Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12200/15
Secção:CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:10/01/2015
Relator:HELENA CANELAS
Descritores:INTIMAÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES
Sumário:
I – Não constitui motivo justificado para recusa da informação solicitada, com acesso aos respetivos documentos administrativos, atinentes ao curriculum vitae e vencimentos dos identificados assessores, a circunstância de os respetivos contratos se encontrarem sujeitos a publicitação no Portal dos Contratos Públicos nos termos impostos no artigo 127º nº 1 do CCP.
II – O princípio da administração aberta não é, em face do artigo 268º nº 2 da CRP, absoluto, e é a essa luz que os artigos 5º e 6º da LADA, que lhe dão concretização, devem ser lidos e interpretados.
III – Do artigo 35º nº 4 da CRP não decorre a consagração de um princípio geral absoluto de proibição de acesso a dados pessoais de terceiros, mas de um princípio que comporta compressões, e é também a essa luz que devem ser lidos e interpretados os artigos 5º e 6º da LADA.
IV – O tratamento diferenciado do acesso a dados, que possa existir nos termos legais, quando estes estão na posse de entidades públicas administrativas ou equiparadas (cfr. artigo 4º da LADA), por contraposição ao que ocorre quando os dados estão na posse de privados, é precisamente justificado pela natureza pública administrativa das funções asseguradas, e pelos valores e interesses que nesse caso estão em jogo, não sendo de considerar materialmente inconstitucionais, por violação do artigo 13º da CRP, os artigos 5º e 6º da LADA.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO


Rui ……………………………………………. (devidamente identificado nos autos) requerente no Processo de Intimação para Prestação de Informações e Passagem de Certidões (previsto e regulado nos artigos 104º ss. do CPTA) que instaurou no Tribunal Administrativo do Circulo de Lisboa (Proc. nº 541/15.5BELSB) contra a Câmara Municipal de Lisboa (igualmente devidamente identificada nos autos), inconformado com a sentença de 24/03/2015 daquele Tribunal, na parte em que nela foi julgada a inutilidade superveniente da lide quanto a parte do pedido - o de intimação da requerida a informar sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa - vem dela interpor recurso pugnando pela revogação da sentença, nessa parte.
Igualmente inconformada com aquela sentença de 24/03/2015, na parte em que nela foi julgado procedente o pedido de intimação da requerida Câmara Municipal de Lisboa a facultar ao requerente o acesso ao curriculum vitae dos assessores da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa, Graça…………………… e do Presidente da Câmara de Lisboa, e aos montantes por eles auferidos mensalmente, a requerida interpõe também recurso daquela sentença, quanto ao assim decidido, pugnando pela sua revogação, nessa parte.

O recorrente Rui ……………………………………….. conclui as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos:







A recorrente Câmara Municipal de Lisboa conclui as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos:























Sendo que preliminarmente invocou, nas suas alegações de recurso, ocorrer entretanto inutilidade superveniente da lide por o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Dr. António……………, ter apresentado na reunião da Câmara de 01/04/2015 renúncia ao cargo, tendo o novo Presidente da Câmara Municipal tomado posse em 06/04/2015, por a renúncia configurar uma das formas de cessação de mandato e o gabinete do Presidente se ter extinguido com aquela renúncia nos termos do artigo 43º nº 4 da Lei nº 75/2013, de 12 de Setembro, de acordo com a qual o exercício das funções dos membros dos gabinetes de apoio pessoal cessa com a cessação do mandato do presidente da Câmara Municipal.

Relativamente ao recurso interposto por Rui ………………………… contra-alegou a Câmara Municipal de Lisboa, pugnando pela sua improcedência, com manutenção da recorrida decisão de inutilidade da lide quanto a tal parte do pedido.

Relativamente ao recurso interposto pela Câmara Municipal de Lisboa o recorrido Rui ……………………………….. não apresentou contra-alegações.

O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146.º e 147.º do CPTA emitiu Parecer no sentido da procedência do recurso interposto por Rui…………………………., com revogação da sentença recorrida no segmento decisório em que julgou ocorrer inutilidade superveniente da lide quanto a parte do pedido. Sendo que dele notificadas nenhuma das partes respondeu.

Por despacho de 27/08/2015 do Mmº Juiz do Tribunal a quo foi indeferida a arguição de nulidade da sentença, mantendo a mesma nos seus exatos termos, do que as partes foram oportunamente notificadas.

Sem vistos, em face do disposto no artigo 36º nº 1 alínea e) e nº 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
*
II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/ das questões a decidir

Da sentença proferida em 24/03/2015 pelo Tribunal a quo vêm interpostos dois recursos:
- um interposto pelo requerente no Processo de Intimação para Prestação de Informações e Passagem de Certidões, Rui……………………………, visando a sentença de 24/03/2015 na parte em que nela foi julgada a inutilidade superveniente da lide quanto a parte do pedido - o de intimação da requerida a informar sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa – pugnando o recorrente pela sua revogação, nessa parte;
- outro interposto pela requerida Câmara Municipal de Lisboa e visa a sentença de 24/03/2015, na parte em que nela foi julgado procedente o pedido de intimação da requerida Câmara Municipal a facultar ao requerente o acesso ao curriculum vitae dos assessores da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa, …………………………… e do Presidente da Câmara de Lisboa, e aos montantes por eles auferidos mensalmente, pugnando pela revogação da sentença, nessa parte.

Em face dos termos em que foram enunciadas pelos recorrentes as respetivas conclusões de recurso, as quais delimitam o objeto de cada um dos recursos (cfr. artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA) são colocadas a este Tribunal, as seguintes questões essenciais:
- quanto ao primeiro recurso: saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, na parte em que julgou ocorrer inutilidade superveniente da lide quanto ao pedido de intimação da requerida a informar sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, com violação do disposto nos artigos 4º e 7º do CPA e do artigo 268º nº 2 da CRP;
- quanto ao segundo recurso:
- saber se a sentença recorrida é nula, por omissão de pronúncia (artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC novo);
- saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, na parte em que julgou procedente o pedido de intimação, com errada interpretação e aplicação do artigo 127º do CCP (Código dos Contratos Públicos) e dos artigos 5º e 6º da LADA, quando articulados e compatibilizados com a Lei de Proteção de Dados e com os artigos 37º, 38º e 35º nº 4 da CRP, ou por se verificar a inconstitucionalidade material das normas dos artigos 5º e 6º da LADA, por violação dos artigos 35º nº 4 e 13º da CRP.
Sendo que antes, importará apreciar e decidir se, como invocou preliminarmente a requerida Câmara Municipal de Lisboa nas suas alegações de recurso, ocorre entretanto inutilidade superveniente da lide por o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Dr. António………………………, ter apresentado na reunião da Câmara de 01/04/2015 renúncia ao cargo, em face do disposto no artigo 43º nº 4 da Lei nº 75/2013, de 12 de Setembro, de acordo com a qual o exercício das funções dos membros dos gabinetes de apoio pessoal cessa com a cessação do mandato do presidente da Câmara Municipal.

*
III. FUNDAMENTAÇÃO

A – De facto
Na sentença recorrida foi dada como provada pelo Tribunal a quo a seguinte factualidade, nos seguintes termos:
A) Rui ……………….. dirigiu à vereadora da Câmara Municipal de lisboa ………………….. em 5 de Fevereiro de 2015 email relativo ao assunto “Informação OCS Tugaleaks – vencimentos e CV de assessores” com o seguinte teor: “Sou Director de Informação do .......................... A minha carteira de jornalista é TE939 e a ficha técnica do nosso órgão de comunicação social pode ser encontrada em www..................com/ficha técnica.

Solicito informação e documentação, ao abrigo da Lei de Acesso a Documentos Administrativos, sobre a seguinte situação: - Curriculum Vitae de todos os assessores da Exma Vereadora ………………………

- Informação, de carácter administrativo, sobre o vencimento de todos os assessores da Exma Srª Vereadora ………………………………….

A vossa resposta deverá ser dada nos termos do artigo 6.º, alínea b), bem como do artigo 8.º da Lei n.º1/99, publicada a 13 de Janeiro, alterada pela Lei n.º64/2007, de 6 de Novembro, com rectificações feitas pela Declaração de Rectificação n.º114/2007, da Assembleia da República conjugada com a LADA – Lei de Acesso a Documentos Administrativos.

Para efeitos do disposto na LADA, informa-se o nome e morada da pessoa que efectua o pedido: Rui…………………………….. Av. …………………….., BL ……… – 2955-……… Pinhal Novo

A falta de resposta da vossa entidade não descarta a possibilidade de recurso à Comissão de Acesso a Documentos Administrativos, Tribunais Administrativos ou outros meios ao dispor para obtenção desta informação, de âmbito público. Cfr. documento n.º3 junto com o requerimento inicial.

B) Rui Cruz dirigiu à Câmara Municipal de Lisboa em 5 de Fevereiro de 2015 email relativo ao assunto “Informação ............... – Presidente da CM Lisboa” com o seguinte teor:”Sou Director de Informação do ................... A minha carteira de jornalista é TE939 e a ficha técnica do nosso órgão de comunicação social pode ser encontrada em www.....................com/ficha técnica

Solicito resposta no prazo de dez dias, com documentação, sobre a seguinte matéria:

- lista (raw data/dados em bruto) sobre as despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa que inclua lugar, tempo e valor discriminado no ano de 2014

- valor total das despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa

- Vencimento mensal e Curriculum Vitae dos membros do Gabinete do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa

Enquadramento legal do pedido efectuado:

Salvo melhor opinião jurídica, o presente pedido é enviado nos termos nos termos do artigo 6.º, alínea b), bem como do artigo 8.º da Lei n.º1/99, publicada a 13 de Janeiro, alterada pela Lei n.º64/2007, de 6 de Novembro, com rectificações feitas pela Declaração de Rectificação n.º114/2007, da Assembleia da República conjugada com a LADA – Lei de Acesso a Documentos Administrativos.

Para efeitos do disposto na LADA, informa-se o nome e morada da pessoa que efectua o pedido: Rui ……………………….. Av. …………………….., BL …….. – 2955- …… Pinhal Novo.” Cfr. documento n.º4 junto com o requerimento inicial.

C) No prazo de 10 dias o município de Lisboa não deu resposta àqueles emails. Acordo das partes.

**

B – De direito

1. Da questão prévia da inutilidade superveniente da lide
A requerida Câmara Municipal de Lisboa invocou preliminarmente nas suas alegações de recurso ocorrer entretanto inutilidade superveniente da lide por o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Dr. António…………., ter apresentado na reunião da Câmara de 01/04/2015 renúncia ao cargo, tendo o novo Presidente da Câmara Municipal tomado posse em 06/04/2015, por a renúncia configurar uma das formas de cessação de mandato e o gabinete do Presidente se ter extinguido com aquela renúncia nos termos do artigo 43º nº 4 da Lei nº 75/2013, de 12 de Setembro, de acordo com a qual o exercício das funções dos membros dos gabinetes de apoio pessoal cessa com a cessação do mandato do presidente da Câmara Municipal.
O recorrido Rui ……………………………………….. não contra-alegou.
No seu Parecer o Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal não se pronunciou sobre esta questão prévia.
Apreciando.
~
Nos termos do disposto no artigo 43º nº 4 da Lei nº 75/2013, de 12 de Setembro (Lei que estabelece o Regime Jurídico das Autarquias Locais) quer os membros do gabinete de apoio à presidência da Câmara Municipal, gabinete que, lembre-se, pode ser constituído pelo presidente da Câmara Municipal nos termos e com os condicionalismos previsto no artigo 42º nº 1 do mesmo diploma, quer os membros do gabinete de apoio à vereação, este destinado a dar apoio ao conjunto dos vereadores que exerçam funções a tempo inteiro ou a meio tempo, nos termos previstos nos nºs 2 e 3 do mesmo artigo 42º, são designados e exonerados pelo presidente da Câmara Municipal “e o exercício das suas funções cessa igualmente com a cessação do mandato do presidente da câmara municipal”.
Mas a circunstância de os membros de tais gabinetes cessarem entretanto funções por força daquele normativo não origina a inutilidade superveniente da presente lide, antes se mantendo a utilidade da apreciação do presente recurso, com vista à emissão de uma decisão final no processo, com trânsito em julgado, versando os pedidos de intimação que foram formulados pelo requerente.
É que estando em causa os pedidos de intimação da requerida a informar sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa e de acesso ao curriculum vitae dos assessores da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa, ……………………………….. e do Presidente da Câmara de Lisboa, e aos montantes por eles auferidos mensalmente, não se vê como a cessação das suas funções torne sem utilidade a decisão da causa. Quando muito poderia o requerente perder eventualmente o interesse (subjetivo) nas informações solicitadas. Mas este tão pouco manifestou essa perda de interesse não tendo desistido nem da instância, nem do recurso, nem do pedido.
Posto isto, não assiste razão à requerida Câmara Municipal de Lisboa, não ocorrendo a invocada inutilidade superveniente da lide.
O que se decide.

*
2. Do mérito dos recursos

2.1. Da questão de saber se a sentença recorrida incorre em nulidade por omissão de pronúncia (artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC novo)
~
Da decisão recorrida
Pela sentença recorrida o Mmº Juiz do Tribunal a quo decidiu o seguinte, nos termos vertidos no respetivo segmento decisório final, que se transcreve:
«Com os fundamentos expostos cabe:

- intimar no município de Lisboa a Câmara Municipal de Lisboa a, no prazo de 10 dias, facultar ao requerente o acesso ao Curriculum Vitae dos “assessores” da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa ………………….. e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa nos termos acima expostos e eventualmente expurgados de matéria que esteja abrangida pela reserva da intimidade da vida privada;

- extinguir a instância com fundamento em inutilidade superveniente da lide quanto ao pedido de informação sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal bem assim sobre os montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa;

- intimar no município de Lisboa a Câmara Municipal de Lisboa a, no prazo de 10 dias, facultar ao requerente o acesso aos montantes auferidos mensalmente pelos “assessores” Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa ……………………… e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa prestadores de serviço, na sequência de ajustes directos.»


~
Da tese da recorrente
Invoca a recorrente Câmara Municipal de Lisboa a nulidade da sentença recorrida, por omissão de pronúncia, evocando o artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC novo. Sustenta a tal respeito, nos termos que expõe no corpo alegatório e reconduz às respetivas conclusões de recurso, que não foi feita pelo Tribunal a quo uma correta interpretação da matéria de direito aplicável, tendo deixado o juiz da causa de se pronunciar sobre questões que deveria ter apreciado no âmbito da concreta aplicação das normas de direito no que tange à decisão de procedência que recaiu sobre o pedido de intimação da requerida a facultar ao requerente o acesso ao curriculum vitae dos assessores da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa, …………………………. e do Presidente da Câmara de Lisboa, e aos montantes por eles auferidos mensalmente.
~
Da análise e apreciação da questão
As situações de nulidade da sentença encontram-se legalmente tipificadas no artigo 615º nº 1 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013), correspondente ao artigo 668º nº 1 do CPC anterior, cuja enumeração é taxativa, comportando causas de nulidade de dois tipos, as de carácter formal (alínea a)) e as respeitantes ao conteúdo da decisão (alíneas b) a e)).
Dispõe, assim, o nº 1 daquele artigo 615º do CPC novo, o seguinte: “É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar -se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.”

A nulidade da sentença por omissão de pronúncia a que alude a alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC novo, aprovado pela Lei nº 41/2013 (correspondente ao artigo 668º do CPC antigo) está diretamente relacionada com o comando inserto na primeira parte do nº 2 do atual artigo 608º do CPC (correspondente ao artigo 660º do CPC antigo), de acordo com o qual o juiz “deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada para a solução dada a outras”.
Tal nulidade serve assim de cominação ao desrespeito de tal dever e só ocorre quando o juiz não conheça de questões essenciais para dirimir a lide que as partes tenham submetido à sua apreciação, traduzidas no binómio pedido/causa de pedir e cujo conhecimento não esteja prejudicado pela decisão dada a outras (vide a este respeito, entre outros, os Acórdãos deste TCA de 11/02/2010, Proc. 05531/09 e de 09/07/2009, Proc. 03804/08, in, www.dgsi.pt/jtcas e o Acórdão do STA de 11/02/2009, Proc. 0217/08, in, www.dgsi.pt/jsta).
Trata-se, como diz Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220 e 221, do “corolário do princípio da disponibilidade objetiva (art. 264.º, n.º 1 e 664.º, 2.ª parte)” que “significa que o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos formulados por elas, com exceção apenas das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões.”
De modo que, como acrescenta este autor “o tribunal não tem de se pronunciar sobre todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes, desde que não deixe de apreciar os problemas fundamentais e necessários à decisão da causa”.
A esta luz não pode, pois, entender-se que a sentença recorrida tenha incorrido em omissão de pronúncia. Não ocorrendo assim a causa de nulidade da sentença prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC novo.
Sendo questão distinta, por se traduzir em erro de julgamento e não em nulidade da sentença, a de saber se o Mmº Juiz do Tribunal a quo fez uma incorreta interpretação da matéria de direito por não ter feito o enquadramento das normas invocadas e respetiva articulação, no que tange à decisão de procedência que recaiu sobre o pedido de intimação da requerida a facultar ao requerente o acesso ao curriculum vitae dos assessores da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa, ………………………… e do Presidente da Câmara de Lisboa, e aos montantes por eles auferidos mensalmente, nos termos invocados pela entidade requerida.
Improcede, pois, nesta parte o recurso da requerida Câmara Municipal de Lisboa, não incorrendo a sentença recorrida em nulidade por omissão de pronúncia.
~
2.2. Da questão de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, na parte em que julgou ocorrer inutilidade superveniente da lide quanto ao pedido de intimação da requerida a informar sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, com violação do disposto nos artigos 4º e 7º do CPA e do artigo 268º nº 2 da CRP.
~
Da decisão recorrida
Pela sentença recorrida o Mmº Juiz do Tribunal a quo julgou, entre o demais, ocorrer inutilidade superveniente da lide quanto à parte do pedido formulado pelo requerente, aqui recorrente, Rui ………………………….. no Processo de Intimação para Prestação de Informações e Passagem de Certidões (previsto e regulado nos artigos 104º ss. do CPTA) contra a Câmara Municipal de Lisboa: o de intimação da requerida a informar sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
E fê-lo com base na matéria de facto que ali deu como provada, assentando tal decisão nos seguintes fundamentos, ali vertidos, que se passam a transcrever:
«Nos termos do artigo 277.º, alínea e) do Código de Processo Civil, a instância extingue-se com a inutilidade superveniente da lide. Esta tem lugar quando a pretensão do autor encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida.

No caso dos autos a pretensão do requerente foi na pendência da presente intimação satisfeita pela entidade requerida como resulta do que refere na contestação quanto ao vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal (cujo vencimento consta do artigo 43.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º75/2013, de 12 de Setembro) e bem assim quanto aos montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa (cujo regime legal se descreve).»

~
Da tese do recorrente
Pugna o recorrente Rui ……………………………….. pela revogação da sentença recorrida, nessa parte, sustentando para o efeito, em suma, que ao assim decidir o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 268º nº 2 da CRP e os artigos 4º, 7º 61º nº 1 e 62º nº 2 do CPA, por o direito ao acesso a documentos administrativos compreender não só o direito a obter a sua reprodução mas também o direito a ser informado sobre a sua existência e conteúdo e que deste modo ao remeter para o portal a consulta de documento pedidos significa negar o acesso ao seu esclarecimento ou à sua reprodução por qualquer meio técnico.
~

Da análise e apreciação da questão
Ressuma da factualidade dada como provada que o requerente dirigiu à vereadora da Câmara Municipal de Lisboa, ………………………. , em 05/02/2015, um email no qual solicitou «…informação e documentação, ao abrigo da Lei de Acesso a Documentos Administrativos, sobre a seguinte situação:
- Curriculum Vitae de todos os assessores da Exma Vereadora …………………….
- Informação, de carácter administrativo, sobre o vencimento de todos os assessores da Exma Srª Vereadora ………………………….»
Como resulta também dado como provado que o requerente dirigiu na mesma data (05/02/2015) à Câmara Municipal de Lisboa um outro email no qual solicitou informação, com documentação, do seguinte: «- lista (raw data/dados em bruto) sobre as despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa que inclua lugar, tempo e valor discriminado no ano de 2014; - valor total das despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa; - Vencimento mensal e Curriculum Vitae dos membros do Gabinete do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa
Foi também dado como provado na sentença recorrida que o Município de Lisboa não deu resposta àqueles emails no prazo de 10 dias.
Perante a inércia da entidade requerida o requerente instaurou o presente processo visando a intimação da entidade requerida a prestar todas aquelas informações solicitadas.
Pela sentença recorrida o Mmº Juiz do Tribunal a quo decidiu o seguinte, nos termos vertidos no respetivo segmento decisório final, que se transcreve:

«Com os fundamentos expostos cabe:

- intimar no município de Lisboa a Câmara Municipal de Lisboa a, no prazo de 10 dias, facultar ao requerente o acesso ao Curriculum Vitae dos “assessores” da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa ……………………… e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa nos termos acima expostos e eventualmente expurgados de matéria que esteja abrangida pela reserva da intimidade da vida privada;

- extinguir a instância com fundamento em inutilidade superveniente da lide quanto ao pedido de informação sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal bem assim sobre os montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa;

- intimar no município de Lisboa a Câmara Municipal de Lisboa a, no prazo de 10 dias, facultar ao requerente o acesso aos montantes auferidos mensalmente pelos “assessores” Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa ……………………... e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa prestadores de serviço, na sequência de ajustes directos.»

Decisão que assentou nos seguintes fundamentos, que se passam a transcrever na íntegra:
«Dispõe o artigo 268.º, n.º1 da Constituição que “Os cidadãos têm o direito de ser informados pela Administração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sejam directamente interessados, bem como de conhecer as
resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas.”
O n.º2 do mesmo artigo da Constituição estatui que “Os cidadãos têm também o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas.”
O artigo 268.º da Constituição consagra no n.º1, um direito fundamental dos directamente interessados num procedimento administrativo e, no n.º2, o princípio do arquivo aberto, da administração aberta, ou “open file”. Estes são os dois planos do direito fundamental à informação administrativa – direito fundamental de natureza análoga aos direitos liberdades e garantias, de cujo regime beneficia.
O artigo 268.º da Constituição, distingue atendendo ao contexto em que o cidadão se dirige à Administração Pública, o direito à informação administrativa procedimental, que pressupõe a qualidade de interessado num procedimento administrativo em curso, do direito de acesso a arquivos e registos administrativos em que um dos pressupostos é precisamente que não haja um procedimento administrativo em curso.
“Ao passo que o primeiro direito (o da informação administrativa procedimental) se concebe no quadro subjectivo e cronológico de um procedimento
administrativo concreto, o segundo existirá independentemente de estar em curso qualquer procedimento administrativo”.
O processo urgente de intimação para a prestação de informações, consulta de
processos e passagem de certidões (artigos 104.º a 108.º do CPTA) compreende quer “a tutela do direito à informação procedimental fundada nos artigos 61.º a 64.º do CPA”, quer “a tutela do direito à informação extra-procedimental consagrado no artigo 268.º, n.º2 da CRP, no artigo 65.º do CPA, e na Lei nº46/2007, de 24 de Agosto”2, 3, que consagra o direito de todos, independentemente de procedimento administrativo, acederem a arquivos e registos administrativos.
Estatui o artigo 2.º, n.º1 do CPA que “As disposições” do CPA “aplicam-se a todos os órgãos da Administração Pública que, no desempenho da actividade administrativa de gestão pública, estabeleçam relações com os particulares.”
Estabelece o artigo 2.º, n.º2, alínea c) do CPA que “São órgãos da Administração Pública, para os efeitos deste Código: (…) b) Os órgãos das autarquias locais (…).”
O município de Lisboa é uma autarquia local, sendo a Câmara Municipal de Lisboa um órgão daquela pessoa colectiva.
Estabelece o artigo 65.º do CPA, no n.º1 ,que “Todas as pessoas têm o direito de
acesso aos arquivos e registos administrativos, mesmo que não se encontre em curso qualquer procedimento que lhes diga directamente respeito, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas.”
Também o artigo 4.º, n.º1, alínea e) da Lei n.º46/2007, de 24 de agosto estabelece que o estatuído neste diploma se aplica aos órgãos das autarquias locais.
O Artigo 3.º da Lei n.º46/2007, de 24 de Agosto estabelece, no n.º1, que se considera “a) «Documento administrativo» qualquer suporte de informação sob forma escrita, visual, sonora, electrónica ou outra forma material, na posse dos órgãos e entidades referidos no artigo seguinte, ou detidos em seu nome.” E “b) «Documento nominativo» o documento administrativo que contenha, acerca de pessoa singular, identificada ou identificável, apreciação ou juízo de valor, ou informação abrangida pela reserva da intimidade da vida privada.”
O Artigo 5.º daquele diploma, a LADA, estabelece como regra geral de direito de acesso a documentos administrativos o seguinte: “Todos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua existência e conteúdo.”
O artigo 6.º, n.º5 da LADA estabelece que “Um terceiro só tem direito de acesso a documentos nominativos se estiver munido de autorização escrita da pessoa a quem os dados digam respeito ou demonstrar interesse directo, pessoal e legítimo suficientemente relevante segundo o princípio da proporcionalidade.”
Dispõe o artigo 11.º da Lei n.º46/2007, de 24 de Agosto com a epígrafe “forma do acesso” o seguinte:
“1- O acesso aos documentos administrativos exerce-se através dos seguintes meios, conforme opção do requerente:
a) Consulta gratuita, efectuada nos serviços de os detêm;
b) Reprodução por fotocópia ou por qualquer meio técnico, designadamente visual, sonoro ou electrónico;
c) Certidão.
2- Os documentos são transmitidos em forma inteligível e em termos rigorosamente correspondentes aos do conteúdo do registo.
3- Quando houver risco de a reprodução causar dano ao documento, pode o requerente, a expensas suas e sob a direcção do serviço detentor, promover a cópia manual ou a reprodução por outro meio que não prejudique a sua conservação.
4- Os documentos informatizados são enviados por qualquer meio de transmissão electrónica de dados, sempre que tal for possível e desde que se trate de meio adequado à inteligibilidade e fiabilidade do seu conteúdo e em termos rigorosamente correspondentes ao do conteúdo do registo.
5- A entidade requerida não tem o dever de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido, nem a obrigação de fornecer extractos de documentos, caso isso
envolva um esforço desproporcionado que ultrapasse a simples manipulação dos
mesmos.”
O requerente solicitou pelos requerimentos de 5 de Fevereiro de 2015 à Câmara Municipal de Lisboa informação sobre os Curriculum vitae de todos os assessores da
Vereadora …………………………… e dos membros do Gabinete do Presidente da Câmara
Municipal de Lisboa.
O artigo 43.º, n.º5 da Lei n.º75/2013, de 12 de Dezembro, diploma que estabelece o regime jurídico das autarquias locais, aprova o estatuto das entidades intermunicipais, estabelece o regime jurídico da transferência de competências do Estado para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais e aprova o regime jurídico do associativismo autárquico” estatui que “aos membros dos gabinetes de apoio referidos nos números anteriores” (chefes de gabinete, adjuntos dos gabinetes de apoios e secretários dos gabinetes de apoio) “é aplicável, com as devidas adaptações, o disposto no diploma que estabelece o regime jurídico a que estão sujeitos os gabinetes dos membros do Governo no que respeita a designação, funções, regime de exclusividade, incompatibilidades, impedimentos, deveres e garantias”.
O diploma que estabelece o regime jurídico dos membros do Governo é o Decreto-Lei n.º11/2012, de 20 de Janeiro que estabelece no artigo 12.º, que tem como epígrafe “Conteúdo do despacho de designação” designadamente que “Do despacho de designação, a publicar na 2.ª série do Diário da República, constam obrigatoriamente: a) A identificação do designado, nota curricular e indicação do serviço ou entidade a que pertence e da carreira e categoria de origem do trabalhador, quando existam.”
Quando o requerente pretende aceder aos curriculum vitae dos “assessores” entende-se que pretende aceder aos CV daquele pessoal membros dos gabinetes daquela vereadora da Câmara Municipal e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Naturalmente que ao abrigo do princípio do “open file” consagrado como vimos quer na Constituição, quer no CPA, quer na LADA o requerente tem direito a aceder aos CV daqueles membros dos gabinetes, tanto mais que as respectivas notas biográficas constam obrigatoriamente publicadas em Boletim Municipal.
A entidade demandada pareceu, na contestação, entender assessores não como o pessoal membro dos gabinetes mas pessoal que exerce naqueles gabinetes serviços ao abrigo de contratos de prestação de serviços. nos termos dos artigos 112-º e seguintes do Código dos Contratos Públicos.
Também em relação a esse pessoal o requente tem direito a aceder aos respectivos CV mas na medida em que os mesmos constem da documentação anexa ao contrato e à proposta apresentada ou por qualquer forma da documentação existente na Câmara Municipal de Lisboa (não tendo o município de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido, nos termos do artigo 11.º, n.º5 da LADA).
Naturalmente que se de tal documentação constar informação abrangida pela
reserva da intimidade da vida privada (como designadamente a morada) devem os
documentos ser expurgados da mesma nos termos do artigo 6.º, n.º7 da LADA.
Quanto pois ao pedido de intimação da Câmara Municipal de Lisboa para facultar o acesso aos Curriculum Vitae dos “assessores” da Vereadora ………………….. e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, tem o mesmo de ser julgado procedente, por provado, com as ressalvas referidas.

*
Nos termos do artigo 277.º, alínea e) do Código de Processo Civil, a instância extingue-se com a inutilidade superveniente da lide. Esta tem lugar quando a pretensão do autor encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida.
No caso dos autos a pretensão do requerente foi na pendência da presente intimação satisfeita pela entidade requerida como resulta do que refere na contestação quanto ao vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal (cujo vencimento consta do artigo 43.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro) e bem assim quanto aos montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa (cujo regime legal se descreve).
Já quanto aos montantes auferidos mensalmente pelos “assessores” prestadores de serviço, na sequência de ajustes directos, tem o requerente direito a aceder a tais elementos, a isso não obstando o facto de tal informação constar eventualmente do Portal dos Contratos Públicos. Pelo que cabe julgar procedente, nesta parte, o pedido de intimação formulado e, em consequência, proceder à correspondente intimação do município de Lisboa.»

Ressuma dos fundamentos externados na sentença recorrida que o Mmº Juiz do Tribunal a quo considerou que a pretensão do requerente, no que se refere aos vencimentos dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e aos montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, foi satisfeita pela entidade requerida na pendência do processo de intimação satisfeita, em face do referido na contestação. Tendo decidido extinguir a instância com fundamento em inutilidade superveniente da lide quanto a tal parte do pedido, ao abrigo do artigo 277.º, alínea e) do CPC novo, que invocou.
Não pode, todavia, manter-se o decidido nesta parte.
Com efeito, e desde logo, não decorre da factualidade dada como provada na sentença que a entidade requerida tenha, na pendência do processo, dado satisfação à pretensão do requerente, mormente nessa parte. O que dali resulta é que o Município de Lisboa não deu resposta aos pedidos de informação efetuados pelo requerente através dos dois referidos emails de 05/02/2015 no prazo legal de 10 dias. Não decorrendo de qualquer suporte documental vertido no processo que em data posterior, e já na pendência do presente processo, tenha o Município prestado qualquer informação ao requerente. De modo que não se impõe nesta instância de recurso proceder a qualquer modificação à matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo.
Ora não se apurando nos autos que o Município requerido tenha prestado ao requerente qualquer das informações por ele solicitadas, objeto do petitório, não pode concluir-se ter-se tornado superveniente inútil a lide. Pelo que ao invés de extinguir-se a instância, quanto a parte do pedido (o atinente à informação relativa aos vencimentos dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e aos montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa), como se decidiu na sentença recorrida, deveria nela ter-se emitido pronúncia sobre o mérito do pedido também nessa parte, deferindo-o ou indeferindo-o.
Pelo que assistindo neste ponto razão ao recorrente Rui…………………………….., deve ser a sentença recorrida revogada no segmento em que com fundamento em inutilidade superveniente da lide (parcial) julgou extinta a instância quanto à parte do pedido referente ao pedido de informação sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
O que se decide.
~
Impor-se-á, por conseguinte, que em substituição se afira se o pedido de informação deve, também nessa parte, ser satisfeito, como propugnado pelo requerente, com a intimação da entidade requerida para o efeito.
O que se fará infra.
*

2.3. Da questão de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, na parte em que julgou procedente o pedido de intimação da requerida Câmara Municipal de Lisboa a facultar ao requerente o acesso ao curriculum vitae dos assessores da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa, …………………………….. e do Presidente da Câmara de Lisboa, e aos montantes por eles auferidos mensalmente.
~

Da decisão recorrida
Pela sentença recorrida o Mmº Juiz do Tribunal a quo decidiu intimar o Município de Lisboa a, no prazo de 10 dias, facultar ao requerente:
- o acesso ao Curriculum Vitae dos “assessores” da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa ………………………….. e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa nos termos acima expostos e eventualmente expurgados de matéria que esteja abrangida pela reserva da intimidade da vida privada;
- o acesso aos montantes auferidos mensalmente pelos “assessores” Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa ……………………… e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa prestadores de serviço, na sequência de ajustes diretos.
~
Da tese da recorrente
Pugna a requerida Câmara Municipal de Lisboa pela revogação da sentença recorrida na parte em que nela foi julgado procedente o pedido de intimação da requerida Câmara Municipal a facultar ao requerente o acesso ao curriculum vitae dos assessores da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa, ………………………… e do Presidente da Câmara de Lisboa, e aos montantes por eles auferidos mensalmente.
Sustenta para o efeito, nos termos que expõe nas suas alegações de recurso e reconduz às respetivas conclusões, que a sentença recorrida ao entender que o requerente tem direito a aceder à informação solicitada quanto aos montantes auferidos mensalmente pelos “assessores” prestadores de serviço, na sequência de ajustes diretos, não obstando o facto de tal informação constar eventualmente do Portal dos Contratos Públicos fez uma errada interpretação do artigo 127º nº 1 do CCP, uma vez que se trata de informação disponível no Portal dos Contratos Públicos (http://www.base.gov.pt) de consulta gratuita; que aquele Portal publica inclusivamente excertos dos contratos de prestação de serviços celebrados, e que assim, estando esta informação disponível e sendo de acesso público, se encontra plenamente assegurado o direito de acesso à tal informação administrativa; que tais contrato estão acessíveis para consulta por terceiros naquele Portal, por imposição legal; que aquele Portal permite a consulta e impressão direta desses contratos, nomes e montantes de remunerações, além de outras cláusulas dos respetivos contratos, equivalendo à pretendida certidão ou cópia certificada das informações solicitadas; que também no que concerne à intimação para fornecer o Curriculum Vitae dos assessores da Vereadora ………………………… e dos membros do Gabinete do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa a sentença recorrida fez uma errada interpretação do direito por não ter tido em consideração que não obstante o direito de acesso livre e generalizado aos documentos administrativos constituir um princípio geral da LADA, que é também digno de tutela constitucional, no âmbito do direito fundamental à liberdade de informação consagrado no artigo 73º da CRP e do direito dos jornalistas ao acesso às fontes de informação, nos termos do artigo 38º da CRP, o artigo 35º nº 4 da CRP proíbe o acesso a dados pessoais de terceiros, apenas ressalvando os casos excecionais previstos na lei; que a sentença recorrida não efetuou qualquer observação quanto à necessidade de articulação entre dois direitos, liberdades e garantias, tendo efetuado uma errada interpretação dos artigos 5º e 6º da LADA por os não ter articulado com as Lei de Proteção de Dados e com a CRP; que a sentença efetuou uma errada interpretação do direito, por não obstante o direito de acesso livre e generalizado aos documentos administrativos constituir um princípio geral da LADA, que é também digno de tutela constitucional no âmbito do direito fundamental à liberdade de informação consagrado no artigo 37º da CRP e do direito dos jornalistas ao acesso às fontes de informação, nos termos do artigo 38º da CRP, o nº 4 do artigo 35º da CRP proíbe o acesso a dados pessoas de terceiros, apenas o ressalvando os casos excecionais previstos na lei, a sentença fez uma errada interpretação dos artigos 5º e 6º da LADA por os não ter articulado com a Lei de Proteção de Dados e com a CRP; que os curriculum vitae dos referidos assessores de vereação e membros do gabinete do presidente da Câmara Municipal de Lisboa configuram documentos nominativos nos termos do artigo 3º nº 1 alínea b) da LADA por conterem dados pessoais, com informações que se encontram abrangidas e tuteladas pela reserva da intimidade da vida privada, cujo acesso está vedado, exceto se autorizado pelo respetivo titular ou quando o terceiro demonstrar interesse direto, pessoal e legítimo suficientemente relevante no acesso, e que tal não sucede no caso; que ao interpretar o princípio «open file» da forma ampla como o fez a sentença efetuou uma errada interpretação do direito; que o conceito de dados pessoais que resulta da Lei de Proteção de Dados (LPD) (cfr. alínea a) do artigo 3º da Diretiva 95/46/CE) inclui as informações que apesar de não se encontrarem abrangidas e tuteladas pela reserva da intimidade da vida privada revestem um caracter sensível (v.g. interesses pessoais, dados referentes a filiação ou atividade partidária, entre outros) que deve ser ponderado e articulado com os outros direitos igualmente dignos de tutela, e que a sentença omitiu tal atividade de ponderação; que as normas dos artigos 5º e 6º da LADA, em que o Tribunal a quo fundamentou a decisão recorrida, são inconstitucionais por violação do artigo 35º nº 4 da CRP na medida em que aqueles normativos admitem como regra o acesso a documentos administrativos mesmo que contenham dados pessoais, não conferindo a CRP ao legislador ordinário a possibilidade de transformar em regra o que nela foi definido como exceção, invocando em abono da sua tese a Deliberação nº 241/2014 da Comissão Nacional de Proteção de Dados, na qual, diz, foi entendido que a LADA poderá encontrar-se ferida de inconstitucionalidade por omissão legislativa e por omissão material, por violação do artigo 13º da CRP, por conter um regime legal menos garantístico do direito fundamental à proteção de dados do que o artigo 7º da Lei de Proteção de Dados, ficando aquém do nível de proteção que a CRP pretende ver assegurado no plano legislativo, incorrendo nesta dimensão em omissão legislativa, e por outro lado por haver uma diferenciação de tratamento dos titulares dos dados pessoais, consoante os seus dados se encontrem na posse de entidades públicas e restantes entidades no artigo 4º da LADA ou na posse de entidades privadas não abrangidas por aquele dispositivo, em incumprimento do artigo 13º da CRP, por conseguinte, com violação do princípio da igualdade e que o artigo 268º nº 2 da CRP salvaguarda especificamente como limite de acesso aos arquivos e registos administrativos o regime legal relativo à intimidade das pessoas, não se reconduzindo tal regime apenas ao contido na LADA.
~

Da análise e apreciação da questão
A Constituição da República Portuguesa (CRP) consagra e distingue, no seu artigo 268º o direito de informação sobre o andamento dos processos em que se seja interessadodispondo que “os cidadãos têm o direito de ser informados pela Administração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sejam diretamente interessados, bem como o de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas” (nº 1) – e o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos – dispondo que “os cidadãos têm também o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas”. (nº 2).
O direito de informação dos cidadãos encerra, pois, uma vertente procedimental (cfr. nº 1 do artigo 268º da CRP), e uma vertente não procedimental (cfr. nº 2 do artigo 268º da CRP).
Enquanto a primeira está intimamente ligada ao direito de participação dos cidadãos na formação das decisões que lhes digam respeito (cfr. artigo 267º nº 5 da CRP e o artigo 8º do CPA), a segunda prende-se com o princípio da administração aberta, assegurando o acesso genérico aos documentos administrativos de acordo com os princípios da publicidade e da transparência.
Sendo que cada uma dessas vertentes está submetida a um regime jurídico próprio, desenvolvido para concretizar e conferir operatividade àqueles princípios constitucionais. Assim, e sem prejuízo da existência de regimes especiais, enquanto o Código de Procedimento Administrativo (CPA) estabelece (artigos 61º a 64º) o regime jurídico do acesso procedimental, à luz do nº 1 do artigo 268º da CRP, já a Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (LADA) (Lei nº 46/2007), estabelece, à luz do nº 2 do artigo 268º da CRP, o regime do acesso extra-procedimental (cfr. artigos 1º e 5º da LADA).
Em todo o caso há-de estar-se perante “documento administrativo” na aceção acolhida no artigo 3º nº 1 alínea a) da LADA, e que é a seguinte: “qualquer suporte de informação sob forma escrita, visual, sonora, eletrónica ou outra forma material, na posse dos órgãos e entidades referidos no artigo seguinte, ou detidos em seu nome”.
E na aceção acolhida no artigo 3º nº 1 alínea b) da LADA, constitui «documento nominativo» o “documento administrativo que contenha, acerca de pessoa singular, identificada ou identificável, apreciação ou juízo de valor, ou informação abrangida pela reserva da intimidade da vida privada”.
Sendo que os órgãos ou entidades a considerar, elencados para tal efeito no artigo 4º da LADA, são os seguintes:
“a) Órgãos do Estado e das Regiões Autónomas, que integrem a Administração Pública;
b) Demais órgãos do Estado e das Regiões Autónomas, na medida em que desenvolvam funções materialmente administrativas;
c) Órgãos dos institutos públicos e das associações e fundações públicas;
d) Órgãos das empresas públicas;
e) Órgãos das autarquias locais e das suas associações e federações;
f) Órgãos das empresas regionais, intermunicipais e municipais;
g) Outras entidades no exercício de funções administrativas ou de poderes públicos.”

Dispõe o artigo 5º da LADA que “Todos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua existência e conteúdo.”
Estabelece todavia o artigo 6º da LADA algumas restrições ao direito de acesso, prevendo designadamente que “um terceiro só tem direito de acesso a documentos nominativos se estiver munido de autorização escrita da pessoa a quem os dados digam respeito ou demonstrar interesse direto, pessoal e legítimo suficientemente relevante segundo o princípio da proporcionalidade” (nº 5). Mas assegurando, ainda assim, que “os documentos administrativos sujeitos a restrições de acesso são objeto de comunicação parcial sempre que seja possível expurgar a informação relativa à matéria reservada.” (nº 7)
E quanto ao exercício do direito de acesso aos documentos administrativos dispõe o artigo 11º da LADA o seguinte:
Artigo 11.º
Forma do acesso
1 - O acesso aos documentos administrativos exerce-se através dos seguintes meios, conforme opção do requerente:
a) Consulta gratuita, efetuada nos serviços que os detêm;
b) Reprodução por fotocópia ou por qualquer meio técnico, designadamente visual, sonoro ou eletrónico;
c) Certidão.
2 - Os documentos são transmitidos em forma inteligível e em termos rigorosamente correspondentes aos do conteúdo do registo.
3 - Quando houver risco de a reprodução causar dano ao documento, pode o requerente, a expensas suas e sob a direção do serviço detentor, promover a cópia manual ou a reprodução por outro meio que não prejudique a sua conservação.
4 - Os documentos informatizados são enviados por qualquer meio de transmissão eletrónica de dados, sempre que tal for possível e desde que se trate de meio adequado à inteligibilidade e fiabilidade do seu conteúdo e em termos rigorosamente correspondentes ao do conteúdo do registo.
5 - A entidade requerida não tem o dever de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido, nem a obrigação de fornecer extratos de documentos, caso isso envolva um esforço desproporcionado que ultrapasse a simples manipulação dos mesmos”.

O processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões de que o requerente lançou mão encontra-se previsto e regulado nos artigos 104º a 108º do CPTA, e pode ser intentado quando não seja dada integral satisfação aos pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos ou ainda quando ocorra notificação ou publicação deficiente de ato administrativo – é o que resulta do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 104º do CPTA.
Com efeito, dispõe o nº1 do artigo 104º do CPTA que “quando não seja dada integral satisfação aos pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, o interessado pode requerer a intimação da entidade administrativa competente”. Dispondo ainda o nº 2 do mesmo artigo que “o pedido de intimação é igualmente aplicável nas situações previstas no nº 2 do artigo 60º” do mesmo Código (que lembre-se são as que respeitam à notificação ou publicação deficiente de atos administrativos, por não conterem a indicação do autor, da data ou dos fundamentos da decisão).
Considerando que o pedido de informação foi formulado pelo requerente com invocação da sua qualidade de jornalista importa ainda avocar o artigo 37º nº 1 da CRP, que dispõe, sob a epígrafe de “liberdade de expressão e informação”, que todos “têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações”. Implicando a liberdade de imprensa, nos termos do disposto no artigo 38º nº 2 alínea b) da CRP “o direito dos jornalistas, nos termos da lei, ao acesso às fontes de informação e à proteção da independência e do sigilo profissionais”. Extraindo-se destes preceitos constitucionais que o direito de informação é um direito fundamental (autónomo relativamente à liberdade de expressão) e que o mesmo constitui, como dizem Jorge Miranda e Rui Medeiros, in, “Constituição Portuguesa Anotada”, Tomo I, 2.ª edição, págs. 852 e 866, uma “estrutura complexa que envolve uma tríade de direitos: (i) o direito de comunicar publicamente informações sem impedimentos nem discriminações; (ii) o direito de procurar informações sem impedimentos nem discriminações; e (iii) o direito de receber informações e de ser mantido informado sem impedimentos nem discriminações”, abrangendo o direito de acesso às fontes de informação “quer os factos, as situações, as notícias, as opiniões, os juízos de valor, etc., quer os conteúdos veiculados pelos diversos meios de comunicação suscetíveis de tratamento jornalístico”.
Como importa ter presente que o artigo 8º do Estatuto do Jornalista (aprovado pela Lei nº 1/99, de 1 de Janeiro), sob a epígrafe “direito de acesso a fontes oficiais de informação”, dispõe que o direito de acesso às fontes de informação é assegurado aos jornalistas “pelos órgãos da Administração Pública enumerados no n.º 2 do artigo 2.º do Código do Procedimento Administrativo (alínea a) do nº 1), sendo que tal direito “não abrange os processos em segredo de justiça, os documentos classificados ou protegidos ao abrigo de legislação específica, os dados pessoais que não sejam públicos dos documentos nominativos relativos a terceiros, os documentos que revelem segredo comercial, industrial ou relativo à propriedade literária, artística ou científica, bem como os documentos que sirvam de suporte a atos preparatórios de decisões legislativas ou de instrumentos de natureza contratual. (nº 3).
A sentença recorrida discorreu o seguinte no seu corpo fundamentador a respeito da decisão de procedência da intimação, nos termos decididos:
“Estabelece o artigo 65.º do CPA, no n.º1, que “Todas as pessoas têm o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, mesmo que não se encontre em curso qualquer procedimento que lhes diga directamente respeito, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas.”
Também o artigo 4.º, n.º1, alínea e) da Lei n.º46/2007, de 24 de agosto estabelece que o estatuído neste diploma se aplica aos órgãos das autarquias locais.
O Artigo 3.º da Lei n.º46/2007, de 24 de Agosto estabelece, no n.º1, que se considera “a) «Documento administrativo» qualquer suporte de informação sob forma escrita, visual, sonora, electrónica ou outra forma material, na posse dos órgãos e entidades referidos no artigo seguinte, ou detidos em seu nome.” E “b) «Documento nominativo» o documento administrativo que contenha, acerca de pessoa singular, identificada ou identificável, apreciação ou juízo de valor, ou informação abrangida pela reserva da intimidade da vida privada.”
O Artigo 5.º daquele diploma, a LADA, estabelece como regra geral de direito de acesso a documentos administrativos o seguinte: “Todos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua existência e conteúdo.”
O artigo 6.º, n.º5 da LADA estabelece que “Um terceiro só tem direito de acesso
a documentos nominativos se estiver munido de autorização escrita da pessoa a quem os dados digam respeito ou demonstrar interesse directo, pessoal e legítimo suficientemente relevante segundo o princípio da proporcionalidade.”
Dispõe o artigo 11.º da Lei n.º46/2007, de 24 de Agosto com a epígrafe “forma
do acesso” o seguinte:
“1- O acesso aos documentos administrativos exerce-se através dos seguintes meios, conforme opção do requerente:
a) Consulta gratuita, efectuada nos serviços de os detêm;
b) Reprodução por fotocópia ou por qualquer meio técnico, designadamente
visual, sonoro ou electrónico;
c) Certidão.
2- Os documentos são transmitidos em forma inteligível e em termos rigorosamente correspondentes aos do conteúdo do registo.
3- Quando houver risco de a reprodução causar dano ao documento, pode o requerente, a expensas suas e sob a direcção do serviço detentor, promover a cópia manual ou a reprodução por outro meio que não prejudique a sua conservação.
4- Os documentos informatizados são enviados por qualquer meio de transmissão electrónica de dados, sempre que tal for possível e desde que se trate de meio adequado à inteligibilidade e fiabilidade do seu conteúdo e em termos
rigorosamente correspondentes ao do conteúdo do registo.
5- A entidade requerida não tem o dever de criar ou adaptar documentos para
satisfazer o pedido, nem a obrigação de fornecer extractos de documentos, caso isso
envolva um esforço desproporcionado que ultrapasse a simples manipulação dos
mesmos.”

O requerente solicitou pelos requerimentos de 5 de Fevereiro de 2015 à Câmara
Municipal de Lisboa informação sobre os Curriculum vitae de todos os assessores da
Vereadora ………………………… e dos membros do Gabinete do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
O artigo 43.º, n.º5 da Lei n.º75/2013, de 12 de Dezembro, diploma que estabelece o regime jurídico das autarquias locais, aprova o estatuto das entidades intermunicipais, estabelece o regime jurídico da transferência de competências do Estado para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais e aprova o regime jurídico do associativismo autárquico” estatui que “aos membros dos gabinetes de apoio referidos nos números anteriores” (chefes de gabinete, adjuntos dos gabinetes de apoios e secretários dos gabinetes de apoio) “é aplicável, com as devidas adaptações, o disposto no diploma que estabelece o regime jurídico a que estão sujeitos os gabinetes dos membros do Governo no que respeita a designação, funções, regime de exclusividade, incompatibilidades, impedimentos, deveres e garantias”.
O diploma que estabelece o regime jurídico dos membros do Governo é o Decreto-Lei n.º11/2012, de 20 de Janeiro que estabelece no artigo 12.º, que tem como epígrafe “Conteúdo do despacho de designação” designadamente que “Do despacho de designação, a publicar na 2.ª série do Diário da República, constam obrigatoriamente: a) A identificação do designado, nota curricular e indicação do serviço ou entidade a que pertence e da carreira e categoria de origem do trabalhador, quando existam.”
Quando o requerente pretende aceder aos curriculum vitae dos “assessores” entende-se que pretende aceder aos CV daquele pessoal membros dos gabinetes daquela vereadora da Câmara Municipal e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Naturalmente que ao abrigo do princípio do “open file” consagrado como vimos quer na Constituição, quer no CPA, quer na LADA o requerente tem direito a aceder aos CV daqueles membros dos gabinetes, tanto mais que as respectivas notas biográficas constam obrigatoriamente publicadas em Boletim Municipal.
A entidade demandada pareceu, na contestação, entender assessores não como o pessoal membro dos gabinetes mas pessoal que exerce naqueles gabinetes serviços ao abrigo de contratos de prestação de serviços, nos termos dos artigos 112-º e seguintes do Código dos Contratos Públicos.
Também em relação a esse pessoal o requente tem direito a aceder aos respectivos CV mas na medida em que os mesmos constem da documentação anexa ao contrato e à proposta apresentada ou por qualquer forma da documentação existente na Câmara Municipal de Lisboa (não tendo o município de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido, nos termos do artigo 11.º, n.º5 da LADA).
Naturalmente que se de tal documentação constar informação abrangida pela reserva da intimidade da vida privada (como designadamente a morada) devem os documentos ser expurgados da mesma nos termos do artigo 6.º, n.º7 da LADA.
Quanto pois ao pedido de intimação da Câmara Municipal de Lisboa para facultar o acesso aos Curriculum Vitae dos “assessores” da Vereadora ………………… e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, tem o mesmo de ser julgado procedente, por provado, com as ressalvas referidas.” - (vide págs. 7 a 10 da sentença).

E mais à frente nela foi externado ainda o seguinte:
“No caso dos autos a pretensão do requerente foi na pendência da presente intimação satisfeita pela entidade requerida como resulta do que refere na contestação quanto ao vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal (cujo vencimento consta do artigo 43.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º75/2013, de 12 de Setembro) e bem assim quanto aos montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa (cujo regime legal se descreve).
Já quanto aos montantes auferidos mensalmente pelos “assessores” prestadores de serviço, na sequência de ajustes directos, tem o requerente direito a aceder a tais elementos, a isso não obstando o facto de tal informação constar eventualmente do Portal dos Contratos Públicos. Pelo que cabe julgar procedente, nesta parte, o pedido de intimação formulado e, em consequência, proceder à correspondente intimação do município de Lisboa.”(vide págs. 10 a 11 da sentença).

E foi com tal fundamentação que nela se decidiu intimar a entidade requerida a, no prazo de 10 dias, facultar ao requerente:
- o acesso ao Curriculum Vitae dos “assessores” da Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa ……………………… e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa nos termos acima expostos e eventualmente expurgados de matéria que esteja abrangida pela reserva da intimidade da vida privada;
- o acesso aos montantes auferidos mensalmente pelos “assessores” Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa …………………. e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa prestadores de serviço, na sequência de ajustes diretos.

E antecipe-se desde já que é de manter o assim decidido, não merecendo acolhimento o invocado pela entidade requerida no presente recurso, pelo que se verá.
~
2.3.1. - No que tange ao invocado erro de julgamento, por errada interpretação do artigo 127º nº 1 do CCP, no que respeita ao entendimento, feito na sentença recorrida, de que o requerente tem direito a aceder à informação solicitada quanto aos montantes auferidos mensalmente pelos “assessores” prestadores de serviço, na sequência de ajustes diretos, apesar de se tratar de informação disponível no Portal dos Contratos Públicos (http://www.base.gov.pt), de consulta gratuita, atenha-se que, com efeito, nos termos do disposto no artigo 127º do Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado pelo DL. nº 18/2008, de 29 de Janeiro, na redação atual (resultante das alterações introduzidas pelo DL. nº 278/2009, de 2 de Outubro e pela Lei nº 64-B/2011, de 30 de Dezembro) “a celebração de quaisquer contratos na sequência de ajuste direto deve ser publicitada, pela entidade adjudicante, no portal da Internet dedicado aos contratos públicos” (nº 1), publicitação que, aliás, é condição do respetivo contrato, independentemente da sua redução ou não a escrito, nomeadamente para efeitos de quaisquer pagamentos (cfr. nº 3 do mesmo artigo 127º).
A este respeito alega a entidade recorrida que os contratos em causa estão acessíveis para consulta por terceiros no referido Portal dos Contratos Públicos, por imposição legal do artigo 127º nº 1 do CCP, e que este portal configura uma sítio legal, público e fidedigno, que permite a consulta e impressão direta desses contratos, nomes e montantes de remuneração, além de outras cláusulas, e que tal equivale à pretendida certidão ou cópia certificada das informações solicitadas.
O referido Portal dos Contratos Públicos está previsto no artigo 4º do DL 18/2008, de 29 de Janeiro (diploma que aprovou o CCP), e a sua constituição, funcionamento e gestão encontra-se regulamentada na Portaria nº 701-F/2008, de 29 de Julho. Ele constitui um espaço multifuncional destinado a disponibilizar a informação sobre a formação e a execução dos contratos públicos sujeitos às regras de formação ou execução previstas no Código dos Contratos Públicos (CCP) e é composto pelas seguintes componentes (cfr. artigo 2º nº 1 da Portaria nº 701-F/2008):
a) Um sistema de informação, designado por Observatório das Obras Públicas, previsto no n.º 1 do artigo 466.º do Código dos Contratos Públicos, dedicado aos contratos de empreitada de obras públicas, de concessão de obras públicas, de empreitadas de obras públicas integradas em concessões, e que incluirá, ainda, informação relativa à aquisição de serviços relacionados com obras públicas;
b) Um sistema de informação dedicado aos contratos de locação e aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços, não enquadráveis na alínea anterior;
c) Uma área comum dedicada a todos os contratos públicos cuja formação ou execução se encontre sujeita ao CCP, incluindo os anteriores.
E o Portal dos Contratos Públicos disponibiliza, obrigatoriamente, na sua área comum, informação sobre, designadamente a “celebração de quaisquer contratos na sequência de ajuste direto, a qual deve ser publicitada pela entidade adjudicante, nos termos do n.º 1 do artigo 127.º do Código” (cfr. artigo 4º nº 1 da Portaria nº 701-F/2008).
Mas a obrigatoriedade de publicitação dos contratos no Portal, imposta pelo artigo 127º nº 1 do CCP não colide, nem exclui, o exercício do direito à informação e ao acesso aos documentos administrativos consagrado no artigo 268º nº 2 da CRP e concretizado designadamente na LADA, mormente nos termos previstos no seu artigo 11º.
A este respeito já se pronunciou, aliás, este Tribunal Central Administrativo no recente acórdão de 31/07/2015, Proc. 11.954/15, in, www.dgsi.pt/jtcas, entendendo precisamente que “a circunstância de as informações e os documentos estarem disponíveis no Portal dos Contratos Públicos não é reconhecida, à face da Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto, como fundamento para recusa do acesso aos documentos pelas vias previstas no seu art. 11º.”.
O que vem na esteira do entendimento que já havia sido sufragado pelo STA no seu Acórdão de 31/08/2011, Proc. 758/11, in, www.dgsi.pt/jsta, no sentido de que a circunstância de os documentos estarem publicados não é reconhecida, à face da Lei n.º 46/2007 como fundamento para recusa ao seu acesso pelas vias previstas no seu art. 11.º, por, como ali se disse, “à face da Lei n.º 46/2007, é o interessado no acesso à informação que decide se pretende ou não exercer o seu direito nos termos que a lei lho faculta, não sendo obstáculo a esse exercício a eventualidade de acesso à informação também ser viável por outras vias.”.
Pelo que a esta luz, não constitui motivo justificado para recusa da informação solicitada, com acesso aos respetivos documentos administrativos, atinentes ao curriculum vitae e vencimentos dos identificados assessores a circunstância de os respetivos contratos se encontrarem publicitados no Portal dos Contratos Públicos nos termos impostos no artigo 127º nº 1 do CCP.
De todo o modo diga-se ainda que não resulta apurado nos autos que os ditos contratos, alegadamente celebrados por adjudicação direta, se encontrem efetivamente publicitados no Portal dos Contratos Públicos. Trata-se, na verdade de factualidade que não foi dada como provada, nem existem elementos nos autos que permitam a este Tribunal de recurso aditá-la oficiosamente ao abrigo do disposto no artigo 662º do CPC novo (correspondente ao anterior artigo 712º). Pelo que, também por essa razão, não se mostrando comprovada a efetiva possibilidade de acesso à informação, e documentos pretendidos, pela consulta no Portal, sempre teria que intimar-se a entidade requerida a fornecê-los, nos termos requeridos.
Improcedem pois, pelo exposto, as conclusões D. a J. das alegações de recurso da entidade requerida.
~
2.3.2. – No que tange ao invocado erro de julgamento no que concerne à intimação para fornecer o Curriculum Vitae dos assessores da Vereadora …………………….. e dos membros do Gabinete do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, por errada interpretação dos artigos 5º e 6º da LADA por falta de articulação e compatibilização com a Lei de Proteção de Dados e com os artigos 37º, 38º e 35º nº 4 da CRP, na medida em que os mesmos configuram documentos nominativos nos termos do artigo 3º nº 1 alínea b) da LADA por conterem dados pessoais, com informações que se encontram abrangidas e tuteladas pela reserva da intimidade da vida privada, cujo acesso está vedado, exceto se autorizado pelo respetivo titular ou quando o terceiro demonstrar interesse direto, pessoal e legítimo suficientemente relevante no acesso, diga-se desde logo que perscrutada a sentença recorrida constata-se que nela foi externado o seguinte, que se para a transcrever:
“O requerente solicitou pelos requerimentos de 5 de Fevereiro de 2015 à Câmara Municipal de Lisboa informação sobre os Curriculum vitae de todos os assessores da Vereadora ……………………… e dos membros do Gabinete do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
O artigo 43.º, n.º5 da Lei n.º75/2013, de 12 de Dezembro, diploma que estabelece o regime jurídico das autarquias locais, aprova o estatuto das entidades intermunicipais, estabelece o regime jurídico da transferência de competências do Estado para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais e aprova o regime jurídico do associativismo autárquico” estatui que “aos membros dos gabinetes de apoio referidos nos números anteriores” (chefes de gabinete, adjuntos dos gabinetes de apoios e secretários dos gabinetes de apoio) “é aplicável, com as devidas adaptações, o disposto no diploma que estabelece o regime jurídico a que estão sujeitos os gabinetes dos membros do Governo no que respeita a designação, funções, regime de exclusividade, incompatibilidades, impedimentos, deveres e garantias”.
O diploma que estabelece o regime jurídico dos membros do Governo é o Decreto-Lei n.º11/2012, de 20 de Janeiro que estabelece no artigo 12.º, que tem como epígrafe “Conteúdo do despacho de designação” designadamente que “Do despacho de designação, a publicar na 2.ª série do Diário da República, constam obrigatoriamente: a) A identificação do designado, nota curricular e indicação do serviço ou entidade a que pertence e da carreira e categoria de origem do trabalhador, quando existam.”
Quando o requerente pretende aceder aos curriculum vitae dos “assessores” entende-se que pretende aceder aos CV daquele pessoal membros dos gabinetes daquela vereadora da Câmara Municipal e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Naturalmente que ao abrigo do princípio do “open file” consagrado como vimos quer na Constituição, quer no CPA, quer na LADA o requerente tem direito a aceder aos CV daqueles membros dos gabinetes, tanto mais que as respectivas notas biográficas constam obrigatoriamente publicadas em Boletim Municipal.”

E continua:

“A entidade demandada pareceu, na contestação, entender assessores não como o pessoal membro dos gabinetes mas pessoal que exerce naqueles gabinetes serviços ao abrigo de contratos de prestação de serviços, nos termos dos artigos 112-º e seguintes do Código dos Contratos Públicos.
Também em relação a esse pessoal o requente tem direito a aceder aos respectivos CV mas na medida em que os mesmos constem da documentação anexa ao contrato e à proposta apresentada ou por qualquer forma da documentação existente na Câmara Municipal de Lisboa (não tendo o município de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido, nos termos do artigo 11.º, n.º5 da LADA).”

Ao que acrescenta:

“Naturalmente que se de tal documentação constar informação abrangida pela reserva da intimidade da vida privada (como designadamente a morada) devem os documentos ser expurgados da mesma nos termos do artigo 6.º, n.º7 da LADA.”

Concluindo do seguinte modo:

“Quanto pois ao pedido de intimação da Câmara Municipal de Lisboa para facultar o acesso aos Curriculum Vitae dos “assessores” da Vereadora ………………….. e do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, tem o mesmo de ser julgado procedente, por provado, com as ressalvas referidas.”

Resulta assim, como é bom de ver, que o Tribunal a quo atendeu na sentença recorrida à necessidade de salvaguardar a informação abrangida pela reserva da intimidade da vida privada. Tendo obedecido, designadamente, ao estatuído no artigo 6º nº 7 da LADA nos termos do qual “os documentos administrativos sujeitos a restrições de acesso são objeto de comunicação parcial sempre que seja possível expurgar a informação relativa à matéria reservada”.
Sendo certo que adequada e cautelosamente o Tribunal a quo ponderou a circunstância de os Curriculum vitae pretendidos (ou, noutra designação, as «notas biográficas») estarem sujeitos a publicitação oficial. Pelo que nessa medida não se justificava a sua reserva, antes se impunha, também por efeito da natureza pública das funções, que se assegurasse o seu acesso ao requerente.
Foi pois, nesta medida, correto o entendimento do Tribunal a quo.
Não colhendo a invocação, que a entidade requerida faz, da Lei da Proteção de Dados Pessoais (LPD), aprovada pela Lei nº 67/98, de 26 de Outubro.
Com efeito este diploma regula, em transposição para a ordem jurídica portuguesa da Diretiva nº 95/46/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Outubro de 1995, a proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento dos dados pessoais e à livre circulação desses dados. Entendendo para os seus efeitos por «Tratamento de dados pessoais» “qualquer operação ou conjunto de operações sobre dados pessoais, efectuadas com ou sem meios automatizados, tais como a recolha, o registo, a organização, a conservação, a adaptação ou alteração, a recuperação, a consulta, a utilização, a comunicação por transmissão, por difusão ou por qualquer outra forma de colocação à disposição, com comparação ou interconexão, bem como o bloqueio, apagamento ou destruição” (cfr. artigo 3º alínea b)). E por «dados pessoais» “qualquer informação, de qualquer natureza e independentemente do respetivo suporte, incluindo som e imagem, relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável («titular dos dados»)” (cfr. artigo 3º nº 1 alínea a)).
Diploma que concretiza simultaneamente o comando constitucional inserto no nº 2 do artigo 35º da CRP de acordo com o qual “a lei define o conceito de dados pessoais, bem como as condições aplicáveis ao seu tratamento automatizado, conexão, transmissão e utilização, e garante a sua proteção, designadamente através de entidade administrativa independente”.
E se é certo que o nº 4 do artigo 35º da CRP consagra como princípio a proibição de acesso a dados pessoais de terceiros, tal princípio comporta exceções, como decorre da expressa ressalva contida naquele nº 4 do artigo 35º da CRP “…salvo em casos excecionais previstos na lei”. Não se trata, por conseguinte, de um princípio absoluto.
Ora a solução à questão de saber se num caso concreto deve ou não ser franqueado o acesso a documento nominativo passa necessariamente pela ponderação, num juízo de proporcionalidade, dos interesses em causa, para que ademais expressamente remetem os nºs 5 e 7 do artigo 6º da LADA. E essa proporcionalidade foi salvaguardada na sentença recorrida, precavendo-se ali a reserva quanto à informação abrangida pela reserva da intimidade da vida privada.
Têm pois que improceder as conclusões L. a R. das alegações de recurso da entidade requerida.
~
2.3.3. – E também não colhe o pugnando pela entidade requerida no que respeita à invocação de inconstitucionalidade das normas dos artigos 5º e 6º da LADA, por violação dos artigos 35º nº 4 e 13º da CRP.
Como já se disse a Constituição da República Portuguesa (CRP) consagra no seu artigo 268º nº 2 o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos dispondo que “os cidadãos têm também o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas”.
O que significa que é desde logo antevista naquele normativo a compressão do direito de acesso à documentação na posse da administração, designadamente quanto esteja em causa matéria relativa à intimidade das pessoas.
De modo que a regra do princípio da administração aberta não é, em face do artigo 268º nº 2 da CRP, absoluto. E é desde logo a essa luz que os artigos 5º e 6º da LADA, que lhe dão concretização, devem ser lidos e interpretados. E como é bom de ver, se bem que o artigo 5º da LADA garanta que “todos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua existência e conteúdo”, a própria LADA consagra situações de restrições àquele direito de acesso, o que faz designadamente no seu artigo 6º.
Por outro lado se é certo que o nº 4 do artigo 35º da CRP consagra como princípio a proibição de acesso a dados pessoais de terceiros, também é ali desde logo previsto o seu excecionamento em casos a prever na lei, como decorre da expressa ressalva contida na parte final daquele nº 4. De modo que não se trata da consagração de princípio geral absoluto de proibição de acesso a dados pessoais de terceiros, mas de um princípio que comporta, também ele, compressões.
E é também a essa luz que devem ser lidos e interpretados os artigos 5º e 6º da LADA.
Nem se vê em que medida ou dimensão possam os artigos 5º e 6º da LADA ser materialmente inconstitucionais por violação do artigo 13º da CRP no qual é assegurado que “todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei” (nº 1) e que “ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual” (nº 2). Sendo certo que o tratamento diferenciado do acesso a dados, que possa existir nos termos legais, quando estes estão na posse de entidades públicas administrativas ou equiparadas (cfr. artigo 4º da LADA), por contraposição ao que ocorre quando os dados estão na posse de privados, é precisamente justificado pela natureza pública administrativa das funções asseguradas, e pelos valores e interesses que nesse caso estão em jogo.
Não colhem, pois, as conclusões S. a CC. das alegações de recurso da entidade requerida.
~
Aqui chegados, e por tudo visto, não merece provimento também nesta parte o recurso da entidade requerida, devendo manter-se o julgamento de procedência da intimação feito na sentença recorrida.
O que se decide.
**

3. Do conhecimento, em substituição, quanto à parte do pedido de intimação referente à informação sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Tendo a sentença recorrida sido revogada no segmento em que com fundamento em inutilidade superveniente da lide (parcial) se julgou extinta a instância quanto à parte do pedido referente ao pedido de informação sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, nos termos decididos supra (ponto 2.2.) cumpre agora que em substituição se afira se o pedido de informação deve, também nessa parte, ser satisfeito, como propugnado pelo requerente, com intimação da entidade requerida para o efeito.
Ora por tudo o que já se disse supra, e não há necessidade de reproduzir, tem que concluir-se que não tendo a entidade requerida dado satisfação à pretensão do requerente também nessa parte, não tendo dado resposta aos pedidos de informação efetuados pelo requerente através dos dois referidos emails de 05/02/2015 no prazo legal de 10 dias, impõe-se conceder provimento ao pedido de intimação também nesta parte.
É que se bem que como referido pela entidade requerida na sua contestação resulte da lei, designadamente dos artigos 6º e ss. do Estatuto dos Eleitos Locais, aprovado pela Lei nº 29/87, de 30 de Junho, na redação atual, o modo de cálculo do valor da remuneração base dos presidentes das Câmaras Municipais, e vereadores, bem como do valor das despesas de representação, tal não implica que a entidade requerida não tenha que dar satisfação ao pedido de informação, formulado pelo requerente em 05/02/2015, já que é absolutamente insuficiente a mera referência para aqueles normativos legais, os quais não fixam valores concretos, mas apenas os valores de referência, indexados designadamente ao vencimento base atribuído ao Presidente da República.
Assim, e em substituição, concede-se provimento à intimação no que respeita ao pedido de informação sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e bem assim sobre os montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Intimando-se, por conseguinte, a entidade requerida a, no prazo de 10 dias, prestar ao requerente a pretendida informação.
O que se decide.

**

IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em:
- negar total provimento ao recurso jurisdicional interposto pela entidade requerida, confirmando-se a sentença recorrida na parte em que vinha impugnada;
- conceder total provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo requerente, revogando-se a sentença recorrida no segmento em que com fundamento em inutilidade superveniente da lide (parcial) se julgou extinta a instância quanto à parte do pedido referente ao pedido de informação sobre o vencimento dos membros dos gabinetes de apoio de pessoal e montantes relativos às despesas de representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, e em substituição conceder provimento a tal pedido, intimando-se a entidade requerida a, no prazo de 10 dias, prestar ao requerente a informação pretendida.
~

Custas pela entidade requerida - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigo 7º e 12º nº 2 do RCP e 189º nº 2 do CPTA.
*
Notifique.
D.N.
*
Lisboa, 1 de Outubro de 2015


______________________________________________________
Maria Helena Barbosa Ferreira Canelas (relatora)




______________________________________________________
António Paulo Esteves Aguiar de Vasconcelos




______________________________________________________
Catarina de Moura Ferreira Ribeiro Gonçalves Jarmela