujeito Passivo, ora recorrente, também não constituíram rendimentos os valores transferidos por J….., conforme resulta da prova documental junta aos autos, bem como da ação de prestação de contas identificada pelo processo n.° 1061/12.5TBLLE do 2.° Juízo de Competência Cível do Tribunal Judicial de Loulé.

I) Tal prestação de contas resulta do facto de ter sido impossível o contacto pessoal com o beneficiário dos valores utilizados na transação a favor de J….., não tendo ainda sido possível a citação do mesmo, apesar de ter sido nomeado Agente de Execução para o efeito.

Termos em que deverá ser negado provimento ao recurso interposto pela Fazenda Nacional por não corresponder à verdade e constituir uma imposição da Administração Fiscal sem legitimidade para tal e sem base factual; e, por via disso, procedente o recurso interposto pelo recorrente, porque baseado, não só na verdade dos factos, mas também em prova documental e testemunhal irrefutável.

Assim se decidindo, se fará seguramente Justiça!”.

Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do então art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento aos recursos.

Colhidos os vistos legais (art.º 289.º, n.º 2, do CPPT) vem o processo à conferência.

São as seguintes as questões a decidir:

Quanto ao recurso do 1.º Recorrente:
a) Há erro no julgamento da matéria de facto?
b) Há erro de julgamento, em virtude de o valor transferido por J….. não ter sido rendimento do Impugnante?

Quanto ao recurso da 2.ª Recorrente:
c) Há erro de julgamento, em virtude de os extratos de contas e respetivos documentos de suporte enviados pelas sociedades B….., Lda e a C….., Lda apresentarem saldos devedores, não tendo sido demonstrado, na parte corrigida, serem os mesmos relativos a despesas pagas pelo Impugnante por conta e em nome das mesmas?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“A) Por despacho do Director de Finanças de Faro, datado de 19/04/2006, foi decidido dar início a um procedimento de inspecção externa ao Impugnante que tinha como objectivo “a consulta, recolha e cruzamento de elementos” abrangendo os exercícios de 2003, 2004 e 2005 (cfr. fls. 335 a 336 dos autos);

B) O procedimento de inspecção externa referido na alínea anterior iniciou-se em 15/03/2007 e terminou em 20/07/2007, de acordo com a nota de diligência emitida nesta data (cfr. fls. 337 dos autos);

C) Em 29/03/2007, foram pedidos esclarecimentos ao Impugnante relativamente à sua “actividade como advogado” (cfr. fls. 162 a 169 e 299 a 305 dos autos);

D) Em 11/04/2007 veio o Impugnante prestar os esclarecimentos solicitados pela Inspectora Tributária e referidos na alínea anterior (cfr. fls. 169 a 209 dos autos);

E) Em 23/07/2007 foi solicitada a emissão de ordens de serviço para os exercícios de 2003, 2004 e 2005, devido à necessidade de efectuar correcções à matéria colectável (cfr. fls. 339 dos autos);

F) Por despacho do Director de Finanças de Faro, datado de 23/07/2007, foi emitida ordem de serviço para a realização de procedimento de inspecção externa ao Impugnante, abrangendo o exercício de 2003 a que foi atribuído o número ….. (cfr. fls. 73, 310 e 335 dos autos);

G) A inspecção externa a que alude a alínea anterior decorreu entre 18/09/2007 e 31/10/2007 (cfr. fls. 73 dos autos);

H) Em 18/09/2007, foi solicitado ao Impugnante esclarecimentos no âmbito do procedimento de inspecção externa (cfr. fls. 208 dos autos);

I) Em 26/09/2007, veio o Impugnante responder ao pedido referido na alínea que antecede e juntar documentos (cfr. fls. 210 a 255 dos autos);

J) Em 18/11/2007 através do ofício nº ….., foi comunicado ao Impugnante o projecto de relatório de inspecção tributária (cfr. fls. 86 dos autos);

K) Em 14/09/2007 veio o Impugnante exercer o direito de audição por escrito (cfr. fls. 302 dos autos);

L) Em 23/11/2007 foi elaborado o relatório final, o qual se tem reproduzido para todos os legais efeitos e de onde, além do mais, consta o seguinte:

I- CONCLUSÕES DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO

Descrição sucinta das conclusões da acção de inspecção

Em resultado da análise aos elementos da escrita, declarações de IR e IVA, do exercício de 2003 foram efectuadas correcções por métodos directos e indirectos as quais se encontram discriminadas nos capítulos III e V do presente relatório:

Em sede de IRS (…) apuraram-se as seguintes correcções:

Correcções meramente aritméticas:

Omissão de Proveitos (IRS): € 189.633,97

(…)

Correcções com recurso a métodos indirectos:

Omissão de Proveitos (IRS) € 8.000,00

(…)

Em face do exposto no capitulo VII, página 22 do presente Relatório, nas correcções meramente aritméticas foi aceite, como prova, cópia de cheque emitido pelo S.P. no valor de € 36.000,00, sendo que o seu valor é abatido à correcção à matéria colectável apurada no Projecto de Relatório de onde resulta uma correcção no montante de € 153.633,97.

(…)

III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

(…)

• Cumprimento das Obrigações Fiscais

IRS

Através do sistema informático verifica-se que o S.P. apresentou a declaração de rendimentos (art.º 57º do CIRS) relativa ao exercício de 2003.

Até 31/12/2003 permaneceu no Regime Simplificado.

Análise Contabilístico-fiscal

IRS

Valores declarados em sede de IRS

Quadro nº 1

ANO 2003.

Actividade “Advogado” — IRS

No sentido de controlar as serviços prestados pelo sujeito passivo, foi efectuada análise comparativa entre os recibos que emitiu e as operações em que teve intervenção, designadamente, no que se refere aos contribuintes que constam dos registos da Direcção Geral dos Impostos como sendo representados pelo sujeito passivo e termos de SISA em que, interveio como gestor de negócios, não se tendo detectado, em relação a algumas dessas operações, respectivos recibos emitidos em nome das entidades a quem foram prestados os Serviços.

Foi ainda efectuado um levantamento nos cartórios notariais de Loulé acerca de todos os actos onde o S.P. interveio como gestor de negócios, procurador ou intérprete. Em relação a algumas destas operações também não foram detectados os respectivos recibos emitidos em nome dos clientes a que foram prestados os serviços.

Através da análise dos recibos emitidos em 2003, pelo S.P. verificou-se que não são emitidos recibos relativos a Adiantamento para pagamento de despesas por conta e em nome do cliente. Todos os recibos que foram emitidos no exercício de 2003 referem-se a “Honorários”.

Com o objectivo de esclarecer as situações acima descritas, em 29 de Março de 2007, o sujeito passivo foi notificado, para prestar, por escrito, os esclarecimentos e elementos abaixo indicados no prazo de dez dias, ao abrigo do n° 4 do artigo 59° da Lei Geral Tributária, conjugado com o artigo 9° do Regime Complementar de Inspecção Tributária (anexo 1).

1. Relativamente aos processos relacionados em anexo 1, nos quais interveio, discriminar individualmente, os serviços que foram prestados, identificando os recibos que titulam os honorários associados à prestação de serviços.

2. Relativamente aos clientes relacionados no ponto 2 da notificação, nos quais interveio como gestor de negócios (dos compradores de imóveis) para efeitos de pagamento de Imposto Municipal de SISA, discriminar individualmente os serviços que foram prestados, identificando os recibos que titulam os honorários associados à prestação de serviços.

3. De acordo com os registos da Direcção-geral dos impostos é ou foi representante dos contribuintes identificados no ponto 5 da notificação, discriminar individualmente, os serviços que foram prestados, identificando os recibos que titulam os honorários associados à prestação de serviços.

A resposta à notificação deu entrada na Direcção de Finanças de Faro, no dia 12 de Abril de 2007 (anexo 2).

Em relação ao ponto 2 da notificação, o S.P. declara, que não cobrou honorários aos contribuintes identificados no quadro, argumentando que os mesmos mudaram de endereço.

Nome                                                   NIF

J…..                       …..

J…..       …..

Em relação ao ponto 2 da notificação, o S.P. declara, relativamente ao cliente - J….., que os serviços foram prestados no ano de 2002, referente à aquisição de uma fracção autónoma de um prédio urbano sito em ….., através da escritura de Compra e Venda lavrada aos 2003-02-28, no 1° Cartório Notarial de Loulé, pelo valor de € 89.000,00. Declara ainda que uma vez que o referido cliente mudou de endereço desconhece o seu paradeiro para cobrar os serviços prestados.

O contribuinte J….. e a esposa A….., foram notificados, na pessoa do Sr. C….., na qualidade de representante de A….., através de ofício (anexo 3) para remeter, relativamente à compra de uma fracção autónoma sita em ….., os seguintes elementos e/ou esclarecimentos:

1. Informar quais os serviços prestados, no ano de 2003, pelo Dr. O…..;

2. Fotocópia da escritura de compra e venda;

3. Fotocópia dos recibos emitidos pelo Dr. O…..;

4. Fotocópia dos comprovativos de todas as importâncias pagas, com a identificação das datas de pagamento, nós de cheques emitidos e respectivos Bancos referentes aos referidos serviços.

A resposta à notificação deu entrada na Direcção de Finanças de Faro, nos dias 3 de Maio de 2007 e 15 de Maio de 2007 (anexo 4).

Nesta resposta o representante de A….., o Sr. C….., enviou os seguintes documentos:

Cópia da escritura de compra e venda, na qual o Dr. O….. interveio como interprete do Sr. J…..;

Cópia de dois faxes (correspondência entre o S.P. e o Sr. A…..), ambos datados de 2 de Dezembro de 2002;

Cópia do documento comprovativo do pedido de transferência bancária, no valor de £ 20.900, da conta do Sr. J….., da entidade bancária - Knightsbridge Premium Banking Center em Londres, para a conta do Dr. O….. na agência do Crédito Predial Português em Loulé, datado de 3 de Dezembro de 2002;

Cópia de um fax (correspondência entre o Sr. J….. e o seu banco acerca de uma transferência no valor de £ 68.500);

Cópia do documento comprovativo do pedido de transferência bancária, no valor de £ 68.500, da conta do Sr. J….., da entidade bancária - Knightsbrídge Premium Banking Center em Londres, para a conta do Dr. O….. na agência do Crédito Predial Português em Loulé, datado de 20 de Fevereiro de 2003;

Verifica-se que relativamente a este cliente o S.P. recebeu duas transferências, para a sua conta bancária n° …..do Crédito Predial Português — Loulé, no valor total de € 133.693,37. (em 3 de Dezembro de 2002 o valor de £ 20.900 / 0,6420 (taxa câmbio — Banco Portugal) = € 32.553,84 e em 20 de Fevereiro de 2003 o valor de £ 68.500 / 0,67445 (Taxa câmbio — Banco Portugal) 101.564, 24);

Que interveio na sisa, na qualidade de gestor de negócios (anexo 5);

Que interveio na escritura na qualidade de intérprete (anexo 6);

Verifica-se ainda que na escritura de compra e venda lavrada nó 1° Cartório Notarial de Loulé, aos 28 de Fevereiro de 2003, consta o preço de € 89.000,00.

Não foram exibidos outros documentos por parte do cliente J….. que, indiquem que tenha havido devolução de quaisquer importâncias.

De facto, o sujeito passivo prestou serviços, ao contribuinte J….., não declarando quaisquer honorários, refugiando-se no facto de o referido cliente ter mudado de endereço. Se assim fosse o representante — Sr. C….. — não teria conseguido contactar o Sr. A…... Segundo informações recolhidas junto do representante da esposa do Sr. A….. - o Sr. C….., o mesmo afirmou que, ele próprio, contactou o Dr. O….. a solicitar os seus serviços tendo-o posto em contacto com o Sr. A….., uma vez que naquela data teve que se ausentar do país não podendo estar presente na data da escritura.

Por outro lado verifica-se que o S.P. utiliza a sua conta particular n° …..do Crédito Predial Português — Loulé, no exercício da Sua actividade.

Como já foi referido o S.P., no exercício de 2003, não emitiu nenhum recibo relativo a “Adiantamento para pagamento e despesas por conta e em nome do cliente”. Relativamente ao caso acima identificado verifica-se que o S.P. recebeu transferências de dinheiro para as suas contas bancárias, para pagamento de despesas de clientes.

Relativamente aos titulares de rendimentos da categoria B, a alínea a) do n° 1 do art° 115 do CIRS, refere que estes são obrigados: “A passar recibo, em impresso de modelo oficial, de todas as importâncias recebidas dos seus clientes, pelas prestações de serviços ainda que a titulo de provisão, adiantamento ou reembolso de despesas

Relativamente à escrituração dos livros, a alínea b) do n°4 do art° 116° do CIRS refere as importâncias recebidas a titulo de provisão, adiantamento ou a qualquer outro destinadas a custear despesas da responsabilidade dos clientes devem ser registadas em conta corrente e escrituradas no respectivo livro, sendo consideradas receita no ano posterior ao da sua recepção, sem contudo exceder apresentação da conta final relativa ao trabalho prestado;

Como o S.P. não emitiu, em 2003, qualquer recibo relativo a importâncias recebidas dos seus clientes para fazer face a despesas por conta e em nome desses mesmos clientes e por outro lado na sua escrita não constam quaisquer contas correntes em nome dos seus clientes a discriminar todas as importâncias recebidas, foi o S.P. aos 18 de Setembro de 2007, notificado para, no prazo de dez dias, “exibir através dos respectivos documentos de suporte, todas as importâncias recebidas, nos anos de 2002 e 2003, a titulo de provisão, adiantamento ou a qualquer outro destinado a custear despesas da responsabilidade dos seus clientes”, e ainda para exibir o registo das importâncias respeitantes a reembolso de despesas efectuadas em nome e por conta dos clientes, no ano de 2003, bem como todos os comprovativos do pagamento das mesmas”. (Anexo 7)

A resposta à notificação deu entrada na Direcção de Finanças de Faro, no dia 2 de Outubro de 2007 (anexo 8).

Em relação ao cliente — J….., o S.P., na sua resposta remete cópia de uma transferência bancária, do pagamento da sisa e do preço pago. Em relação à transferência bancária verifica-se que a mesma foi recebida aos 04 de Dezembro de 2002, no valor de € 32.553,84. No que respeita à sisa paga, o S.P. apresenta cópia do termo de declarações na qual foi paga sisa no valor de €1.698,08. Em relação ao valor pago, o S.P, apresenta cópia de um cheque, da sua conta bancária n° ….. do banco — Crédito Predial Português, no valor de € 31.800,00 emitido à ordem de “Q….., Lda.”. Quanto a estes documentos há a referi o seguinte:

Que a transferência coincide com a primeira transferência efectuada pelo Sr. J…..;

Que a soma dos valores pagos pela sisa e cheque, emitido à empresa vendedora do imóvel, perfaz o montante transferido.

Contudo relativamente à segunda transferência enviada pelo Sr. ….., no valor de € 101.564,24, em Fevereiro de 2003, para a mesma conta bancária do S.P., o mesmo nada refere acerca do seu recebimento nem dos pagamentos que efectuou com o referido montante.

Atendendo ao estipulado nos art° 115 e 116° do CIRS, e uma vez que não são conhecidos mais nenhuns negócios efectuados pelo S.P., a este cliente, que não foram exibidos mais nenhuns documentos de despesa nem de transferência de devolução, para que foi notificado, o valor de € 101.564,24 é considerado proveito em 2003.

Ainda em relação ao ponto 2 da notificação, o S.P. declara, relativamente ao que os serviços foram prestados em 2002 e referem-se à aquisição de um prédio rústico na freguesia e concelho de S. Brás de Alportel, através da escritura de compra e venda lavrada no Cartório Notarial de S. Brás de Alportel aos 13 de Fevereiro de 2003, pelo preço de €6.000,00. Através da referida escritura verifica-se que de facto o S.P. prestou serviços ao cliente J….., uma vez que interveio na qualidade de procurador, no entanto na sua resposta refere que não cobrou honorários refugiando-se no facto de o referido cliente ter mudado de endereço.

Relativamente ao levantamento efectuado nos Cartórios Notariais, foram detectados os seguintes actos onde o S.P., interveio como gestor de negócios, representante ou procurador, sem que tenha emitido os correspondentes recibos:

- Escritura de Compra e Venda lavrada no 2° Cartório Notarial de Loulé, aos 7 de Julho de 2003, na qual a Sr.ª E….. e marido compra um prédio rústico, pelo valor de € 30.000,00. Neste negócio o S.P., interveio como gestor de negócios, da Sr.ª E….., no termo de declarações de Sisa;

- Escritura de Habilitação lavrada no 20 Cartório Notarial de Loulé, aos 23 de Outubro de 2003, na qual o S.P. interveio como interprete da Sr.ª Bárbara A…..;

- Escritura de Compra e Venda lavrada no 1º Cartório Notarial de Loulé, aos 29 de Outubro de 2003, na qual o S.P. interveio como procurador da empresa “P…..”. Nesta escritura a empresa representada pelo S.P. vende um prédio urbano pelo valor de € 140.000,00:

Relativamente a estes actos o S.P. não emitiu quaisquer recibos de honorários. Na resposta, do S.P., que deu entrada na Direcção de Finanças de Faro, no dia 12 de Abril de 2007 (anexo 2), podemos observar que relativamente ao cliente “P…..” refere que prestou serviços na aquisição de um prédio urbano na freguesia de ….., tendo emitido um recibo no valor de 108.000$00 em Outubro de 1989 Relativamente à sua intervenção no negócio da venda de um prédio urbano, em 2003, propriedade da referida empresa o SP nada refere.

No que diz respeito à cliente B….., o S.P. menciona que de facto prestou serviços de tradução na Habilitação de herdeiros por óbito T….., de registo na herança, com vista à sua venda, o que ainda não se concretizou.

Relativamente a todos estes clientes a quem o S.P. prestou efectivamente serviços, no exercício de 2003, não tendo emitido os respectivos recibos, convêm salientar que uma vez que o S.P. se encontra enquadrado, em sede de IVA, no Regime Normal Trimestral, temos que observar o preceituado no n° 6 do art.º 3º do CIRS “Os rendimentos ficam sujeitos a tributação desde o momento em que para efeitos de IVA seja obrigatória a emissão de factura ou documento equivalente...”.

Por outro lado a alínea b) do n° 1 do art° 7° do CIVA refere que o “... o imposto devido e torna-se exigível, nas prestações de serviços, no momento da sua realização.

Atendendo que o S.P. exerce uma actividade lucrativa não é aceitável que perante a administração fiscal se refugie no argumento mais fácil, que é o facto de os seus clientes terem mudado de endereço. Não quer dizer com isto que tal nunca aconteça, mas por sistema e havendo provas de que tal não aconteceu, a quantificação por métodos directos não se torna de todo possível, pelo que a quantificação dos proveitos relacionados com os clientes: J….., E….., B….. e “P…..”, encontram-se quantificados no capítulo V do presente relatório.

No decurso da presente acção de inspecção foram detectadas duas. empresas – “B….., Lda.” e “C….., Lda. — com as quais o S.P. tem uma avença mensal.

Relativamente a estas duas empresas, aos 2007-05-30, foram ambas notificadas para enviar/prestar os seguintes esclarecimentos:

- Informar quais os serviços prestados, nos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006, pelo Advogado Dr. O…..;

Enviar fotocópia de todos os documentos de suporte da conta (POC) 26701 / 26702 — Dr. O….., dos exercícios de 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006;

- Enviar fotocópia de todos os recibos emitidos pelo Dr. O….., nos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006;

- Enviar fotocópia de todos os comprovativos de todas as importâncias pagas, com identificação das datas de pagamento, n°s dos cheques emitidos e respectivos bancos, referentes aos referidos serviços nos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006.

Em resposta a ambas as notificações, aos 2007-08-17, deu entrada nestes serviços oficio a enviar fotocópias da documentação solicitada.

Dos elementos enviados temos a destacar o seguinte:

Relativamente à empresa “B….., Lda., foram enviados extractos da conta (POC) — 26702 — O….., bem como todos os documentos de suporte aos lançamentos efectuados, nos exercícios solicitados.

De salientar que a conta (POC) 267 reflecte todas as transacções com entidades especializadas em determinados assuntos ou ramos de acção e que colaboram com a empresa sem fazerem parte do seu pessoal. É debitada pelos adiantamentos efectuados pela empresa, em contrapartida duma conta de meios monetários, e pelos restantes pagamentos que lhe hajam sido efectuados; é creditada, pelas notas de débito, facturas, contas de compra e venda e demais documentos comprovativos de despesas que hajam efectuado por conta da empresa, ou remunerações que lhe são atribuídas, em contrapartida da respectiva conta de encargos.

Analisado o extracto da conta (POC) 26702 — Dr. O….., da empresa “B….., Lda., bem como verificados todos os documentos de suporte da mesma, verifica-se que no exercício de 2003, esta conta, tanto no inicio do ano como no fim do ano apresenta saldos devedores.

Os saldos devedores, nesta contado POC, significa que foram efectuadas transferências bancárias das contas da empresa para contas bancárias em nome do S.P. em valor superior do que as despesas efectuadas ou apresentadas.

Relativamente a esta conta do POC verifica-se que no início do exercício de 2002, foram efectuadas transferências para contas bancárias em nome do S.P. no valor de € 215.079,90, que o S.P. efectuou despesas, por conta e em nome da sua cliente, no valor de € 129.341,50 de onde resulta um saldo final, também devedor, no valor de €85.738,40.

Relativamente a este cliente, o S.P., até à presente data, não exibiu quaisquer transferências efectuadas para as suas contas bancárias, nem exibiu nenhuns documentos de despesa pagos por conta e em nome desta empresa.

Em face do preceituado no n°4 alínea b) do art° 116° do CIRS, o saldo devedor no valor de € 85.738,40 é considerado receita do exercício do ano de 2003.

Em relação à empresa C….., Lda.”, através da análise do extracto de conta corrente da conta (POC) 26701, do exercício de 2002, que foram efectuadas -transferências bancárias para as contas bancárias do S.P. no valor de € 3.550,00, que o S.P. efectuou pagamentos, em nome e por conta do cliente, no valor de € 1.218,67, de onde resulta um saldo final, também devedor, no valor de €2.331,33.

Relativamente a este cliente, o S.P., até à presente data, não exibiu quaisquer transferências efectuadas para as suas contas bancárias, nem exibiu nenhuns documentos de despesa pagos por conta e em nome desta empresa.

Em face do preceituado no n° 4 alínea b) do art° 116º do CIRS, o saldo devedor no valor de €53.675,18 é considerado receita do exercício do ano de 2003.

As correcções efectuadas, em sede de IRS totalizam o valor de € 189.633,97 (€ 101.564,24 + € 85.738,40 + € 2.331,33).

(…)

IV - MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

No decurso da presente acção de inspecção foi efectuada uma análise comparativa entre os recibos que o S.P. emitiu e as operações em que teve intervenção, quer na qualidade de gestor de negócios, de procurador ou ainda como intérprete. Esta análise comparativa teve por base os recibos emitidos pelo S.P. e ainda os contribuintes que constam dos registos da Direcção Geral do Impostos.

Para além desta análise comparativa foi ainda efectuado um levantamento, em alguns, Cartórios Notariais deste distrito, nos quais foi possível detectar, que em algumas destas operações, não foram emitidos os respectivos recibos.

No decorrer da acção de inspecção o S.P. foi notificado para esclarecer o tipo de serviços prestado bem como identificar os recibos que titulam os honorários associados a cada prestação de serviço.

Uma vez que não emite recibos pelas importâncias recebidas dos seus clientes para fazer face a despesas por conta e em nome desses mesmos clientes, que não possui contas correntes em nome dos seus clientes a discriminar todas as importâncias recebidas bem como todas as importâncias pagas em nome e por conta de cada um dos seus clientes, foi o S.P. notificado para exibir todas as importâncias recebidas a titulo de provisão, adiantamento ou a qualquer outro destinado a custear despesas em nome e por conta dos seus clientes. Foi ainda notificado para exibir todos os documentos de suporte das despesas pagas em nome e por conta dos seus clientes.

Relativamente a todas as notificações efectuadas, o S.P., respondeu atempadamente, no entanto as suas respostas não foram conclusivas no que respeita a alguns clientes, nomeadamente a J….., E….., B….. e “P…..”.

No que respeita a estes clientes o S.P. prestou efectivamente serviços, quer na qualidade de procurador, gestor de negócios ou ainda de intérprete. No entanto no que diz respeito aos honorários recebidos e os respectivos recibos o SP para alguns clientes, refugia-se no facto de terem mudado de endereço e para outros nada refere.

Por outro lado há ainda outros clientes que nem sequer foram mencionados pelo S.P., contudo existem provas de que esses mesmos clientes transferiram para despesas em nome e por conta do cliente.

De salientar que os clientes: J….., “B….., Lda. e “C….., Lda.”, apresentaram provas das transferências bancárias efectuadas para o S.P..

Não sendo possível, através da contabilidade, a quantificação directa dos resultados efectivamente obtidos, existindo indícios de que, a mesma, não reflecte a exacta situação patrimonial do S.P, configuram-se os factos e procedimentos tipificados no n° 1 do art.º 39° do CIRS conjugado com o art° 54° do CIRC e com a alínea b) do art° 87° e art.º 88° da L.G.T.

V - CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

ANO 2003 — IRS

Nos termos do art.° 90° n.° 1 al. d) da L.G.T. a determinação do rendimento colectável, por métodos indirectos teve em conta os seguintes valores declarados pelo S.P.:

Neste exercício foi detectado um recibo emitido a G….. e I….., no valor liquido de € 2.000,00, relativamente a este cliente os serviços prestados pelo o S.P. reportam-se à transferência de um prédio urbano pelos quais foi emitido um recibo no valor de € 2.380,00 (com IVA incluído).

Verificando-se que as prestações de serviço que o S.P. prestou aos clientes:

J….., E….., B….. e “P…..”., em tudo se assemelham à prestada ao cliente acima identificado, presume-se que, o S.P., tenha recebido, por cada cliente, o valor líquido de € 2.000,00.

As correcções efectuadas, com recurso à aplicação de métodos indirectos, em sede de IRS totalizam o valor de € 8.000,00 (€ 2.000,00 * 4).

(…)

VIII — DIREITO DE AUDIÇÃO

Através do oficio n° ….., datado de 2007-11-08, foi o S.P., notificado, nos termos do art° 60° da LGT e art° 60° do RCPIT, para, no prazo de quinze dias, exercer o direito de audição sobre o projecto de Conclusões do Relatório de Inspecção.

Aos 2007-11-15, deu entrada nestes serviços, o direito de audição, sobre o qual há a referir o seguinte:

Ponto I

Relativamente ao cliente J….. refere não ter sido possível cobrar os seus honorários, uma vez que o mesmo mudou de endereço. Refere ainda que desde 2003-01-16 que aquele cliente não é contactável, juntando para o efeito cópia de selo dos Correios de S. Brás de Alportel, daquela data e outro ainda de 2005-12-14.

Curiosamente a escritura de compra e venda, na qual o S.P. interveio na qualidade de procurador, deste cliente e da esposa, realizou-se no Cartório Notarial de S. Brás de Alportel em 2003-02-13 a Sisa relativa ao prédio em questão foi liquidada aos 2003-01-29, a certidão da Conservatória do Registo Predial de S. Brás de Alportel foi emitida aos 2003-01-29. Uma vez que o S.P. afirma que não consegue contactar o seu cliente desde 2003-01-16, como é que em 2003-02-13 o representou numa escritura pública? Quem pagou o Imposto Municipal de Sisa em 2003-01-29? Quem requereu a certidão emitida pela Conservatória em 2003-01-29? Quem pagou a escritura?

Relativamente a todos os preparos para a realização da escritura no dia 13 de Fevereiro de 2003, o S.P. nada refere.

Por outro lado convém lembrar, ao S.P., que o facto de ter prestado serviços, só por si, é suficiente para a respectiva tributação, conforme preceitua o n° 6 do art° 3° do CIRS e a alínea b) do n° 1 do art.º 7º do CIVA conjugada com o n° 1 do art° 8° do mesmo diploma legal.

Em face do exposto não é de todo credível que não tenha cobrado os seus honorários pelo serviço prestado e este cliente.

Ponto II

Relativamente ao seu cliente J….. o S.P. refere que o preço efectivo da venda do prédio em questão foi de € 127.200,00 e não de € 89.000,00 conforme consta na escritura. Refere ainda que o preço de € 127.200,00 inclui recheio. Por outro lado junta cópia de dois contratos de promessa de compra e venda, os quais não se encontram assinados pelas partes.

Nos referidos contratos de promessa compra e venda encontra-se estipulado que a empresa “Q….., Lda.” vende ao cliente do S.P. uma fracção autónoma, designada pela letra “AH” de um prédio urbano sito em ….., pelo preço de € 127.200,00. Encontra-se estipulado nos referidos contratos que como sinal é entregue a quantia de € 31.800,00 e que o remanescente, €95.400,00, será pago no acto da escritura.

Junto de um dos contratos encontra-se discriminado o recheio do referido prédio. Relativamente ao recheio os contratos são omissos assim como a escritura também é omissa.

Refere ainda o S.P. que emitiu três cheques, no pagamento daquela transacção, um no valor de € 31800,00, em 2002-12-06, o segundo no valor de € 57.200,00, em 2003-02-28, e o terceiro no valor de €38.200,00, em 2003:02-28. Mais refere que o primeiro e o segundo cheques, foram emitidos em nome da empresa vendedora e o terceiro em nome da Dra. M…...

Relativamente aos cheques o S.P. apenas fez a prova do primeiro cheque, no que respeita ao segundo e terceiro cheques não apresentou qualquer prova documental de que os tenha emitido.

Por outro lado uma vez que tanto os contratos como a escritura do prédio em questão são de todo omissos quanto ao recheio, que não foram apresentadas quaisquer provas de que o recheio tenha sido transaccionado, nomeadamente com a apresentação documental de factura/recibo da venda do mesmo.

Uma vez que não trouxe ao processo provas que refutassem a correcção efectuada a mesma mantêm-se.

Ainda no Ponto II o S.P. refere que na mesma data se encontrava agendada uma outra escritura de compra e venda, na qual era vendedor o Sr. J….. e comprador o Sr. G…... Nesta escritura refere o S.P., juntando cópia da procuração, que era legal representante do comprador Refere ainda que a escritura não se concretizou, naquela data, pelo facto do comprador ter desistido da mesma. Em face desta desistência o processo do Sr. J….. ficou pendente, na expectativa da mesma ser concretizada e assim cobrar os seus honorários, uma vez que se tratava de uma compra e de uma venda em simultâneo.

Relativamente a esta situação convém salientar o preceituado no n° 6 do art° 3º do CIRS e ainda a alínea b) do n° 1 do art° 7° do CIVA, conjugado com o n° 1 do art° 8° do mesmo diploma legal.

Por outro lado no que se refere à questão da segunda escritura que estava agendada para o mesmo dia só vem acrescentar que, no exercício de 2003, o S.P. foi constituído procurador de um outro cliente — Sr. G….., tendo tratado de toda a documentação para a celebração de uma escritura a qual só não se realizou porque houve desistência no próprio dia. Em relação a este cliente também não há nenhum recibo emitido no exercício de 2003, embora tenha prestado os seus serviços.

Ponto III

No que se refere à intervenção, na qualidade de gestor de negócios, no termo declaração de sisa da Sra. E….., o SP afirma que tal se deu ao facto de a senhora ser sua vizinha e, naquela data, não ter tido condições para se deslocar ao Serviço de Finanças competente para liquidar o referido imposto. Refere ainda que não cobrou quaisquer honorários por se tratar de uma sua conhecida e das suas relações de amizade, indicando a mesma como sua testemunha como prova de que não cobrou honorários.

O S.P., no exercício do seu direito de audição, não apresentou qualquer prova de que efectivamente não cobrou honorários pelos serviços que prestou à E…...

Ponto IV

Os serviços de intérprete, que o S.P., prestou à sua cliente B….., conforme consta na escritura de habilitação de herdeiros lavrada em 2003-10-28, foram efectivamente prestados, conforme é confirmado pelo S.P. Contudo na sua argumentação, o S.P., refere que não foram cobrados quaisquer honorários por estarem pendentes outros serviços nomeadamente com a filha desta cliente. Refere ainda que não se justificou cobrar honorários à Sr.ª B….., uma vez que estavam em curso serviços mais importantes.

De salientar que o S.P. neste ponto refere-se a duas clientes, e que prestou gratuitamente serviços à Sr.ª B….. porque estavam em curso serviços mais importantes relacionados com a Sr. Z…...

Não é de todo aceitável que pelo facto de se encontrar a tratar de assuntos duas pessoas da mesma família, e “refugie no argumento de não ter cobrado honorários à Sr.ª Bárbara porque tinha outros assuntos pendentes, mais importantes, em nome da filha.

Na resposta datada de 2007-04-12, o S.P. relativamente à cliente Sr.ª B….., refere que “...prestou serviços de tradução da habilitação de herdeiros e registo da herança, com vista à sua venda, o que ainda não se concretizou”. Ou seja por um lado não cobrou honorários porque a venda da herança ainda não se concretizou, por outro lado não cobrou honorários porque tinha assuntos pendentes, mais importantes, de uma familiar próxima.

Em face do exposto a correcção mantém-se.

Ponto V

Na escritura de compra e venda lavrada no 1° cartório Notarial de Loulé, em 2003-10-29, o SP interveio na qualidade de procurador da offshore denominada P….. Ltd.”, na venda de um prédio urbano. No que respeita a esta intervenção o S.P. refere que os adquirentes, na referida escritura, são os próprios donos da offshore, pelo que não houve qualquer valor transaccionado. Refere ainda que aquela transacção teve em vista uma futura transacção do mesmo prédio.

Na sua resposta o S.P. refere que cobrou honorários e emitiu os respectivos recibos aquando da segunda venda do imóvel em 2007.

Mais uma vez convém ter presente o preceituado no n° 6 do art° 30 do CIRS ainda a alínea b) do n° 1 do art° 7º do CIVA

Dado que não trouxe ao processo qualquer prova de que não cobrou quaisquer honorários, à offshore, pelos serviços que efectivamente prestou, a correcção mantêm-se.

Ponto VI

Relativamente aos documentos relacionados e identificados pelo S.P., como tendo sido pagos, por si, em nome e por conta da “B…..”, conforme consta em anexo 9, o único que não se encontra contabilizado na conta (POC) 26702 — Dr. O….., no ano de 2002, naquela empresa, corresponde ao cheque no valor de € 36.000,00, emitido em 2002-08-12, em nome de “F….., Lda.”, sendo o seu valor abatido à correcção efectuada no Projecto Relatório. Os restantes documentos, conforme se pode observar no anexo 9, na sua maioria encontra-se contabilizado, no ano de 2002, pelo que o valor dos mesmos não influencia a correcção proposta. No mesmo anexo constam outros documentos, que não se encontrando contabilizados, o S.P., no direito de audição, não apresentou prova de que os mesmos tenham sido pagos por si, motivo pelo qual não são abatidos à correcção inicialmente efectuada.

Relativamente aos documentos relacionados e identificados pelo S.P., como tendo sido pagos, por si, em nome e por conta da “C….., Lda.”, conforme consta em anexo 10, detectou-se que a maioria se encontram contabilizados na conta (POC) 26701, no ano de 2002, naquela empresa, pelo que o valor dos mesmos não influencia a correcção proposta.

No mesmo anexo encontram-se outros valores que não se encontram contabilizados, o S.P., no direito de audição, não apresentou prova de que os mesmos tenham sido pagos por si, motivo pelo qual não são abatidos à correcção inicialmente efectuada.

Em face do exposto relativamente à empresa “B….., Lda.” o valor de € 36.000,00 é abatido à correcção efectuada no Projecto de Relatório. No que respeita à empresa “C….., Lda., pelos motivos atrás enunciados, a correcção proposta no Projecto Relatório mantém-se.

(…)

À consideração superior

Direcção de Finanças de Faro, 23 de Novembro de 2007.»

(cfr. fls. 72/91 dos autos);

M) O relatório final de inspecção tributária foi enviado ao Impugnante, através do ofício …..de 29/11/2007 (cfr. fls. 105 dos autos);

N) Em 2/01/2008 o Impugnante apresentou um pedido de revisão da matéria colectável (cfr. fls. 105 dos autos);

O) A decisão referida na alínea anterior foi comunicada ao Impugnante através do ofício nº ….., datado de 06/02/2008 (cfr. fls. 43 e 306 dos autos);

P) Em 14/02/2008, o Director de Finanças de Faro, lavrou decisão final referente ao pedido de revisão apresentado pelo Impugnante e referido na alínea O), que aqui se dá igualmente por reproduzida e de onde, além do mais, consta o seguinte:

Tendo decorrido o prazo de 30 dias contados do início do procedimento (início no dia 11/01/2008) sem que o perito (sujeito passivo) tivesse apresentado laudo sobre a sua posição e fundamentos demonstrativos da falta de acordo, cabe resolver de acordo com o prudente juízo considerando os elementos integrados no respectivo processo.

(…)

O perito da administração tributária, mantém o apoio das conclusões retiradas do relatório, visto que, os argumentos invocados pelo perito (sujeito passivo), não permitiu estabelecer qualquer acordo, não tendo sido apresentados factos susceptíveis de produzir alterações. Os fundamentos da aplicação por métodos indirectos para a tributação em IRS e IVA do exercício acima referido, baseia-se na impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável devido a irregularidade descritas no ponto IV do relatório de inspecção, pretendendo o s.p. que as correcções efectuadas fossem totalmente, anuladas, justificando nada ter recebido. Por tudo isto e não sendo possível estabelecer acordo previsto no art° 92º da LGT o perito da administração tributária considera correctos os pressupostos para a aplicação dos métodos indirectos, mantendo os valores fixados.

Ponderados todos os fundamentos invocados, e dado que houve erro material na fixação, quando a mesma para efeitos de IRS deveria ter sido no valor do € 132.604,89, pelo que concordo com a posição assumida pelo Perito da Administração Tributária, e mantenho o rendimento que deveria ter sido fixado e que agora se fixa para o ano: 2003, nos valores de: € 132.604,89 para IRS e € 1.520,00 para IVA, fixados por métodos indirectos.” (cfr. fls. 46 e 312 dos autos);

Q) Ao Impugnante foi comunicada a decisão a que alude a alínea anterior ofício nº ….., datado de 15/02/2008 (cfr. fls. 45 dos autos);

R) Foi emitida liquidação no montante de 47.066,09 referente a IRS, conforme demonstração de acerto de contas constante de fls. 51 dos autos;

S) Em 13/02/2003, o Impugnante esteve presente como procurador de J….. e mulher M….., na escritura de compra e venda de prédio rústico (cfr. fls. 413 dos autos);

T) Em 28/02/2003, o Impugnante esteve presente na escritura de compra e venda da fracção autónoma designada pelas letras AH, correspondente ao 5º andar, gaveto, no extremo nascente, para habitação, como intérprete de J….. (cfr. fls. 205 dos autos);

U) Em 17/09/2004, o Impugnante esteve presente na escritura de compra e venda do prédio rústico, no sítio de Madeira, freguesia de Salir, concelho de Loulé, como procurador da empresa “B….., Lda” (cfr. fls. 480 dos autos);

V) Em 27/02/2008, foi enviado ao Impugnante por C….., um email relativo à conta-corrente com as empresas B….. e C….. (cfr. fls. 101 dos autos);

W) Por sentença de 4/07/2008 foi homologada a transacção no processo judicial nº 943/08.3TBLLE do Tribunal Judicial de Loulé, entre o Impugnante e a empresa “B….., Lda” (cfr. fls. 275 dos autos);

X) Por sentença de 4/07/2008 foi homologada a transacção no processo judicial nº 943/08.3TBLLE do Tribunal Judicial de Loulé, entre o Impugnante e a empresa “C….., Lda” (cfr. fls. 285 dos autos)”.

II.B. Relativamente aos factos não provados, refere-se na sentença recorrida:

“Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se nos documentos juntos aos autos e nos depoimentos das testemunhas, dos quais resultou o seguinte:

A testemunha A....., em síntese, referiu que:

Houve uma inspecção na área da advocacia, não só ao Impugnante mas a uma centena de colegas do mesmo. Foi feito o levantamento de toda a actividade do Impugnante e do mesmo resultou que em relação a alguns clientes não tinham sido emitidos os respectivos recibos pelos serviços que lhes tinha prestado. O Impugnante foi confrontado com transferências feitas pelos clientes para contas privadas, ao que o mesmo respondeu que não havia adiantamentos dos clientes e que não tinha uma conta afecta à sua actividade. Referiu também que foram feitas várias notificações ao Impugnante para exibir documentos de transferência, registos dessas transferências e registos de despesas que tivessem sido feitos em nome de clientes. Especificamente quanto às transferências do Sr. A….., ao Impugnante foi perguntado se tinha emitido algum recibo. Numa 1ª resposta disse que tinha prestado serviços, mas não lhe tinha cobrado honorários, porque o mesmo tinha mudado de residência, nunca o conseguiu contactar, pelo que nunca teve oportunidade de receber os honorários. Não obstante tal explicação, foi possível contactar um representante do Sr. A….. em Portugal, que se disponibilizou para mostrar todos os documentos do próprio, nomeadamente uma transferência de 2002 e outra de 2003 para o Impugnante para aquisição de um prédio urbano em 2003. Da consulta destes documentos a depoente verificou que o Impugnante tratou da compra de um imóvel e inclusive esteve presente na escritura no dia 28/02/2003, surgindo na declaração de sisa como gestor de negócios e na escritura, como intérprete, o que contraria a alegação que não foi possível contactar o Sr. A…... Só mais tarde, em sede de processo de revisão é que o Impugnante veio reconhecer que tinha recebido a tal quantia. Mais afirmou haver diferenças de valor entre uma transferência de 101.564,24€ e o valor que veio a ser declarado na escritura do tal imóvel. Confirmou que contactou o Impugnante e que o mesmo se justificou juntando dois contratos-promessa onde constava esse valor e afirmando que esse valor incluía o recheio da casa. No entanto, afirmou a depoente que os contratos juntos não estavam assinados e que quer nos contratos - promessa, quer na escritura não havia qualquer referência a aquisição do recheio da casa, apenas existia junto a um dos contratos uma relação de mobiliário mas do qual não contavam valores nem foi mencionada no contrato. Foi confrontada com 2 cheques (doc. 19 e 21) junto à contestação e afirmou que na altura da inspecção não lhe foram exibidos. Explicou ainda outros factos apurados durante a inspecção e que constam do seu relatório e afirmou que não lhe foi mostrada qualquer conta-corrente, bem como, não conseguiu contactar os vários clientes do Impugnante, à altura da inspecção.

A testemunha E….., referiu, em síntese, que:

A área de actividade do Impugnante era a prestação de serviços jurídicos para empresas, em regime de avença, tratava de aquisições de imóveis, redigia os contratos de empreitadas, fazia os pagamentos no âmbito destes contratos. Confirmou também que nunca conseguiram contactar o Sr. A…..; que o Impugnante tinha um contabilista, mas que só começaram a fazer contas correntes com as empresas com que o Impugnante tinha avenças, depois da Inspecção, pois só nessa altura é que souberam que tinham as fazer, bem como, emitir recibos pelos serviços prestados. No que diz respeito às contas-correntes com as empresas referidas no relatório de inspecção, confirmou que após a inspecção foi feita uma correcção por essas empresas com base em documentação que segundo a testemunha havia sido enviado às empresas, tendo inclusive resultado um saldo credor e não devedor como havia sido afirmado no relatório.

A testemunha E….., referiu, em síntese, que:

Adquiriu um imóvel no concelho de Loulé e que pediu àquele para lhe tratar ou do registo ou do pagamento de sisa, já não se recorda, mas sabe que nunca pagou nada por isso, só as despesas e que tal aconteceu em 2003, mas não se lembra em que mês foi.

A testemunha M….., referiu, em síntese, que:

Pediu dinheiro emprestado ao seu patrão, Sr. D….., no valor de 50.000 euros e que esse empréstimo passou pela conta do Impugnante, foi-lhe directamente pago por este. Para garantir a dívida assinou 3 procurações em nome do Impugnante para vender terrenos que tinha. Mais disse que nunca devolveu o dinheiro ao Impugnante. O dinheiro foi entregue à empresa B….., por indicação do Sr. D….., foi metido na conta da empresa. O restante dinheiro foi pago mediante acertos de contas com dinheiros a receber quando saiu da empresa, bem como com uma quota que detinha noutra empresa e uma parte de um terreno seu. Com esse pagamento, livrou-se da dívida. Reafirmou nunca ter pago nada ao Impugnante. Trouxe consigo vários documentos para comprovar o afirmado que foram juntos aos autos a fls. 288 a 295.

A testemunha R….., em síntese, referiu que:

Ajudou o Impugnante a fazer as contas correntes, no fundo, a fazer um trabalho mais profissional. Instruiu a D. E….., a fazer as contas, a fazer os lançamentos nas contas-correntes, a lançar os recibos que ela passou a fazer e faz actualmente.

A testemunha C….., em síntese, referiu que:

Ttrabalhou para uma empresa de contabilidade a partir de 2006 e começou a fazer, a partir dessa altura, a contabilidade das empresas B….. e C…... Solicitou um extracto de conta-corrente ao Impugnante e comparou com a contabilidade da empresa B….. e verificaram que havia divergências por falta de documentos. Contactaram o Impugnante e o Sr. D…..e foram regularizadas as contas – correntes. Não havia nos registos da empresa que o Impugnante lhe tinha enviado documentos, pelo que estavam em falta. O Impugnante alegou que tinha enviado cópias ao que a depoente respondeu que do protocolo da empresa não havia qualquer registo desses documentos pelo que os solicitaram ao Impugnante, que os enviou. Confirmou com o Sr. D….. que tinha sido feito o tal empréstimo de 50.000 euros e verificou apenas que o dinheiro entrou na conta do Impugnante mas não tinha saído e que aquele lhe confirmou que o dinheiro tinha sido entregue ao Sr. M…... Os saldos devedores que a inspecção encontrou existiam porque não havia documentos a suportá-los.

A testemunha F….., em síntese, referiu que:

O Impugnante fazia-lhe pagamentos de facturas em nome da empresa B….., no âmbito de contratos de empreitadas e que os vários montantes em causa foram pagos e apresentados recibos.

A Representante da Fazenda Pública, afirmou que todos os cheques que o Impugnante passou à empresa da testemunha foram considerados justificados, conforme decorre do anexo 9 do relatório, pelo que, tudo o que havia sido justificado pelo mesmo na sequência da inspecção, já tinha sido aceite pela Inspecção Tributária, pelo que o depoimento da testemunha em nada releva.

Do depoimento das testemunhas aqui transposto resultou que a Sra. Inspectora Tributária revelou conhecimento directo dos factos e fez um depoimento claro, conciso e muito credível.

O mesmo aconteceu relativamente ao depoimento de C….. que provou terem sido feitas correcções às contas-correntes das empresas “B….., Lda” e “C….., Lda”.

Já os depoimentos de E….., que é empregada do escritório do Impugnante e E….., amiga do mesmo, contêm algumas contradições, tendo a certeza em relação a certos factos relatados e um profundo desconhecimento de outros que com aqueles estão encadeados, bem como, são contraditados por documentos juntos aos autos.

No que diz respeito ao depoimento da testemunha M….., foi o mesmo pouco claro na explicação do empréstimo que recebeu, tendo junto documentos que trouxe consigo para confirmar o que ia dizendo, nomeadamente uma declaração assinada por si em que declara tudo o que afirmou em audiência.

Finalmente, quanto à testemunha F….., não foi dada relevância ao seu depoimento, porquanto os factos que o Impugnante pretendeu provar já foram aceites pela Administração Tributária e não são objecto de litígio nesta impugnação”.

II.D. Do erro na decisão proferida sobre a matéria de facto alegada pelo 1.º Recorrente

Entende o 1.º Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto, na medida em que não foram especificados os pontos de contradição da testemunha E….., o que desvirtuou a realidade, e não foram ainda tidos em conta elementos documentais diversos (alguns deles considerados pelo Ministério Público em sede de processo de inquérito).

Considerando o disposto no art.º 685.º-B do CPC/1961 (a atentar para efeitos de análise das alegações de recurso, em virtude da data de apresentação das mesmas, correspondendo, em grande medida, ao disposto no art.º 640.º do CPC/2013), a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão[1].

Assim, o regime então vigente relativo à impugnação da decisão atinente à matéria de facto impunha ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 685.º-B, n.º 1, al. a), do CPC/1961, equivalente ao art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC/2013];
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 685.º-B, n.º 1, al. b), do CPC/1961, equivalente ao art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC/2013], sendo de atentar nas exigências constantes dos n.ºs 2 e 4 do mesmo art.º 685.º-B, do CPC/1961.

Especificamente quanto à prova testemunhal, dispunham os n.ºs 2 e 4 do art.º 685.º-B do CPC/1961:

“2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição.

(…) 4 - Quando a gravação da audiência for efetuada através de meio que não permita a identificação precisa e separada dos depoimentos, as partes devem proceder às transcrições previstas nos números anteriores”.

Como tal, não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo­‑se-lhe os ónus já mencionados[2].

Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que tais ónus não foram cumpridos.

Com efeito, desde logo não foram indicados os concretos pontos de facto que o 1.º Recorrente considerou incorretamente julgados (nem mesmo os factos que considera que eventualmente resultam provados). Por outro lado, quanto aos meios probatórios, também se verifica uma insuficiência da alegação, sendo que em relação à prova testemunhal não foram minimamente cumpridas as exigências legalmente prescritas.

Nesse sentido, aliás, já decidiu este TCAS, em situação em tudo similar com a presente, mas atinente ao IVA, em Acórdão de 17.09.2013 (Processo: 05855/12 - inédito).

Como tal, rejeita-se o recurso nesta parte.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Do erro de julgamento no alegado pelo 1.º Recorrente

Considera o 1.º Recorrente que o Tribunal a quo errou no seu julgamento, ao considerar como rendimento o valor de 101.564,24 Eur., relativo a transferência efetuada por J…...

Vejamos.

In casu, atentando no relatório de inspeção tributária (RIT), no qual radica a fundamentação da correção técnica em causa, foram identificadas duas transferências feitas por J….. ao Impugnante (a quem este prestara serviços, mas relativamente a quem não emitira qualquer recibo de honorários), concretamente:
a) Uma transferência no valor de 32.553,84 Eur.;
b) Uma transferência no valor de 101.564,24 Eur.

Do mesmo RIT resulta que, se em relação à primeira das transferências, o Recorrente demonstrou que a mesma se destinara a pagar uma liquidação de Sisa e a efetuar pagamento à sociedade Q….., Lda, quanto à segunda nada é referido nem, por consequência, demonstrado, motivando a correção efetuada.

Em sede de impugnação, o 1.º Recorrente invocou que a transferência foi por conta da compra do apartamento identificado pela fração AH, 5.º andar gaveto, no extremo nascente, para habitação, do prédio urbano denominado “…..”, situado em ….., concelho de Loulé, à empresa M….., Lda, a quem emitiu dois cheques, um de 57.200,00 Eur. e outro de 38.200,00 Eur. Considera ainda que não foi tido em conta o efetivo montante creditado, de 99.878,18 Eur.

Ora, em relação ao valor transferido, o mesmo decorre da aplicação à transferência em libras efetuada da taxa de câmbio respetiva, o que, por mera operação aritmética, perfaz o valor calculado pela administração tributária (AT).

Por outro lado, face à matéria de facto provada (que, relembramos, não foi cabalmente impugnada), não obstante resultar demonstrada a presença do 1.º Recorrente na escritura a que respeita a fração autónoma em causa, na qualidade de intérprete [cfr. facto T)], não ficou provado que o mesmo tenha utilizado o valor transferido para qualquer pagamento.

Também aqui seguimos de perto o já citado Acórdão deste TCAS, de 17.09.2013 (Processo: 05855/12 - inédito), onde se refere a este propósito:

“Quanto a essa mesma verba de € 101.564,24, como se pode colher do relatório da inspecção tributária (…), foi documentalmente comprovada a sua efectiva transferência para a conta privada do impugnante, entre outra efectuada pelo mesmo J….., que quando lhe foram solicitados esclarecimentos, o mesmo nada referiu acerca do seu recebimento e nem dos pagamentos que por conta de tal valor efectuou, sobre que não passou qualquer recibo, nem mesmo a título de provisão, adiantamento ou reembolso de despesas, tendo a sentença recorrida entendido e decidido que o mesmo não fez a prova relativa à utilização de tal montante na compra de tal apartamento em nome e por conta do mesmo cliente, sendo que o valor do preço declarado e da sisa é inferior a tal montante e não justificou tal diferença de valores, onde não passou qualquer recibo, bem como não justificou, como invocara, que não cobrara quaisquer honorários a tal cliente.

Em sede do presente recurso continua, o mesmo a esgrimir, desde logo, que tal montante é apenas de € 99.8 78, 18 que não daquele montante, o que não vale mais do que uma sua mera invocação face à matéria constante em tal relatório e não infirmada qualquer outra, já que se trata da transferência relativa a 20-2-2003, de 68.500 libras, que então à taxa de câmbio de 0,67445 perfaz aquele montante, que não de qualquer uma outra transferência do mesmo cliente, bem como os montantes pagos por conta deste cliente o tenham sido por conta desta importância, cujos montantes são, também, de menor montante que o daquela transferência, onde não emitiu qualquer recibo, nem pela respectiva diferença, como lhe cabia, nos termos do disposto.nos art.°s 2.°, n.° 1, alinea a) e 125.° e 116.° do CIRS, pelo que tal importância só lhe pode ser imputada a titulo de rendimento para 2003, recebida como foi em 2002, por força da provisão ou adiantamento para tal prestação de serviços a cal cliente.

Também não pode deixar de ser irrelevante para a decisão do presente pleito, outras possíveis transferências do mesmo cliente a favor do ora recorrente e aqui não em causa, designadamente as invocadas na matéria da sua conclusão c), onde logo deveria o mesmo ter observado que dessas aí invocadas, nenhuma se reporta a de 20-2-2003, daquele montante de € 101.564,24, que efectivamente constitui a aqui em causa nos presentes autos, como igualmente bem se decidiu na sentença recorrida, não sendo merecedora da censura que o recorrente lhe assaca e devendo ser confirmada com a improcedência de toda a matéria das conclusões das alegações recursivas”.

Face ao exposto, não assiste razão ao 1.º Recorrente.

III.B. Do erro de julgamento suscitado pela 2.ª Recorrente

Por seu turno, a 2.ª Recorrente que considera que errou o Tribunal a quo, no julgamento que fez, concernente às correções atinentes às sociedades B….., Lda e a C….., Lda, na medida em que as mesmas apresentaram saldos devedores na conta 267 de valores superiores às despesas efetuadas ou apresentadas por conta e em nome das mesmas empresas, nunca tendo sido apresentados comprovativos que justificassem tais valores enquanto despesas. Entende ainda que das transações efetuadas entre o Impugnante e as duas sociedades em causa não se pode extrair a consequência extraída pelo Tribunal a quo.

Apreciando.

Também sobre esta questão já se pronunciou este TCAS, no já mencionado Acórdão de 17.09.2013 (Processo: 05855/12 - inédito), onde se refere:

“Como se não coloca em causa, o ora recorrido, em 2002/2003, tinha um contrato de avença mensal com cada uma das referidas empresas, cujas contas correntes no final do 2002, apresentavam tais montantes de saldos devedores, tendo as mesmas, para tanto notificadas, apenas justificado parte dos mesmos com os respectivos documentos do suporte, mas tendo, já no ano de 2008, havido transacção, homologada judicialmente, entre o impugnante e a empresa B….., Lda e extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, relativamente à C….. Lda, nesta por ter havido acordo extra-judicial  - cfr. matéria das alíneas V) e W) do probatório firmado na sentença recorrida e docs. de fls 274 a 284 dos autos - tendo a M. Juiz do tribunal "a quo", acrescentado ainda, na fundamentação do assim decidido, que pela prova testemunhal foi provado que as contas correntes com as empresas "B….., Lda" o "C…..,L da", se encontram regularizadas e inclusive o Impugnante tem um saldo credor sobre as mesmas, deve a liquidação de IVA ser anulada e corrigida tendo em conta este facto, só que dos autos, do probatório firmado na sentença recorrida, não vimos rasto de tal matéria ter sido dado como provada, e muito menos que esses novos e posteriores saldos apurados, resultassem da apresentação dos respectivos documentos de suporte, entretanto carreados para as mesmas.

(…).

Resta a transacção que, nos termos do disposto nos art. °s 1248.º a 1250.° do Código Civil, constitui um contrato especialmente previsto no mesmo Código - cfr. seu Título II - bem como o acordo extra-judicial firmado com a segunda daquelas empresas, que, após homologação Judicial, findaram o litigio com o impugnante, ou seja, tudo actos que apenas vinculam as partes outorgantes, dentro do âmbito da liberdade contratual e no âmbito dos seus direitos disponíveis, sobre os quais podem livremente confessar, desistir ou transigir, nos termos do disposto nos art.°s 354.° do Código Civil e 299.° do CPC, que também apenas vinculam as partes outorgantes, nos termos do disposto nos art.°s 405.º e 406.° do mesmo Código, que não a AT, que neles não foi parte e nem neles interveio de qualquer forma, pelo que o respectivo conteúdo lhe não pode ser oponível (…).

Em suma, o ora recorrido não logrou provar que os saldos para si devedores (…) com as referidas empresas avençadas, se não mostrassem correctamente apurados, tal como foi apurado pela fiscalização tributária, e que existiam os adequados documentos de suporte que fundaram as posteriores correcções aos mesmos efectuados, como invocara, pelo que também nesta parte a impugnação judicial tem de improceder, já que na falta de tal documentação de suporte, tais provisões ou adiantamentos são consideradas receitas no ano posterior ao da sua recepção, nos termos do disposto no art.º 116.°, n.° 1, alínea b) e n.°4, alínea b) do CIRS, desta forma improcedendo a impugnação judicial…”.

Aderindo a este entendimento, decorre que o Impugnante não logrou provar que os valores em causa tenham respeitado a quaisquer pagamento de aquisições efetuadas pelos referidos intervenientes, como alegara na sua petição inicial, não sendo a prova produzida suficiente (mesmo aquela para que remete a sentença, que se limita a extratos de conta, cujos documentos de suporte não foram apresentados) para se poder concluir nos termos invocados pelo Impugnante e não tendo as transações homologadas a consequência extraída pelo Tribunal a quo, nos termos já decididos por este TCAS e transcritos supra, motivo pelo qual assiste razão à 2.ª Recorrente.

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:
a) Negar provimento ao recurso interposto por O…..;
b) Conceder provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública e, em consequência, revogar a decisão recorrida, na parte relativa a correções técnicas, atinentes às sociedades B….., Lda e a C….., Lda., mantendo, em consequência, as liquidações nessa parte;
c) Custas em ambos os recursos e em ambas as instâncias por O…..;
d) Registe e notifique.


Lisboa, 11 de fevereiro de 2021


[A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores António Patkoczy e Vital Lopes]

Tânia Meireles da Cunha

_______________________
[1] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Ed., Almedina, Coimbra, 2018, p. 169.
[2] V., a título exemplificativo, o Acórdão deste TCAS, de 27.04.2017 (Processo: 638/09.0BESNT) e ampla doutrina e jurisprudência no mesmo mencionada.