Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1767/08.3BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:02/11/2021
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO.
NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO.
ÓNUS DA PROVA.
Sumário:Declarada a falsidade dos documentos aduzidos como prova das notificações em causa cabe à exequente aduzir ulterior e diferente prova da efectividade de tais notificações que não se resuma a meros registos internos.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I- Relatório

J...... veio deduzir oposição ao processo de execução fiscal n.º .......... e apensos, instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa-14, para cobrança coerciva de dívidas de IVA, referentes aos seguintes anos e períodos: 0012T, 0009T, 0006T, 0003T, 9912T, 9909T, 9906T, 9903T, 9812T, 9809T, 9806T, e 9830T 3, perfazendo a quantia exequenda o valor global de € 4.489,20 (quatro mil, quatrocentos e oitenta e nove euros e vinte cêntimos).

O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls. 483 e ss. (numeração SITAF), datada de 14 de Março de 2020, julgou a presente acção procedente.

A Fazenda Pública interpôs recurso contra a sentença. Nas alegações de fls. 499 e ss. (numeração do SITAF), a recorrente formulou as conclusões seguintes: // «(…)

B. Especificando, a sentença em crise, em resposta à alegação de caducidade do direito de liquidação feita pelo oponente, considerou que a AT não conseguiu provar que notificou o oponente, concluindo que as presentes liquidações são ineficazes, nos termos da alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.

C. Com o devido respeito e salvo melhor opinião, a Fazenda Pública entende que o Ilustre Tribunal, ao considerar que a Fazenda Pública não faz prova material das notificações realizadas, quando as mesmas constam nos autos, em fls. 71 a 131, incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, na medida em que decorre do probatório designado, a regularidade das notificações das liquidações de IVA em crise e que não foram consideradas na douta decisão.

D. Resulta da prova junta pela Fazenda Pública, contante dos autos a fls. 75 a 131, que as liquidações de IVA foram notificadas ao Oponente, nos termos do artigo 39.º, nºs 1 e 5 do CPPT, pois, não tendo sido levantadas as cartas registadas, enviadas para o domicílio fiscal do oponente, foram enviadas novas cartas, nos mesmos termos, para o mesmo domicílio.

E .Estabelece o disposto no n.º 5 do artigo 39.º do CPPT:  "Em caso de o aviso de recepção ser devolvido ou não vier assinado por o destinatário se ter recusado a recebê-lo ou não o ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal, a notificação será efectuada nos 15 dias seguintes à devolução por nova carta registada com aviso de receção, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada, sem prejuízo de o notificando poder provar justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação da mudança de residência no prazo legal".

F. Assim sendo, todas as notificações remetidas pela administração fiscal, em nome do oponente e para o domicílio fiscal daquele, na Rua………….., …….. Lisboa, foram enviadas devidamente, não sendo oponível à administração fiscal o facto alegado de que o oponente as não receber.

G. Quer seja pelo facto de não as ter levantado nos Serviços Postais, quer seja por se ter recusado a recebê-las.

H. Conclui-se, pois, que no caso concreto, a alegada falta de prova da notificação dentro

do prazo de caducidade, constante no artigo 45.º, n.º 1, do CPPT, não se verifica, uma vez que a prova junta pela RFP é manifestamente suficiente para conferir ao douto tribunal a certeza de que a mesma foi efetivamente realizada.

I. Face ao exposto, com o devido respeito, a douta sentença ora recorrida, a manter-se na ordem jurídica, é convencimento da Fazenda Pública que incorreu em erro de julgamento, uma vez que a prova junta aos autos é suficiente para conferir ao douto tribunal a certeza de que a notificação das liquidações em causa foi efetivamente realizada.

J. Ora, com base no teor nos documentos do processo de execução fiscal que se encontra

junto aos presentes autos, designadamente a fls. 75 a 131 do mesmo, obtidos através da remessa do Serviço de Finanças de Lisboa 14, e efetuadas pela Direção de Serviços do IVA, resultam demonstrados os seguintes factos: foram emitidas as liquidação de IVA n.ºs 03014768M,03014769M,03014770M, 03014771M,03014764M,03014765M, 03014766M, 03014767M, 03014760M, 03014761M, 03014762M e 03014763M, em que é sujeito passivo o oponente, com o contribuinte n.º 101604041, tendo as notificações destes atos de liquidação sido remetidas para o domicílio fiscal do sujeito passivo através de correio postal registado, a que foram atribuídos os registos dos CTT n.º R…………, R……………, R…………, R…………, R…………., R………….., R…………., R……………, R…………., R…………., R……….. e R………, tendo as referidas notificações sido devolvidas em 30/01/2003, foram novamente remetidas em 25/03/2003, através do registo R……….., tendo o mesmo sido devolvido em 27/05/2003, com a mesma menção, pelo que após confirmação da morada fiscal foram remetidas as terceiras vias, através do ofícios 4451 e 4462 e do registo postal R………….., novamente devolvidas em 27/06/2003, tendo nos termos do n.º 5 do artigo 39.º do CPPT, consideradas notificadas nessa data.

K. Por outro lado, com o devido respeito e salvo melhor opinião, a douta Sentença proferida pelo Tribunal “a quo” padece de erro de julgamento da matéria de direito, por violação das disposições legais dos artigos 36.º, 38.º, 39.º e 43.º todos do CPPT, artigo 19.º, 74.º, 77.º todos da LGT, e ainda do artigo 342.º, 344.º e 350.º todos do Código Civil.

L. Com a devida vénia, estamos em manifesto desacordo com o entendimento do Ilustre Tribunal de primeira instância, pois que os documentos que se encontram juntos aos autos, a que supra aludimos nas alegações de recurso da matéria de facto, são idóneos para demonstrar que não só existe correspondência entre os atos de liquidação de IVA e os atos de notificação a que os referidos documentos fazem alusão e os registos postais respetivos, como também provam, sem margens para dúvidas, que as notificações dos atos de liquidação foram efetuadas através de correio postal registado, foram remetidos ao sujeito passivo dos atos de liquidação, naturalmente para o seu domicílio fiscal e devolvidos mas que cumprem a presunção legal do n.º 5 do artigo 39.º do CPPT.

M. A informação oficial efetuada pela administração fiscal possui força probatória bastante quanto aos factos nela afirmados como tendo sido praticados pela Administração Tributária (vide n.º 1 do art. 371.º do Código Civil).

N. Assim, ainda que se admita a não exigência da prova em contrário dos factos vertidos na referida informação oficial, sempre teria a ora recorrida de carrear aos autos elementos de prova, de todos os meios gerais de prova admitidos legalmente, suscetíveis de causar a dúvida sobre a veracidade dos factos demonstrados pela Administração Tributária, o que não diligenciou por fazer, limitando-se a alegar no libelo inicial que não foi notificada dos actos de liquidação (vide artigo 346.º do Código Civil).

O. Por outro lado, não se poderá olvidar que os documentos constantes a fls. 75 a 131 dos autos executivos, têm a força probatória dos seus originais, apenas podendo a sua força probatória ser invalidade ou modificada por confronto com os originais (vide n.º 2 do art. 76.º da LGT e artigos 383.º, 385.º e 387.º, todos do Código Civil).

P. Assim, e contrariamente ao que Ilustre Tribunal “a quo” entende, a nosso ver, nos autos de primeira instância encontra-se demonstrado que as notificações a que aludimos supra foram efetuadas nos termos legais, encontram-se reunidas as condições para que a presunção de notificação prevista no n.º 5 do artigo 39.º do CPPT possa operar.

Q. Quem tem a seu favor uma presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz (artigo 350.º, n.º 1, do CC), apenas tem de provar o facto que lhe serve de base, de acordo com as regras gerais do ónus da prova, artigo 74.º, n.º 1, da LGT, o que a Administração Tributária logrou fazer no caso concreto.

R. Destarte, e em conformidade com os factos que deverão ser considerados provados nos presentes autos, bem como considerando as disposições legais supra mencionados, atento o teor dos documentos que se encontram juntos aos autos, há que presumir que o sujeito passivo foi devidamente notificado dos atos de liquidação, ficando, assim, o recorrido com o ónus de provar o justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação da mudança de residência no prazo legal, o que não logrou fazer, por não juntarem aos autos de primeira instância qualquer meio de prova nesse sentido.


*

O recorrido, devidamente notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações.
X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, notificado para o efeito, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.


X


Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.


X


II- Fundamentação.

2.1. De Facto.

A sentença recorrida considerou provados os factos seguintes:

«1) Em 18.10.2003, foram emitidas pelo serviço de finanças de Lisboa-14, certidões de dívida de IVA, referentes aos seguintes anos e períodos: 0012T, 0009T, 0006T, 0003T, 9912T, 9909T, 9906T, 9903T, 9812T, 9809T, 9806T, e 9830T, cujas datas de pagamento voluntario haviam terminado a 25.09.2003, sendo devedor o ora Oponente J......, e destinando-se as certidões em apreço à respetiva cobrança coerciva em sede de processo de execução fiscal, perfazendo a quantia exequenda o valor global de € 4.489,20 (quatro mil, quatrocentos e oitenta e nove euros e vinte cêntimos) - cf. certidões de dívida juntas de fls. 9 e segs. dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos.

2) Em 29.07.2008, foi o ora Oponente regularmente citado para os termos do processo de execução fiscal n.º .......... e apensos, contra si instaurados para cobrança coerciva da quantia exequenda descrita na alínea antecedente - ofício de citação de fls. 47 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido para todos os legais.

3) Notificada a Fazenda Pública, para, fazer prova perante este Tribunal das notificações postas em causa, veio por requerimento de fls.477 do SITAF (16-012020, 15:19:57) dizer:

Exma. Juiz de Direito do Tribunal Tributário de Lisboa

Tribunal Tributário de Lisboa

Vem a representante da Fazenda Pública, notificada para se pronunciar sobre a materialidade das (alegadas) notificações, dizer que, as mesmas constam nos presentes autos, em fls. 71 a 131, tendo sido efetivamente juntas em 07/05/2003, constando na fl. 74, a referência de todas as notificações efetuadas ao Oponente. Note-se que primeiramente foram remetidas notificações pelos serviços do IVA, com a indicação de todos os números dos registos dados pelos CTT e referindo que foram devolvidas em 30/01/2003, com a menção “Remetente-Não Reclamado” (cfr, fls. 34 a 57). Sendo visível o carimbo dos CTT dos Olivais Sul, com data de 2003.01.30. Trata- se de uma entidade terceira e legitima, pelo que terá, consequentemente, de considerar-se que foram autenticamente efetuadas, para a morada designada pelo Oponente, no seu cadastro fiscal (fls. 15 a 19).

Foram, também, remetidas novamente outras notificações das liquidações de IVA sindicadas, pelo serviço de finanças de Lisboa 14, através dos Correios de Portugal (CTT), sendo passível de asseverar nas fls. 20 a 33 a sua veracidade, bastando analisar os documentos juntos, assim considerando que consta o aviso de receção, carimbado pela estação dos CTT, dos Olivais Sul, com data de 2003.05.27, juntamente com os ofícios datados de 2003.05.23, sendo de observar que se tratam de documentos autênticos, porquanto tiveram não só a intervenção da administração fiscal, como de uma entidade externa que deixou a sua marca respetivamente à data da devolução, novamente com a indicação de “Remetente-Não reclamado”.

Nesta senda, foi o serviço de finanças verificar, se haveria sido efetuada alguma alteração do domicílio fiscal do Oponente, tendo-se apurado, conforme cadastro junto de fls. 15 a 19, que a morada fiscal estava correta e se mantinha inalterada.

Por ultimo infere o referido oficio, que foram remetidas novamente e pela terceira vez, as referidas notificações das liquidações de IVA sindicadas, constando uma indicação do carteiro por escrito com a indicação “não atendeu 12/6/3 às 10:05” e correspondendo o carimbo dos CTT, com data de 2003.06.27 indicando os ofícios n.º 4451 a 4462, portanto, mais uma vez cabe indagar que não se trata de uma operação meramente interna, tendo tido a intervenção de uma entidade externa, que deixou bem clarificado qual o motivo pelo qual obstou à respetiva entrega.

Ora como muito bem está indicado no ofício do serviço de finanças in fine, notoriamente tem que se considerar o Oponente devidamente notificado das liquidações, nos termos do n.º 5 do artigo 39.º do CPPT.

Assim nos explica o douto parecer do Ministério Público, de 01/03/2018, o qual reiteramos:

 “Compulsados os autos verifica-se que a FLS 74 se referem todas as notificações das liquidações em causa que foram devolvidas por não serem reclamadas, sendo repetidas e devolvidas em 27 Maio 2003 com a mesma menção e depois de confirmação do domicílio fiscal foram remetidas de novo / 3a via / sendo igualmente devolvidas.

Em 27 Junho 2003 consideraram as notificações realizadas.

O cadastro do contribuinte inclui o DOMICÍLIO FISCAL v.g. FLS 90 com a morada onde se realizaram todas as notificações e o carteiro fez constar que o destinatário não atendeu sendo passado AVISO.

Mais consta que foi arguida A FALTA DE GENUINIDADE DOS DOCUMENTOS e que a AT notificada nos termos do ART 548º N 1 CÓD. PROC. CIVIL nada requereu.

Assim releva apenas a forma e tendo em conta a Jurisprudência do STA “A existência de irregularidades da notificação (que não as previstas no n.º 9 do artigo 39º do CPPT, pois estas consubstanciando nulidades da notificação tornam esta absolutamente irrelevante para assegurar a eficácia do acto notificado) não constitui fundamento de oposição à execução fiscal enquadrável na alínea i) do nº1 do artigo 204º do CPPT. “

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: 0611/09 // Data do Acórdão: 16-09-2009 // Tribunal: 2 SECÇÃO // Consequentemente a presente OPOSIÇÃO é totalmente improcedente por falta de fundamento legal. “ // (negrito e sublinhados nossos). // Pelo que tendo em conta os princípios fundamentais e enformadores do processo tributário, tal como o princípio do inquisitório, previsto no artigo 99.º da LGT, que tem como escopo a descoberta da verdade material, neste caso em concreto com certeza logrará considerar que as notificações foram validamente realizadas, nos termos do artigo 39.º, n.º 1 e n.º 5 do CPPT, conforme prova material efetuada nos presentes autos. // P.E.D. // A representante da Fazenda Pública // (Despacho n.º 2247/2019 - D.R - 2.ª série -n.º 50 – 12.03.2019) // Ana Morais

4) A presente oposição foi apresentada em 29.09.2008, no respetivo serviço de finanças - carimbo aposto a fls. 3 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

FACTOS NÃO PROVADOS:

1 - Que o ora Oponente tivesse sido regularmente notificado das liquidações dos tributos, subjacentes à quantia exequenda, no respetivo prazo de caducidade.

MOTIVAÇÃO DO TRIBUNAL

Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados, na análise dos documentos juntos aos autos, supra ids., a propósito de cada uma das alíneas do probatório, cujo conteúdo não foi impugnado pelas partes. // O Oponente notificada da contestação, nada disse ou requereu. // Oficiosamente foi determinada a notificação do órgão da execução fiscal para proceder à junção aos autos de documento comprovativo da notificação da liquidação em causa nos autos. // Foram juntos aos autos impressão de documento denominado «detalhes de cobrança» da liquidação exequenda retirado da base de dados em uso na Administração Fiscal donde consta a data de registo postal CTT.»


X

Compulsados os autos, impõe-se eliminar o facto não provado, por ser conclusivo.

X

2.2. De Direito

2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento sobre o enquadramento jurídico da causa em que incorreu a sentença recorrida.

2.2.2. A sentença julgou procedente a oposição, com base na asserção de que a AT não logrou provar a notificação dos tributos, subjacentes à dívida exequenda.

Para tanto, a sentença estruturou, em síntese, a argumentação seguinte.
«No caso dos autos, alega o Oponente que apenas teve conhecimento das liquidações exequendas com a citação no PEF. // A única prova que consta dos autos é um documento extraído da base de dados em uso pela Administração Tributária, denominado «print» que refere o n.º do registo postal e o comprovativo do registo coletivo, dos quais não pode retirar-se a prova inequívoca de que o Oponente foi notificado das liquidações cuja cobrança coerciva constitui o objeto do PEF. // Não existindo a prova da receção da notificação, é inócua a prova da sua remessa, por não constituir prova da sua receção, que associada à informação oficial a que se fez alusão supra, impõe a conclusão de que a Administração Tributária não fez prova de que tal notificação teve lugar e assim sendo, a dívida é inexigível. // Nos termos do artigo 204.º, n.º 1 alínea i) do CPPT, e nos do artigo 286.º, n.º 1 do CPT, aplicável por força do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, a inexigibilidade da dívida constitui fundamento de oposição que, assim, será considerada procedente, julgando-se prejudicada a apreciação das demais questões invocadas pelo Oponente. // Pelos motivos supra referidos, não fez a Fazenda Pública, mesmo depois da notificação efetuada por este Tribunal (cf. douto Acórdão), para, fazer prova da notificação das liquidações em causa, qualquer prova adicional, à já existente no processo, da realização e regularidade da notificação das liquidações que estão na génese da dívida exequenda (requerimento de fls.477 do SITAF)».

2.2.2. A recorrente coloca sob censura o veredicto que fez vencimento na instância. Alega, em síntese, que: «o Ilustre Tribunal, ao considerar que a Fazenda Pública não faz prova material das notificações realizadas, quando as mesmas constam nos autos, em fls. 71 a 131, incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, na medida em que corre do probatório designado, a regularidade das notificações das liquidações de IVA em crise e que não foram consideradas na douta decisão. // Resulta da prova junta pela Fazenda Pública, contante dos autos a fls. 75 a 131, que as liquidações de IVA foram notificadas ao Oponente, nos termos do artigo 39.º, nºs 1 e 5 do CPPT, pois, não tendo sido levantadas as cartas registadas, enviadas para o domicílio fiscal do oponente, foram enviadas novas cartas, nos mesmos termos, para o mesmo domicilio».

Apreciação.

Na sequência de recurso jurisdicional interposto pela Fazenda Pública contra o despacho proferido pelo tribunal recorrido, por meio do qual foi determinada a não atendibilidade dos documentos juntos a fls. 75 a 131, dos autos, o TCAS proferiu acórdão, em 19/12/2018. No aresto foi concedido provimento ao recurso e foi determinada a revogação do despacho recorrido, mantendo a inatendibilidade dos documentos juntos com a contestação, com a consequente anulação do processado subsequente, devendo os autos baixar à instância com vista à prolacção de sentença.

A fundamentação do acórdão em apreço é, em síntese, a seguinte:
«A efectividade das notificações dos actos tributários questionados é questão essencial ao presente litígio, cuja falta de certeza sobre a sua ocorrência não permite formar uma convicção segura sobre o bem fundado da pretensão extintiva da execução em exame. Ou seja, a preclusão associada à falta de resposta do apresentante dos documentos ao incidente de falsidade não pode dispensar o tribunal do dever de aferir da efectividade das notificações em causa, cuja alegação corresponde à contestação da posição assumida pelo oponente/recorrido na petição inicial de oposição. // A preclusão da atendibilidade dos documentos, associada à falta de resposta da requerida, ora recorrente, no âmbito do incidente de falsidade, não pode significar a dispensa do tribunal de aferir da verdade material das notificações em causa, em nome do princípio do inquisitório, a que o mesmo está sujeito (artigo 114.º do CPPT). // No caso, impõe-se a realização de ulteriores diligências a determinar pelo tribunal, com vista a aferir da materialidade das notificações, cerne do litígio subjacente à oposição à execução fiscal. // Ao julgar em sentido discrepante, o despacho recorrido deve ser revogado, com a consequente anulação do processado subsequente, bem como sentença em conformidade».

O tribunal recorrido observou as determinações do aresto citado (V. fundamentação da matéria de facto assente). Sem embargo, a dúvida sobre a efectividade e regularidade das notificações permanece por resolver. A recorrente considera que tal dúvida foi suprida através dos documentos de fls. 71 a 131. Mas, salvo o devido respeito, não tem razão. Os documentos em causa correspondem a cópias de registos postais sobre os quais incide decisão judicial positiva que acolheu a arguida falsidade das mesmas, a qual foi mantida pelo acórdão citado. Neste quadro, cabia à recorrente fazer a prova da efectividade e da regularidade das notificações em causa, sem remeter para as cópias dos registos referidas. O que não foi feito, como se refere na sentença recorrida.

No que respeita ao ónus da prova da efectividade das notificações, cumpre reiterar a jurisprudência fiscal assente, nos termos da qual,
i) «Por força do disposto no artigo 74º da LGT, cabia à Administração o ónus da prova da notificação da liquidação, ónus este que, de todo, in casu, não foi cumprido, uma vez que a Administração não juntou aos autos o registo comprovativo do envio da liquidação para o domicílio fiscal do sujeito passivo (tão-pouco um registo colectivo ou o aviso de recepção, se foi utilizado), antes se limitando a juntar prints informativos. // Tais prints não podem deixar de ser considerados como documentos internos elaborados pela própria Administração, para efeitos internos, não oponíveis à executada»[1].
ii) «É a administração tributária que tem o ónus de demonstrar que efectuou a notificação de forma correcta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais; // O «recibo de aceitação» e o «recibo de entrega» da carta registada pelos serviços postais, previstos nos nºs 2 e 4 do artigo 28º do Regulamento do Serviço Público de Correios são documentos idóneos para provar que a carta foi registada, remetida e colocada ao alcance do destinatário»[2].
No caso, não foram juntos elementos que comprovem a efectividade e a regularidade das notificações em causa.

Em face do exposto e atendendo a que dos elementos coligidos nos autos não resulta demonstrada a efectividade das notificações em presença, impõe-se decidir pela procedência da oposição com base na falta de exigibilidade da dívida exequenda. Como se determinou na sentença recorrida, a qual deve ser mantida na ordem jurídica, dado que não incorre no erro que lhe é assacado.

Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.


Dispositivo

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Registe.

Notifique.

[O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Desembargadoras Lurdes Toscano e Maria Cardoso]


(Jorge Cortês)


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[1] Acórdão do TCAN, de 12/04/2013, P. 01727/07.1BEPRT

[2] Acórdão do TCAS, de 18-04-2018, P. 628/10.0BELRA