Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05098/11
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:01/17/2012
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores: IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. IRC. RETENÇÃO NA FONTE. DIREITO COMUNITÁRIO. DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS.
Sumário:Doutrina que dimana da decisão:
1. A Directiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, veio regular a retenção na fonte dos lucros distribuídos entre uma sociedade afiliada e a sociedade-mãe, com domicílio fiscal em um dos diversos países membros da União Europeia, tendo em vista criar condições análogas às de um mercado interno e facilitar os agrupamentos de sociedades à escala comunitária;
2. Tal directiva veio impor aos Estados-membros que a distribuição de lucros não se encontra sujeita à retenção na fonte, salvo se necessário para prevenir fraudes e abusos, e autorizou a derrogação desta não retenção a três países, entre os quais a Portugal, em que permitiu tal retenção por razões orçamentais, por oito anos, com a taxa máxima de 15% nos primeiros cinco e de 10% nos restantes três anos;
3. A legislação nacional ao transpor para a ordem interna tal Directiva, tem de respeitar o seu texto e o seu espírito, não lhe podendo ser contrária, sob pena da sua violação e não poder ser aplicada, tendo em conta a primazia na ordem constitucional do direito comunitário sobre o direito interno;
4. A verificação do pressuposto substantivo de que a beneficiária dos lucros distribuídos era detentora de pelo menos 25% do capital social da afiliada, tal como dos demais requisitos, para vigorar apenas no período de tempo em que a mesma Directiva dispôs da sua derrogação quanto a Portugal da isenção de retenção, não foi directamente regulado no texto da Directiva, tendo o legislador nacional, em complemento da texto da mesma, vindo regular tais requisitos, os quais assim instituiu como elementos constitutivos do direito à redução da taxa de retenção para 10%, no caso, que assim não pode ser feita a posteriori, pelo que o preenchimento do tempo de dois anos no capital social da afiliada tem de se verificar no momento dessa distribuição de lucros;
5. O reconhecimento e funcionamento do regime fiscal decorrente de benefícios, maxime de natureza fiscal tem, em geral, carácter meramente declarativo, salvo se o legislador lhe atribuir o efeito constitutivo – art.º 4.º n.º2 do EBF de então.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. A Exma Representante da Fazenda Pública (RFP) e A...BV, representada por B... ...– Comunicações Pessoais, SA, identificadas nos autos, dizendo-se inconformadas com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa - 4.ª Unidade Orgânica – na parte em que para cada uma delas a impugnação judicial foi julgada improcedente, vieram da mesma recorrer para este Tribunal, formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


A) da Representante da Fazenda Pública:

I - Visa o presente Recurso reagir contra a douta Sentença que julgou parcialmente procedente a Impugnação deduzida pela B... BV, representada por B... ...– Comunicações Pessoais SA, Nif. 502.544.180, que teve por objecto o pedido de reembolso da diferença entre o montante de Retenção na Fonte de IRC sobre dividendos do exercício de 1997 (distribuídos em 15/06/1998), efectuado a uma taxa de 25% (€ 2.046.525,44), e o valor que resultaria da aplicação da taxa de 10% (€ 818.610,17), ou seja, o montante de € 1.227.915,26;
II - Na situação “sub júdice” está em discussão saber qual a taxa de Retenção na Fonte de IRC que deve ser aplicada à distribuição de dividendos do exercício de 1997 efectuada em 15/06/1998 pela B... ...– Comunicações Pessoais SA, Nif. 502.544.180, tendo em conta que a Impugnante é uma sociedade de direito Holandês e sujeita a imposto neste Estado (vennootschapsbelasting) sem possibilidade de isenção ou opção, e detém 50,88% do capital da B... ...desde 10/12/1996;
III – Isto é, cumpre averiguar se pode ser aplicada a taxa de 10% prevista no Art. 5.º, n.º 4 da Directiva n.º 90/435/CEE, de 23 de Julho de 1990, sem que seja necessário que na data da distribuição dos lucros se encontre já decorrido o prazo de dois anos de detenção de pelo menos 25% do capital da entidade que procede à distribuição, ou se deve ser aplicada a taxa de 25%, por não se encontrar preenchido aquele lapso temporal previsto no Art. 69.º, n.º 2, al. c) do CIRC com redacção à data dos factos;
IV - Ora, a Directiva n.º 90/435/CEE, normalmente designada pela Directiva mães-filhas, teve como objectivo facilitar a implementação de grupos de sociedades à escala comunitária, criando um regime análogo ao de um mercado interno, garantindo a neutralidade fiscal e não permitindo a retenção na fonte na distribuição de lucros entre a sociedade afilhada e a sociedade mãe, tendo esta domicílio fiscal noutro Estado-membro; porém, tal como decorre do Art. 1.º, n.º 2 desta Directiva, esta não impede a aplicação de disposições nacionais ou convencionais que se afigurem necessárias para evitar fraudes e abusos;
V - De acordo com o Art. 3.º, n.º 2 desta Directiva, os Estados-membros dispõem da faculdade de não aplicar a Directiva às suas sociedades quando estas não conservem uma participação mínima 25% na qualidade de sociedades-mãe por um período ininterrupto de dois anos, ou às sociedades em que uma sociedade de outro Estado-membro não conserve essa participação durante aquele período, cabendo aos Estados-membros a adopção de medidas nos respectivos ordenamentos jurídicos, com vista a garantir o cumprimento daquele período de permanência;
VI – De harmonia com o Art. 5.º, n.º 1 da mencionada Directiva, os lucros distribuídos por uma sociedade afilhada à sua sociedade-mãe são isentos de retenção na fonte, desde que esta sociedade detenha uma participação mínima de 25% do capital da afilhada, para além do cumprimento dos requisitos previstos nos Arts. 2.º e 3.º, n.º 1; porém, foram concedidos regimes de excepção à República Federal da Alemanha, à República Helénica e à República Portuguesa;
VII - Assim, e no que concerne a Portugal, dispõe o Art. 5.º, n.º 4 que: “Em derrogação do disposto no nº. 1, a República Portuguesa pode cobrar uma retenção na fonte sobre os lucros distribuídos pelas suas sociedades afilhadas a sociedades-mães de outros Estados-membros até uma data que não poderá ser posterior ao fim do oitavo ano seguinte à data de entrada em aplicação da presente Directiva.
Sem prejuízo das disposições das convenções bilaterais existentes, celebradas entre Portugal e um Estado-membro, a taxa dessa retenção não pode exceder 15% durante os cinco primeiros anos do período referido no parágrafo anterior e 10% durante os três últimos anos. (…)”
VIII – Nos termos do Art. 8.º, n.º 1 desta Directiva, os Estados-membros teriam que criar medidas legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para se conformarem com aquela até 01/01/1992, sendo que esta Directiva foi transposta para o ordenamento jurídico Português através do D.L 123/92, de 2 de Julho, que assim veio complementar os aspectos não regulados na Directiva;
IX - Também foi este o entendimento adoptado pelo Acórdão do TCA Sul de 17/02/2009, Proc. 1931/07, atinente à prova de residência fiscal a efectuar antes da distribuição de dividendos de 1998 efectuada por uma sociedade portuguesa à uma sociedade com domicílio fiscal no Luxemburgo, no qual se prescreveu que: “Tal directiva foi transposta para o ordem jurídica interna portuguesa pelo Dec-Lei n.° 123/92, de 2 de Julho, como desde logo se pode ler do seu preâmbulo, para entrar em vigor em l de Janeiro de 1992, desta forma tendo vindo complementar o texto da citada directiva nos aspectos por esta não regulados, como seja a forma da prova quanto à residência fiscal da empresa não domiciliada em território português, bem como o tempo em que esta devia ter lugar (…)”
X - Ora, tendo em conta que apenas as Directivas formuladas em termos claros, precisos e incondicionais e sem necessidade de adopção de medidas complementares por parte dos Estados-membros é que tem efeito directo na ordem jurídica interna dos Estados-membros, tal como foi defendido no Acórdão do STA de 07/12/2010, Proc. 01075/10, e que a Directiva n.º 90/435/CEE ficou dependente de adopção de medidas complementares, tendo este D.L. n.º 123/92 vindo complementar o texto da Directiva e preencher conceitos em branco que a mesma continha, significa que esta Directiva não era dotada de efeito directo na ordem jurídica Portuguesa nesta fase inicial;
XI - Também este foi o entendimento acolhido pelo Acórdão do TCA Sul supra referido, que preconizou que:
“É certo que as directivas, em certas condições, são de aplicação directa nos Estados-membros e podem ser invocadas pelos particulares sujeitos das relações jurídicas reguladas pelo direito comunitário, cuja primazia lhes advém do disposto no art.° 8.° n.°4 da Constituição da República Portuguesa (redacção da Lei Constitucional n.° 1/2004, de 24 de Julho), como constitui jurisprudência fixada, quer deste Tribunal, quer do Tribunal de Justiça das Comunidades, como se pode ver, quer dos acórdãos citados pela recorrente, quer dos enumerados no acórdão deste Tribunal de 22.5.2007, recurso n.° 1685/07 (de que o ora Relator foi 1.° Adjunto), no seguimento da teoria do acto claro, em que o TJCE então se pronunciou no seu acórdão de 6.10.1982, tirado no caso CILFIT, em que quando a norma comunitária aplicável se apresente perfeitamente clara, não suscitando qualquer dificuldade de interpretação, em honra ao velho princípio jurídico segundo o qual in claris nonfit interpretado, logra aplicação directa na ordem jurídica do Estado membro, em detrimento de eventual lei nacional que em contrário disponha.
Mas não é isto que acontece no caso dos autos.
A Directiva em causa, ela própria, não regula todos os aspectos para que veio contemplar a não retenção na fonte, ou retenção inferior, dos rendimentos distribuídos entre sociedades afiliadas e sociedades-mãe, desta forma não podendo ser directamente aplicável no Estado-membro sem uma intervenção legislativa do legislador do Estado-membro para colmatar as faltas e insuficiências da Directiva, como seja a propósito do que entende por domicílio fiscal e o momento em que este e outros requisitos necessários à aplicação da Directiva, devem ser apresentados.
E foram estes e outros aspectos que o legislador nacional veio regular pelo citado Dec-Lei 123/92, de 2 de Julho, como acima se transcreveu, que assim complementam o texto da Directiva, surgindo como requisitos necessários à respectiva aplicação, (…)”
XII – Desta forma, no que concerne ao D.L. 123/92, este deu nova redacção ao Art. 69.º, n.º 2, al. c) do CIRC, que passou a prescrever que:
“Tratando-se de rendimentos de entidades que não tenham sede nem direcção efectiva em território português e aí não possuam estabelecimento estável ao qual os mesmos sejam imputáveis, a taxa do IRC é de 25%, excepto relativamente aos seguintes rendimentos:
c) Lucros que uma entidade residente em território português, na condições estabelecidas no artigo 2.° da Directiva n.º 905435/CEE, de 23 de Julho de 1990, coloque à disposição de entidade residente noutro Estado membro das Comunidades Europeias que esteja nas mesmas condições e que detenha directamente uma participação no capital da primeira não inferior a 25% durante dois anos consecutivos ou desde a constituição da entidade participada, contanto que, neste último caso, a participação seja mantida durante aquele período, em que a taxa do IRC é de 15% até 31 de Dezembro de 1996, sem prejuízo do disposto nas convenções bilaterais em vigor, e de 10% desde l de Janeiro de 1997 até 31 de Dezembro de 1999; (…)”
XIII - O D.L. 123/92 aditou ainda o n.º 7 e 8 ao Art. 75.º do CIRC, decorrendo daquele n.º 7 que: “Quando seja aplicável o disposto na alínea c) de n.°2 do artigo 69.°, deverá ser feita a prova perante a entidade devedora dos rendimentos, anteriormente à data da sua colocação, à disposição do respectivo titular, de que este se encontra nas condições de que depende a aplicação da taxa aí estabelecida;” (sublinhado nosso)
XIV - Daqui resulta que, para que seja aplicada a taxa de 10%, é necessário que na data da distribuição dos dividendos a sociedade-mãe detenha uma participação igual ou superior a 25% no capital da sociedade afilhada há pelo menos dois anos, sendo que a prova deste e dos outros requisitos teria que ser efectuada antes da data da colocação à disposição da sociedade-mãe, tal como resulta dos normativos supra referidos e do Ofício-circulado n.º 20069 de 31/05/2002 (ns. 1 a 5), da Direcção de Serviços de Benefícios Fiscais;
XV - Também neste sentido vai o Aresto do TCA Sul supra mencionado, ao referir que: “Como resulta dos transcritos artigos, toda a prova atinente à subsunção da entidade beneficiária dos rendimentos ao texto da citada Convenção tem de ser efectuada, perante a entidade que vai colocar tais rendimentos à sua disposição e previamente a tal colocação por força do citado art.° 75.° n.°7 do CIRC, todos esses requisitos, que não à posteriori, constituindo assim, uma feição constitutiva para a entidade beneficiária poder obter no caso, a taxa de retenção de imposto na fonte de apenas 10%, entre os quais se inclui pois, o certificado de residência no outro Estado membro passado pelas entidades competentes que, não o tendo feito, como não se encontra em causa, a sua situação não se encontra subsumível ao regime da citada Convenção, não beneficiando pois do respectivo regime nela contido, pelo que a retenção na fonte teria de ser efectuado pelo regime geral, como foi, que assim não enferma da ilegalidade apontada.”
XVI – Assim como o Acórdão do STA de 21/10/2010, Proc. 0518/09, ao preconizar que: “O contribuinte optou pelo benefício que lhe é concedido pela alínea c) do n° 2 do artigo 69° do Código do IRC, que se traduz numa redução da taxa de retenção de IRC de 25% para 10%.
Para usufruir deste benefício, a entidade pagadora do rendimento deve provar que a entidade beneficiária do mesmo cumpre os seguintes pressupostos:
- Que seja residente noutro Estado membro da Comunidade Europeia;
- Que detenha directamente uma participação no seu capital superior ou igual a 25%, durante dois anos consecutivos ou desde a sua constituição, contanto que neste último caso, a participação seja mantida durante aquele período.
Nos termos do n° 7 do artigo 75° do CIRC quando seja aplicável o disposto na alínea a) do n° 2 do artigo 69°, do mesmo Código, deve ser feita prova perante a entidade devedora dos rendimentos, anteriormente à data da sua colocação à disposição do respectivo titular, de que este se encontra nas condições estabelecidas e das quais depende a aplicação da taxa de retenção de IRC de 10 %.”
XVII - Ora, se é exigida que a prova da verificação dos requisitos antes da data da colocação à disposição dos dividendos, por maioria de razão, estes requisitos têm que estar verificados na data da distribuição;
XVIII – Quanto à questão dos dois anos de detenção da participação no momento da colocação à disposição dos dividendos, o Acórdão do Acórdão do STA de 09/05/2007, Proc. 0880/06, acolhe a nossa posição ao referir que: “Ora, como notou o relator do processo no seu falado parecer, a sentença não fixou, nem do que estabeleceu se pode inferir, que a agora recorrente seja detida pela «Casa Mãe», há mais de 2 anos, no momento em que os dividendos foram colocados à disposição desta última. Para a sentença, essa detenção iniciou-se em 19 de Dezembro de 1997 e durou todo o ano seguinte – o que está longe de perfazer dois anos.
Acresce que a recorrente alega que foi em 25 de Agosto de 1999 que os dividendos foram colocados à disposição da «Casa Mãe»; enquanto que a sentença estabeleceu como data da mesma ocorrência o dia 19 de Outubro de 1999. E a data em que isso aconteceu tem a relevância que já se viu, pois que os 2 anos de detenção do capital da recorrente se contam, para o passado, a partir daí.” (sublinhado nosso)
XIX – No mesmo sentido vai o Parecer do Procurador-Geral Adjunto junto do STA emitido no Acórdão do STA de 18/11/2009, Proc. 0588/09: “A aplicação da taxa reduzida de 10%, por retenção na fonte, sobre os lucros colocados à disposição de uma entidade com sede num Estado membro das Comunidades Europeias por outra entidade, com sede em território português, depende da prova, perante a entidade devedora dos rendimentos, anteriormente à data “colocação à disposição do respectivo titular, das condições estabelecidas no artº 2º Directiva nº 90/435/CEE, 23 Julho 1990 e de uma participação no capital da entidade devedora dos rendimentos não inferior a 25% durante dois anos consecutivos ou desde a constituição da entidade participada, desde que mantida durante aquele período (arts 69º n° 2 al. c) e 75° n° 7 CIRC redacção vigente em 1997).
A comprovação exigida constitui formalidade ad substanciam (e não meramente ad substanciam (e não meramente ad probationem), como claramente inculca:
a) o termo final do prazo para a apresentação da prova, explicitamente estabelecido pelo legislador (antes da colocação dos lucros à disposição do titular)
b) o facto de o seu cumprimento ser essencial à verificação das condições de que depende a aplicação da taxa reduzida do imposto.
A anterioridade da prova em relação à colocação dos rendimentos à disposição entidade não residente é indispensável à aplicação pela entidade devedora da correcta, por retenção na fonte. (…)” (sublinhado nosso)
XX - E também o Acórdão do STA de 12/06/2007, Proc. 0397/06, ao referir que: “Deste modo - de acordo com as prescrições contidas nos transcritos dispositivos - a taxa que incidirá, em sede de IRC, sobre os rendimentos de sociedade que não tenha sede ou direcção efectiva em Portugal e que aqui não possua estabelecimento a quem os mesmos possam ser imputados será, por via de regra, de 25%, taxa essa que poderá ser reduzida no caso de reunião dos seguintes requisitos:
a) Estar a sociedade residente no território português nas condições do art.º 2.º da Directiva n.º 90/435/CEE.
b) Estar a sociedade a quem os dividendos são distribuídos nas mesmas condições e ser residente em Estado membro da CE.
c) Deter esta sociedade uma participação no capital da sociedade residente em Portugal não inferior a 25%.
d) Deter essa participação durante dois anos consecutivos ou desde a constituição da participada, contando que, neste último caso, a participação seja mantida durante aquele período.
e) E fazer-se prova perante a entidade devedora, anteriormente à data da colocação dos rendimentos, de que está em condições de poder beneficiar de uma taxa reduzida, prova essa que terá de ser remetida, acompanhada do mod. 130, à DGCI.
E se assim é, como é, a questão que temos para resolver é a de saber se, in casu, se reuniam os mencionados requisitos e se, portanto, a Recorrente podia liquidar o IRC a taxas reduzidas.” sublinhado nosso)
XXI - Deste modo, face às disposições legais mencionadas (Arts. 69.º, n.º 2, al. c) e 75.º, n.º 7 do CIRC), ao regime derrogatório conferido a Portugal até 31/12/1999, bem como ao entendimento da Jurisprudência supra transcrita, afigura-se-nos que na data dos factos, para beneficiar da taxa de 10%, na data da distribuição dos dividendos, a impugnante teria que dispor da participação de 25% do capital da B... ...há dois anos, o que não acontecia no caso em apreço;
XXII - A partir de 01/01/2000 cessa o regime derrogatório conferido a Portugal, e a Directiva passa a ter efeito directo, tal como foi o entendimento veiculado no Acórdão do STA de 07/12/2010, Proc. 01075/10: “Da conjugação destes diplomas resulta, claramente, que Portugal só estava autorizado a tributar os lucros que a sociedade afiliada colocasse à disposição da sociedade mãe residente noutro Estado membro até 31 de Dezembro de 1999, e que a taxa aplicável e essa tributação era, sem prejuízo das disposições das convenções bilaterais existentes, a de 15% até 31/12/96 e a de 10% desde aí até 31/12/99. E porque esse regime derrogatório terminava em 31 de Dezembro de 1999, tendo a norma contida no nº 1 do art.º 5.° da Directiva, sobre a isenção de tributação, entrado em pleno vigor no dia 1 de Janeiro de 2000, conclui-se que as taxas reduzidas previstas nessas normas do CIRC deixaram de poder ser aplicadas por Portugal a partir de então.”
XXIII – Apenas com o aditamento do Art. 75.ºA do CIRC (efectuado pela Lei n.º 30-G/2000, de 29/12), que entrou em vigor em 01/01/2001 e não tem natureza interpretativa, ficou prevista a possibilidade de reembolso da diferença de retenção na fonte no caso do prazo de dois de detenção da participação se completar após a data da colocação à disposição dos dividendos;
XXIV - Pelo que deve a douta Sentença ser revogada e substituída por outra que considere que não é de restituir qualquer valor de Retenção na Fonte, já que a Impugnante não dispunha, na data da distribuição dos dividendos, de participação de 25% do capital da B... ...há dois anos, pelo que a taxa aplicável é de 25%, e não de 10%, sobre 50% dos dividendos;
XXV - A manter-se na Ordem Jurídica, a douta Sentença ora recorrida revela uma inadequada interpretação e aplicação quer dos Arts. 69.º, n.º 2, al. c) e 75.º, n.º 7 do CIRC, quer do regime excepcional concedido a Portugal pela Directiva n.º 90/435/CEE;

Termos em que deve o presente Recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, ser reconhecida a legalidade da Retenção na Fonte de IRC sobre dividendos à taxa de 25%, efectuada à Impugnante pela B... Telecel.”


B) Da recorrente A...BV:

A) A ora Recorrente submeteu perante o Tribunal a quo a apreciação jurisdicional da legalidade do acto tributário melhor identificado no ponto imediatamente anterior com fundamento no disposto na Directiva do Conselho n.º 90/435/CEE - Directiva relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mães e sociedades filiadas de Estados-membros diferentes – bem, como a consequente restituição do imposto indevidamente retido, bem como o reconhecimento do seu direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do disposto no artigo 43.º da Lei Geral Tributária (“LGT”);
B) O mui douto Tribunal a quo considerou a impugnação judicial parcialmente procedente, tendo determinado a anulação da retenção na fonte de IRC suportada pela Recorrente, na parte correspondente à diferença entre a taxa de 25% prevista na lei interna e a taxa de 10% prevista na Directiva n.º 90/435/CEE;
C) O Tribunal a quo indeferiu o pedido da ora Recorrente na parte relativa ao direito ao pagamento de juros indemnizatórios com fundamento na inexistência de erro por parte da Administração Tributária – por não ser ela a responsável pela retenção na fonte – sendo, pois, este o objecto do presente recurso;
D) A ora Recorrente não se pode conformar com a referida decisão, pois que a mesma consubstancia um manifesto erro de julgamento consubstanciado numa errónea aplicação do artigo 43.º da LGT e do artigo 22.º da Constituição da República Portuguesa (CRP);
E) Face à factualidade assente nos presentes autos, e atenta a jurisprudência citada pelo Tribunal a quo, parece claro que a legislação nacional não se mostrava totalmente conforme com o artigo 3º da Directiva n.º 90/435/CEE, o que determinou a retenção indevida de imposto à taxa de 25% prevista na legislação interna;
F) Destarte, apesar da referida desconformidade, a Administração Tributária – quando confrontada com a pretensão da ora Recorrente, formulada na única via processual admissível, ou seja, a reclamação do acto de retenção prevista no artigo 132º do CPPT – indeferiu a mesma, invocando precisamente a norma desconforme da legislação nacional para sustentar a sua posição;
G) É neste acto administrativo de indeferimento da reclamação graciosa do acto tributário de retenção na fonte que sustenta o erro da administração tributária que a faz incorrer em responsabilidade indemnizatória por via do artigo 43º da LGT;
H) Apesar da Administração Tributária não poder ser responsabilizada pelo acto de retenção praticado pelo substituto tributário, parece relativamente pacífico que a mesma terá de responder por todos os actos procedimentais posteriores que posterguem e retardem a reposição da legalidade tributária e a restituição do indevido;
I) Uma leitura apressada do referido preceito legal poderia levar o intérprete a considerar que se mostra precludida a possibilidade de os sujeitos passivos requererem o pagamento de juros indemnizatórios, ainda que o erro imputável aos serviços decorra não de um acto de liquidação de imposto, mas seja decorrente de um acto administrativo inserido num procedimento tributário de apreciação da legalidade de um acto tributário;
J) Uma tal interpretação, para além de não ter suporte na letra do artigo 43º da LGT, consubstanciaria uma restrição inaceitável da responsabilidade da Administração Tributária, bem como a negação dos pressupostos de um Estado de direito;
K) Parece claro que se a Administração Tributária não tivesse negado a pretensão da Recorrente em sede graciosa, esta não teria sido privada das quantias a que tinha direito durante os últimos 8 anos;
L) A prática do acto lesivo – em conformidade com a lei em vigor, também ela desconforme com o Direito Comunitário – só poderia ser anulada pela via prosseguida pela Recorrente, pois, recorde-se, o artigo 132º do CPPT impõe a reclamação prévia quando se trate da impugnação da retenção na fonte por parte do substituto e do substituído tributário, sendo que aquele actuou no âmbito de um mandato legal em substituição da Administração Tributária;
M) Existe erro dos serviços porquanto confrontados com a pretensão da Recorrente, negaram a mesma com base na aplicação de uma norma julgada em sede judicial ilegal;
N) O artigo 3º da Directiva 90/435/CE, ao contrário do disposto no artigo 69.º do CIRC (na redacção em vigor à data dos factos tributários), não exigia como condição para aplicação da taxa reduzida de imposto que, no momento da distribuição dos dividendos, a sociedade mãe detivesse a participação no capital social da afiliada durante um período de pelo menos 2 anos, mas apenas que a participação fosse detida por um período ininterrupto de 2 anos;
O) O entendimento propugnado pela Recorrente foi expressamente acolhido pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE), o qual julgou incompatível com a Directiva as normas de direito interno dos Estados Membros que fizessem depender a aplicação do regime comunitário da condição da sociedade-mãe, no momento da distribuição dos dividendos, ter detido a participação durante o período mínimo fixado pela respectiva legislação interna (Acórdão Denkavit, processos apensos C-283/94, C-291/94 e C-292/94;
P) O facto de a decisão de indeferimento da reclamação graciosa ter obedecido às disposições do CIRC não exclui a existência de erro de direito, uma vez que o referido preceito legal se mostra contrário a uma norma de fonte superior, erro esse que foi reconhecido por via judicial quando determinou a restituição das retenções na fonte indevidamente suportadas pela Recorrente no ano de 1998;
Q) Ao aplicar uma norma ilegal em sede do procedimento de reclamação graciosa, a Administração Tributária chamou a si a responsabilidade pelo pagamento indevido do imposto, motivo por si só bastante para se entender que são devidos juros indemnizatórios a contar desde a data do indeferimento da reclamação graciosa, i.e., da data em que se consumou o erro imputável aos serviços da Administração Tributária;
R) A posição da nossa jurisprudência sobre a matéria é unânime no sentido do direito ao pagamento de juros indemnizatórios sempre que exista um erro imputável aos serviços da Administração Tributária, sendo que o STA já se pronunciou num caso similar ao dos presentes autos, conforme ora se transcreve, “Assente, como vimos, que não havia lugar a tributação em IRS, forçoso é concluir pela ilegalidade da predita retenção na fonte, com o consequente direito a juros indemnizatórios, desde 25/6/99. Isto porque foi nesta data que a A.F. indeferiu a reclamação graciosa deduzida pelo contribuinte contra a retenção na fonte.Tal indeferimento lavrou em erro de direito, imputável aos serviços, pois que a dita reclamação devia, e não foi, atendida. Tem, pois, o contribuinte, direito a juros indemnizatórios nos termos do art. 24º do C.P.T.” (cfr. Acórdão do STA de 09.1.02, recurso n.º 26807);
S) Requer-se assim a este Venerando Tribunal que se digne deferir o presente recurso e revogar a sentença proferida pelo Tribunal a quo na parte ora recorrida, e que ordene consequentemente aos serviços responsáveis da Administração Tributária o pagamento à ora Recorrente dos juros indemnizatórios sobre a quantia a restituir no valor de EUR 1.227.915,26, a computar desde a data de indeferimento da reclamação graciosa (26.06.2003), os quais na presente data se estimam em EUR 403.967,30, acrescidos dos juros vincendos até à data do trânsito em julgado da decisão que reconheça o direito da ora Recorrente ao reembolso do IRC indevidamente suportado em Portugal no ano de 1998.

Nestes termos, e nos melhores de Direito que os mui Ilustres Juizes DESEMBARGADORES deste Venerando Tribunal assim o julgarem no seu MUI douto juízo, deve o recurso interposto pela ora Recorrente ser julgado totalmente procedente, por provado, revogando-se a Douta Sentença na parte ora recorrida, tudo com as demais consequências legais.
Assim fazendo, VOSSAS EXCELÊNCIAS, a costumada Justiça!


Foram admitidos ambos os recursos para subirem imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


Também a impugnante veio a apresentar alegações e nestas as respectivas conclusões quanto ao recurso interposto e admitido da RFP, as quais, igualmente na íntegra se reproduzem:


A) Na óptica do Tribunal a quo, a ora Recorrida tem direito à restituição do IRC retido na fonte à taxa de 25%, uma vez que tendo-se comprovado a detenção da participação na sociedade afiliada pelo prazo mínimo de 2 anos, será de aplicar a Directiva 90/435/CEE, a qual previa uma taxa especial de retenção na fonte de 10% para Portugal, um regime, diga-se, excepcional e transitório, pois o regime-regra é a dispensa de retenção na fonte na distribuição de dividendos no seio de grupos empresariais com sede na União Europeia;
B) Na óptica da Fazenda Pública, ora Recorrente, a sentença recorrida efectua uma errada aplicação do regime legal aplicável, uma vez que,"(...) para que seja aplicada a taxa de 10%, é necessário que na data da distribuição dos dividendos a sociedade-mãe detenha uma participação igual ou superior a 25% no capital da sociedade afiliada há pelo menos dois anos (...)", em estrito cumprimento do disposto nos artigos 69.° e 75.° do CIRC com a redacção em vigor à data dos factos tributários, o que não sucedia no caso objecto dos presentes autos;
C) A questão decidenda consiste em determinar se um sujeito passivo que, à data da distribuição de dividendos da sua afiliada sediada na UE não cumpria com o requisito mínimo de dois anos previsto na Directiva n.° 90/435/CE e no Código do IRC, pode solicitar a restituição do imposto a posteriori assim que se completar o período mínimo de detenção de dois anos;
D) Face à factualidade assente nos presentes autos, e atenta a jurisprudência citada pelo Tribunal a quo na sua douta sentença, parece claro que a legislação nacional não se mostrava totalmente conforme com o artigo 3° da Directiva n.° 90/435/CEE, o que determinou a retenção indevida de imposto à taxa de 25% prevista no Código do IRC;
E) A Directiva 90/435/CEE exigia, apenas, que a participação fosse detida por um período ininterrupto de dois anos, não erigindo como requisito que o prazo de detenção fosse completado antes da distribuição de dividendos como requisito de aplicação da taxa reduzida de retenção na fonte;
F) O TJUE veio no Acórdão Denkavit a julgar incompatível com a Directiva as normas de direito interno dos Estados-membros que fizessem depender a aplicação do regime comunitário da condição da sociedade-mãe, no momento da distribuição dos dividendos, ter detido a participação durante o período mínimo fixado pela respectiva legislação interna (processos apensos C-283/94, C-291/94 e C-292/94;
G) A sentença recorrida não merece qualquer censura, pois a mesma limita-se a aplicar a jurisprudência comunitária sobre este tema, suportando, ainda, a sua decisão no acórdão proferido pelo STA no Processo n.° 01008/05, de 7 de Junho de 2006, nos termos do qual se perfilha a posição sustentada pela ora Recorrida nos presentes autos;
H) A Directiva veio impor aos Estados Membros uma obrigação de conformação dos seus sistemas tributários com as disposições e princípios nela constantes, tendo em vista a eliminação da dupla tributação económica sobre os dividendos distribuídos dentro do espaço comunitário, procurando contribuir, desse modo, para criar as condições para o desenvolvimento de um verdadeiro mercado único europeu;
I) O facto de ter sido dada liberdade aos Estados-membros para complementarem as disposições da Directiva, nomeadamente quanto aos requisitos formais e medidas de carácter administrativo para comprovação dos elementos materiais ali previstos, não pode ser interpretado no sentido de que não se consegue retirar de forma clara e inequívoca do texto da Directiva qual o regime fiscal a que ficam sujeitos os dividendos distribuídos entre sociedades residentes na União Europeia, sendo assim evidente que as normas aí contidas são susceptíveis de gozar de efeito directo -neste mesmo sentido, veja-se o acórdão do TJUE no citado processo Denkavit;
J) O regime previsto no artigo 69° do CIRC decorre de um regime excepcional e de uma derrogação provisória concedida ao Estado Português, sendo certo que constitui Jurisprudência assente do TJUE que as medidas de natureza excepcional deverão ser interpretadas de forma restritiva - cfr. Acórdão Denkavit, de 17.10.96, Processo n° C-283/94 e Processos apensos n°s C-291/94 e C-292/94;
K) Da Jurisprudência firmada no Acórdão Denkavit resulta, de forma absolutamente cristalina, que a faculdade prevista no artigo 5°, n.° 1, da Directiva, não pode ser interpretada como autorizando um Estado-Membro a fazer depender a referida isenção da condição de, no momento da distribuição dos lucros, a sociedade-mãe ter detido a participação exigida no capital da sociedade filial durante um período pelo menos igual ao que tiver sido fixado nos termos da faculdade que lhe é reconhecida;
L) A jurisprudência firmada no referido Acórdão é plenamente aplicável ao caso sub judice, uma vez que a Autora, a sociedade Denkavit International BV, detinha uma participação superior a 25% numa subsidiária alemã, por um período inferior a 12 meses, aquando da distribuição dos dividendos;
M) O Estado Português, ao fazer depender a concessão do beneficio fiscal previsto no artigo 5°, n.° 1, da Directiva da condição de, no momento da distribuição dos lucros, a sociedade-mãe ter detido uma participação na sociedade filial durante um período mínimo de dois anos, sem qualquer possibilidade de ulterior reembolso, transpôs de forma incorrecta a referida Directiva para o respectivo direito interno (no sentido ora propugnado, ver Dali Bouzoraa, in The Parent-Subsidiary Directive: Denkavifs Lessons, European Taxation, IBFD, Janeiro de 1997, páginas 14 a 18);
N) No âmbito da referida Jurisprudência decorrente do Acórdão Denkavit, o TJCE destacou, de forma absolutamente inequívoca, a constituição de direitos mínimos na esfera dos particulares ao abrigo das disposições de princípio contidas no artigo 5° da Directiva;
O) O legislador interno, entrevendo as fragilidades ora apontadas às normas previstas no CIRC, propôs, na denominada Lei da Reforma Fiscal - a Lei n.° 30-G/2000, de 29 de Dezembro - a possibilidade de ser requerido o reembolso nos casos em que a participação mínima de dois anos se verificasse depois da colocação à disposição dos rendimentos (cfr. actual n.° 2 e 3 do artigo 89° do CIRC), adaptando a legislação interna à jurisprudência firmada no Acórdão Denkavit);
P) São, igualmente, de rejeitar as asserções da Recorrente em torno da possibilidade dos Estados-membros adoptarem medidas anti-abuso e de combate à fraude ao abrigo da faculdade prevista no artigo 1.°, n.° 2 da Directiva, sendo que a Fazenda Pública não invocou, demonstrou ou sequer identificou qualquer comportamento fraudulento por parte da ora Recorrida;
Q) Os artigos 69.° e 75° do CIRC, na redacção à data dos factos tributários, condicionavam a aplicação da Directiva ao cumprimento de um requisito material não previsto na Directiva e de natureza desproporcionada face à letra e espírito do referido diploma, inviabilizando qualquer prova ulterior, mesmo que verificados os requisitos materiais consagrados pelo legislador comunitário, o que se invoca para efeitos de improcedência do presente recurso;
R) Considerando que a Jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo em matéria de direito comunitário, nenhuma dúvida restará que face à Jurisprudência do TJUE no Acórdão Denkavit, decisão transponível para o caso em apreço por se verificarem todas as condições previstas naquele aresto, as normas previstas nos artigos 69° e 75° do CIRC são desconformes com a Directiva n.° 90/435/CEE, o que determinará a improcedência do presente recurso e a anulabilidade parcial da retenção na fonte de IRC de 1998, devendo, em consequência, e tal como determinado na douta sentença recorrida, ser a Administração Tributária condenada à restituição da quantia de EUR 1.227.915,26, tudo com as devidas consequências legais.

Nestes termos, e nos melhores de Direito que os mui Ilustres Juizes DESEMBARGADORES deste Venerando Tribunal assim o julgarem no seu MUI douto juízo, deve o recurso interposto pela Recorrente ser julgado totalmente improcedente, requerendo-se a este Venerando Tribunal que confirme a sentença recorrida, determinando a consequente anulação do acto de retenção na fonte sindicado referente a IRC do exercício de 1998, por clara violação do artigo 8.° da CRP, da Directiva n.° 90/435/CEE e da jurisprudência do TJCE acima citada. Assim fazendo, VOSSAS EXCELÊNCIAS, a costumada Justiça!


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado concedido provimento ao recurso interposto pela RFP, cujos fundamentos diz assumir.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. A única questão a decidir consiste em saber se no ano de 1998, o pressuposto de a sociedade-mãe deter no capital social da afiliada uma participação de não inferior a 25% do seu capital social, durante dois anos consecutivos, tinha de se verificar logo no momento da distribuição dos dividendos desta, para efeitos de beneficiar da taxa de retenção reduzida de 10%.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A. B... AirTouch (Europe) Bv é uma sociedade legalmente constituída, de acordo com a lei holandesa sujeita a tributação naquele Estado, sem possibilidade de opção por isenção, “como mencionado no anexo à Directiva 90/435/EEC” – informação prestada pelas autoridades holandesas a fls. 31;
B. B... Air Touch (Europe) Bv detém, desde 10 de Dezembro de 1996, ininterruptamente, 50,88% do capital social de B... – ...– fls. 30;
C. Em 15 de Junho de 1998 B... – ...(cujas acções se encontram admitidas a negociação nos mercados de bolsa) procedeu à distribuição de dividendos, do ano de 1997, aos seus accionistas, sendo os da ora Impugnante no valor de €16 372 203,49 – fls. 74 do processo de reclamação;
D. Sobre a quantia referida em C, foi retida e entregue nos cofres do Estado a quantia de €2 046 525,44, correspondente a IRC à taxa de 25% sobre 50% – fls. 74 do processo de reclamação;
E. Em 14 de Junho de 2000, deduziu a ora Impugnante reclamação graciosa do acto de liquidação/retenção na fonte referido em D, invocando o art. 3º, nº 2, da Directiva nº 90/435/CEE, do Conselho e pedindo o reembolso da quantia a mais retida na fonte, no montante de Esc.:246 174 908$00/ €1 227 015,26, por alegada errada interpretação de tal norma – fls. 2 do processo de reclamação graciosa;
F. A reclamação graciosa referida em E foi indeferida por decisão de 24 de Junho de 2003 de que a ora Impugnante foi notificada em 1 de Julho de 2003, com fundamento em não ter a ora Impugnante feito prova de que reunia os requisitos da al.c) do nº 2 do art. 69º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, que transpôs a invocada Directiva para o direito interno, isto é, por não ter feito prova de que, em data anterior à da distribuição dos dividendos em causa, detinha uma participação no capital social de B... – ...não inferior a 25% durante dois anos consecutivos ou desde a constituição da sociedade participada – fls. 90 e ss do processo de reclamação graciosa;
G. A fundamentação referida em F, teve por base ofício circulado da Direcção de Serviços de Benefícios Fiscais nos seguintes termos: “Os lucros distribuídos, nos anos de 1996 a 1999, por empresas portuguesas a favor de empresas que estivessem nas condições da Directiva nº 90/435/CEE, por força do disposto na alínea c) do nº 2 do art. 69º do CIRC estavam sujeitas a tributação através do método de retenção na fonte pela taxa reduzida ali prevista, desde que as empresas beneficiárias dos rendimentos detivessem uma participação não inferior a 25% no capital social da empresa devedora durante um período mínimo de 2 anos.”
“Só que, para que a empresa beneficiária dos rendimentos pudesse beneficiar desta disposição, tinha de efectuar a prova de que reunia as condições previstas na citada directiva, bem como que detinha o capital social ali previsto tal como preceituava o nº 7 do art. 75º do CIRC, prova essa que devia ser efectuada anteriormente à data da colocação à disposição dos rendimentos relativamente aquela entidade beneficiária.”

Não foram alegados factos que não se encontrem provados.

A convicção do Tribunal quanto à decisão da matéria de facto fundou-se na análise da prova documental produzida, conforme referido a propósito de cada facto julgado provado.


4. Para julgar procedente a impugnação judicial e na parte em que o foi, considerou a M. Juiz do tribunal “a quo”, em síntese, que para a impugnante beneficiar da retenção à taxa reduzida de 10% nos dividendos atribuídos bastava que a sociedade-mãe possuísse uma participação de menos pelo menos de 25% no capital social da sociedade afiliada, ainda que ao tempo da sua distribuição não tivesse completado os dois anos dessa participação (o que poderia ser preenchido a posteriori), bem não tendo conferido o direito a juros indemnizatórios, por a retenção a tal percentagem não ter sido por iniciativa da AT mas sim da sociedade afiliada que assim procedeu.

Para a recorrente Fazenda Pública, de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, é contra o assim entendido que vem esgrimir argumentos tendentes à reapreciação da decisão recorrida em ordem a sobre ela ser emitido um juízo de censura conducente à sua revogação ou alteração, pugnando que os pressupostos para haver lugar à retenção à taxa reduzida de 10% se têm de verificar no momento dessa atribuição que não posteriormente e, quanto à impugnante-recorrente, que tal direito a juros indemnizatórios existe a partir do indeferimento da reclamação graciosa, altura em que a AT manteve na ordem jurídica um acto ilegal, pelo que a existência de erro imputável aos serviços não pode deixar de existir.

Vejamos então.
Desde logo convém frisar que, tendo sido interpostos dois recursos relativos a dois segmentos distintos da mesma sentença, deve-se começar por conhecer do recurso interposto pela Fazenda Pública, porque a proceder, com a manutenção na ordem jurídica do acto impugnado, prejudicado no seu conhecimento ficaria este outro recurso, o qual assenta em que tal acto tenha sido anulado, por ilegal, e em que o contribuinte ficou desembolsado do montante que a título de imposto pagou.

A questão dos requisitos fixados no citado Dec-Lei n.º 123/92, de Julho, na redacção do art.º 69.º do CIRC, em complemento do estatuído na citada Directiva n.º 90/453/CEE, para a sociedade-afiliada poder reter o imposto sobre os dividendos atribuídos à casa-mãe apenas à taxa reduzida de 10% (em 1998), foi questão já tratada no acórdão deste Tribunal, no recurso n.º 1931/07(1), de 17-2-2009, como bem se pronuncia a recorrente, ainda que o requisito em falta, naquele caso, não fosse o mesmo que no presente, já que naquele caso se reportava à falta da entrega do certificado de residência no outro Estado membro passado pelas entidades competentes até à data da atribuição de tais dividendos, enquanto que no presente recurso, se reporta ao requisito temporal de dois anos, de pelo menos 25% , no capital social da afiliada, à mesma data, o qual, igualmente, constitui um requisito ou pressuposto para puder haver lugar à retenção de tal taxa reduzida.

Assim, a parte da fundamentação em que tal acórdão conhece da natureza de tais requisitos e do momento em que os mesmos têm de estar verificados e na posse da sociedade afiliada, obrigada à retenção, têm aqui cabimento.

Fundamentou-se no mesmo, além do mais:
(...)
Pela leitura e interpretação, quer do conteúdo do preâmbulo da citada directiva, quer pelos seus artigos acima citados, deles se pode colher, com segurança, que o propósito da mesma directiva foi, no âmbito da criação para as sociedades, de um regime análogo ao de um mercado interno, e assim facilitar a criação de agrupamentos de sociedades à escala comunitária, tendo como corolário garantir a neutralidade fiscal, não permitir a retenção na fonte na distribuição de lucros, entre a sociedade afiliada e a sociedade-mãe, com domicílio fiscal em um outro Estado-membro, bem como o inverso, nessa mesma distribuição de lucros entre a sociedade-mãe e a sua afiliada, igualmente com domicílio fiscal em um outro Estado-membro.

Veio contudo, na citada norma do seu art.º 5.º, excepcionar deste regime de retenção zero, três Estados-membros, entre eles Portugal, este por razões orçamentais, que podia continuar a efectuar tal retenção, sem contudo ter deixado de balizar, ela própria, os limites dessa retenção, quer no tempo – oito anos a contar da aplicação da directiva – quer a taxa máxima – de 15% até ao quinto ano e de 10% nos restantes três anos.

Tal directiva foi transposta para o ordem jurídica interna portuguesa pelo Dec-Lei n.º 123/92, de 2 de Julho, como desde logo se pode ler do seu preâmbulo, para entrar em vigor em 1 de Janeiro de 1992, desta forma tendo vindo complementar o texto da citada directiva nos aspectos por esta não regulados, como seja a forma da prova quanto à residência fiscal da empresa não domiciliada em território português, bem como o tempo em que esta devia ter lugar, introduzindo pelo seu art.º 1.º, no art.º 45.º do CIRC nova redacção em, entre outros normativos, no seu n.º6, com a seguinte redacção:
a) A definição de entidade residente é a que resulta da legislação fiscal do Estado membro em causa, sem prejuízo do que se achar estabelecido nas convenções destinadas a evitar a dupla tributação;
...
E no art.º 69.º n.º2, alínea c), sob a epígrafe Taxas, com a seguinte redacção:
Lucros que uma entidade residente em território português, na condições estabelecidas no artigo 2.º da Directiva n.º 90/435/CEE, de 23 de Julho de 1990, coloque à disposição de entidade residente noutro Estado membro das Comunidades Europeias que esteja nas mesmas condições e que detenha directamente uma participação no capital da primeira não inferior a 25% durante dois anos consecutivos ou desde a constituição da entidade participada, contanto que, neste último caso, a participação seja mantida durante aquele período, em que a taxa do IRC é de 15% até 31 de Dezembro de 1996, sem prejuízo do disposto nas convenções bilaterais em vigor, e de 10% desde 1 de Janeiro de 1997 até 31 de Dezembro de 1999;
...
E no seu art.º 75.º, nos seus n.ºs 7 e 8, o qual tem por epígrafe, Retenções na fonte, com a seguinte redacção o seu n.º7:
Quando seja aplicável o disposto na alínea c) do n.º2 do artigo 69.º, deverá ser feita a prova perante a entidade devedora dos rendimentos, anteriormente à data da sua colocação, à disposição do respectivo titular, de que este se encontra nas condições de que depende a aplicação da taxa aí estabelecida;
E o seu n.º8:
A prova a que se refere o número anterior é feita através de declaração, em duplicado, confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado membro das Comunidades Europeias de que é residente a entidade beneficiária dos rendimentos, devendo o duplicado, acompanhado da relação modelo n.º 130 a que se refere a Portaria 376/90, de 15 de Maio, ser remetido à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos.

Como resulta dos transcritos artigos, toda a prova atinente à subsunção da entidade beneficiária dos rendimentos ao texto da citada Convenção tem de ser efectuada, perante a entidade que vai colocar tais rendimentos à sua disposição e previamente a tal colocação por força do citado art.º 75.º n.º7 do CIRC, todos esses requisitos, que não à posteriori, constituindo assim, uma feição constitutiva para a entidade beneficiária poder obter no caso, a taxa de retenção de imposto na fonte de apenas 10%, entre os quais se inclui pois, o certificado de residência no outro Estado membro passado pelas entidades competentes que, não o tendo feito, como não se encontra em causa, a sua situação não se encontra subsumível ao regime da citada Convenção, não beneficiando pois do respectivo regime nela contido, pelo que a retenção na fonte teria de ser efectuado pelo regime geral, como foi, que assim não enferma da ilegalidade apontada.

É certo que a norma do art.º 4.º n.º2 do EBF, na redacção então vigente, correspondente à do art.º 5.º n.º2 na republicação introduzida pelo Dec-Lei n.º 108/2008, de 26 de Junho, atribuem como regra, ao reconhecimento dos benefícios fiscais, o efeito de meramente declarativo (salvo quando a lei dispuser o contrário), pelo que, ela própria, consagra ampla margem de liberdade ao legislador para ao contrário dispor, como dispôs, que assim a não afronta, antes com ela se compagina, pelo que no caso, uma vez não entregue previamente à colocação de tais rendimentos à disposição da entidade beneficiária, o citado certificado de domicílio fiscal passado pelas autoridades fiscais do Estado-membro da sociedade-mãe (cfr. pontos 6. e 15. da matéria de facto provada), não lhe pode aproveitar o apenas emitido em 12.12.2002, que assim não pode retroagir nos seus efeitos à data da distribuição dos mesmos lucros à referida sociedade, como também se entendeu na sentença recorrida, desta forma não se encontrando efectuada a aludida prova de domicílio fiscal da referida sociedade-mãe em um outro Estado-membro antes da data de tal entrega, pelo que a taxa de retenção é a de 25%, como foi aplicada, que não de 10%, como pretende a recorrente, que assim se não mostra ilegal.


É certo que as directivas, em certas condições, são de aplicação directa nos Estados-membros e podem ser invocadas pelos particulares sujeitos das relações jurídicas reguladas pelo direito comunitário, cuja primazia lhes advém do disposto no art.º 8.º n.º4 da Constituição da República Portuguesa (redacção da Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho), como constitui jurisprudência fixada, quer deste Tribunal, quer do Tribunal de Justiça das Comunidades, como se pode ver, quer dos acórdãos citados pela recorrente, quer dos enumerados no acórdão deste Tribunal de 22.5.2007, recurso n.º 1685/07 (de que o ora Relator foi 1.º Adjunto), no seguimento da teoria do acto claro, em que o TJCE então se pronunciou no seu acórdão de 6.10.1982, tirado no caso CILFIT, em que quando a norma comunitária aplicável se apresente perfeitamente clara, não suscitando qualquer dificuldade de interpretação, em honra ao velho princípio jurídico segundo o qual in claris nonfit interpretado, logra aplicação directa na ordem jurídica do Estado membro, em detrimento de eventual lei nacional que em contrário disponha.

Mas não é isto que acontece no caso dos autos.
A Directiva em causa, ela própria, não regula todos os aspectos para que veio contemplar a não retenção na fonte, ou retenção inferior, dos rendimentos distribuídos entre sociedades afiliadas e sociedades-mãe, desta forma não podendo ser directamente aplicável no Estado-membro sem uma intervenção legislativa do legislador do Estado-membro para colmatar as faltas e insuficiências da Directiva, como seja a propósito do que entende por domicílio fiscal e o momento em que este e outros requisitos necessários à aplicação da Directiva, devem ser apresentados.

E foram estes e outros aspectos que o legislador nacional veio regular pelo citado Dec-Lei 123/92, de 2 de Julho, como acima se transcreveu, que assim complementam o texto da Directiva, surgindo como requisitos necessários à respectiva aplicação, não podendo, contudo, este texto complementar do legislador nacional revogar ou limitar o âmbito e conteúdo do próprio texto da directiva, sob pena de lhe ser desconforme e nessa medida não poder ser aplicado pela ordem jurídica nacional como acima se disse, antes cabendo ao legislador nacional desenvolver uma regulamentação complementar que seja harmoniosa com o sentido e alcance do texto da mesma directiva, como no caso entendemos que aconteceu, pelo que a mesma não pode deixar de ser aplicada por este Tribunal.

Também não se vê que o legislador nacional, ao assim ter legislado na transcrição e requisitos para que o regime da citada Directiva pudesse se aplicado na ordem jurídica interna portuguesa possa constituir restrição ilícita à liberdade de circulação de capitais e ao próprio art.º 56.º do TCE, violando o princípio da proporcionalidade, como invoca a recorrente, quando o que se tratou foi de complementar o texto da mesma Directiva ou, em outros casos, preencher conceitos em branco que a mesma continha, sem ultrapassar os limites impostos pelo mesmo texto, quer na sua letra, quer também, no seu espírito, crê-se, antes a própria ora recorrente só de si própria se poderá queixar, ao não ter apresentado em tempo o citado certificado de residência fiscal para assim poder beneficiar da retenção do imposto à taxa de apenas 10% nos lucros a si distribuídos pela sua afiliada com estabelecimento em Portugal...

Toda esta fundamentação deste citado acórdão deste Tribunal vale também o caso presente, já que quer a certificação da entidade não residente, quer a participação no capital social da empresa afiliada por dois anos consecutivos, constituem requisitos expressamente previstos na citada alínea c) do n.º2, do art.º 69.º do CIRC, na redacção introduzida pelo citado Dec-Lei 123/92, para o efeito de retenção a taxa reduzida, que, por força do n.º7 do art.º 75.º do mesmo CIRC (introduzido pela mesma norma do art.º 1.º deste Dec-Lei), deverá ser feita prova perante a entidade devedora dos rendimentos, anteriormente à data da sua colocação, à disposição do respectivo titular, de que se encontra nas condições de que depende a aplicação da taxa aí estabelecida, que não posteriormente, como pretende a recorrida e entendeu a sentença recorrida.

É certo que este requisito ou pressuposto, tal como foi erigido pelo legislador português, não encontra completa guarida no texto da citada Directiva 90/435/CEE, como bem salienta a impugnante na matéria da sua conclusão E) das suas contra-alegações, em cuja norma do seu art.º 3.º, n.º2, 3.º travessão, apenas admite a sua não aplicação aos casos de sociedades que não conservem, por um período ininterrupto de pelo menos dois anos, uma participação que dê direito à qualidade de sociedade-mãe, ou às sociedades em que uma sociedade de outro Estado-membro não conserve essa participação durante um período ininterrupto de pelo menos dois anos, o que contudo, atenta a natureza de complementar o texto da mesma Directiva, como acima se disse, nos aspectos em que o legislador comunitário se absteve de o fazer, como que tendo o mesmo delegado no legislador nacional tal tarefa, não se vê que enferme a exigência de tal requisito de qualquer vício que afecte a sua legalidade.

Quanto ao acórdão do TJUE de 17-10-1996 – Processos apensos C-283/94, C-291/94 e C-292/94, entre outras questões tratadas, a relativa à citada Directiva 90-435/CEE do Conselho, não se reporta a caso paralelo ao dos presentes autos, mas sim à isenção de retenção, caso em que o Estado-membro não pode ele próprio fixar, em legislação interna, um requisito de duração da participação no capital social igual ao que o mesmo tiver fixado ao abrigo do disposto no art.º 3.º, n.º2 da mesma Directiva, no momento da distribuição dos lucros – cfr. ponto 36 desse acórdão – nada tendo decidido sobre a norma do n.º4 do art.º 5.º da mesma Directiva, que derrogou o seu n.º 1 (isenção de retenção), bem como da delegação à República Portuguesa para, em vez da isenção da retenção, durante oito anos, fixar essas taxas (entre os limites que a própria Directiva estabeleceu), bem como dos requisitos que para esse efeito poderia fixar, pelo que não vemos, que ao seu arrimo, a liquidação deva ser anulada, como a mesma pretende.

E muito menos ao abrigo da doutrina do citado acórdão do STA de 7-6-2006, no recurso n.º 1008/05(2), como invoca a impugnante na matéria das conclusões das suas contra-alegações, secundando aliás, a fundamentação expendida na sentença recorrida ao abrigo da qual, nesta parte, foi julgada procedente a impugnação judicial deduzida.

É que a M. Juiz do Tribunal “a quo”, na decisão recorrida, não identificou correctamente o objecto da impugnação judicial, tomando-o como se fosse subsumível à citada alínea c) do n.º2, do art.º 69.º do CIRC, mas na sua última parte – desde a constituição da entidade participada, contanto que, neste último caso, a participação seja mantida durante aquele período (dois anos consecutivos) – situação esta sobre que incidiu este acórdão do STA que, dilucidando a disjuntiva ou que separa os dois trechos, concluiu que, apenas na situação subsumível ao segundo trecho é que não era necessário que à data da distribuição dos dividendos a entidade-mãe fosse detentora por dois anos consecutivos de tal participação social na afiliada.

Ora, não é esta a situação dos autos.
Como desde logo se pode colher do art.º 1.º da ora impugnante nessa reclamação graciosa, da sua decisão de fls 90 e segs do mesmo procedimento, como do art.º 3.º da petição inicial de impugnação judicial e alínea B) do probatório fixado na sentença recorrida, desde o alegatório e até ao presente, sempre a concreta questão decidenda foi de a mesma ser possuidora de 50,88% do capital social da afiliada desde 10-12-1996, pelo que em 15-6-1998 (data da distribuição dos dividendos), não era detentora, há pelo menos dois anos, dessa participação no capital social, pelo que cai na previsão da primeira parte da citada norma – e que detenha directamente uma participação no capital da primeira não inferior a 25% durante dois anos consecutivos – que não na segunda, separadas pela citada disjuntiva ou, que desta forma separou a primeira parte onde tal requisito de dois anos de detenção consecutiva era necessária no momento da distribuição dos dividendos, da segunda parte, onde tal requisito não tinha que se verificar, logo nesse momento da distribuição (podendo ser preenchido a posterior), sendo esta, em nosso entender, a verdadeira doutrina do acórdão em questão, que também secundamos, face não só aos fundamentos nele invocados como tendo em conta todos os elementos de interpretação, desde logo o literal e o sistemático, onde ao distinguir claramente entre a detenção da participação social por dois anos e a participação social desde a constituição da entidade participada, certamente que no propósito do legislador não foi para lhe fazer aplicar o mesmo regime, mas sim para lhe aplicar um regime diverso, consoante a situação fosse subsumível na sua primeira parte ou na sua segunda.

Em suma, na situação prevista na primeira parte de tal norma, a sociedade-mãe tem de ser detentora na sua afiliada de pelo 25% do seu capital social durante dois anos consecutivos à data da distribuição dos dividendos; na situação prevista na sua segunda parte, a sociedade-mãe pode preencher tal requisito de dois anos consecutivos em data posterior a tal distribuição desde que tal participação venha desde a data da constituição dessa afiliada.


Procede assim o recurso da Fazenda Pública, sendo de revogar a sentença recorrida que em contrário decidiu, ficando prejudicado no seu conhecimento o recurso interposto pela impugnante relativo aos juros indemnizatórios que, como é bem de ver, se a diferença de liquidação dessa retenção entre os 25% efectuados e os pretendidos 10% não foi anulada, inexiste dívida tributária paga em montante superior ao legalmente devido, base dos mesmos, nos termos do n.º1 do art.º 43.º da LGT.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em conceder provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública e em revogar a sentença recorrida, julgando-se improcedente a impugnação e em não conhecer do recurso interposto pela impugnante, por prejudicado.


Custas pela impugnante em ambas as instâncias.


Lisboa,17/01/2012
EUGÉNIO SEQUEIRA
ANÍBAL FERRAZ
PEDRO VERGUEIRO


1- O qual teve por Relator o do presente.
2- Ainda que tal acórdão tenha tido por objecto questão relativa a imposto sucessório que não a IRC, a sua doutrina, como nele próprio se fundamenta, deve valer para ambos os impostos.