Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03163/09
Secção:Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/25/2009
Relator:Eugénio Sequeira
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. IRC. CUSTOS. PROVA.
Sumário:1. Tendo a AF coligido para os autos indícios certos e seguros da prova da falsidade das facturas desconsideradas como custos, cabia por sua vez à contribuinte, infirmá-los ou seja efectuar a prova da efectiva aderência de tais facturas com a realidade, no que consistiam "os factos e as razões de direito que fundamentam o pedido", ou sejam as razões que podem levar à almejada anulação, ou ainda, criar a fundada dúvida sobre os mesmos;
2. Não logra fazer tal prova, a impugnante que através dos depoimentos das testemunhas inquiridas e dos documentos juntos não alcança a prova da efectiva aderência de tais facturas com a realidade, e nem, sequer, coloca em dúvida séria, fundada, que tais prestações de serviços não tenham, efectivamente, acontecido, com a dimensão que da sua contabilidade emanava.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. L ...– ..., Lda, identificada nos autos, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


A) – A R. reafirma, na íntegra o conteúdo da Impugnação Judicial objecto da Douta Sentença recorrida;
B) - Os autos referem-se ao desacordo manifestado pela R. em relação às correcções que a AT introduziu na matéria colectável em sede de IRC, relativas aos exercícios de 1994 e 1995, de onde resultou uma liquidação adicional de IRC de l995 totalizando € 70.649,77, incluindo juros compensatórios (Esc. 11.346.625$00, de IRC e 2.817.383$00 de juros);
C) – A R. considerou tais correcções, bem como a concomitante liquidação adicional, estavam feridas de ILEGALIDADE, por falta de fundamente, já que a AT não demonstrou ter-se, por parte da R., qualquer prática ou situação que, de alguma forma, fosse susceptível de justificar o essencial das correcções efectuadas;
D) – Na verdade a AT não teve minimamente em conta a realidade negocial e empresarial em que os factos ocorreram, tendo desprezado, designadamente, todo circunstancialismo em que se desenvolveu a relação com o prestador de serviços MÁRIO PORTUGAL, especialista na gestão, acompanhamento e fiscalização de obras de empreitadas públicas, onde a R. não tinha qualquer experiência;
E) – Por isso, a AT apenas sustentou a decisão de efectuar as ditas correcções, em quatro questões muito concretas e objectivas:
- que as facturas/recibo emitidas pelo Mário Portugal exibiriam os requisitos formal legalmente exigidos;
- que o NIPC indicado pelo mesmo Mário Portugal não constaria do cadastro do IVA;
- que os valores dos cheques correspondentes ao pagamento de cada factura referiam-se ao valor das mesmas mas sem liquidação do competente IVA, e
- que, das cópias dos cheques em causa resulta indiciado de que se trataria de cheques em branco fornecidos ao sócio-gerente da Reclamante António Vicente, o que constituiria um procedimento anormal.
F) – Todavia, em relação à forma das facturas/recibo emitidas pelo Mário Portugal, analisando ponderamente o respectivo conteúdo, pode concluir-se que as mesmas cumprem adequadamente com as exigências determinadas pelo Art.º 35.º, n.º5, alínea b), do CIVA, na medida em que, para além do mais, ostentam de forma clara todos os elementos necessários à determinação da taxa tributária a aplicar, sem margem para qualquer dúvida ou equívoco;
G) - Do mesmo modo, no que se refere ao alegado facto do NIPC averbado nas facturas/recibo processadas pelo Mário Portugal não estar identificado no cadastro, como motivo para a recusa, conclui-se que tudo não passou de um equívoco por parte da AT que, de qualquer modo, nunca poderia justificar a imposição à R. de quaisquer consequências tributárias desfavoráveis;
H) – Em relação à terceira das questões referidas na conclusão E)., determinada pelo facto do valor dos cheques apresentados meio de pagamento das facturas/recibo em causa ostentarem o valor inferior ao que aparecia naqueles, documentos psoteriormente emitidos, o equívoco resume-se ao facto da R. entender que o valor da remuneração que pagava ao Mário Portugal incluía já o IVA liquidado à taxa legal, ao passo que aquele defendia a posição contrária – que ao pago, deveria, ainda, acrescer o IVA;
I) – Nesta matéria a R. acabou por aceitar a tese do Mário Portugal, pagando àquele e na íntegra o saldo que, entretanto, se havia acumulado, sendo evidente que o facto não consubstancia a prática de qualquer irregularidade susceptível de relevar do ponto de vista fiscal, tratando-se apenas de um mero diferendo que apenas interessava aos sujeitos envolvidos, não se registando o mínimo fundamento para que a realidade em causa possa ser usada como fundamento para a recusa dos ditos documentos, enquanto comprovativos de custos previstos no Art.º 23.º, n.º1, alínea a) do CIRC;
J) – De resto, pode ainda concluir-se que o facto da R. não pagar a totalidade das facturas – até poderia nem ter pago nada – nunca eximia o dito Mário Portugal do cumprimento de qualquer das suas obrigações fiscais e não fazia reverter para a mesma R. qualquer especial obrigação decorrente dessa circunstância;
L) – No que concerne à metodologia usada pela R. para efectuar os pagamentos ao Mário Portugal, não se consegue entender que tipo de censurabilidade existe no facto dos necessários cheques serem confiados pela R. ao seu sócio-gerente António Vicente, para que este, nos locais das obras, muitas vezes afastados centenas de quilómetros da sede da empresa, acertar as contas com o referido prestador de serviços;
M) - Do mesmo modo, carece do mínimo de fundamento legal e de qualquer tipo de razoabilidade, eleger este facto como fundamento para recusar autenticidade às facturas/recibo em causa, desconsiderando o respectivo valor como custo, nos termos do já aludido Art.º 23º, nº1, alínea a), do CIRC, e, como se isso não fosse já bastante, servir para sustentar uma ignominiosa suspeita das mesmas consubstanciavam a prática de um crime fiscal;
N) - Deve conclui-se, por isso, que a invocação desta questão, sem o mínimo de suporte legal, sustentando-se nas meras convicções pessoais dos seus autores, revela, desde logo, uma clara e inaceitável falta de atenção, por parte da AT, para com observância do incontornável PRINCÍPIO DA LEGALIDADE;
O) – Verifica-se, assim, que em todos os casos invocados como fundamento para a não aceitação das facturas/recibo processadas pelo Mário Portugal e usadas contabilisticamente pela R., para efeitos de dedução do IVA suportado, como para documentar os custos correspondentes ao respectivo valor para efeitos de IRC, os mesmos não se sustentam em quaisquer fundamentos minimamente objectivos, nem fazem apelo a quaisquer regras legais legitimadoras, de forma inequívoca, das posições assumidas;
P) – Em todas esta matéria é patente que a AT se fundou em equívocos, que não cuidou de esclarecer atempadamente, ou em meras convicções pessoais dos funcionários que realizaram a acção inspectiva, as quais, ainda por cima, estão muito longe de corresponder ao que deveria ser o resultado de uma análise rigorosa, ponderada e sensata dos factos em presença;
Q) – Nestes termos, relativamente a todos os apontados casos objecto de Impugnação, é patente que, estando perante situações que configuram, inequivocamente, uma errónea qualificação dos factos tributários em apreço, por parte da AT, de acordo com o preceituado no Art.º 120º, alínea a) do CPT, continua a R. e defender que se deverá proceder à anulação da liquidação adicional em causa e correspondentes juros compensatórios, feridos desse vício, consubstanciado numa evidente e objectiva falta de suporte legal;
R) – Não obstante, no que se refere às correcções à matéria colectável, a R. aceita as que, de acordo com o Relatório da Inspecção Tributária, se referem a menos-valias não existentes e a amortizações indevidas, tanto no exercício de 1994, como no de 1995, as quais resultaram de efectivos lapsos técnicos, razão pela qual, apenas deverá ser ordenada a anulação das seguintes correcções:
IRC - 1994
- Custos não aceites.............1.500.000$00
IRC – 1995
- Custos não aceites.............11.250.000$00
procedendo-se, depois, à correspondente anulação parcial da liquidação do IRC e juros compensatórios, ora impugnada, relativa ao exercício de 1995, no montante total de 14.164.008$00;
S) - Assim, não pode a R. concordar com a Douta Sentença Recorrida lugar porque:
- em relação aos FACTOS PROVADOS, não corresponde ao que resulta dos autos e da objectiva observação dos documentos juntos, tanto pela R. como pela AT o facto referido no n.º 3, alínea b), na medida em que o serviço prestado está devidamente identificado, nos termos legalmente exigíveis, como detalhadamente se demonstrou na Impugnação;
- depois, a referência feita no n.º 3, alínea d) da mesma Douta Sentença é equívoca, já que a realidade que resulta dos autos e da prova produzida é a da que os cheques, pertencentes a um “livro” com original e cópia, sempre teriam que estar em branco, antes de serem preenchidos, e a inabitualidade do procedimento resulta, excluisamente, do carácter excepcional dos pagamentos em causa (de montante potencialmente incerto e efectuados no local das obras, a centenas de quilómetros da sede da R.);
- por outro lado, conforme o que consta dos autos e de acordo com a prova produzida a R. não pode aceitar como NÃO PROVADOS os factos que a Douta Sentença qualifica como tal;
- finalmente porque, versando a Impugnação, no essencial, sobre a não observância do Princípio da Legalidade, pela existência de evidentes erros na qualificação dos factos em causa e, em geral, pela manifesta falta de objectividade que caracterizou a fundamentação usada pela AT, é o próprio Ex.mo Juiz a quo quem, usado de extrema subjectividade, descredibiliza liminarmente a prova testemunhal produzida e decide com base em meras convicções de natureza pessoal;
T) – Apesar de tudo, o que a R. considera como mais inaceitavelmente relevante na Douta Decisão o Ex.mo Juiz a quo é a que resulta da mesma acabar por negar total provimento às pretensões invocadas pela R., não por força do vencimento dos factos relatados pela Inspecção Tributária, não obstante as demonstrações e detalhados esclarecimentos feitos pela R., mas sustentado numa questão inteiramente nova: porque foi entendido que as quantias pagas ao prestador de serviços Mário Portugal eram injustificadamente excessivas, se comparadas, até, com o que, na mesma altura, auferia um Eng. Civil Estagiário;
U) – Conclui-se assim, que o Ex.mo Juiz a quo até nem deu grande relevo à questão dos requisitos legais das facturas/recibo em causa, acabou por admitir que a R. nada tinha que ver com a situação irregular do NIF do Mário Portugal, negligenciou o caso da diferença de valores entre o meio de pagamento e o correspondente cheque e também não achou que existisse qualquer comportamento fiscalmente censurável no facto dos pagamentos serem feitos, directamente no local das obras e através de cheque, por um sócio-gerente da R.;
V) – De forma que surpreendeu a R. o que veio a ser considerado como realmente foi importante e decisivo para a Douta Decisão Recorrida foi o facto do Ex.mo Juiz a quo ter achado, no uso de seu prudente, equilibrado e sensato critério pessoal, que o que foi pago ao Mário Portugal era excessivo, designadamente, se comparado com o que auferia o Eng. Civil Estagiário, sem necessitar de saber e perceber que a remuneração Mário Portugal incluía tudo o que ela tinha que despender com hotel, com todas as refeições, todos os custos da operação com viatura própria e, igualmente, uma remuneração extra decorrente do facto de ter sido ele quem, no uso dos seus contactos e experiência no meio das subempreitadas de obras públicas, agenciou as obras em causa para a R., e, ao mesmo tempo se atender a que, em sentido diametralmente oposto, o dito Eng. Civil Estagiário, tinha tudo pago pela R., desde as deslocações, a estadia e própria viatura que usava que pertencia à R.;
X) – De resto esta, com todo o respeito, equívoca Douta Decisão só é possível porque não foi tido minimamente em consideração, sempre por razões de natureza subjectiva, o depoimento das testemunhas arroladas, o qual esclarecia suficientemente todas estas questões, e de onde resultava a inexistência de qualquer estranheza pelo montante de remuneração auferida pelo Mário Portugal, cujo trabalho e envolvimento bem conheciam;
Z) - E o mais singular, ainda e se possível, é a circunstância do Ex.mo Juiz a quo vir levantar uma questão que nem a Inspecção Tributária, quando procedeu à exaustiva análise das contas da R. assinalou, na medida em que se ateve aos aspectos formais dos documentos e dos procedimentos em causa, para fundamento para os recusar como comprovativos de custos fiscalmente relevantes, não indo mais longe porque, porventura (para não dizer certamente), no decurso da acção inspectiva teve oportunidade de colher todas as esclarecimentos que obstaram à existência de qualquer objecção em relação ao montante da remuneração auferida pelo Mário Portugal;
AA) – Desta forma a Douta Decisão Recorrida coloca, de forma intensa, a questão do ónus da prova e da latitude dos critérios que hão-se ser observados na apreciação da mesma, tanto na vertente da valoração do respectivo conteúdo, como do ponto de vista da apreciação da sua legitimidade e credibilidade, ab inicio;
AB) – Neste sentido deve dar-se por assente que actos administrativos em geral e, igualmente, o acto tributário, não gozam da presunção da legalidade que, apesar de não s encontrar expressamente formulada em, regra legal alguma, constitui um princípio doutrinal e jurisprudencial que, face à actual compreensão do princípio da legalidade administrativa, se tem por ultrapassado, surgindo hoje a Administração, em termos de justiça administrativa e tributária, em situação de paridade com o Particular;
AC) – Não fazendo, actualmente, sentido invocar a presunção da legalidade do acto tributário para efeitos de averiguar da repartição do ónus da prova, incumbe à AT o ónus da prova da verificação dos requisitos legais das decisões positivas e desfavoráveis ao destinatário, comos ejam a existência dos factos tributários e a respectiva quantificação;
AD) - Objectivamente, como no caso dos presentes autos, quando estão em causa correcções à matéria colectável, fundadas na recusa pela AT de custos declarados, por desconsideração dos documentos em que o contribuinte os pretende suportar, designadamente, por não correspondem a operações realmente efectuadas, compete à AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, no sentido da correcção do lucro tributável, competindo ao contribuinte o ónus da prova da efectiva existência dos factos tributários que alegou;
AE) - Deste modo, se o juízo da AT assenta em ter considerado que os documentos em causa não correspondem operações realmente efectuadas, bastará demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas nas facturas que suportam tais custos são simuladas, passando então a competir ao Contribuinte o ónus da prova de que tais operações são reais;
AF) – Ora, neste contexto, não basta à AT a fundamentação formal do seu juízo, exigindo-se-lhe também que demonstre em Tribunal a pertinência desse juízo ou seja, que prove a existência desses indícios que permitam concluir pela correcta fundamentação material desse juízo, cabendo ao Tribunal a superior tarefa de verificar se podem ou não ser dados como provados os factos indicados pela AT para considerar como correcto o juízo por si formulado que os documentos;
AG) - Todavia, no que tange aos presentes autos, é evidente que os fundamentos usados pela AT, por avocação do Relatório da Inspecção de Tributária da Direcção de Finanças de Leiria, faleceram completamente, na medida em que foram totalmente contraditados, explicados e demonstrados pela R., enquanto Impugnante, não tendo a AT, sequer, apresentado qualquer contestação ou esboçado da mínima tentativa de justificação;
AH) – Não obstante, efectuado o julgamento o Ex.mo Juiz a quo veio a dar como genericamente provados os factos alegados pela AT e acrescentou mais um: o valor excessivo da remuneração auferida pelo Carlos Portugal, extrapolando da prova documental existente nos autos decorrente, exclusivamente, relatório de inspecção elaborado pela AT, e sustentando-se em convicções pessoais ou em critérios subjectivos;
AI) - Mas o que a realidade, objectivamente considerada, permite verificar é que do relatório da Inspecção Tributária não decorre uma única prova que fosse susceptível de permitir ao Tribunal dar como provado ou, sequer, sustentar em tese geral, o conteúdo e sentido dos factos ou situações Impugnados:
- que provas, face aos esclarecimentos e justificações apresentadas pelo R., permitam fazer subsistir que as facturas/recibo emitidas pelo Mário Portugal, não contêm os requisitos formais legalmente exigidos?
- que prova foi produzida de onde resulte a demonstração de que as obras em causa não existiram, que o Mário Portugal não prestou os serviços que constam dos documentos em causa e que o respectivo pagamento não foi efectuado da forma e montante indicados pela R.?
- que provas permitem sustentar a convicção pessoal do Ex.mo Juiz a quo de que a remuneração paga ao Mário Portugal é exagerada e, por isso, nunca poderia ser a que consta nos documentos em apreço?
AJ) – E apesar destas dúvidas e interrogações, claramente colocadas pela R., em sede Impugnação Judicial, bem como a abundante prova aí produzida, a AT, como se disse, não contestou, nem apresentou em juízo qualquer prova, testemunhal ou outra, susceptível de sustentar o juízo que serviu de base à liquidação adicional Impugnada;
AL) – Porque a AT não fez juntar aos autos quaisquer provas que infirmassem os esclarecimentos e as demonstrações concretizadas pela R., não podem os factos alegados pela AT ser considerados como “automaticamente” assentes e verdadeiros, por forma a permitir que operações subjacentes às facturas em causa seriam simuladas;
AM) – Assim, com todo o respeito, não podia Tribunal a quo dar tais factos como “liminarmente” verificados e, consequentemente, julgar provada a matéria de facto apresentada pela AT, desprezando totalmente o esforço defesa dos seus legítimos direitos promovido pela R.;
AN) – Decidindo como fez, a Douta Sentença de que se recorre incorreu em manifesto erro de valoração da prova pelo que não pode subsistir nesta parte, na justa medida em que a Recorrida AT não logrou (nem se “incomodou” com isso) provar a verificação dos requisitos que permitiam a sua actuação, pelo que, terá de se concluir pela ilegalidade dessa actuação e consequentemente, pela ilegalidade da liquidação;
AO) – Do mesmo modo, também os desígnios da AT não podem ser suportados por uma mera, ainda que muito respeitável, convicção pessoal do Ex.mo Juiz a quo, ao arrepio de qualquer menção feita pela própria AT e desacompanhada de qualquer prova minimamente objectiva que, no caso, fosse susceptível de infirmar a esclarecedora prova recolhida pela via testemunhal;
AP) – Devendo, em consequência, ser considerado procedente, por provado, o presente recurso deduzido pela R. anulando, consequentemente e ainda que de forma parcial, o acto de liquidação em causa, por padecer de clara ILEGALIDADE, consubstanciada na demonstrada ERRÓNEA QUALIFICAÇÃO DOS FACTOS em apreço.

Termos em que, sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, se renova o pedido de provimento para o presente recurso, com o que, certamente, se fará inteira Justiça.


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por a AT ter logrado obter a prova que lhe permitiram afastar os custos constantes de tais facturas desconsideradas através de indícios sérios e suficientes que apontavam para que as mesmas não tivessem aderência com a realidade, ao passo que a impugnante e ora recorrente, não logrou fazer prova para contrariar tais indícios fundados, como lhe cabia, que tais facturas respeitavam a efectivas e reais operações em cujos custos tinha incorrido.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se a matéria de facto fixada no probatório da sentença recorrida deve ser alterada quando a recorrente não indica quais os concretos pontos incorrectamente julgados e, oficiosamente, pelo Tribunal, também se ajuíza pela desnecessidade dessa alteração; E se a ora recorrente logrou provar a efectiva aderência à realidade das prestações de serviços invocadas nas facturas desconsideradas pela AT donde resultou a liquidação adicional em causa.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório o M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
1. A impugnante foi submetida a uma acção de fiscalização externa que incidiu sobre os exercícios de 1994 e 1995, de que foi elaborado o relatório junto a fls. 44 e segs. cujo conteúdo se dá por reproduzido.
2. Como consequência da acção de fiscalização foi efectuada a liquidação adi­cional de IRC referente a 1995 no montante de Esc. 14.164.008$ (fls. 15 do apenso de reclamação cujo conteúdo se dá por reproduzido).
3. Tal correcção baseou-se nos seguintes factos:
a. Na análise aos cheques para pagamento ao prestador de serviços Mário Portugal, estes pagavam unicamente o valor líquido das facturas;
b. As facturas/recibo não possuem a forma legal, por falta de identificação do serviço prestado;
c. O NIPC do fornecedor não está identificado no cadastro;
d. As cópias dos cheques (livro de cheques) indiciam que estes foram entregues em branco (não preenchidos) ao Sr. António Vicente, que é sócio gerente da impugnante, tratando-se de um tipo de procedimento não utilizado na actividade normal no que concerne ao pagamento aos fornecedores;
4. Por tais factos, os valores destes documentos foram corrigidos por documen­tarem custos não efectivamente suportados (fls. 46 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
5. O Sr. Mário Portugal emitia recibos/factura, no qual, abaixo do seu nome, indicava "Prestação de Serviços" (fls. 50 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
6. As facturas/recibos emitidas designavam «Serviços prestados nas vossas obras» a que se seguia a importância facturada e respectivo IVA.
7. Noutras facturas/recibo, era indicado o mês a que se referia (fls. 52 a 56 cujo conteúdo se dá por reproduzido).­
8. Nas facturas/recibo era indicado o n.º fiscal 500 164 029.
9. Mas este número não corresponde ao número fiscal do referido prestador de serviços (fls. 59 e 60 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
10. O referido prestador de serviços encontrava-se «cessado» desde 31/12/1994 (informação de fls. 61 cujo conteúdo se dá por reproduzido).­
11. Mas tal cessação por «saneamento do cadastro» foi reconhecida como inde­vida pela administração fiscal (fls. 100 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
­12. E foram enviadas DPs referentes aos períodos de 9409T a 9512T com o NIF 815 191 855 (informação de fls. 100 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
13. O Sr. Mário Moura Portugal não declarou em sede de IRS os rendimentos mencionados nas aludidas facturas/recibos supra identificados (informação de fls. 178 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
14. Apresentou na declaração mod. 1 de IRS, referente a 1994 o rendimento bru­to de Esc. 1.679.955$ (fls. 82 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
15. Na declaração referente a 1995 declarou 1.363.100$ (fls. 84 cujo conteúdo se dá por reproduzido).­
16. E na declaração referente a 1996 declarou 1.065.600$ (fls. 86 cujo conteúdo se dá por reproduzido).­
17. O Sr. Mário Moura Portugal foi contratado pela impugnante, em 1994, para dar apoio na execução de obras públicas a cargo daquela.
18. O Engº Filipe Nuno, na mesma altura ao serviço da impugnante, auferia cer­ca de 200.000$/mês na qualidade de engenheiro em estágio.
19. A impugnante apresentou reclamação graciosa (fls. 2 e segs. do apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido).­
20. Que não foi objecto de apreciação expressa (fls. 86 do apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido)
21. A execução fiscal contra a impugnante foi instaurada em 12/10/1998)
22. Por despacho de 12/2/1999 foi ordenada a suspensão da execução por força da garantia prestada para o efeito (fls. 221 cujo conteúdo se dá por reprodu­zido).
23. A impugnação judicial foi apresentada em 24/2/1999 e esteve parado por facto não imputável ao sujeito passivo desde 7/3/2002 até 11/12/2007 (fls. 192 a 195 cujo conteúdo se dá por reproduzido).

FACTOS NÃO PROVADOS.
Com interesse para a decisão da causa, não se provou que:
Os pagamentos eram efectuados pelo Sr. António Vicente, na obra;
O Sr. Mário Portugal facturava o valor acordado, a que fazia acrescer o respecti­vo IVA;
O Sr. António Vicente, por seu lado, achava que devia pagar apenas o valor acordado, que já incluía IVA.
Tal diferendo manteve-se durante algum tempo, até que a impugnante resolveu conceder razão ao Sr. Mário Portugal, com regularização posterior.

MOTIVAÇÃO.
A convicção do tribunal baseou-se nos seguintes meios de prova:
PROVA DOCUMENTAL. Os meios de prova documental que serviram para a convicção do tribunal estão referidos no «probatório» com remissão para as fls. do pro­cesso onde se encontram.

PROVA TESTEMUNHAL. Quanto a este meio de prova, relevaram os depoi­mentos das testemunhas inquiridas, funcionários da impugnante, que confirmaram, no essencial, os fatos alegados pela impugnante, mas o seu depoimento não mereceu credi­bilidade.
Tentar-se-á resumir porquê, tendo em conta que a prova exigível em direito não é uma prova que vise a certeza total e exclua a possibilidade de o facto não ter ocorrido de modo diferente, como acontece nas ciências matemáticas. A demonstração da realidade dos factos em processo judicial "...não pode visar um estado de certeza lógica, absoluta, sob pena de o Direito falhar clamorosamente na sua função essencial de ins­trumento de paz social e de realização da justiça entre os homens. A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção assente na certeza relativa do facto".

São esses critérios de razoabilidade que devem nortear a apreciação dos factos. Admite-se que o Sr. Mário Portugal esteve ao serviço da impugnante; mas não que tenha recebido os montantes facturados.
Com efeito, tais montantes alegadamente pagos ao prestador de serviços eram muito elevados em 1995: 2.250.000$ em cada mês de Agosto a Novembro de 1995, equivalendo, actualmente, a € 11.222,95/mês. Ora, este valor é muito elevado mesmo para os padrões actuais, e não se podem aceitar sem um juízo crítico sobre a matéria, ainda que os documentos e a aparência dos factos seja coincidente.
Note-se que o Sr. Mário Portugal apresentou na declaração mod. 1 de IRS, refe­rente a 1994 o rendimento bruto de Esc. 1.679.955$ na declaração referente a 1995 declarou 1.363.100$ e na declaração referente a 1996 apresentou 1.065.600$ de rendi­mento bruto individual. A fazer fé nos documentos e nas testemunhas da impugnante, o Sr. Mário Portugal auferiu muito mais num mês ao serviço da impugnante do que em todo o trabalho realizado durante o ano de 1994 e 1996 (e o declarado em 1995). Bem vistas as coisas, auferia num mês de 1995 ao serviço da impugnante quase tanto como aquilo que recebeu em dois anos, 1995 e 1996, (1.065.600$ + 1.363.100$). Não é mini­mamente razoável.
Não quer dizer que seja impossível a existência de momentos «tão altos» na vida profissional e patrimonial; eles podem existir, mas são tão raros que carecem de justifi­cação plausível.
Repare-se que apesar de tão elevados montantes remuneratórios, ainda subsistia divergência entre as partes quanto à questão de saber se tais quantias incluíam IVA ou não. A impugnante acabou por aceitar que não, e acertou contas com o prestador.
Disse a testemunha Filipe Nuno que na mesma altura, ao serviço da impugnante auferia cerca de 200.000$/mês na qualidade de engenheiro em estágio. Ora mesmo des­contando o facto de esta testemunha se encontrar em fase de estágio, não é possível aceitar-se uma discrepância tão elevada entre o que lhe era pago, como técnico altamen­te especializado, e o que era facturado pelo Sr. Mário Portugal que certamente não era detentor das mesmas credenciais académicas.
Com a remuneração alegadamente paga ao Sr. Mário Portugal, a impugnante poderia simplesmente ter contratado mais de 10 engenheiros. . .Não é razoável.
Por outro lado, pergunta-se, porque razão o Sr. Mário Portugal não declarou para efeitos de IRS, os montantes auferidos. A impugnante dirá, e muito bem, que é alheia a esse facto.
Na verdade, é alheia a esse facto, e por essa omissão jamais poderá ser penaliza­da. Que isso fique bem claro.
Mas em sede de apreciação da prova não podemos deixar de «olhar» para essa omissão e verificar que a mesma confirma os indícios acumulados na esfera de respon­sabilidade da impugnante.
Por essa razão, o depoimento das testemunhas não mereceu credibilidade.


4. Para julgar a impugnação judicial improcedente considerou o M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que os custos em causa, desconsiderados pela AT como tal, de Esc. 11.250.000$, relativos a invocadas prestações de serviços que no exercício de 1995 totalizavam este montante, única parte da liquidação colocada em causa pela ora recorrente, a AT logrou recolher indícios suficientes de que tais montantes inscritos nas facturas/recibos passados por Mário Portugal não correspondiam a efectivas prestações de serviços, não tendo ao invés, a ora recorrente, logrado provar a efectiva aderência de tais facturas com a realidade, não demonstrando que tais trabalhos tenham efectivamente sido prestados, sobretudo com a dimensão que daquelas facturas emanam.

Para a recorrente, de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, é contra esta fundamentação que se vem insurgir, designadamente com o modo como na mesma sentença se entendeu ser de repartir o ónus da prova entre a AT e a impugnante e ora recorrente, para além de também vir colocar em causa o julgamento da matéria de facto tal como foi efectuado na mesma sentença, ao não dar à prova testemunhal produzida o relevo que a mesma entende merecer.

Vejamos então.
Quanto ao errado julgamento da matéria de facto, conforme consta da matéria das suas conclusões do recurso na alínea S) e segs, insurge-se a ora recorrente, quer quanto aos factos que na sentença recorrida foram dados como provados, quer quanto àqueles que foram dados como não provados, embora não elencando e não especificando os que foram dados como provados e o não deveriam ter sido, bem aqueles que foram dados como não provados e o deveriam ter sido, desta forma não dando cumprimento ao disposto no art.º 690.º-A do Código de Processo Civil (CPC), que dispõe que, quando se impugne a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados bem quais os concretos meios probatórios, constantes do processo que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

Tal norma impõe ao recorrente um ónus alegatório acrescido ao pretender impugnar a matéria de facto, especificando concretamente esses pontos que considera incorrectamente julgados, que destacará (1), bem como quais os meios de prova constantes dos autos que, em seu entender, levariam a que outra fosse a matéria provada, sob pena de o recurso não poder deixar de naufragar nesta parte.

Como a ora recorrente não deu cumprimento ao que em tal norma se dispõe, não tendo vindo especificar qual a concreta factualidade que deveria ser considerada como provada e a que não o deveria, não se vendo também que a mesma matéria provada e não provada, careça de ser alterada, oficiosamente, pelo Tribunal, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º1 do art.º 712.º do CPC, é a mesma de manter, já que a aí contida é a relevante para a decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito – cfr. art.ºs 123.º, n.º2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 511.º do CPC.

Sempre se dirá contudo, serem injustas as críticas formuladas pela ora recorrente à sentença recorrida quanto à fixação da matéria de facto tal como efectuada pelo Tribunal “a quo”, tendo o M. Juiz efectuado uma análise aprofundada do porquê da não aceitação dos depoimentos testemunhais no sentido pretendido pela ora recorrente, em que dentro de um critério de razoabilidade e de normalidade nada lhe há a apontar, tanto mais que as testemunhas foram inquiridas em audiência a que presidiu o mesmo M. Juiz que depois veio a lavrar a sentença ora recorrida – cfr. acta de fls 237 e segs dos autos – encontrando-se o mesmo, pois, perfeitamente posicionado para melhor poder apreender as circunstâncias em que tais depoimentos foram prestados e aquilatar, pessoal e directamente, por força dessa imediação, da efectiva razão de ciência invocada para o conhecimento dos factos a que as testemunhas depuseram, de molde a que, fundadamente, deu uns factos por provados e outros por não provados – cfr. art.º 638.º, n.º1 do CPC.


Quanto à outra questão a decidir no presente recurso e a que assim temos de responder, de acordo com as restantes conclusões, é se aquelas verbas relativas às sete facturas/recibos passadas pelo invocado Mário Manuel Pereira de Moura Portugal,(n.ºs 0056 a 0102, fls 50 a 56 dos autos) à impugnante e ora recorrente, no exercício em causa, de 1995, em que esta as considerou como custos desse exercício, correspondem a reais operações de aquisição de bens e serviços, como nelas constam – invariavelmente, por serviços prestados nas vossas obras - efectivas e concretas, com os seus exactos montantes, constituindo as respectivas contrapartidas, relativas às prestações de tais serviços que a mesma utilizou na sua actividade de serviços relacionados com a agricultura, por esta desenvolvida.

Os factos patrimoniais registados pela contabilidade são descritos e comprovados por meio de escritos comerciais - os documentos - base de todo o registo contabilístico, sem os quais o mesmo não se poderá processar. Aliás, as empresas estão sujeitas a incorrerem em sanções se procederem ao registo de factos não devidamente documentados...cfr. A. Borges, A. Rodrigues e R. Rodrigues, in "Elementos de Contabilidade Geral", Editora Rei dos Livros, pág. 62.

Anteriormente, na norma do art.º 26.º do CCI, aí se não via a formulação directa de qualquer exigência de suporte documental condicionante da qualificação de verbas como custos, como a que hoje se infere dos art.ºs 23.º e 41.º n.º1 h) do CIRC. Estas, de acordo com tais preceitos, exigirão a demonstração efectiva da (ocorrência) do sacrifício; a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos ao imposto e para a manutenção da fonte produtora.
Fazendo apelo à existência, por um lado, da sua concreta verificação ou acontecimento do mundo real (que efectivamente se suportaram), e, por outro, de um nexo de causalidade com os proveitos ou manutenção da fonte produtora, para que as verbas sejam qualificadas como custos, logo de tais preceitos se intuirá que a evidenciação de tais realidades se terá de materializar em quaisquer instrumentos formais de suporte que apenas poderiam ser, atento o princípio da praticabilidade que enforma o direito fiscal, os documentos.

E tais documentos terão de conter, tendo em vista tal função de qualificação de custos, os elementos necessários àquela determinabilidade ou seja têm de externar a existência do sacrifício patrimonial, a sua extensão (montante), e a sua causa, donde resultará a aferição sobre se o proveito será dela resultado.

Por outro lado, também, ao enunciar o modo de determinação do lucro tributável, no art.º 17.º do CIRC reportando-o à soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo exercício e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade, está o legislador a exigir um suporte documental dos ganhos e perdas, pois que tal resultado só pode repousar sobre uma realidade formalizada e não só realmente pressuposta.
Temos, pois, por assente que as verbas contabilizadas pelo contribuinte na conta de resultados hão-de transparecer da sua escrita formal e que esta tem de estar organizada em termos de possibilitar fácil, clara e precisamente, as operações (exigência do art.º 29.º do C.Comercial) e fortuna dos comerciantes, como de evidenciar a causa, natureza e montante das operações aqui de modo, não só, a permitir a sua arrumação contabilística (segundo o POC), como a determinação dos ganhos, perdas, proveitos e custos.

Quanto às categorias dos documentos aptos a preencher aqueles requisitos, no domínio da contribuição industrial, era entendido que os documentos teriam a quota de credibilidade que emergir dos termos em que se encontrar organizada a contabilidade, face à imposição legal dos referidos art.ºs 51.º e 22.º do CCI e 29.º do C. Comercial, exigindo-se que tal contabilidade permita o apuramento e também o controlo claro e inequívoco do lucro tributável. Se a escrituração comercial estiver organizada em termos de, apenas perante ela, se poder efectuar a prognose das operações efectuadas e do lucro tributável, evidente é que se terá de atribuir eficácia probatória ao documento de suporte, a menos que se indicie não corresponder à realidade.
Se o documento se encontra inserido numa escrita organizada, nos termos sobreditos, dando a conhecer os elementos necessários ao desempenho da sua função fiscal, terá de atribuir-se-lhe o crédito de confiança correspondente. Era a contrapartida legal da imposição de uma escrita organizada aos contribuintes do grupo A, decorrente dos citados preceitos legais (2).

E hoje, face às citadas normas do CIRC, o sistema em termos de exigibilidade dos correspondentes suportes documentais para demonstração das operações subjacentes, não poderá deixar de ser, ao menos, igual ao então vigente quanto à contribuição industrial, e da existência deles resulta, actualmente, por força do disposto no art.º 75.º da LGT e anteriormente, do art.º 78.º do CPT, a presunção de veracidade dos dados e lançamentos deles decorrentes.

Sendo mesmo mais exigente quanto ao IVA, no tocante ao direito à dedução do imposto suportado pelo sujeito passivo, em que só as facturas passadas na forma legal conferem tal direito - art.ºs 19.º n.º2 e 35.º do CIVA.

Mas na falta de tais suportes documentais, ou das menções supra, não podem ter os mesmos efeitos que no âmbito deste imposto(IVA), logo pela singela mas não menos lógica razão de que nenhuma norma deste CIRC o sanciona, sendo tal sanção do vício formal da respectiva desconsideração do montante aí inscrito, específica deste imposto, atento a sua estrutura de dedução de tais montantes de IVA inscrito nas facturas no imposto a entregar, funcionando como notas de crédito (3).

No caso, os montantes das quatro facturas não aceites como constituindo custos do exercício de 1995 em sede de IRC fundaram-se, além do mais, em que ...
...
- Na análise aos cheques para pagamento ao prestador de serviços Mário Portugal, estes pagavam unicamente o valor líquido das facturas;
- As facturas/recibo não possuem a forma legal, por falta de identificação do serviço prestado;
- O NIPC do fornecedor não está identificado no cadastro;
- As cópias dos cheques (livro de cheques) indiciam que estes foram entregues em branco (não preenchidos) ao Sr. António Vicente, que é sócio gerente da impugnante, tratando-se de um tipo de procedimento não utilizado na actividade normal no que concerne ao pagamento aos fornecedores;
- Por tais factos, os valores destes documentos foram corrigidos por documen­tarem custos não efectivamente suportados (fls. 46 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
- O Sr. Mário Portugal emitia recibos/factura, no qual, abaixo do seu nome, indicava "Prestação de Serviços" (fls. 50 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
- As facturas/recibos emitidas designavam «Serviços prestados nas vossas obras» a que se seguia a importância facturada e respectivo IVA.
- Noutras facturas/recibo, era indicado o mês a que se referia (fls. 52 a 56 cujo conteúdo se dá por reproduzido).­
- Nas facturas/recibo era indicado o n.º fiscal 500 164 029.
- Mas este número não corresponde ao número fiscal do referido prestador de serviços (fls. 59 e 60 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
- O referido prestador de serviços encontrava-se «cessado» desde 31/12/1994 (informação de fls. 61 cujo conteúdo se dá por reproduzido).­
- Mas tal cessação por «saneamento do cadastro» foi reconhecida como inde­vida pela administração fiscal (fls. 100 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
­- E foram enviadas DPs referentes aos períodos de 9409T a 9512T com o NIF 815 191 855 (informação de fls. 100 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
- O Sr. Mário Moura Portugal não declarou em sede de IRS os rendimentos mencionados nas aludidas facturas/recibos supra identificados (informação de fls. 178 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
- Apresentou na declaração mod. 1 de IRS, referente a 1994 o rendimento bru­to de Esc. 1.679.955$ (fls. 82 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
- Na declaração referente a 1995 declarou 1.363.100$ (fls. 84 cujo conteúdo se dá por reproduzido)
...
Tratam-se assim de operações documentadas, com as facturas/recibos emitidas pelo indicado prestador de serviços Mário Portugal por “Serviços prestados nas vossas obras”, como nelas, invariavelmente, se indica, em posse do sujeito passivo, na aquisição desses serviços pela impugnante, existentes na contabilidade desta, como não se encontra colocado em causa, que a Administração Tributária não aceitou como titulando as correspondentes operações, face aos termos supra, e na sentença recorrida também assim se entendeu, quer por a ora recorrente não ter logrado abalar ou infirmar esses factos índices em que repousam os fundamentos apurados pela fiscalização tributária no seu relatório do exame à escrita, quer por não ter logrado provar que tais facturas correspondiam a efectivas e reais operações de prestação desses serviços.

Como constitui jurisprudência, ao que se saiba unânime, apenas para efeitos do direito à dedução do IVA mencionado nas facturas ou documentos equivalentes passadas pelos vendedores, é que tais documentos em posse do sujeito passivo, se têm de apresentar com os requisitos mencionados na norma do art.º 35.º n.º5 do CIVA, por força da norma do n.º2 do art.º 19.º do mesmo Código, que o exige. Para todos os outros efeitos, designadamente para documentar um custo, inexiste norma legal a impôr tal restrição (4).

Para efeitos de documentar um custo em sede de contribuição industrial e hoje do IRC, nenhuma norma do respectivo Código exige directamente que a correspondente factura ou documento equivalente, tenha de conter todos os elementos referidos no n.º5 do art.º 35.º do CIVA, que para efeito deste imposto (IVA), o impõe, para poder ser exercido o direito à dedução nos termos do seu art.º 19.º. Aliás, como antes se viu, inexiste mesmo qualquer norma em sede de IRC a exigir que os custos estivessem documentados com qualquer categoria de documentos, se bem, como também ali se disse,... para que as verbas sejam qualificadas como custos, logo de tais preceitos resulta que a evidenciação de tais realidades se teria de materializar em quaisquer instrumentos formais de suporte que apenas poderiam ser, atento o princípio da praticabilidade que enforma o direito fiscal, os documentos.

Por outro lado, os suportes materiais da contabilidade englobam, não só, os livros e registos, mas também os documentos justificativos como hoje dispõe a norma do art.º 98.º n.º3 a) do CIRC, mas que já no âmbito da contribuição industrial se entendia vigorar. Os documentos justificativos de origem externa, como no caso, necessários para comprovar a operação, em princípio não podem ser supridos por documentos internos, mas podem ser substituídos por outros meios de prova tendentes a demonstrar a veracidade da operação e logo, o bem fundado dos lançamentos efectuados na contabilidade. Designadamente por prova testemunhal, já que esta é admitida em todos os casos em que não seja directa ou indirectamente afastada, como dispõe a norma do art.º 392.º do Código Civil.

Como refere M. H. de Freitas, in parecer publicado na CTF n.º 365, pág. 343 e segs, conclusão c) "A inexistência, relativamente a um dado lançamento, de documento de origem externa, nos casos em que devesse existir, pode contudo, e sem prejuízo das sanções que forem aplicáveis, ser suprida, para efeitos de determinação de um lucro real efectivo, por outros meios de prova que demonstrem de forma inequívoca a materialidade da operação que está subjacente ao lançamento efectuado e os demais elementos indispensáveis à quantificação dos respectivos reflexos".

No caso, a recusa da AT em com base nessas facturas serem aceites os montantes nelas constantes como constituindo custos, resultou além do mais acima exposto, quanto a este invocado prestador de serviços, por em tais facturas/recibos não terem sido identificados, em concreto, quais os concretos serviços prestados e onde, o invocado fornecedor não se encontrar identificado no cadastro e tratarem-se de valores elevados que o mesmo não declarou em sede da sua declaração de rendimentos de 1995, e daí a ilação de tais facturas se reportarem a operações simuladas, tendo feito cessar a presunção de veracidade das operações e lançamentos decorrentes de uma escrita regularmente organizada (art.º 78.º da LGT), desta forma tendo a AT cumprido o ónus da prova que sobre si impendia (5), com indícios suficientes que se nos afiguram consistentes para tal desconsideração, para cumprimento do ónus probatório que sobre si impendia, da existência dos pressupostos do acto de liquidação adicional, dado que de acordo com o disposto no art.º 266.º n.º2 da Constituição da República Portuguesa a Administração só pode agir nas condições em que a lei lho autoriza, tendo de ser ela a suportar a desvantagem de não ser feita prova da verificação dos pressupostos legais que lhe permitam agir com autoridade (pelo menos, quando produza efeitos desfavoráveis para os particulares).

E assim sendo, cabia agora à impugnante ter vindo com a necessária prova, infirmar ou abalar os pressupostos contidos no relatório da inspecção em que repousa a mesma desconsideração de tais facturas ou demonstrar a materialidade das operações subjacentes a tais documentos, e se o conseguisse, apesar daqueles indícios de tais facturas/recibos não terem aderência com a realidade, os mesmos teriam de ser aceites e logo o bem fundado desses lançamentos na sua contabilidade.

Em direito fiscal tal como no direito comum (este em relação à indivisibilidade da confissão), é possível aproveitar apenas uma parte dos dados e lançamentos de uma escrita regularmente organizada, e rejeitar a parte viciada por inaptidão para evidenciar o lucro real da empresa em ordem ao lançamento da tributação, nos termos, entre outros, do citado art.º 78.º do CPT e hoje do art.º 75.º da LGT.

Aliás, ninguém melhor do que a ora recorrente se encontraria em condições de provar que os referidos montantes inscritos em tais facturas/recibos se reportam às tais faladas prestações de serviços em obras de subempreitadas por si tomadas, que aquele Mário Portugal para si angariava, orientava e fiscalizava, nos termos sobreditos, ainda que quanto aos respectivos termos formais dessas facturas/recibos e sua envolvência, tivessem ocorrido as vicissitudes acima apontadas, que apontavam para a sua não aderência com a realidade.

Cabe referir que no direito adjectivo fiscal, art.º 40.º n.º1 do CPT, e no direito adjectivo civil, art.º 265.º n.º3 do CPC, ambos regidos pelos princípios da aquisição processual e do inquisitório do tribunal em matéria de provas, o que interessa em ordem à solução jurídica do litígio é o que resulte provado, seja por via das partes seja por via do tribunal.
Nesta medida, o ónus da prova da factualidade alegada pelas partes tem a natureza de ónus objectivo, por decorrência do princípio da oficialidade, e não de ónus subjectivo tal como em sede de alegação, embora hoje este ónus subjectivo de alegação se apresente mitigado por disposição expressa do art.º 264.º n.ºs 2 e 3 do CPC, que introduziu o conhecimento oficioso de factos instrumentais e complementares.
A consequência do ónus de prova objectivo é que vem a...suportar as desvantagens da incerteza do facto de que não tenha logrado prova, por via das partes ou do tribunal, a parte a quem interesse a aplicação da norma de que ele for pressuposto...cfr. Anselmo de Castro, in Direito Processual Civil Declaratório, Almedina/1982, V-III, pág. 163.

O impugnante não deve limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida a existência e a quantificação do acto tributário. Cabe-lhe o ónus de prova de tais factos, sem embargo de o juiz, no âmbito do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também comprová-los - cfr. Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, in CPT, Comentado e Anotado, 3.ª Edição, anotação 8. ao art.º 121.º, págs. 267 e 268.
Em igual sentido, já antes da LGT, aponta Vieira de Andrade (6), ao escrever:
«há-de caber, em princípio, à Administração o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável); em contrapartida, caberá ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos».

A repartição do ónus da prova em sede de impugnação judicial, após a entrada em vigor do CPT, em que se situa a presente liquidação adicional, ao vir introduzir um novo preceito - o do art.º 121.º e hoje do art.º 100.º do CPPT - afigura-se-nos como exprimindo um princípio estruturante do processo contencioso tributário, como do processo administrativo tributário, em que a «fundada dúvida sobre a existência do facto tributário» deve implicar que a administração fiscal se abstenha, quer da respectiva quantificação, quer da subsequente liquidação do imposto.
No dizer de Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão (7), é a consagração do princípio de que a dúvida reverte a favor do contribuinte, em substituição do princípio «in dubio pro fisco» que, na prática, era acatado no regime anterior à Reforma Fiscal.

A «dúvida fundada» a que alude o referido art.º 100.º do CPPT, que implica a anulação do acto impugnado, não pode assentar na ausência ou inércia probatória das partes, sobretudo do impugnante (8).
Este não deve limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida a existência e quantificação de facto tributário.
Cabe-lhe o ónus da prova de tais factos, sem embargo de o juiz, no âmbito do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também comprová-los.
Só mediante a prova concludente de tais factos é que é possível pelo fundamento daquela dúvida.

Como aliás também entendem, A. José de Sousa e José da Silva Paixão, in Código de Processo Tributário, Comentado e Anotado, 4.ª Edição, pág. 292, nota 7., "O impugnante tem, por conseguinte, o ónus da alegação dos factos integradores da ilegalidade do acto tributário a anular"...E na nota 10., pág. 293: Sem embargo do ónus da prova de tais factos que recai sobre o impugnante (art.º 342.º do Código Civil)"...

A produção de prova está associada à alegação. Quem tem de alegar os factos tem também em princípio, o ónus da produção da prova respectiva. No caso, pretendia a impugnante anular o acto de liquidação adicional do referido exercício de 1995, por terem tido lugar aquelas concretas prestações de serviços efectuadas pelo dito Mário Portugal, como tal carecia de fundamento a liquidação adicional de IRC, pelos montantes de tais facturas/recibos desconsiderados como custos do exercício.
Cabia, com efeito, à impugnante, para obter a almejada anulação da liquidação, ter provado tal factualidade (ou seja, quer destruindo os pressupostos em que assentou a liquidação, quer provando que tais facturas correspondem às exactas prestações de serviços da invocada pessoa e a quem os pagou, incluindo o IVA mencionado, como alegou) como parte integrante do seu direito à referida anulação, o que constituía a causa de pedir, ou sejam "os factos e as razões de direito que fundamentam o pedido", como se diz na norma do art.º 127.º n.º1 do CPT e hoje do art.º 108.º n.º1 do CPPT, tendo em vista obter a pretendida anulação (9) .

Cabia à impugnante alegar tal matéria, como alegou – cfr. art.ºs 15.º e segs da sua petição inicial de impugnação judicial - mas também prová-la, aliás de acordo com a norma geral em tal matéria do art.º 342.º do CC, que dispõe que «àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado». Princípio que hoje encontra expressa guarida na norma do art.º 74.º da LGT.

E para contrariar os indícios fundados em que a AT fez assentar tal liquidação adicional por desconsideração daqueles custos, referida, veio a impugnante juntar documentos e arrolar três testemunhas.

Foram todas estas testemunhas inquiridas, como consta da respectiva acta de fls 237 e 238 dos autos, tendo todas elas, prestado o respectivo testemunho que, no essencial, o M. Juiz fez constar da matéria de facto provada da sentença recorrida, com a dimensão aí referida, e onde não logra alcançar a prova da tese da recorrente, como bem se fundamenta na sua motivação quanto à prova testemunhal, de que tais facturas/recibos correspondam aos invocados serviços prestados por aquele Mário Portugal, sobretudo com a dimensão dos valores descritos em tais facturas/recibos, nas obras da mesma, efectuados durante o ano de 1995,

Diga-se, que a desconsideração de tais depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas pelo M. Juiz do Tribunal “a quo”, se deverá, também, às circunstâncias próprias do princípio da imediação, que permite ao juiz melhor ajuizar de pequenos pormenores da mesma como seja a firmeza e a convicção com que os depoimentos são prestados pelas testemunhas, e que na sua transcrição/gravação, naturalmente, se não consegue, por completo, apreender.
É que a sentença recorrida foi proferida pelo Juiz que foi o que presidiu à mesma inquirição de testemunhas como se pode ver da respectiva acta de fls 237/238 e da sentença recorrida, a fls 260 dos autos, pelo que este acesso a tal prova foi, na decisão recorrida, não exactamente igual ao verificado neste Tribunal, ou seja, aqui, apenas pela audição dos respectivos depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas, desta forma se podendo concluir ser o tribunal “a quo” que melhor poderia ter apreendido o sentido e alcance de tais depoimentos, mercê dessa imediação.

Do conjunto de tais depoimentos, como se disse, e dos demais elementos probatórios constantes dos autos, não são pois, aptos a contrariar, com um mínimo de certeza e de segurança, os indícios seguros e vastos carreados pela AT referidos supra, e com base nos quais considerou que tais concretas facturas não tinham aderência com a realidade, que nesse exercício de 1995, tenham ocorrido as prestações de serviços imputadas àquele Mário Portugal, relativamente às sete facturas em causa, desconsideradas pela AT, relativamente às apontadas prestações de serviços pelo indicado prestador de serviço, desta forma não tendo logrado provar a efectiva aderência de tais facturas/recibos com a realidade que deveriam descrever, não chegando sequer a criar uma dúvida fundada sobre a existência e a quantificação do facto tributário em causa (nesta parte da liquidação adicional relativa ao exercício de 1995 e aqui em causa), que implica que a sua liquidação adicional não poderá deixar de se manter.

O conjunto daquela prova documental e testemunhal, acima analisada, não constitui prova positiva suficiente, para considerar provada tais prestações de serviços, sobretudo quanto à extensão que a impugnante apresentava na sua contabilidade e que fez inscrever em custos do exercício, não sendo também, susceptível de abalar os fortes e vastos indícios recolhidos pela AT que apontavam tais prestações de serviços como operações simuladas, não resultando, também, uma dúvida fundada sobre a existência dos pressupostos de tal liquidação que favoreceria a impugnante e desfavoreceria a AT, nos termos da citada norma do art.º 121.º n.º1 do CPT, pelo que a liquidação não pode deixar de se manter.

E não tendo feito tal prova em contrário, e nem tendo colocado em dúvida séria, fundada, a conclusão tirada pela Administração Fiscal baseada naqueles indícios supra de que tais lançamentos se reportam a operações simuladas, tem a causa de ser decidida contra a impugnante e ora recorrente, como bem se decidiu na sentença recorrida, com a confirmação da sentença recorrida, que no mesmo sentido decidiu.

Cabia à impugnante, ter alegado e provado factos certos e concludentes que infirmassem os concretos indícios recolhidos pela AT ou que tivesse vindo fazer a prova da existência daquelas operações subjacentes aos referidos documentos, ou que no caso, haviam ocorrido circunstâncias especiais que levaram a que os mesmos tivessem sido emitidos nos termos em que o foram, mas que os seus montantes consistiam exactamente nos montantes pagos pela mesma na aquisição de tais prestações de serviços. Situação que colocava a impugnante nas melhores condições para o esclarecer e provar, como antes se disse, e que nos termos supra não logrou fazer, e nem sequer colocar em dúvida séria, fundada, mediante a prova testemunhal arrolada e prestada e perante a existência de fortes e vastos indícios aportados pela fiscalização tributária no sentido da desconsideração de tais facturas/recibos.

Não se encontra em causa a falsidade ou a simulação, com os exactos contornos que tais figuras se revestem no direito civil, no art.º 240.º do Código Civil, mas tão só se tais facturas/recibos têm ou não aderência com a realidade, isto é se se tratam de meros papéis ou se correspondem à realidade aí descrita, sendo bastante à AT a prova de elementos indiciários que levam a concluir nesse sentido, isto é, de indícios sérios e objectivos, que traduzam uma probabilidade elevada de que tais facturas não titulam operações reais, pois de contrário seria praticamente impossível atingir o objectivo legal de tributação das empresas pelo seu rendimento real e de combate à fraude e evasão fiscais.


Improcedem assim todas as conclusões do recurso, sendo de negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.


Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em oito UCs.


Lisboa, 25 de Novembro de 2009

Eugénio Sequeira
Magda Geraldes
José Correia

(1) Cfr. neste sentido, entre muitos outros, o acórdão do TC n.º 122/2002 e acórdão do TCAN de 31.1.2008, recurso n.º 65/03.
(2) Cfr. neste sentido o acórdão do então Tribunal Tributário de 2.ª Instância de 16.2.1993, recurso n.º 61 331.
(3) Cfr. em sentido semelhante o acórdão deste Tribunal de 29.6.99, recurso n.º 318/97.
(4) Cfr. entre outros, os acórdãos do STA de 15.1.1997, recurso n.º 21 167 e de 22.1.1997, recurso n.º 21 103.
(5) Como constitui jurisprudência repetidamente afirmada, designadamente pela do STA, como se podem ver dos seus acórdãos de 24.4.2002, de 17.4.2002 e de 20.4.2003, recursos n.ºs 102/02, 26.635 e 241/03.
(6) In A Justiça Administrativa, (Lições), 2.ª edição, pág. 269.
(7) In Código de Processo Tributário, Comentado e Anotado, 4.ª Edição, pág. 275, notas 7. e 8.
(8) Cfr. neste sentido o acórdão do STA de 15.1.1997, recurso n.º 17 914.
(9) Cfr. neste sentido o acórdão do então Tribunal Tributário de 2.ª Instância de 4.4.1995, recurso n.º 62 872.