Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09592/16
Secção:CT
Data do Acordão:06/09/2016
Relator:BÁRBARA TAVARES TELES
Descritores:RESTITUIÇÃO DAS PENHORAS EM PROCESSO EXECUTIVO AO SÍNDICO DA INSOLVÊNCIA NOS TERMOS DO REGULAMENTO COMUNITÁRIO 1346/2000
Sumário:As normas do Regulamento 1346/2000 determinam que, por um lado que seja imediatamente reconhecida no nosso território a decisão que declarou a insolvência da Recorrida e que a mesma produz, no nosso ordenamento jurídico, os mesmos efeitos que tem em território nacional (artigo 16, 17º), e por outro que qualquer credor que, após a abertura de um processo de insolvência obtiver por qualquer meio, nomeadamente com carácter executório, satisfação total ou parcial do seu crédito com base nos bens do devedor situados no território de outro Estado-Membro, deve restituir ao síndico o que tiver obtido. A norma do ordenamento jurídico interno, por seu lado, prevê que a declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:A FAZENDA PÚBLICA, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que julgou procedente a Reclamação de Actos do Órgão de Execução Fiscal interposta pelos Administradores da Massa Falimentar da sociedade D… contra o despacho de 25-07-2013 proferido pelo Subdiretor-Geral da AT com incidência nos processos de execução fiscal n.os e apensos, , , e , instaurados pelo Serviço de Finanças de contra a Reclamante por dívidas de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), veio dela interpor o presente recurso jurisdicional.

A Recorrente termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

I. Vem a Reclamante apresentar nos termos do artigo 276.º do CPPT, reclamação judicial do despacho do Subdiretor-Geral da Autoridade Tributária, alegando que a executada foi declarada insolvente pelo Tribunal da Holanda em 28-07-2008, pelo que o produto das penhoras efectuadas pelo Serviço de Finanças de , ao seu cliente Industria, deve ser restituído aos síndicos da executada, nos termos do artigo 20.º do Regulamento (CE) n.º 1346/2000 do Conselho de 29/05/2000 e ao abrigo do n.º 1 do artigo 80.º do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas.
II. Da leitura da sentença recorrida constata-se que a mesma padece de erro de julgamento, precisamente por não abarcar na sua conclusão, a falta de comunicação/citação nos termos do artigo 40.º, por parte dos síndicos ao Serviço de Finanças de
III. e a falta de publicidade do processo de insolvência nos termos do artigo 21.º no território nacional de forma tornar eficaz e a cominar materialmente os efeitos da declaração de insolvência, ambos do Regulamento (CE) n.º 1346/2000, do Conselho de 29/05/2000.
IV. Por outro lado e conforme se constata nos anexos juntos à presente reclamação, a procuração que legitima o mandatário a representar os síndicos da executada, foi registada em 04/12/2013, nos termos da portaria 657-B/2006 de 29/06 e conforme documento 6, e entregue no Serviço de Finanças de em 06/12/2013, pelo que não seria possível constar na documentação analisada e que teve como base o despacho que foi proferido em 25/07/2013, não sendo descabido que o despacho reclamado tenha indicado existir a excepção de ilegitimidade, ao contrário do que consta na douta sentença.
V. Sobre a matéria dos presentes autos, confirmam os factos, que os síndicos apenas informaram o Serviço de Finanças da respectiva declaração de insolvência (de 28/07/2008 e que foi publicada no Diário do Estado Neerlandês em 01/08/2008) em 18/12/2009 (documento 5 da PI).
VI. Ora como se verificam as penhoras, junto da cliente Industria, foram efectuadas entre 05-09-2008 e 07-11-2008 e aplicadas de imediato nos processos de execução fiscal, significando que os síndicos quando solicitaram a respectiva suspensão dos processos de execução fiscal, parte destes já estariam pagos
VII. Pelo que os montantes em causa identificados nas alíneas H), I), J), L), N) e P) no valor de €468.574,97 devem ser mantidos por não padecerem de qualquer ilegalidade.
VIII. Aliás, como referido até à presente data não existiu qualquer citação por parte dos síndicos ao Serviço de Finanças de para o processo de insolvência a correr no Tribunal do Distrito de Arhnem na Holanda, tendo sido entregue o documento n.º 5 anexo à PI que não cumpre os requisitos prescritos no artigo 40.º do Regulamento n.º 1346/2000 e portanto não podendo ser considerada como a citação para a apresentação da reclamação da certidão das dívidas à Fazenda Pública, por parte da executada.
IX. Nesta sequência afere também o Regulamento n.º 1346/2000 no n.º 1 do artigo 21.º (com a epígrafe Publicidade) o seguinte: ”O síndico pode solicitar que o conteúdo essencial da decisão de abertura do processo de insolvência, bem como, se for caso disso, da decisão que o nomeia, seja publicado em todos os demais Estados-Membros, de acordo com as normas de publicação previstas nesse Estado. As medidas de publicidade devem, além disso, identificar o síndico designado e indicar se a regra de competência aplicada é a do n.º 1 ou a do n.º 2 do artigo 3.º”
X. Na verdade desconhecemos se houveram medidas adoptadas pelos síndicos para publicitar a insolvência da D, no território português.
XI. O carácter universal do processo de insolvência comunitário implica que os credores do insolvente com residência noutro Estado–Membro tenham o direito de reclamar os seus créditos por escrito no processo de insolvência artigo 39.º do Regulamento.
XII. Pelo que a falta desta citação deve obstar à restituição das referidas verbas e à improcedência do desiderato propugnado na reclamação.
XIII. Além do mais acresce o facto de que conforme despacho reclamado a emitir parecer que deveriam ser reclamados os créditos, não obstante a falta de comunicação do síndico, a certidão das dívidas constante nos autos foram enviadas aos síndicos e devolvidas novamente ao Serviço de Finanças , não existindo qualquer reclamação por parte da administração fiscal no processo de insolvência.
XIV. Nesta conformidade e apesar dos efeitos consignados do reconhecimento imediato e automático por todos os Estados-Membros, existem razões de facto que obstam aos efeitos proclamados na declaração de insolvência, por falta de conhecimento e portanto de serem ineficazes, nomeadamente a convocação a dirigir ao credor na qual devem constar os prazos a observar na reclamação e que nunca se verificou até à presente data.
XV. Deste modo, e salvo o devido respeito não tendo os síndicos tomado as devidas providências que cabem ao administrador da insolvência, não deverá ser lesada a administração fiscal.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser substituída por Acórdão que declare a Reclamação improcedente.
PORÉM V. EX.AS, DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA”

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A Recorrida apresentou contra-alegações, tendo expendido o seguinte quadro conclusivo:

A. Estando em causa recurso sobre a matéria de facto, nos termos do disposto no artigo 640.° do Código de Processo Civil ("CPC"), aplicável ex vi artigo 2.º alínea e) e 281.º, ambos, do CPPT, impende sobre a Recorrente um ónus rigoroso da impugnação da matéria de facto.
B. Da análise das Alegações de Recurso apresentadas, conclui-se que foi incumprido o ónus de impugnação nos termos previstos no artigo 640.º do CPC, dado que é invocada uma (alegada) devolução das "certidões de dívida" (vide, fls. 2 das Alegações de Recurso e ponto 11 das Alegações de Recurso).
Porém,
C. Não é questionado qualquer elemento de prova produzido no processo, nem é apresentado qualquer outro meio probatório, por referência ao facto superveniente invocado, que permita extrair tal conclusão (devolução das certidões de dívida).
Sem conceder,
D. Vem a Fazenda Pública, apenas, em sede de Recurso questionar a "(...) falta de mandato para solicitar quer a suspensão dos processos de execução fiscal, quer o reembolso dos montantes penhorados (..,)" (vide, ponto 2 das Alegações de Recurso), porquanto "(...) o pedido sobre o qual foi emitido o despacho ora reclamado de 25/07/2013, considerando o documento 6 que se encontra anexo à reclamação e que consubstancia na procuração por parte do mandatário do síndico, cujo registo efetuado pelo Dr. Gonçalo se encontra datado de 04/12/2013" (vide, ponto 2 das Alegações de Recurso e ponto IV das Conclusões de Recurso).
Ora,
E. A argumentação da Fazenda Pública quanto à falta de legitimidade não só é ilegal (argumentação a posteriori) como carece de qualquer fundamento jurídico, dado que o registo em causa, efetuado ao abrigo da Portaria n.9 657-B/2Q06, de 29 de Junho, é tão-somente o registo Informático da certificação da fotocópia. Sendo que o mandatário tem legitimidade, polo menos, desde a data da respetiva outorga (i.e. 18 de Novembro de 2008).
Sem conceder,
F. Perante a ratio do Regulamento n.º 1346/2000, mormente o seu artigo 20.º, o que está em causa nos presentes autos é, tão-somente, determinar se existiu ou não uma penhora após a declaração da insolvência.
Sendo que,
G. A insolvência foi declarada em 28/07/2008 e publicada no jornal oficial em 01/08/2008 (vide, fls. 21-22, 25-26, 332-333 e 343-344 dos autos) e as notificações das penhoras (e as respectivas efectivações) foram, claramente, efetuadas em momento posterior (a partir de) 05/09/2008 (tendo os montantes sido entregues nos cofres do Estado a partir de 15/10/2008), conforme Factos "F" a "P" da douta Sentença.
H. Invoca, ainda, a Fazenda Pública que a Sentença recorrida "padece de erro de julgamento, precisamente por não abarcar na sua conclusão, a falta de comunicação/citação nos termos do artigo 40.º, por parte dos síndicos ao Serviço de Finanças de " (Conclusão II das Alegações de Recurso).
Porém,
I. A própria Fazenda Pública admite que existiu essa comunicação, porquanto "(...) os síndicos apenas informaram o serviço de finanças da respectiva declaração de insolvência (...) 18/12/2009 (documento 5 da PI)" (vide, Conclusões V do Recurso).
Sendo que,
J. A análise do Doc. 5 da P.I. permite, precisamente, concluir pela existência de anterior comunicação/informação da insolvência, dado que a fls. 43 dos autos consta email - datado de 02 de Outubro de 2008 - no qual se reporta a existência de insolvência.
K. Por último, confessando a Fazenda Pública que remeteu ao Síndico da Insolvência a Reclamação de Créditos (cfr. Conclusão XIII do Recurso) -deu cumprimento ao Regulamento n.º 1346/2000, ao apresentar o pedido de valores que deviam ser exigidos em Processo de Execução Fiscal -pelo que está, através do presente Recurso, a incorrer em "venire contra factum proprium", na medida em que, em tempo, adoptou o procedimento que a legislação comunitária determinava.

Termos em que deverá a Douta Sentença proferida pelo Tribunal «a quo» ser mantida com as legais consequências.


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Neste Tribunal, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer de fls. 499 a 501 dos autos no sentido da improcedência do recurso.
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Foram dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo (cf. artigo 707º, nº 4 do Código de Processo Civil (CPC) e artigo 278º, nº 5 do Código do Processo e do Procedimento Tributário (CPPT)).
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Objecto do recurso - Questão a apreciar e decidir:
Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pela Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
A questão suscitada pela Recorrente consiste em apreciar se a sentença a quo andou bem ao anular o despacho reclamado.
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II.FUNDAMENTAÇÃO
II. 1. Da Matéria de Facto
Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:

A. A Reclamante é uma pessoa colectiva de direito holandês, sem estabelecimento estável em Portugal, mas aqui registada para efeitos de IVA com o n.º [acordo – art. 1º da petição inicial e art. 1º da resposta];
B. O Serviço de Finanças de instaurou contra a Reclamante os processos de execução fiscal n.os e apensos, , , , , e [cfr. autuações a fls. 1 de cada uma das cópias dos respectivos PEF apensas];
C. Em 28-07-2008, o Tribunal de Arnhem, Países Baixos, declarou a falência da Reclamante [cfr. decisão judicial a fls. 21-22 e respectiva tradução a fls. 332-333, todas dos autos];
D. A decisão judicial identificada em C) foi publicitada no “Staats Courant” (Diário do Estado Neerlandês) n.º , de [cfr. extracto a fls. 25-26 e respectiva tradução a fls. 343-344, todas dos autos];
E. Em 05-09-2008, o Serviço de Finanças de emitiu o Ofício n.º 10526, de notificação à sociedade “Indústria”, NIF , da penhora de créditos da titularidade da Reclamante até ao montante de € 21.135,45 [cfr. ofício a fls. 10 da cópia do PEF n.º e apensos];
F. Em 05-09-2008, o Serviço de Finanças de emitiu o Ofício n.º 10527, de notificação à sociedade “Indústria ”, NIF , da penhora de créditos da titularidade da Reclamante até ao montante de € 76.989,60 [cfr. ofício a fls. 3 da cópia do PEF n.º ];
G. Em 05-09-2008, o Serviço de Finanças de emitiu o Ofício n.º 10538, de notificação à sociedade “Indústria”, NIF , da penhora de créditos da titularidade da Reclamante até ao montante de € 63.545,43 [cfr. ofício a fls. 16 da cópia do PEF n.º ];
H. Em 15-10-2008, a sociedade “Indústria” depositou na Tesouraria de Finanças de , a quantia de € 21.135,45, que foi aplicada nos processos de execução fiscal n.º e apensos, nomeadamente no PEF n.º [cfr. documentos a fls. 18-20 da cópia do PEF n.º e apensos];
I. Em 15-10-2008, a sociedade “Indústria ” depositou na Tesouraria de Finanças de a quantia de € 76.989,60 [cfr. guia a fls. 19 da cópia do PEF n.º ];
J. Em 15-10-2008, a sociedade “Indústria ” depositou na Tesouraria de Finanças de a quantia de € 63.545,43 [cfr. guia a fls. 32 da cópia do PEF n.º ];
K. Em 17-10-2008, o Serviço de Finanças de emitiu o Ofício n.º 11981, de notificação à sociedade “Indústria ”, NIF , da penhora de créditos da titularidade da Reclamante até ao montante de € 102.090,52 [cfr. ofício a fls. 8 da cópia do PEF n.º ];
L. Em 20-10-2008, a sociedade “Indústria” depositou na Tesouraria de Finanças de a quantia de € 102.090,52 [cfr. documentos a fls. 10-11 da cópia do PEF n.º ];
M. Em 22-10-2008, o Serviço de Finanças de emitiu o Ofício n.º 12156, de notificação à sociedade “Indústria ”, NIF , da penhora de créditos da titularidade da Reclamante até ao montante de € 12.440,36 [cfr. ofício a fls. 8 da cópia do PEF n.º ];
N. Em 23-10-2008, foi recebida na Tesouraria de Finanças de a quantia de € 12.440,36 [cfr. documento a fls. 10 da cópia do PEF n.º e print a fls. 30 da cópia do PEF n.º ];
O. Em 07-11-2008, o Serviço de Finanças de … emitiu o Ofício n.º 19005, de notificação à sociedade “Indústria …”, NIF …, da penhora de créditos da titularidade da Reclamante até ao montante de € 192.373,61 [cfr. ofício a fls. 6 da cópia do PEF n.º …];
P. Em 10-11-2008, a sociedade “Indústria…” depositou na Tesouraria de Finanças de … a quantia de € 192.373,61 [cfr. guia a fls. 33 dos autos];
Q. Em 29-06-2009, a Reclamante, através de mandatário constituído por seu síndico, requereu à Chefe do Serviço de Finanças de … a extinção de todos os processos de execução fiscal instaurados contra aquela sociedade, bem como a colocação à disposição dos administradores nomeados para o respectivo processo de insolvência de todos os montantes recebidos pela Fazenda Pública após a data da publicação da declaração de insolvência [cfr. requerimento a fls. 27-30 e procuração a fls. 31-32, todas da cópia do PEF n.º … e apensos];
R. Em 18-12-2009, os síndicos da Reclamante comunicaram à Chefe do Serviço de Finanças de … a declaração de insolvência, para apresentação de certidão comprovativa de quaisquer dívidas à Fazenda Pública por parte da Reclamante, com vista à reclamação dos respectivos créditos à massa falimentar [cfr. documento a fls. 97-98 dos autos];
S. Em 03-06-2013, 11-12-2013 e 16-01-2014, a Reclamante solicitou à Chefe do Serviço de Finanças de … informação sobre o estado do procedimento relativo ao seu requerimento de 29-06-2009, bem como sobre a data previsível para a sua conclusão [cfr. requerimentos a fls. 33-36, 56 a 57-verso e 58-61 da cópia do PEF n.º … e apensos];
T. Em 02-07-2013, a Direção de Serviços de Gestão dos Créditos Tributários da AT elaborou a Informação n.º …, na qual se pode ler, nomeadamente, que:
“2. De acordo com o artigo 20.º do Regulamento sempre que qualquer credor obtiver por qualquer meio a satisfação ou parcial do seu crédito com base nos bens do devedor situados no território do outro Estado-membro, deve restituir ao síndico o que tiver obtido, sob reserva do disposto nos artigos 5.º e 7.º, o que no caso concreto houve uma penhora de créditos, tendo a AT recebido o valor de € 204.813,97.
3. O Estado português deveria restituir o referido montante ao síndico.
4. Conforme constatamos no disposto anterior, não tem por esse fato legitimidade o mandatário da D… para solicitar a extinção dos processos de execução fiscal acima identificados e o reembolso do montante indevidamente pago de € 204.813,97, pois esta competência sempre caberia ao síndico, e não diretamente para a insolvente.
(…)
10. Quanto ao pedido de esclarecimento ao mandatário nos termos do artigo 67.º da LGT, deverá ser informado que a sua pretensão não é legítima pelos motivos acima invocados.”
[cfr. informação a fls. 177-181 dos autos];
U. Em 25-07-2013, o Subdiretor-Geral da AT exarou despacho de concordância sobre a informação identificada em T) [cfr. despacho a fls. 177 dos autos];
V. Em 10-03-2014, o Serviço de Finanças de … remeteu, por carta registada com aviso de recepção, à Reclamante, que recebeu em 11-03-2014, o Ofício n.º 3294, de notificação do despacho de 25-07-2013 [cfr. ofício e respectivo registo postal a fls. 210- 212 dos autos];
W. A petição inicial dos presentes autos foi remetida ao Serviço de Finanças de … em 21-03-2014 e deu entrada em juízo em 04-09-2015 [cfr. registo postal aposto no sobrescrito a fls. 74 e carimbo aposto a fls. 1, ambas dos autos];
X. Em 17-07-2015, o Serviço de Finanças de … remeteu aos síndicos da Reclamante o Ofício n.º 11667, acompanhado de certidão de reclamação de créditos, a qual aqui se dá por integralmente reproduzida, da qual constam, entre outras, as dívidas correspondentes aos montantes identificados em I), J), L), N) e P) [cfr. ofício e certidão a fls. 297-300 dos autos];
Y. Os processos de execução fiscal nº … e apensos, …, …, …, …, … e … encontram-se na fase de “Suspensão por Declaração de Falência” a contar de 28-07-2008 [cfr. prints respectivamente a fls. 25, 38, 20, 42, 26, 23 e 22 da cópia de cada um dos respectivos PEF apensa].

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Nada mais foi provado com relevância para a decisão da causa, atenta a causa de pedir.
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A decisão da matéria de facto foi tomada com base nos documentos juntos aos autos e não impugnados, constantes das cópias dos processos de execução fiscal n.os … e apensos, …, …, …,…, … e …, apensas por linha, conforme especificado nos vários pontos do probatório.”

Ao abrigo do disposto no artigo 662º, nº 1, do CPC, aditam-se ao probatório os seguintes factos, os quais resultam provados por documentos juntos aos autos:
Z. A procuração forense que consta dos autos e do processo executivo apenso foi outorgada em 18/11/2008, em Arnhem – Holanda, por , na qualidade de síndico da D e em representação desta, onde declara ter poderes para o acto e que confere ao Dr. Miguel os mais amplos poderes forenses gerais em Direito permitidos, cf. fls. 14 dos autos e 80 do PE apenso.
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Estabilizada a matéria de facto, avancemos para a questão que nos vem colocada.
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II.2. Do Direito
Conforme resulta dos autos, constitui objecto do presente recurso a sentença proferida pelo TAF de Lisboa que anulou o despacho reclamado, vinculando em consequência a Fazenda Pública a restituir aos síndicos da Reclamante o montante total de € 468.574,97 obtidos no âmbito dos processos de execução fiscal suspensos.
A reclamação apresentada pela aqui Recorrida visa o despacho do Sub – Director Geral subjacente à informação efectuada em 02/07/2013 pela Direcção de Serviços de Gestão dos Créditos Tributários (cf. alíneas T., U. e V. do probatório), no âmbito da penhora realizada pelo serviço de Finanças de sobre créditos da Recorrida ao seu cliente Industria, no valor de €204.813,97 e assim requerer a suspensão dos processos de execução fiscal e a devolução dos créditos penhorados aos administradores da insolvência.
Recuperemos, na íntegra, o despacho reclamado:
“1. Estando em causa um processo de insolvência estrangeiro deveremos verificar certas condições previstas no Regulamento (CE) nº 1346/2000 do Conselho. Assim nos termos do artigo 16º e 17º do regulamento: Qualquer decisão que determine a abertura de um processo de insolvência proferida por um órgão jurisdicional de um Estado-Membro competente por força do artigo 3º é reconhecida em todos os outros Estados-Membros logo que produza efeitos no Estado de abertura do processo” (…)be produz sem mais formalidades, em qualquer Estado-Membros, os efeitos que lhe são atribuídos pela lei do estado de abertura do processo”
2. De acordo com o artigo 20.º do Regulamento sempre que qualquer credor obtiver por qualquer meio a satisfação ou parcial do seu crédito com base nos bens do devedor situados no território do outro Estado-membro, deve restituir ao síndico o que tiver obtido, sob reserva do disposto nos artigos 5.º e 7.º, o que no caso concreto houve uma penhora de créditos, tendo a AT recebido o valor de € 204.813,97.
3. O Estado português deveria restituir o referido montante ao síndico.
4. Conforme constatamos no disposto anterior, não tem legitimidade o mandatário da D para solicitar a extinção dos processos de execução fiscal acima identificados e o reembolso do montante indevidamente pago de € 204.813,97, pois esta competência sempre caberia ao síndico, e não diretamente para a insolvente.
5. No entanto, nos termos do artº. 40 do referido Regulamento consta também que “o sindico deve informar sem demora os credores conhecidos que tenham residência habitual, domicilio ou sede nos outros Estados- Membros”. No nº 2 do mesmo artigo refere que esse informação deve ser “prestada mediante o envio de uma comunicação a cada credor conhecido e diz respeito aos prazos a observar, às sanções previstas relativamente a esses prazos, ao órgão habilitado a receber a reclamação dos créditos e outras medidas impostas. A comunicação deve igualmente indicar se os credores cujos créditos seja garantido por um privilégio ou uma garantia real dêem reclamar o seu crédito.”
6. Quanto a este ponto há a referir que a AT apenas teve conhecimento da declaração de insolvência datada de Julho 2008 em 12.03.2009 aquando da visita dos síndicos.
7. O prazo para reclamar créditos devia ter sido comunicado pelo síndico, o que segundo o referido SF não se verificou.
8. Nestes termos, somos do parecer que o SF reclame os créditos, não obstante a falta de comunicação do síndico, nos termos dos artigos 40º e 41º do Regulamento ao abrigo dos princípios de cooperação administrativa e assistência mutua entre os Estados – Membros da União Europeia em matéria de cobrança de créditos.
9. Face ao exposto, deverá o SF dirigir a reclamação de créditos aos sindico (pois desconhecemos qual o órgão ou autoridade habilitado para receber a reclamação, uma vez que essa informação deveria constar da comunicação que nunca foi recepcionada pela AT), realçando para tanto o que vem previsto no artigo 40º1 do Regulamento em que a AT deve indicar “natureza dos créditos, a data da respectiva restituição e o seu montante; devem igualmente informar se reivindicaram, em relação a esses créditos, um privilégio, uma garantia real ou uma reserva de propriedade, e quais os bens sobre os quais incide a garantia que invocam”.
10. Quanto ao pedido de esclarecimento ao mandatário nos termos do artigo 67º da LGT, deverá ser informado que a sua pretensão não é legítima pelos motivos acima invocados.”

Perante tal despacho a Recorrida reclamou invocando, em síntese, que o despacho é ilegal por violação dos artigos 20º do Regulamento (CE) nº 1346/2000 do Conselho de 29 de Maio de 2000 e 88º nº1 do CIRE.

A sentença a quo decidiu da seguinte forma:
“(…) diga-se que não faz sentido o argumento da falta de legitimidade (substantiva, entenda-se) do mandatário (…) porque o mandatário foi constituído pelo síndico , aquele exercendo poderes forenses conferidos por este em representação da sociedade em causa.
(…)
tendo ficado provado que, na sequencia de penhoras de créditos da Reclamante efectuadas entre 05-09-2008 e 07-11-.2008, a Fazenda Publica obteve, entre 15-10.-2008 e 10-11-2008, os montantes identificados nas alíneas H), I), J), L), N) e P) dos factos provados, num total de €468.574,97, tudo após a data da declaração de insolvência e da respectiva publicitação, conclui-se que deve a Fazenda Publica restitui-los aos síndicos da Reclamante para que sejam integrados na massa insolvente, sendo que, de resto, o Serviço de Finanças de procedeu à suspensão dos processos de execução fiscal nº e apensos, , , …, …, … e … a contar de 28-07-2008 – data da declaração de insolvência da reclamante; cf. alínea Y) dos factos provados -, tendo remetido aos mesmos síndicos, após comunicação destes, certidão para reclamação dos respectivos créditos – cf. alíneas R) e X) dos factos provados.
(…)
anulo o despacho reclamado devendo a Fazenda Publica restituir aos sínicos da Reclamante o montante total de €468.574,97 obtidos no âmbito dos processos de execução fiscal suspensos.”

Inconformada com tal decisão a Fazenda Publica vem nesta instancia recursiva, questionar a "(...) falta de mandato para solicitar quer a suspensão dos processos de execução fiscal, quer o reembolso dos montantes penhorados porquanto "(...) o pedido sobre o qual foi emitido o despacho ora reclamado de 25/07/2013, considerando o documento 6 que se encontra anexo à reclamação e que consubstancia na procuração por parte do mandatário do síndico, cujo registo efectuado pelo Dr. Gonçalo se encontra datado de 04/12/2013"
Mais invoca que a Sentença recorrida "padece de erro de julgamento, precisamente por não abarcar na sua conclusão, a falta de comunicação/citação nos termos do artigo 40.º, por parte dos síndicos ao Serviço de Finanças de ".

Posto isto vejamos,
Esta assente nos autos que os processos executivos aqui em causa estão suspensos (fase de “Suspensão por Declaração de Falência”) a contar de 28-07-2008, assim sendo, quanto a esta questão nada mais há a decidir.
Importa agora, apenas e só, aferir se andou bem a sentença a quo quando anulou o despacho reclamado por ilegal e ordenou a restituição das penhoras de créditos efectuadas nos processos executivos instaurados contra a Recorrida (agora suspensos).

Comecemos por analisar a questão da falta de mandato que, como se verá, está voltada ao insucesso.
Conforme consta do probatório, nomeadamente do facto agora aditado, a procuração que consta do presente processo, que foi junta com a pi., e que consta do processo executiva, junta com o requerimento apresentado pela Recorrida e objecto do presente despacho, esta conforme o disposto nos artigos 40º e seguintes do Código do Processo Civil. Acresce que foi o mandatário da Recorrida foi constituído pelo síndico , aquele exercendo poderes forenses conferidos por este em representação da sociedade em causa. Quanto ao registo a que a Recorrente se refere no ponto IV das suas conclusões de recurso, efectuado ao abrigo da Portaria n.9 657-B/2Q06, de 29 de Junho, é tão-somente o registo Informático da certificação da fotocópia. Sendo que o mandatário tem legitimidade, pelo menos, desde a data da respectiva outorga, ou seja desde 18 de Novembro de 2008.

Quanto à decidida manutenção das penhoras e não restituição dos créditos penhorados.
Comecemos por analisar a legislação aplicável:
Regulamento (CE) nº 1346/2000 do Conselho de 29 de Maio de 2000 e 88º do CIRE.
Artigo 16º
Principio

1.Qualquer decisão que determine a abertura de um processo de insolvência, proferida por um órgão jurisdicional de um Estado-Membro competente por força do artigo 3.o, é reconhecida em todos os outros Estados-Membros logo que produza efeitos no Estado de abertura do processo.
A mesma regra é aplicável no caso de o devedor, em virtude da sua qualidade, não poder ser sujeito a um processo de insolvência nos restantes Estados-Membros.
2. O reconhecimento de um processo referido no n.º 1 do artigo 3.º não obsta à abertura de um processo referido no n.º 2 do artigo 3.o por um órgão jurisdicional de outro Estado- -Membro. Este último processo constitui um processo de insolvência secundário na acepção do capítulo III.
3. No exercício dos seus poderes, o sýndico deve observar a insolvência nos restantes Estados-Membros especial as disposições que digam respeito às formas de liquidação dos bens. Esses poderes não podem incluir o uso de meios coercivos, nem o direito de dirimir litígios ou diferendos.

Artigo 17º
Efeitos do reconhecimento

1.A decisão de abertura de um processo referido no nº 1 do artigo 3.o produz, sem mais formalidades, em qualquer dos demais Estados-Membros, os efeitos que lhe são atribuídos pela lei do Estado de abertura do processo, salvo disposição em contrário do presente regulamento e enquanto não tiver sido aberto nesse outro Estado-Membro um processo referido no n.º 2 do artigo 3.º

Artigo 20º
Restituição e imputação de créditos

1.Qualquer credor que, após a abertura de um processo referido no n.º 1 do artigo 3.º, obtiver por qualquer meio, nomeadamente com carácter executório, satisfação total ou parcial do seu crédito com base nos bens do devedor situados no território de outro Estado-Membro, deve restituir ao síndico o que tiver obtido, sob reserva do disposto nos artigos 5.º e 7º
2. A fim de assegurar um tratamento equitativo dos credores, qualquer credor que, num processo de insolvência, tiver obtido um dividendo com base no respectivo crédito só toma tente por força do n.º 1 do artigo 3.º pode exercer no território mesmo grau ou da mesma categoria tiverem obtido um de outro Estado-Membro todos os poderes que lhe são dividendo equivalente nesse outro processo.
(Artigo 5º
Direitos reais de terceiros
1.A abertura do processo de insolvência não afecta os direitos reais de credores ou de terceiros sobre bens corpóreos ou incorpóreos, móveis ou imóveis, quer sejam bens específicos, quer sejam conjuntos de bens indeterminados considerados como um todo, cuja composição pode sofrer alterações ao longo do tempo, pertencentes ao devedor e que, no momento da abertura do processo, se encontrem no território de outro Estado-Membro.

Artigo 7º
Reserva de Propriedade
1.A abertura de um processo de insolvência contra o comprador de um bem não afecta os direitos do vendedor que se fundamentem numa reserva de propriedade, desde que, no momento da abertura do processo, esse bem se encontre no território de um Estado-Membro que não o Estado de abertura do processo.)


Artigo 40º
Obrigação de informação dos credores

1. Logo que num Estado-Membro seja aberto um processo de insolvência, o órgão jurisdicional competente desse Estado, ou o síndico por ele nomeado, deve informar sem demora os credores conhecidos que tenham residência habitual, domicílio
Essa informação, prestada mediante o envio de uma comunicação a cada credor conhecido, diz respeito aos prazos a observar, às sanções previstas relativamente a esses prazos, ao órgão ou autoridade habilitado a receber a reclamação dos créditos e a outras medidas impostas. A comunicação deve igualmente indicar se os credores cujo crédito seja garantido por um privilégio ou uma garantia real devem reclamar o seu crédito.

Artigo 41º
Conteúdo da reclamação dos créditos

Os credores devem enviar cópia dos documentos comprovativos, caso existam, e indicar a natureza dos créditos, a data da respectiva constituição e o seu montante; devem igualmente informar se reivindicam, em relação a esses créditos, um privilégio, uma garantia real ou uma reserva de propriedade, e quais os bens sobre os quais incide a garantia que invocam.”

Código das Insolvências e Recuperação de Empresas

Artigo 88º
                Acções Executivas
                1 - A declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência; porém, se houver outros executados, a execução prossegue contra estes.
                2 - Tratando-se de execuções que prossigam contra outros executados e não hajam de ser apensadas ao processo nos termos do n.º 2 do artigo 85.º, é apenas extraído, e remetido para apensação, traslado do processado relativo ao insolvente.

                3 - As acções executivas suspensas nos termos do n.º 1 extinguem-se, quanto ao executado insolvente, logo que o processo de insolvência seja encerrado nos termos previstos nas alíneas a) e d) do n.º 1 do artigo 230.º, salvo para efeitos do exercício do direito de reversão legalmente previsto.
                4 - Compete ao administrador da insolvência comunicar por escrito e, preferencialmente, por meios electrónicos, aos agentes de execução designados nas execuções afectadas pela declaração de insolvência, que sejam do seu conhecimento, ou ao tribunal, quando as diligências de execução sejam promovidas por oficial de justiça, a ocorrência dos factos descritos no número anterior.


                Perante tal cenário legal a Recorrida invoca que por força do disposto nos artigos 20º do Regulamento 1346/2000 e 88º nº 1 do CIRE as penhoras efectuadas devem ser restituídas ao síndico da insolvência e a manterem-se, sem a respectiva restituição, são ilegais.
                Por seu turno a Recorrente, apesar de reconhecer o disposto no artigo 20º do Regulamento 1346/2000, defende, que por força dos artigos 40º e 41º do mesmo Regulamento o síndico deveria ter efectuado uma comunicação que, em seu entender, não sucedeu.

                Conforme se apurou na matéria assente, que não foi impugnada, a Recorrida, D, foi declarada insolvente pelo Tribunal de Arnhem, Países Baixos, em 28/07/2008, e a respectiva decisão judicial foi publicitada no “Staats Courant” (Diário do Estado Neerlandês) n.º , de .
                Também resulta provado que o serviço de finanças de procedeu à penhora de créditos da Recorrida em 05/09/2008, 17/10/2008, 22/10/2008, 07/11/2008, e que os respectivos depósitos ocorreram em 15/10/2008, 20/10/2008, 23/10/2008 e 10/11/2008.
                Ora, as normas supra descritas no Regulamento Comunitário, pressupõem por um lado que seja imediatamente reconhecida no nosso território a decisão que declarou a insolvência da Recorrida e que a mesma produz, no nosso ordenamento jurídico, os mesmos efeitos que tem em território nacional (artigo 16, 17º), e por outro que qualquer credor que, após a abertura de um processo de insolvência obtiver por qualquer meio, nomeadamente com carácter executório, satisfação total ou parcial do seu crédito com base nos bens do devedor situados no território de outro Estado-Membro, deve restituir ao síndico o que tiver obtido.
                A norma do ordenamento jurídico interno, por seu lado, prevê que a declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência.
                Assim sendo, resulta claro e obvio da lei aplicável que as penhoras (de crédito, no caso em concreto) a manterem-se violam as normas previstas nos artigos 16º e 20º do Regulamento 1346/2000, uma vez que os seus montantes devem ser restituídos ao síndico da insolvência. É a própria AT que o reconhece nos pontos 1, 2 e 3 do despacho reclamado.
                De acordo com os artigos citados, após a declaração de insolvência os efeitos no nosso território são imediatos e não prevê o Regulamento aplicável que tal reconhecimento dependa de qualquer formalidade, seja ela publicação ou uma comunicação específicas para qualquer acto em particular. Ao contrário do que invoca a Fazenda Publica a lei não faz depender o reconhecimento da decisão judicial de insolvência tomada noutro Estado-membro de mais nenhuma formalidade. Nem comunicação para reclamar créditos, nem publicação em local específico, etc. Vejamos sobre este assunto um Acórdão da Relação do Porto, no processo nº 3175/06.1TBPRD.P1, de 18/05/2009
                Ora, de acordo com o art.º 16.º do Regulamento (CE) n.º 1346/2000 do Conselho, de 29 de Maio de 2000, relativo aos processos de insolvência (…), “ qualquer decisão que determine a abertura de um processo de insolvência, proferida por um órgão jurisdicional de uma Estado-Membro competente por força do art.º 3.º, é reconhecida em todos os outros Estados - Membros logo que produza efeitos no Estado de abertura do processo.”
                E no art.º 17.º estabelece-se que “a decisão de abertura de um processo (…) produz, sem mais formalidades, em qualquer dos demais Estados Membros, os efeitos que lhe são atribuídos pela lei do Estado de abertura do processo”.
                Assim, sendo imediatamente reconhecida no nosso território aquela decisão que declarou a insolvência do Réus, a mesma produz, no nosso ordenamento jurídico, os mesmos efeitos que tem em território espanhol. Logo, tendo a presente acção sido proposta após a referida declaração de insolvência, é a lei espanhola a aplicável no que se refere aos efeitos da insolvência relativamente à presente acção. Trata-se da Ley Concursal 22/2003 de 9 de Julho que à semelhança do nosso CIRE prevê a obrigatoriedade de um concurso universal de credores para o exercício dos direitos de carácter patrimonial contra o insolvente, ou seja, impõe que os créditos anteriores à sentença que decreta a insolvência sejam reclamados naquele processo devendo os juízes dessas acções abster-se de as conhecer, remetendo as partes para o processo de insolvência.
                (…)
                Como se pode ler no considerando Regulamento, “o bom funcionamento do mercado interno exige que os processos de insolvência que produzem efeitos transfronteiriços se efectuem de forma eficiente e eficaz.” “Para assegurar o bom funcionamento do mercado interno, há que evitar quaisquer incentivos que levem as partes a transferir bens ou acções judiciais de um Estado-Membro para outro, no intuito de obter uma posição legal mais favorável”. Com este objectivo, o Regulamento assenta nos seguintes princípios:
                1-O princípio de que o processo de insolvência seja aberto no Estado-Membro em que se situa o centro de interesses principais do devedor, visando abarcar todo o património do devedor - art.º 3.º (…)
                2-O princípio do reconhecimento imediato e automático por todos os Estados-Membros das decisões relativas à abertura, tramitação e encerramento dos processos de insolvência abrangidos pelo seu âmbito de aplicação, bem como de decisões proferidas em conexão directa com esses processos. Assim sendo, o reconhecimento automático deve conduzir a que os efeitos conferidos pela lei do processo pela lei do Estado de abertura se estendam a todos os outros Estados - Membros - (artigos 16.º e 17.º do Regulamento e considerando (22).
                3-O princípio de que deve aplicar-se a lei do Estado – Membro de abertura do processo (lex concursus) que determina todos os efeitos processuais e materiais dos processos de insolvência sobre as pessoas e relações jurídicas em causa, regulando todas as condições de abertura, tramitação e encerramento do processo de insolvência”- art.º 4.º e considerando (23).
                Mais se conclui que a declaração de insolvência do Réu, decidida pelo Tribunal competente de Espanha, produz efeitos imediatos nos outros Estados - Membros, logo, também em Portugal.”

                No entanto, ainda que assim não se entendesse, em 18/12/2009 os síndicos da Reclamante comunicaram à Chefe do Serviço de Finanças de a declaração de insolvência, para apresentação de certidão comprovativa de quaisquer dívidas à Fazenda Pública por parte da Reclamante, com vista à reclamação dos respectivos créditos à massa falimentar. Visto o teor de tal documento, cujo carimbo de recepção do original por parte do serviço de finanças consta do canto superior direito e esta assinado em 17/12/2009, o mesmo integra cópia da respectiva decisão judicial e a respectiva citação com vista à Reclamação dos créditos – veja-se alínea R) do probatório.

                Face ao exposto, mantem-se a decisão recorrida que andou bem ao anular o despacho reclamado.


                III. DECISÃO
                Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso, e em consequência, manter a sentença recorrida.
                Lisboa, 09 de Junho de 2016.

                __________________________
                (Barbara Tavares Teles)


                _________________________
                (Pereira Gameiro)


                _________________________
                (Anabela Russo)