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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2623/21.5 BEPRT
Secção:CA
Data do Acordão:05/19/2022
Relator:PEDRO NUNO FIGUEIREDO
Descritores:CONTRATAÇÃO PÚBLICA
DATAS DAS NOTIFICAÇÕES E COMUNICAÇÕES
PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA IGUALDADE
Sumário:I - Decorre do disposto no artigo 469.º, n.º 1, al. a), do CCP, que os concorrentes se devem considerar notificados a partir do momento da comunicação da decisão estar disponível na plataforma eletrónica, podendo reagir invocando justo impedimento quanto ao respetivo conhecimento, nos termos do artigo 224.º do CPC, ou invocar a deficiência da notificação, nos termos do artigo 60.º do CPTA.
II - Ainda que o artigo 469.º, n.º 2, do CCP, estabeleça um regime de exceção quanto à entidade adjudicante ou contraente público, tal não implica violação do princípio da proporcionalidade, por se revelar a medida adequada, necessária e proporcional, relativamente ao fim que prossegue, nem violação do princípio da igualdade, por assentar a diferenciação de tratamento na lei entre situações distintas e ancorada em justificação razoável.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO
E....., Lda., e N..... instauraram ação de contencioso pré-contratual contra a M....., S.A., visando a declaração de nulidade da decisão que determinou a exclusão do Trabalho de Conceção n.º…., apresentado pelas autoras ao Concurso Público Internacional de Conceção para elaboração dos Projetos de Execução da Ponte Sobre o Rio Douro e Acessos entre o Porto (Campo Alegre) e Vila Nova de Gaia (Candal).
Por sentença proferida em 05/01/2022, o TAC de Lisboa rejeitou liminarmente a ação por se verificar exceção dilatória de intempestividade da prática do ato processual.
Inconformadas, as autoras interpuseram recurso desta decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
“1.ª A sentença recorrida padece de erro de julgamento e viola o artigo 102.º, n.º 3 do CPTA, pois para além de errada no seu sentido decisório a respeito da questão da extemporaneidade, não se mostram reunidos pressupostos de evidência ou de indiscutibilidade para ser proferida uma decisão excecional de indeferimento liminar, já que,
a) Não está em causa o efeito imediato da notificação feita em 18 de outubro e 2 de novembro, com a expedição do que foi expedido, como se encontra estabelecido no art. 469.º/1/a) do CCP;
b) Só que nessas datas de 18 de outubro e 2 de novembro, não foi expedida a notificação de um ato administrativo, mas foi expedido apenas e só um aviso ao destinatário, a avisá-lo que tinha precisamente um ato na plataforma para ser notificado;
c) um simples aviso ao destinatário de que deve ir à plataforma ver o que lá está não é uma notificação de um ato; no limite, pode não estar nenhum ato na plataforma ou esta não estar a funcionar corretamente; defender a posição do Tribunal recorrido, levaria ao absurdo de considerar notificado um ato, mesmo que ele não existisse ou não estivesse acessível na plataforma ou só ficasse acessível muito tempo depois da expedição desse aviso ao destinatário, eliminando a garantia constitucional do caráter receptício dos atos administrativos, como melhor consta das restantes conclusões;
d) por isso a lei regula expressamente este tipo de situações de “notificações imperfeitas” no artigo 113.º, n.ºs. 5 e 6, do CPA, ao estabelecer que a notificação feita por meios eletrónicos só se torna «perfeita» - como refere a epígrafe do artigo –, «no caso de correio eletrónico, no momento em que o destinatário aceda ao específico correio enviado para a sua caixa postal eletrónica, e, no caso de outras notificações por via de transmissão eletrónica de dados, no momento em que o destinatário aceda ao específico correio enviado para a sua conta eletrónica aberta junto da plataforma informática disponibilizada pelo sítio eletrónico institucional do órgão competente.» (v. artigo 113.º, n.º 5 do CPA), estabelecendo a lei que a notificação do ato se dá se o particular não consultar a plataforma dentro do prazo de 5 dias subsequentes a esse aviso (v. artigo 113.º, n.º 6 do CPA);
e) de resto e contrariamente ao que se escreveu na sentença recorrida, não foi alegado pelas Autoras na p.i. que a notificação do ato da sua exclusão tenha ocorrido em 18.10.2021 e/ou que a notificação da decisão da reclamação administrativa tenha ocorrido em 02.11.2021, nem se mostra alegado na p.i. que nas referidas datas tenham ocorrido as expedições dessas notificações – o que se alega na p.i. (e documenta) é que as notificações ocorreram, respetivamente, em 19.10.2021 e em 03.11.2021 –, e nenhum outro facto jurídico se mostra alegado na p.i. com relevo para apurar o termo inicial do prazo de propositura da ação administrativa nas datas a que se refere o Tribunal a quo, (muito menos ditando a extemporaneidade da ação de modo evidente e indiscutível).
2.ª Não se mostra alegado pelas Autoras na p.i. – e também não consta do Instrutor - que a notificação do ato da sua exclusão tenha ocorrido em 18.10.2021 e/ou que a notificação da decisão da reclamação administrativa tenha ocorrido em 02.11.2021, nem se mostra alegado na p.i. que nas referidas datas tenham ocorrido as expedições dessas notificações – o que se alega na p.i. (e documenta) é que as notificações ocorreram, respetivamente, em 19.10.2021 e em 03.11.2021 –, e nenhum outro facto jurídico se mostra alegado na p.i. com relevo para apurar o termo inicial do prazo de propositura da ação administrativa nas datas a que se refere o Tribunal a quo, (muito menos ditando a extemporaneidade da ação de modo evidente e indiscutível);
3.ª Ao rejeitar a ação administrativa com fundamento na sua extemporaneidade considerando como data relevante para efeitos do termo inicial do prazo de impugnação judicial, a data da expedição de um simples aviso para ir consultar a plataforma informática, a sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do artigo 469.º, n.º 1, al. a), do CPP, na sua leitura conjugada com os artigos 101.º e 59.º do CPTA e 113.º, n.ºs. 5 e 6 do CPA, pois a citada norma do CCP não regula a notificação enquanto facto determinante para fixar o termo inicial para a prática de direitos pelo destinatário da expedição, designadamente, o direito de ação administrativa de impugnação de atos, apenas se ocupando de regular especialmente a notificação e a comunicação de atos enquanto factos associados ao cumprimento da obrigação de notificar e ao cumprimento de prazos pelo expedidor – órgão da administração pública;
4.ª Desde logo porque o que esse normativo estatui é que as notificações e comunicações se consideram feitas na data da sua expedição. Mas são as notificações ou comunicações do que é transmitido. Esse normativo legal não estabelece qualquer presunção de conhecimento de atos que não estão na comunicação expedida, pois, isso seria um absurdo em face do regime constitucional e legal, que atrás expusemos;
5.ª Expedir avisos de comunicações para consultar a plataforma informática do CCP e tomar conhecimento de notificações de atos e do seu conteúdo são coisas diferentes: a Administração expede os avisos, que não têm o ato ou o seu conteúdo, tendo por conteúdo apenas e só o aviso de que algo está por notificar na plataforma; o particular consulta e recebe o conteúdo desses atos;
6.ª Contrariamente ao pressuposto na decisão de indeferimento liminar sub judice, a previsão do artigo 469.º, n.º 1, alínea a), do CCP não pode ter-se como preenchida no caso concreto dos autos, pois a única «expedição» para as Autoras relacionada com o ato impugnado foi um alerta, desacompanhado do ato ou da sua fundamentação ou do seu sentido decisório (como tal não oponível ex vi dos arts. 60.º, n.º 1 e 101.º do CPTA), sendo que a inserção de dados numa plataforma online não traduz uma ação de expedir, nem – em qualquer caso – traduz uma comunicação especialmente dirigida às Autoras aqui Recorrentes, faltando-lhe os requisitos indispensáveis da pessoalidade e da efetiva cognoscibilidade;
7.ª A decisão impugnada ao indeferir liminarmente a petição inicial com fundamento da sua extemporaneidade por considerar o ato impugnado como notificado à data da sua expedição, desconsiderando ou irrelevando a alegação e a prova das Autores aqui recorrentes no sentido de ilidir tal presunção, padece de erro de julgamento e viola por errada interpretação e aplicação o artigo 469.º, n.º 1, alínea a), do CCP, norma que deve ser interpretada no sentido de admitir prova em contrário;
8.ª De outro modo, seria aceitar que a simples expedição de um aviso para ir à plataforma conhecer do ato e do seu conteúdo se produziria de imediato, ainda que o ato e os seus fundamentos não estivessem na plataforma ou por problemas informáticos não fossem possíveis de consultar em tempo útil e de imediato, levando a reduzir prazos de impugnação ou mesmo eliminando-os. Esta constatação por si só leva a concluir que se trata de uma presunção como juris tantum que assim admite prova em contrário, prova essa que foi feita pelos ora Recorrentes, como se viu;
9.ª O artigo 469.º, n.º 1, alínea a), do CCP, na interpretação que dele extraia o sentido de que o mesmo consagra uma presunção inilidível, de que o destinatário se deve ter como notificado do ato logo no preciso momento (hora e segundo) em que a notificação de um simples aviso a comunicar que se deve consultar a plataforma se mostre expedida ou se mostre inserida numa plataforma na Internet – dimensão normativa que se mostra conferida na sentença recorrida – padece de inconstitucionalidade material, por violação do disposto no artigo 268.º n.º 3 da Constituição da República e dos princípios da segurança jurídica, da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana, o que imporia a sua desaplicação;
10.ª O artigo 469.º, n.º 2, do CCP, quando interpretado no sentido em que o fez a sentença recorrida, excluindo da aplicabilidade da presunção ali consagrada para entidades adjudicantes e contraentes públicos, todos os sujeitos destinatários de notificações e todas as partes contraentes, é materialmente inconstitucional por violação do princípio da igualdade e da proporcionalidade, pois a distinção operada relativamente a privados não tem, para o efeito, fundamento razoável nem justificação objetiva e racional, impondo-se a desaplicação de tal norma com essa dimensão ou a sua aplicação conforme com a Constituição.
11.ª A sentença viola por errada interpretação e aplicação do artigo 469.º, n.º 2, do CCP ao julgar a disciplina de tal preceito inaplicável aos casos em que os destinatários das notificações ou comunicações sejam outros sujeitos que não apenas «entidades adjudicantes ou contraentes públicos», abstendo-se de uma aplicação analógica da norma e de uma interpretação constitucionalmente orientada, o que foi decisivo para o sentido da decisão recorrida, pois que a notificação às Requerentes do indeferimento da reclamação administrativa foi-lhes expedida dia 02.11.2021 já depois das 17.00 h., mais precisamente pelas 18.10 h (v. doc. n.º 10 junto à p.i. e factos provados na sentença recorrida).
12.ª Por aplicação do artigo 469.º, n.º 2 do CCP, ter-se-iam as Recorrentes por notificadas às 10 horas do dia seguinte (isto é, no dia 3 de novembro de 2021, precisamente quando o sistema registou a receção da notificação) e, como a essa data lhe restariam 24 dias para a impugnação da decisão, o termo desse prazo não se esgotaria no dia 26.11.2021 como conclui o Tribunal a quo, mas sim no dia seguinte (dia 27.11.2021), o qual, correspondendo a um sábado, se transfere para o primeiro dia útil seguinte, o dia 29.11.2021 (segunda-feira), data em que a ação sub judice deu entrada”.
A recorrida apresentou contra-alegações, terminando as mesmas com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
“i) As Autoras e Recorrentes propuseram uma ação de contencioso pré-contratual em violação do prazo de um mês fixado no artigo 101.° do CPTA;
ii. As Recorrentes, corroborando o entendimento do Tribunal a quo, confirmam e confessam que a "Notificação da decisão de seleção", ora impugnada, foi disponibilizada, no dia 18 de outubro de 2021, na plataforma eletrónica, à qual têm acesso na condição de concorrentes;
iii. As Recorrentes nada alegam sobre a razão pela qual não consultaram a plataforma eletrónica no dia 18 de outubro de 2021, data em que a notificação foi disponibilizada para consulta a todos os concorrentes;
iv. As alegações das Recorrentes traduzem-se numa confissão da cognoscibilidade da notificação que foi expedida no dia 18 de outubro de 2021, pelo que, em face da matéria de facto vertida nos autos, o Tribunal a quo decidiu de modo irrepreensível ao conhecer esta exceção dilatória e indeferir liminarmente a ação;
v. O n.º 3 do artigo 102. ° do CPTA determina o indeferimento liminar da ação no caso de ‘manifesta ausência dos pressupostos processuais’;
vi. A exceção dilatória de intempestividade da impugnação administrativa da decisão promanada pelo Réu resulta de forma evidente destes autos, derivando de um raciocínio claro e facilmente compreensível;
vii. Respeitando plenamente o princípio do contraditório, o Tribunal a quo ouviu as Autoras sobre esta exceção - abstendo-se de proferir qualquer decisão-surpresa -, sem que estas tivessem acrescentado factos que alterassem o entendimento daquele órgão jurisdicional;
viii. Feita esta constatação, a Douta Sentença recorrida não poderia ter deixado de decidir como decidiu, nos termos dos artigos 87. °, n.º 1, alínea a), 89.°, 102.°, n.º 3, do CPTA, e 590.°, n.º 1, do CPC, ex vi do artigo l.° do CPTA;
ix. Aliás, se porventura permitisse o andamento do processo, depois de tomar conhecimento dos dados necessários à tomada de decisão, o Tribunal a quo violaria o disposto no artigo 7.°-A, n.° 1, do CPTA;
Sem prescindir,
x. A norma vertida na alínea a) do n.° 1 do artigo 469.° do CCP é plenamente aplicável aos autos;
xi. Ao dispor que as notificações entre as entidades adjudicantes e os concorrentes ‘consideram-se feitas na data da respetiva expedição’, o preceito consagra um regime jurídico especial aplicável à data da notificação dos procedimentos pré-contratuais regidos pelo CCP - o que tem vindo a ser reconhecido, pacificamente, pelos nossos tribunais;
xii. À luz do brocardo latino lex specialis derogat legi generali, o artigo 469.° do CCP - acompanhado pelo artigo 61.° da Lei n.º 96/2015 - prevalece sobre o disposto noutras normas, ramos e ordenamentos jurídicos, que só seriam aplicáveis a título meramente subsidiário;
xiii. As Recorrentes entendem, erradamente, que não foram notificadas e que não estariam sequer constituídas no ónus de impugnar a decisão de seleção sub judice; mas a sua tese é frontalmente contrária aos factos que elas próprias confessam;
xiv. Além disso, a valer o princípio da inoponibilidade das notificações expendidas por via da plataforma eletrónica prevista no CCP, o início da contagem dos prazos procedimentais e processuais aplicáveis ficaria, invariavelmente, dependente da conduta e da vontade de todos e de cada um dos concorrentes, o que criaria uma desigualdade gritante na data da consulta dos diversos concorrentes e paralisaria os procedimentos;
xv. Acresce ainda que as Autoras não alegaram a inoponibilidade da notificação na petição inicial - o que então poderiam ter feito ao abrigo do artigo 60. ° do CPTA -, pelo que não podem vir agora sugerir que não foram devidamente notificadas.
Ademais,
xvi. As Recorrentes alegam infundadamente que a notificação da decisão de seleção foi imperfeita e que seria de aplicar o artigo 113. ° do CPA aos autos;
xvii. Essa alegação não tem um mínimo de correspondência com a letra do artigo 469. °, n.º 1, alínea a), do CCP, e viola o disposto no n.º 2 do artigo 9. ° do Código Civil;
xviii. Tal alegação não encontra paralelo em nenhuma disposição do CCP e vem ao arrepio das finalidades deste Código, sendo suscetível de violar tanto os prazos procedimentais relativos ao concurso de conceção (vide artigo 27.°, n.º 1, alínea g), e n.º 5), como os prazos relativos aos procedimentos pré-contratuais em geral (por exemplo, o prazo de prestação de caução do artigo 90.°);
xix. Acresce que, como a jurisprudência vem reconhecendo, o legislador do artigo 469. °, n.º 1, alínea a), soube exprimir-se bem, pelo que as notificações regidas pelo disposto naquela norma ‘consideram-se feitas na data da respetiva expedição’, sob pena de violação do artigo 9.°, n.os 2 e 3, do Código Civil;
xx. No caso das plataformas eletrónicas utilizadas na contratação pública, a expedição do ato é automaticamente recebida pelos concorrentes, porquanto é a data de expedição que efetivamente importa para efeitos de contagem dos prazos de impugnação dos atos notificados;
xxi. As notificações feitas ao abrigo do artigo 469. °, n.º 1, alínea a), chegam à esfera de cognoscibilidade dos concorrentes a partir do momento em que estes podem aceder ao seu conteúdo;
Aliás,
xxii. As Recorrentes não têm razão quando afirmam que o artigo 469. °, n.º 1, alínea a), do CCP, consagra uma presunção relativa, cujo teor pode ser ilidido mediante prova em contrário;
xxiii. O artigo 469. °, n.º 1, alínea a), do CCP, consubstancia uma norma imperativa assente na garantia da igualdade e da concorrência equitativa entre os destinatários das notificações nele previstas;
xxiv. O preceito não pode consagrar uma presunção, talqualmente definida no artigo 349.° do Código Civil, porque, no âmbito das notificações realizadas através da plataforma eletrónica, todos sabem quando é que as notificações são expedidas e quando é que as notificações são abertas pelos concorrentes, pelo que não há nenhum facto desconhecido que o artigo 469.°, n.° 1, alínea a), possa revelar;
xxv. Sem prescindir, ainda que esta norma contivesse uma presunção, ela seria absoluta;
xxvi. Ao prever que as notificações "consideram-se feitas", o artigo 469.°, n.° 1, alínea a), estabelece uma clara destrinça relativamente ao n.° 2 do mesmo artigo, que apenas indica que as presunções "presumem-se feitas", pelo que não pode deixar de ter um efeito jurídico mais qualificado e determinante da data de notificação dos seus destinatários;
xxvii. Mesmo relativamente ao n.º 2 do artigo 469.°, a generalidade da doutrina e da jurisprudência vem entendendo que se trata de uma presunção iuris et de iure;
xxviii. Enfim, ainda que o artigo 469.°, n.º 1, alínea a), consagrasse uma presunção relativa, sempre ela incidiria sobre a data da expedição e, não, sobre a data da consulta das notificações.
Por outro lado,
xxix. As Recorrentes alegam, sem fundamento, que o disposto nos artigos 58.° a 60.° do CPTA pressupõe o conhecimento do ato impugnado para o início da contagem do prazo de impugnação; mas o que aqueles preceitos referem é que a notificação deve dar a conhecer o sentido da decisão - o que efetivamente sucedeu no caso vertente;
Ainda sem prescindir,
xxx. As Recorrentes afirmam, sem razão, que o artigo 469.°, n.º 2, do CCP, deve ser aplicado analogicamente aos autos;
xxxi. Mas nestes não há qualquer "caso omisso" ou lacuna, pelo que o recurso à analogia violaria o disposto no artigo 10.°, n.° 2, do Código Civil;
xxxii. Além disso, o n.º 2 do artigo 469.° do CCP diz respeito às relações de notificação entre as entidades adjudicantes e os contraentes públicos, pelo que, como a jurisprudência tem confirmado, não é aplicável aos concorrentes;
Por sua vez,
xxxiii. A imputação de inconstitucionalidades à norma vertida no artigo 469.°, n.° 1, alínea a), do CCP, parece resultar apenas da insatisfação das Recorrentes relativamente à inapelável aplicabilidade daquele preceito;
xxxiv. Na verdade, só o cumprimento do disposto no artigo 469.°, n.º 1, alínea a), assegura que "cada notificação é feita em simultâneo a todos os concorrentes" e dá cumprimento aos artigos 81.°, alínea f), 99.°, alínea a), e 266.°, n.º 1, da Constituição;
xxxv. Aquela norma não viola o disposto no artigo 268.°, n.° 3, da Lei Fundamental, nem o princípio da tutela jurisdicional efetiva: aquele preceito constitucional apenas obriga a que o ato notificando seja posto na esfera de percetibilidade do seu destinatário, não implicando o conhecimento efetivo do conteúdo do ato por todos e por cada um dos concorrentes - o que até prejudicaria a celeridade e a concorrência equitativa nos procedimentos pré-contratuais regulados pelo CCP;
xxxvi. Acresce, ainda, que o n.º 3 do artigo 268.° atribui uma expressa margem de discricionariedade ao legislador - "na forma prevista na lei";
xxxvii. Também não se verifica qualquer violação do princípio da segurança jurídica, como sustentam as Recorrentes, pois que o regime previsto no artigo 469.° do CCP e no artigo 61.° da Lei n.° 96/2015 fornece "com exatidão" a "data de expedição" das notificações, que são automaticamente recebidas, sendo outrossim uma garantia acrescida de segurança jurídica;
xxxviii. O artigo 469. °, n.º 1, alínea a), não viola o princípio da proporcionalidade, sendo necessário, desde logo, à luz do interesse público subjacente a esta norma; ademais, a consulta virtual da plataforma eletrónica pode ser feita em qualquer momento, em qualquer lugar, pelos vários destinatários com acesso à plataforma - o que torna ainda mais adequada a previsão daquela norma;
xxxix. Afinal, a consulta da plataforma eletrónica é ditada pelos princípios da boa-fé e da colaboração com a Administração Pública;
xl. O artigo 469. °, n.º 1, alínea a), não viola o princípio da igualdade vertido no artigo 13.° da Constituição, uma vez que as soluções procedimentais naquele previstas têm plena justificação à luz do interesse público especificamente prosseguido na fase de formação dos contratos públicos;
xli. No caso dos autos, aquela norma contribui, nomeadamente, para que nenhum dos concorrentes beneficie de um privilégio injustificado relativamente aos seus pares;
xlii. Em consequência, não se verifica, nos autos, qualquer inconstitucionalidade ou obstáculo à plena aplicabilidade do disposto na alínea a) do n.° 1 do artigo 469.° do CCP;
xliii. Razão pela qual se verifica no presente uma exceção dilatória de intempestividade do ato processual, com consequente caducidade do direito de ação pelas Autoras, nos termos do artigo 89.°, n.° 2 e n.° 4, alínea k), do CPTA, e do artigo 278.°, n.° 1, alínea e), do CPC;
xliv. Por conseguinte, nenhuma censura merece a Douta Sentença recorrida, ao determinar a absolvição da Ré da instância”.
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Perante as conclusões das alegações da recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir do erro de julgamento da decisão recorrida, ao julgar verificada a exceção dilatória de intempestividade da prática do ato processual.

Dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.
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II. FUNDAMENTOS
II.1 DECISÃO DE FACTO
Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
A) - Foi promovido pela M....., S.A. o concurso público internacional de conceção, designado por «Concurso Publico Internacional de Conceção para elaboração dos Projetos de Execução da Ponte Sobre o Rio Douro e Acessos entre o Porto (Campo Alegre) e Vila Nova de Gaia (Candal)»;
B) - As ora Autoras apresentaram o trabalho de conceção n.º … no âmbito do procedimento pré-contratual identificado na alínea antecedente;
C) - Em 18-10-2021, foi proferida a «Decisão de Seleção», no âmbito do qual foi decidida a exclusão, entre outros, do trabalho de conceção n.º …. apresentado pelas Autoras;
D) - Em 18-10-2021, às 11:46:27, foi inserida na plataforma eletrónica AcinGov, a seguinte comunicação com a mensagem relativa ao assunto “Notificação da decisão de seleção - CO/2021/183”, nos seguintes termos:
“(…)
“(texto integral no original; imagem)”
(…)” - cf. documento n.º 2 junto com a petição inicial;
E) - A comunicação identificada na alínea antecedente foi consultada pelas Autoras em 19-10-2021, às 11:13:54, da qual se extrai o seguinte conteúdo:
“(…)

(…)” - cf. documento n.º 2 junto com a petição inicial;
F) - Em 25-10-2021, às 16:30:58, as ora Autoras apresentaram impugnação administrativa da decisão de seleção mencionada em C) proferida no âmbito do procedimento concursal identificado em A);
G) - Em 02-11-2021, foi proferida pela Entidade Demandada decisão sobre a impugnação administrativa identificada na alínea antecedente;
H) - Em 02-11-2021, às 18:10:11, foi inserida na plataforma eletrónica AcinGov, a seguinte comunicação com a mensagem relativa ao assunto “Notificação nos termos do artigo 274.º do Código dos Contratos Públicos - Decisão sobre impugnações administrativas apresentadas - CO/2021/183”, nos seguintes termos:
“(…)
“(texto integral no original; imagem)”

(…)” - cf. documento n.º 10 junto com a petição inicial;
I) - A comunicação identificada na alínea antecedente foi consultada pelas Autoras em 03-11-2021, às 10:42:22, da qual se extrai o seguinte conteúdo:
“(…)
“(texto integral no original; imagem)”
“(…) - cf. documento n.º 10 junto com a petição inicial;
J) - Em 29-11-2021, foi instaurada a presente ação de contencioso pré-contratual, via sistema eletrónico SITAF - cf. fls. 1 dos autos.
*


II.2 APRECIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Conforme supra enunciado, a questão a decidir neste processo cinge-se a saber se ocorre erro de julgamento da decisão recorrida, ao julgar verificada a exceção dilatória de intempestividade da prática do ato processual.
Consta da decisão recorrida a seguinte fundamentação:
[N]o âmbito do CCP (v. Considerando 52.º e no artigo 22.º da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro relativa aos contratos públicos) - tendo presente a multiplicidade de notificações e comunicações que são possíveis de ocorrer durante a fase de formação dos contratos públicos, e com vista à obtenção de transparência, eficiência e celeridade dos procedimentos - foi estabelecido um regime específico aplicável às notificações e às comunicações no âmbito da contratação pública em particular.
Preceitua-se no artigo 467.º do CCP que “as notificações previstas no CCP devem ser feitas através de correio eletrónico ou da transmissão eletrónica de dados”, para depois estabelecer, no seu artigo 469.º, n.º 1, alínea a), o momento em que as notificações se consideram feitas ou, dito de outro modo, o momento a partir do qual as notificações dos atos começam a produzir os seus efeitos, i.e. “Na data da respetiva expedição, quando efetuadas através de correio eletrónico ou de outro meio de transmissão escrita e eletrónica de dados” - destaque nosso.
Não sendo aqui de considerar a jurisprudência produzida pelo Tribunal Constitucional, como dizem as Autoras, “em torno da inconstitucionalidade material do artigo 70.º, n.º 1, al. a) do antigo CPA” relativamente a “interpretações que possibilitassem a realização de notificações de atos por carta postal simples sem registo”, pois o quadro jurídico e factual aplicável ao caso dos autos distingue-se do aí concretamente apreciado.
Até porque as notificações dos atos, efetuadas através de plataforma eletrónica de contratação pública utilizadas pelas entidades adjudicantes, não prescinde da sua receção pelos concorrentes ou candidatos.
Veja-se, aliás, o disposto no n.º 1 do artigo 61.º da Lei n.º 96/2015, de 17/8 [diploma que regula a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública, previstas no CCP], que prevê os requisitos e as condições a que as plataformas eletrónicas devem obedecer e a obrigação de interoperabilidade com o Portal dos Contratos Públicos e com outros sistemas de entidades públicas, designadamente quando refere que “Todas as notificações e comunicações entre a entidade adjudicante ou o júri do procedimento e os interessados, os concorrentes ou o adjudicatário, relativas à fase de formação do contrato e que, nos termos do CCP, devem ser praticadas num determinado prazo são feitas através das plataformas eletrónicas por via de envio automático de mensagens eletrónicas, devendo as mesmas ficar disponíveis para consulta na área exclusiva respetiva”. Pelo que não se vê em que medida é que os princípios da segurança jurídica e da tutela jurisdicional efetiva saem beliscados com este regime. Importa é não confundir a expedição da notificação dos atos e a sua disponibilização para consulta - assegurada pelas regras a que obedecem a tramitação dos procedimentos de contratação pública nas plataformas eletrónicas - com o seu efetivo conhecimento, seja através da consulta ou do descarregamento dessa notificação disponível para consulta na área exclusiva respetiva.
Daí que no já acima citado Acórdão do STA de 04-04-2019, P. 0198/19.4BELSB, a data considerada para se iniciar a contagem do prazo de impugnação corresponde ao dia da expedição da notificação do ato (no caso, 10-08-2018) e não ao dia da sua consulta/descarregamento da plataforma eletrónica (que, no caso, ocorreu a 14-08-2018), extraindo-se desse aresto o seguinte:
«Resulta dos factos provados que a A…………. intentou a presente acção no dia 30.01.2019, sendo que foi informada, através da plataforma electrónica de contratação utilizada neste procedimento pré-contratual, no dia 10.08.2018, de que fora publicado e estava disponível o relatório final e decisão de adjudicação.
Tendo de seguida, em 14.08.2018, descarregado da plataforma electrónica os elementos procedimentais, designadamente a referida notificação de que “no seguimento da proposta formulada pelo júri no Relatório Final, comunica-se que por deliberação do Conselho Administrativo de 09.08.2018, a mesma foi adjudicada à B………… Portugal, …………, S.A.” (cfr. pontos 14, 10, 11 e 12 dos FP).
A Autora alega logo na petição inicial não ter sido formalmente “notificada do Relatório final e da Adjudicação”, considerando que nada prova tê-lo sido.
A notificação em causa, da decisão de adjudicação, encontra-se prevista no art. 77º do CCP, sendo feita em simultâneo a todos os concorrentes (respectivo nº 1).
As notificações previstas no CCP devem ser feitas através de correio electrónico ou da transmissão eletrónica de dados (cfr. art. 467º do CCP), considerando-se feitas, de acordo com o art. 469º, nº 1, al. a) deste diploma, “Na data da respectiva expedição, quando efectuadas através de correio electrónico ou de outro meio de transmissão escrita e electrónica de dados…”, pelo que foi o dia 10.08.2018, aquele a partir do qual se conta o prazo de impugnação (cfr. art. 59º, nº 2 do CPTA). Aliás, demonstra-se na plataforma de contratação pública utilizada de que a A. teve efectivo conhecimento da adjudicação, ao ter consultado e descarregado a notificação da decisão de adjudicação e o relatório final no dia 14.08.2018, às 17:37 (ponto 11 dos FP).
Se desconhecia o exacto teor da decisão de adjudicação, o que não foi por si alegado, deveria ter lançado mão dos meios previstos no art. 60º, nºs 2 e 3 do CPTA, ao ser notificada de que a decisão de adjudicação foi tomada, o que não fez. Ora, não há dúvida de que a A… foi notificada da decisão de adjudicação, pelo menos nos termos da “Notificação” indicada em 12 do probatório (de acordo com o respectivo ponto 1.), pelo que não pode também invocar o previsto no nº 1, do mesmo art. 60º do CPTA, ao estabelecer, para efeitos da impugnação contenciosa, um princípio de inoponibilidade da notificação ou da publicação, quando esta não dê a conhecer ao interessado o sentido da decisão, o que significa que se não inicia o prazo para a utilização do meio processual impugnatório enquanto não for efectuada uma nova notificação que identifique o conteúdo e o objecto da decisão. (…)”.
A invocação da violação dos princípios da segurança jurídica e da tutela jurisdicional efetiva, previsto nos artigos 20.º e 268.º, n.ºs 3 e 4, da CRP, nos termos em que decorre da alegação das Autoras, quanto a nós, resulta de as mesmas olvidarem as regras próprias e particulares da contratação pública, e da lei que regula a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública, com reflexos no modo de contagem do prazo de instauração da ação de contencioso pré-contratual.
Pretendem ainda as Autoras que seja aplicável à contagem do prazo relativo à decisão de indeferimento da impugnação administrativo o n.º 2 do artigo 469.º do CCP, fazendo apelo à jurisprudência que dimana do Acórdão do TCAN de 19.04.2018, proferido no Proc. n.º 01539/17.4BEBRG, salientando neste conspecto que “é certo que o citado normativo se refere literalmente apenas às notificações «que tenham como destinatário a entidade adjudicante ou o contraente público» e já não às recíprocas notificações dirigidas pela Administração aos particulares nada regulando em relação a estas, deixando em aberto um vazio legal que cabe ao intérprete preencher (v. art. 10.º do Código Civil), a menos que se entenda que se trataria de consagrar aí conscientemente uma solução díspar, hipótese em que se imporia reconhecer que tal regulação se revelaria injustificadamente desigual, violando os princípios da justiça, da proporcionalidade e da igualdade, cabendo aos tribunais encontrar interpretações normativas que se mostrem conformes com a Constituição da República ou a esta orientadas e rejeitar a aplicação de normas inconstitucionais”.
De acordo com o artigo 469.º, n.º s1, alínea a) e 2 do CCP:
“1- As notificações e as comunicações consideram-se feitas:
a) Na data da respetiva expedição, quando efetuadas através de correio eletrónico ou de outro meio de transmissão escrita e eletrónica de dados, salvo o disposto no número seguinte”.
(…)
2- As notificações e as comunicações que tenham como destinatário a entidade adjudicante ou o contraente público e que sejam efetuadas através de correio eletrónico, telecópia ou outro meio de transmissão escrita e eletrónica de dado, após as 17 horas do local de receção ou em dia não útil nesse mesmo local, presumem-se feitas às 10 horas do dia útil seguinte”.
Ora, não sendo as Autoras nem entidade adjudicante, nem o contraente público, não se lhes aplica a exceção do n.º 2, mas a regra geral contida no n.º 1, alínea a) deste normativo, que considera as notificações e as comunicações efetuadas na data da respetiva expedição, quando efetuadas através de correio eletrónico ou de outro meio de transmissão escrita e eletrónica de dados, como foi o caso.
Importa ter presente que a questão jurídica (ligada ao exercício do direito de participação/direito de audiência prévia) e os factos tratados no referido Acórdão do TCAN de 19.04.2018, proferido no proc. n.º 01539/17.4BEBRG, invocado pelas Autoras, é distinto do que está aqui a ser analisado.
No referido processo foram considerados como factos assentes “(i) a existência de um relatório preliminar submetido em plataforma eletrónica, em 23/5/2017, às 21:22:55; (ii) que a pronúncia em sede de audiência prévia deveria ser apresentada, em prazo fixado pelo júri do procedimento, até as 17:30, de 30/5/2017; (iii) que a pronúncia em sede de audiência prévia foi apresentada através de mensagem, datada de 30/5/2017, às 18:08:06; (iv) que a apresentação da pronúncia em sede de audiência prévia foi considerada extemporânea pelo júri do procedimento, em sede de relatório final; e (v) que o órgão competente para a decisão de contratar acabou por acolher as conclusões propostas pelo júri em sede de relatório final” [resumo extraído do artigo “Breves notas sobre a presunção das notificações e das comunicações consagrada no art. 469.º, n.º 2, do CCP”, Justiça Administrativa n.º 140 - Março/Abril 2020].
E perante este quadro factual, tendo presente que “a fixação daquele horário não é aleatória, já que parte da convicção que os serviços administrativos estarão encerrados a partir dessa hora, já que tradicionalmente a Administração Pública nos seus mais variados serviços não funciona depois das 17:00”, o TCAN entendeu que “a entidade demandada remeteu o relatório preliminar às 21:22:55, ou seja, em horário em que não é normal uma sociedade encontrar-se em funcionamento. Portanto, as razões que justificam a presunção do artigo 469.º, n.º 2, do CCP para proteger a Administração Pública das comunicações feitas após as 17:00 também justificam a aplicação da mesma presunção para proteger os particulares das comunicações feitas pela Administração Pública após as 21:00” - destaque nosso.
Depois referiu que “a não aplicação da norma referida redunda numa situação de inconstitucionalidade por violação do direito de participação. (…) Assim, para que o direito constitucional seja assegurado, não é suficiente que o mesmo tenha uma consagração legal e seja formalmente consagrado, impondo-se também que o particular tenha um prazo que lhe permita efetuar, em tempo útil, esse direito”. Para depois concluir que: “De qualquer modo, sempre se poderia afirmar que no caso em apreço, assegurando a entidade demandada as funções no âmbito da formação do contrato em apreço pelo menos até às 21:22, o que está demonstrado por ser essa a hora em que submete documentos relevantes, como o relatório preliminar, não se justifica a aplicação do artigo 469.º, n.º 2 do CCP ao caso em apreço porque o propósito do legislador parte do pressuposto de que os serviços das entidades adjudicantes estarão encerrados a partir das 17:00, o que manifestamente não é o caso da entidade demandada: se pode submeter o relatório preliminar às 21:22 também pode dar tratamento à audiência prévia da autora pouco depois das 18:00 - destaque nosso.
Digamos que, para além de o citado aresto tratar de um caso específico relacionado com o exercício do direito de audiência prévia, para o qual é conferido um prazo de 5 dias, há aqui uma conjugação de argumentos que é evidenciada pelo TCAN para decidir, no caso, pela violação do direito de participação no procedimento.
Porém, no caso em apreciação, não só não está em causa esse específico tema, como a expedição da notificação da decisão de indeferimento da impugnação administrativa marca que ocorreu às 18:10:11, horário em que podemos considerar “normal” uma sociedade encontrar-se em funcionamento.
Em todo o caso, importa evidenciar que um outro Acórdão do TCAN, esse sim proferido a propósito da caducidade do direito de ação no âmbito de uma ação de contencioso pré-contratual, datado de 04-11-2011, Proc. n.º 00741/11.7BEPRT (disponível para consulta em www.dgsi.pt aresto que, aliás, foi objeto de recurso para o TC, que, no seu Ac. n.º 325/2012, decidiu não tomar conhecimento do recurso), em que estava em causa uma deliberação camarária cuja notificação foi efetuada por transmissão eletrónica de dados expedida no dia 04.02.2011, pelas 22h50m, que responde aos argumentos suscitados pelas Autoras, e em que se decidiu o seguinte: “(…) Como salienta Mário Aroso, em “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, pág. 259, trata-se de “processos de impugnação dos actos administrativos praticados no âmbito do procedimento de formação desses tipos específicos de contratos e apenas desses, que são subtraídos ao modelo normal de tramitação dos processos impugnatórios, para serem submetidos a um modelo de tramitação especial, que se pretende mais célere, e à aplicação do regime dos processos urgentes. A razão para isso reside na circunstância de os contratos do tipo referido se encontrarem abrangidos pelo âmbito da aplicação de duas directivas comunitárias, as Directivas do Conselho nº 89/665/CEE, de 21 de Dezembro e nº 92/13/CEE, de 25 de Fevereiro que, entre outras coisas, exigem que os Estados membros da União Europeia criem condições para a rápida resolução dos litígios que possam surgir a propósito de formação daqueles contratos...”
Por isso o processo dirigido à impugnação dos actos administrativos relativos à formação dos contratos tem um formalismo especial e urgente, subordinado a prazos relativamente curtos, tendo em vista uma solução rápida do litígio, em detrimento da forma processual relativa às impugnações em geral dos restantes actos administrativos (cfr. nomeadamente artº 78º e segs. do CPTA).
O n.º 2 do artigo 2.° do Código de Processo Civil, ao estabelecer que “a todo o direito... corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo” indicia que o interessado se não pode socorrer de qualquer meio processual, mas apenas do meio processual de tutela estabelecido pela lei como sendo o adequado à resolução do litígio, ou seja o meio processual especialmente previsto tendo em consideração a urgência na resolução dos recursos contenciosos dos actos administrativos relativos à formação dos contratos de empreitadas e concessão de obras públicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens, aos quais é aplicável imperativamente o regime previsto nos artºs 100º a 103º do CPTA, designadamente no que ao prazo para interposição desses recursos diz respeito.
Em conformidade, o processo dos autos tinha forçosamente de ser intentado no prazo de um mês, a contar da notificação do acto (artº 101º do CPTA), sendo certo que, como as recorrentes foram notificadas da deliberação camarária impugnada por correio electrónico no dia 4.02.2011 o prazo de um mês para instaurar a acção terminava no dia 04.03.2011, que foi dia útil (sextafeira), pelo que tendo a mesma sido instaurada no dia 07.03.2011, ela é intempestiva, como bem se entendeu na decisão sub judice (cf. artº 279/c) do CC). E, sendo assim, tem de se concluir que a pretensão a formular no processo principal não poderá ser apreciada dada a existência de circunstância que obsta ao prosseguimento do processo e que por isso impede que se conheça de mérito - a caducidade do direito de acção. Em suma, a tese das recorrentes não pode ser acolhida.
Os processos do contencioso pré-contratual têm carácter urgente e devem ser intentados no prazo de um mês a contar da notificação dos interessados ou, não havendo lugar a notificação, da data do conhecimento do acto. E, dado que o prazo previsto no art. 101° se aplica à hipótese dos autos, fica automaticamente excluído que, sobre o assunto, paire um estado de dúvida que justifique o uso sucedâneo do mecanismo do art. 7º do CPTA. Tal equivale a dizer que não há que recorrer ao princípio pro actione, também invocado nas alegações de recurso. O apelo à presunção de que a expedição/comunicação electrónica somente é realizada no 3º dia útil posterior ao da sua elaboração e registo (cfr. 56. e 57. das alegações) e de que, por isso, devia aplicar-se às notificações referidas no art. 469º do CCP uma “dilação de três dias”, também não tem cobertura, na medida em que as próprias recorrentes não questionam que a deliberação camarária impugnada foi efectuada por transmissão electrónica de dados expedida no dia 4.02.2011, pelas 22h50m.
Além disso, essa dilação não resulta nem da lei geral sobre procedimento administrativo-arts. 70º e art. 73º do CPA-, nem das regras especiais do CCP, o que só pode interpretar-se no sentido de que foi essa a vontade do legislador. Na verdade, segundo o artº 9º nº 2 do C. Civil Artigo 9.º -
(Interpretação da lei)
1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o
pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
, relativo à interpretação da lei, “Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.”; assim, mesmo quando o intérprete “...se socorre de elementos externos, o sentido só poderá valer se for possível estabelecer alguma relação entre ele e o texto que se pretende interpretar”- cfr. o Prof. J. Baptista Machado, em “Introdução ao Direito Legitimador”, 1983-189-. E refere José Lebre de Freitas, BMJ 333º-18 “A mens legislatoris só deverá ser tida em conta como elemento determinante da interpretação da lei quando tenha o mínimo de correspondência no seu texto e no seu espírito”. No caso posto, a questão aludida (e totalmente ao arrepio da sua posição anterior: sobre o facto da data do efectivo conhecimento do acto impugnando), de uma pretensa “dilação de 3 dias” ou da aplicação da presunção de que a notificação se dá apenas no 3º dia útil posterior ao registo ou à expedição da telecópia ou correio electrónico, não resulta da letra da lei, que, sendo clara desaconselha o recurso ao seu espírito ou à reconstituição do pensamento legislativo. Assim sendo, e, salvo melhor opinião, parece-nos que não se pode deixar de presumir “...que o legislador consagrou a solução mais acertada e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”-nº 3 do citado artº 9º .
E o que dizer da inconstitucionalidade da norma contida na alínea a) do nº 1 do art. 469º do CCP, na medida em que não concede aos particulares concorrentes ou candidatos em procedimentos adjudicatórios, a mesma possibilidade que pelo nº 2 do mesmo artigo é conferida às entidades adjudicantes? A este propósito as recorrentes argumentam o seguinte: -a decisão de que se recorre assenta, entre outros argumentos, na aplicação do artigo 469.º do CCP que, sob a epígrafe “Data da notificação e da comunicação”, estipula que as notificações se consideram efectuadas na data da expedição; -porém, o mesmo artigo, no seu n.º2, estabelece que, na eventualidade dos destinatários da notificação ou comunicação, feita após as 17h, serem “(…) a entidade adjudicante ou o contraente público (…)”, aquela se presume feita “(…) às 10 horas do dia útil seguinte”; -não existe qualquer justificação para a diferenciação feita entre as pessoais de direito privado, como as ora recorrentes, e as pessoas de direito público; -no caso em concreto, a diferença de tratamento jurídico, isto é, a verdadeira discriminação à pessoa de direito privado, é totalmente desprovida de justificação. -as ora recorrentes viram-se coarctadas no seu direito, o que foi motivado pelo simples facto de serem pessoas de direito privado – pois, caso lhes fosse aplicado o disposto no n.º 2 do artigo 469.º do CCP, o prazo para reagirem seria mais longo e a questão da excepção de caducidade nunca se teria posto; -a aplicação de um prazo igual ao fornecido às entidades públicas seria fundamental para que, gozando de prazo mais longo, fosse possível preparar uma defesa mais eficaz e cabal e, assim, estar em igualdade perante qualquer outra pessoa. -estamos, assim, perante uma situação de violação do princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
Vejamos.
O artigo 13.º da CRP estabelece que “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”.
Este princípio constitucional da igualdade do cidadão perante a lei é um princípio estruturante do Estado de Direito Democrático e do sistema constitucional global, que vincula directamente os poderes públicos, tenham eles competência legislativa, administrativa ou jurisdicional.
Como o Tribunal constitucional tem uniformemente entendido, a obrigação da igualdade de tratamento (apenas!!!) exige que "aquilo que é igual seja tratado igualmente”, de acordo com o critério da sua igualdade, e “aquilo que é desigual seja tratado desigualmente, segundo o critério da sua desigualdade".
Tal princípio -da igualdade-, entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a realização de distinções, antes lhe proíbe a adopção de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, ou seja, desigualdades de tratamento materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ou sem qualquer justificação objectiva e racional.
Em suma, traduz-se na ideia geral da proibição do arbítrio - ACTC00003222 Acordão :92-157-1 Processo: 90-0288 ACTC00002927 Acordão: 91-331-1 Processo: 90-0033 ACTC8167 Acordão: 98-185-2 Processo: 95-0598
Só que, não sendo as situações referidas totalmente idênticas, elas não podem ser tratadas de forma totalmente igual, pelo que, salvo melhor entendimento, não se vê que haja aqui violação da Constituição quer por parte da decisão quer por parte do artigo 469º do CCP.
Contrariamente ao aventado, não se nos afigura que a desigualdade de tratamento contemplada na norma em apreço seja arbitrária ou irrazoável, assente numa qualquer ordem corporativista ou política de privilégio do funcionalismo público, parecendo-nos antes que encontra fundamento material bastante na defesa do interesse público, nos vários casos a reclamar solução por parte dos entes públicos e nos horários de expediente dos mesmos serviços públicos.
Improcedem, pois, as conclusões das alegações das recorrentes, embora, como a recorrida não deixa de salientar, em abstracto, em tese, ou num plano de jure condendo, as mesmas não sejam de desprezar”.
Duas considerações finais.
A este respeito importa não confundir a interpretação da lei com o juízo de mérito sobre a maior ou menor bondade dessa mesma norma. Se é certo que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, certo é também que não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso; o que sucede - como as Autoras expressamente reconhecem - com a interpretação do n.º 2 do artigo 469.º do CCP que é aqui sugerida pelas mesmas.
Depois, a ideia pugnada pelas Autoras de que “se é compreensível atender a que a Administração Pública encerra os seus serviços pelas 17.00 h, tendo-se por isso como notificada apenas às 10.00 h do dia seguinte sempre que as notificações lhe sejam entregues depois dessa hora”, já “nenhuma razão subsiste para afastar o mesmo critério de tutela para os particulares e assumir que as empresas privadas funcionam 24h por dia, podendo ser notificadas de um ato a qualquer hora da noite e com isso podendo perder um dia de prazo” tem de ser afastada. Aliás, com a sua aplicação o que se obteria era justamente um alargamento injustificado do prazo impugnatório, pois, como referido, no modo de contagem do prazo de instauração da ação não é considerado o próprio dia do evento (no caso, o dia em que ocorre a expedição da notificação do ato - cf. artigo 279.º, al. c) do CC e a jurisprudência acima citada).
Por conseguinte, face a tudo quanto acima foi exposto, considerando que a presente ação foi instaurada em 29-11-2021, tem, pois, que concluir-se ter sido, no presente caso, intempestivamente instaurada, verificando-se a exceção dilatória de intempestividade da prática do ato processual (artigo 89.º, n.ºs 2 e 4, alínea k), do CPTA e artigo 278.º, n.º 1, alínea e) do CPC), o que deve determinar neste caso, nesta fase preliminar da presente ação de contencioso pré-contratual, em que a ED e as CI não foram sequer citadas, a sua rejeição liminar.
Ao que contrapõe a recorrente, em síntese:
- nas datas de 18/10 e 02/11 não foi expedida notificação, mas apenas um aviso de que deve ir à plataforma, sendo certo que nos termos do artigo 113.º, n.os 5 e 6, do CPA, a notificação feita por meios eletrónicos só se torna ‘perfeita’ quando o destinatário aceda ao específico correio ou se não consultar a plataforma nos 5 dias subsequentes ao aviso;
- a sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do artigo 469.º, n.º 1, al. a), do CPP, conjugado com os artigos 101.º e 59.º do CPTA e 113.º, n.os 5 e 6, do CPA, pois apenas foi expedido alerta e não o ato, e a recorrente ilidiu a presunção daquela primeira norma;
- a interpretação veiculada na sentença implica a inconstitucionalidade material da norma, por violação do artigo 268.º, n.º 3, da CRP, e dos princípios da segurança jurídica, da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana;
- excluir da aplicabilidade da presunção consagrada no artigo 469.º, n.º 2, do CCP, todos os sujeitos destinatários de notificações e todas as partes contraentes, é materialmente inconstitucional por violação do princípio da igualdade e da proporcionalidade.
Como bem se vê, as recorrentes disputam o acerto da decisão recorrida em duas vertentes.
A primeira consiste em considerar que o artigo 469.º, n.º 1, al. a), do CCP, consagra uma presunção de notificação, ilidível pelos concorrentes.
A segunda consiste em considerar que a presunção consagrada no n.º 2 do citado artigo se deve aplicar igualmente aos sujeitos concorrentes e não apenas à entidade adjudicante ou contraente público.
Em ambas as questões, vem suscitada a inconstitucionalidade da interpretação diversa da defendida pelas recorrentes, ali por violação do artigo 268.º, n.º 3, da CRP, e dos princípios da segurança jurídica, da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana, aqui por violação do princípio da igualdade e da proporcionalidade.
Vejamos então.
Nos termos do disposto no artigo 469.º, n.º 1, do CCP, as notificações e as comunicações consideram-se feitas:
a) Na data da respetiva expedição, quando efetuadas através de correio eletrónico ou de outro meio de transmissão escrita e eletrónica de dados, salvo o disposto no número seguinte;
b) Na data constante do relatório de transmissão bem sucedido, quando efetuado através de telecópia, salvo o disposto no número seguinte;
c) Na data indicada pelos serviços postais, quando efetuadas por carta registada;
d) Na data da assinatura do aviso, quando efetuadas por carta registada com aviso de receção.
Está em causa a notificação da decisão de impugnação administrativa, prevista no artigo 274.º do CCP, devendo a respetiva notificação ser efetuada através de correio eletrónico ou transmissão eletrónica de dados, nos termos do artigo 467.º do mesmo diploma legal.
Conforme decorre da factualidade assente, os recorrentes tiveram conhecimento da disponibilidade da decisão na plataforma eletrónica no dia 02/11/2021 e consultaram a mesma no dia seguinte.
Ao contrário do que propugnam as recorrentes, não está em causa a ilisão de uma notificação, mas tão-só o cumprimento da providência legal, consideram-se notificadas a partir do momento da comunicação da decisão estar ao seu alcance.
Podendo então invocar justo impedimento quanto ao respetivo conhecimento, nos termos do artigo 224.º do CPC, ou invocar a deficiência da notificação, nos termos do artigo 60.º do CPTA.
O que bem sabe não ter feito.
Nestes termos, não se vê em que medida possam ter sido violados os invocados princípios constitucionais da segurança jurídica, da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana, nem as recorrentes o densificam.

No que respeita ao disposto no artigo 469.º, n.º 2, do CCP, é verdade que a lei estabelece um regime de exceção quanto à entidade adjudicante ou contraente público.
Contudo, não se vislumbra aqui a invocada violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade.
No tocante ao primeiro, não suscita dúvidas que a opção do legislador implica uma proteção adicional dos serviços públicos, mas que à luz dos princípios da contratação pública se revela a medida adequada, necessária e proporcional, relativamente ao fim que prossegue, estando em causa regras de otimização e eficiência, sendo a medida apropriada ao objetivo de garantir a correta utilização dos recursos humanos em função dos horários de funcionamento dos serviços.
Quanto ao princípio da igualdade, constitui entendimento consensual, que se exige o tratamento igual de situações de facto iguais e um tratamento diverso de situações de facto diferentes, pelo que apenas se encontram vedadas, na dimensão jurídico-constitucional da proibição do arbítrio, as diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objetivos, e a identidade de tratamento em situações manifestamente desiguais (cf., vg. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1993, p. 127).
No caso, como se reconhece com acerto na decisão sob recurso, a opção legislativa encontra fundamento material bastante na defesa do interesse público, nos vários casos a reclamar solução por parte dos entes públicos e nos horários de expediente dos mesmos serviços públicos.
Sendo certo que aplicação do citado normativo implicaria um alargamento injustificado do prazo de impugnação, quando, nos termos do disposto no artigo 279.º, al. c), do CCivil, o mesmo apenas se inicia no dia seguinte ao da notificação.
Temos, pois, que a diferenciação de tratamento na lei ocorre entre situações distintas e ancorada em justificação razoável.
Conclui-se, pois, com a sentença, não ser aplicável à recorrente o disposto no artigo 469.º, nº 2, do CCP, o que se afigura em conformidade com os princípios da igualdade e da proporcionalidade.

Em suma, cumpre negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.
*


III. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.
Custas a cargo das recorrentes.

Lisboa, 19 de maio de 2022

(Pedro Nuno Figueiredo)
(Ana Cristina Lameira)

(Ricardo Ferreira Leite)