Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:234/21.4BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:01/13/2022
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:RAC
PENHORA DE SALDO BANCÁRIO
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:I - Se está pendente um pedido de suspensão da execução fiscal, estando a ATA a analisar a idoneidade e suficiência da garantia oferecida (tendo em conta, inclusive, a penhora do saldo bancário que não se afigura ter sido contestada), não há justificação para que se proceda à aplicação dos saldos bancários penhorados, obtendo justamente o pagamento parcial coercivo da dívida e prosseguindo, assim, com uma execução fiscal que precisamente se pretende suspender.

II - A pendência da apreciação de tal requerimento obsta à prossecução da execução até à sua decisão (artigo 56º, nº1, da LGT e artigo 169º, nº3, do CPPT).

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

S………………e S………………, inconformados com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que julgou improcedente a reclamação apresentada, ao abrigo do artigo 276º do CPPT, contra o ato do órgão da execução fiscal que determinou o levantamento dos valores depositados em conta bancária penhorada de que são titulares, no âmbito do processo executivo nº…………….., que lhes foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Oeiras-1, com vista à cobrança coerciva de uma dívida tributária de IRS, do ano de 2018, no montante de €267.799,55, dela vieram recorrer.

Formulam, para tanto, as seguintes conclusões:

«1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida em 6 de Outubro de 2021 em que é julgada improcedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal, apresentada contra o acto do órgão de execução fiscal que determinou a aplicação de valores depositados em conta bancária retirando-os da conta onde se encontravam depositado;

2. Os autores deduziram reclamação graciosa contra o acto de liquidação que subjaz à presente execução fiscal, que se encontra pendente de decisão;

3. Os autores requereram a prestação de garantia através da hipoteca voluntária de imóvel;

4. O Órgão de Execução Fiscal determinou a penhora de saldo de conta bancária;

5. Em 10 de Dezembro de 2020, os Autores tomaram conhecimento de que teria sido determinado o levantamento do valor de € 140.232,00.

6. Tendo os Autores contestado a legalidade da dívida exequenda, a penhora efectuada é, para todos os efeitos legais, uma mera garantia (cfr. artigo 199.º, n.º 4, do CPPT);

7. Sendo uma garantia o valor penhorado deve ser mantido na conta em que se encontra depositado, mas indisponível;

8. O acto do órgão de execução fiscal que determina o levantamento do valor penhorado é, pois, ilegal por violação do disposto nos artigos 199º, 215º e 223º, nº8 (a contrario) do CPPT devendo ser anulado em conformidade e o valor retirado reposto na conta bancária.

9. É, pois, evidente o erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo cuja sentença também violou as referidas disposições legais, não se podendo manter e devendo ser revogada em conformidade.

TERMOS EM QUE, E NOS MAIS DE DIREITO, SEMPRE COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSA EXCELÊNCIA, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE E REVOGADA A SENTENÇA QUE CONSTITUI O OBJECTO DO PRESENTE RECURSO E, CONSEQUENTEMENTE, SE DETERMINE A ANULAÇÃO DO ACTO DO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL QUE DETERMINOU O LEVANTAMENTO E APLICAÇÃO NO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL DO VALOR DO SALDO DE CONTA BANCÁRIA PENHORADO, E DETERMINADA A SUA REPOSIÇÃO NA REFERIDA CONTA.»


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Não foram apresentadas contra-alegações.

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Neste TCA, o Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso, aderindo ao parecer que já havia sido proferido pelo EMMP no Tribunal a quo.

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Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente dos autos, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO


- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:


«a) Em 25/02/2020 foi instaurado, no serviço de finanças de Oeiras-1, o Processo de Execução Fiscal n.º……………………., para cobrança coerciva de dividas de IRS dos ora reclamantes, relativas ao ano de 2018, contabilizando a dívida exequenda, àquela data, o valor global de €267.799,55 (duzentos e sessenta e sete mil, setecentos e noventa e nove euros e cinquenta e cinco cêntimos) - certidão de dívida de fls. 15 e cópia da tramitação do PEF, junto a fls. 30 e verso dos autos, em suporte físico;

b) Em 27/03/2020, foi o reclamante Steve pessoalmente citado para os termos do processo de execução fiscal, ascendendo a dívida exequenda, à data da referida citação, ao montante de € 269.919,95 (duzentos e sessenta e nove mil, novecentos e dezanove euros e noventa e cinco cêntimos) e ascendendo o montante da garantia a prestar, para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal, ao valor de € 340.145,33 (trezentos e quarenta mil, cento e quarenta e cinco euros e trinta e três cêntimos) - ofício de citação de fls. 17 dos autos, em suporte físico e citado doc. de tramitação do PEF;

c) Em 08/03/2020 foi a reclamante S......... pessoalmente citada para os termos do processo de execução fiscal, ascendendo a dívida exequenda, à data da citação da reclamante, ao montante de € 269.919,95 (duzentos e sessenta e nove mil, novecentos e dezanove euros e noventa e cinco cêntimos) e ascendendo o montante da garantia a prestar, para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal, ao valor de €340.145,33 (trezentos e quarenta mil, cento e quarenta e cinco euros e trinta e três cêntimos) - oficio de citação de fls. 11 dos autos, em suporte físico e citado doc. de tramitação do PEF;

d) Em 26/03/2020, o OEF solicitou aos serviços competentes, nomeadamente entidades bancárias, as penhoras dos saldos bancários das contas dos reclamantes, até ao valor de € 273.317,96 (duzentos e setenta e três mil, trezentos e dezassete euros e noventa e seis cêntimos), tendo obtido em 06/08/2020, resposta por parte da entidade bancária A………………….. S.A., Sucursal em Portugal e penhorado o saldo da conta dos reclamantes, sediada naquele Banco, no montante global de € 180.296,24 (cento e oitenta mil, duzentos e noventa e seis euros e vinte e quatro cêntimos) - informação do OEF de fls. 12 dos autos e doc. de fls. 14 dos autos, em suporte físico e citado doc. de tramitação do PEF;

e) Em 22/05/2020, foi deduzida reclamação graciosa, pelos ora Reclamantes, sindicando a liquidação oficiosa de IRS, subjacente aos presentes autos de execução fiscal - informação do OEF, de fls. 12 dos autos, em suporte físico;

f) Em 17/12/2020, o peticionado, em sede do procedimento de reclamação graciosa, foi indeferido, pela ATA - citada informação do OEF;

g) Em 22/01/2021, os reclamantes interpuseram o competente recurso hierárquico, sindicando a decisão de indeferimento em sede do procedimento de reclamação graciosa - citada informação do OEF;

h) Em 10/08/2020, foram os reclamantes notificados da penhora do saldo da conta bancária, identificada em d) - facto admitido por acordo das partes;

i) Em 10/08/2020 deu entrada, no serviço de finanças, um requerimento dos ora reclamantes, solicitando a atribuição de efeito suspensivo aos autos de execução fiscal, por via da dedução do procedimento de reclamação graciosa, id. em e) e peticionando ainda a prorrogação de prazo para a prestação de garantia - citada informação do OEF de fls. 12 dos autos;

j) O pedido foi deferido, por despacho proferido a 17/08/2020 - citada informação do OEF;

k) Em 11/09/2020, deu entrada um requerimento, dos reclamantes, dando conta da intenção de constituição de hipoteca voluntária, a favor da ATA, sobre um imóvel, sito em Pombal, com o VPT de € 36.280,00 – requerimento junto a fls. 9 verso e 10, caderneta predial de fls. 10 verso e citada informação do OEF;

l) Em 28/10/2020, na sequência da solicitação do OEF, vieram os Reclamantes juntar a certidão do registo predial do prédio e, em 02/12/2020 vieram juntar outros elementos solicitados pelo OEF - citada informação do OEF;

m) Prestadas as informações pertinentes, o requerimento dos reclamantes, id. em k), foi remetido para a Direcção de Finanças de Lisboa, para efeitos de apreciação e decisão e, em 29/12/2020, foi proferido despacho pelo Director de Finanças Adjunto da respectiva Direcção de Finanças, nos seguintes termos:
“Concordo. Face à informação e pareceres prestados e, com os fundamentos neles aduzidos, dá-se concordância à constituição da garantia, sob a forma de hipoteca voluntária sobre bem imóvel, sem prejuízo de ser aferida a suficiência da mesma, após sua efectivação, tendo em conta o valor da garantia a constituir e o respectivo valor líquido à data, alertando-se ainda o contribuinte, ao abrigo dos princípios da colaboração, boa fé e da proporcionalidade, dos condicionalismos previstos no artigo 199.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na avaliação das garantias, bem como da necessidade de proceder ao reforço da garantia, conforme o disposto no artigo 199.º do CPPT (…)”

4.5.

FACTOS NÃO PROVADOS:

Inexistem factos não provados com relevância para as questões a decidir.

4.6.

MOTIVAÇÃO:

Resultou a convicção do Tribunal, quanto aos factos provados, da análise dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados por qualquer das partes, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.»


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- De Direito

Está em causa a sentença do TAF de Sintra que julgou improcedente a reclamação apresentada, ao abrigo do artigo 276º do CPPT, contra o ato do órgão da execução fiscal que determinou a aplicação, na execução, de valores (€140.232,00) depositados em conta bancária cujo saldo havia sido penhorado.

No essencial, defendiam os Reclamantes (e aqui mantêm) que tendo os mesmos contestado a legalidade da dívida exequenda e requerido a prestação de garantia através de hipoteca voluntária de imóvel, a penhora efetuada é, para todos os efeitos, uma mera garantia, pelo que o valor penhorado deve ser mantido na conta bancária em que está depositado, embora indisponível. Assim – prosseguem – o ato do órgão de execução fiscal que determina o levantamento do valor penhorado é ilegal por violação do disposto nos artigos 199º, 215º e 223º, nº8 (a contrario) do CPPT, devendo ser anulado em conformidade.

Recuperemos, para mais fácil compreensão, o discurso fundamentador alinhado na sentença e que culminou com a decisão de improcedência da reclamação. A Mma. Juíza, depois de transcrever os artigos 169º e 199º do CPPT, fez consignar o seguinte:

“(…)

Ora, conforme decorre do disposto no artigo 169.º, n.º1 do CPPT, supra transcrito, “A execução fica suspensa, até à decisão do pleito, em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial, ou (…), desde que tenha sido constituída garantia nos temos do artigo 195.º ou prestada, nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido (…)”.

Por outro lado, os n.ºs 6 e 7 do artigo 169.º do CPPT estabelecem que, se não houver garantia constituída ou prestada ou, se os bens penhorados não garantirem a totalidade da dívida exequenda e acrescido, é facultada ao executado a informação necessária para prestar a garantia referida no n.º 1, dentro do prazo de 15 dias, e se esta não for prestada se procederá de imediato à penhora.

As citadas disposições legais têm ainda que ser articuladas com o disposto no artigo 199.º, n.º4 e n.º7 podendo e devendo ser aceite como garantia a conversão das penhoras, já efectuadas, em sede do PEF, pelo OEF.

Em anotação a estes preceitos, Jorge Lopes de Sousa (em CPPT Anotado e Comentado, Áreas Editora, III volume, anotações 4 a) e b) ao artigo 169.º, págs. 217/218) salienta que deles resulta que “mesmo que não esteja prestada garantia, a mera dedução de reclamação graciosa ou impugnação judicial ou a interposição de recurso têm um efeito suspensivo provisório, até que termine o prazo de 15 dias que se prevê que seja concedido ao executado para a prestar” Em igual sentido se tem pronunciado o STA, nomeadamente em sede dos acórdãos de 19/05/2010, processo n.º 344/10 (penhora de créditos); de 24/10/2012, processo n.º 01042/12 (penhora de créditos), de 15/02/2012, processo n.º 89/12 (compensação de créditos); e de 08/08/2012, processo n.º 806/12 (compensação de créditos).

Ora, volvendo à análise dos autos, resulta do probatório que, os Reclamantes deduziram reclamação graciosa em Maio de 2020, e ofereceram garantia ao OEF em Agosto de 2020, mediante a proposta de constituição de hipoteca legal sobre imóvel.

Assim, tendo em conta a data de apresentação da reclamação graciosa pelos Reclamantes, bem como o requerimento, por estes deduzido para prestar garantia, temos de concluir que não foi apresentada garantia idónea, ou pelo menos requerida, no prazo de 15 dias, a que alude o n.º7 do artigo 169.º do CPPT.

(…)

Efectivamente, da leitura do preceito transcrito decorre que, com a mera interposição da reclamação graciosa opera-se, desde logo, o efeito suspensivo o qual, todavia, será meramente provisório, até que termine o prazo de 15 dias concedido ao executado para prestar garantia.

Por outro lado, a conjugação das disposições, supra identificadas, decorre que, atento o valor da quantia exequenda, o montante efectivamente penhorado pela FP em saldos bancários e o valor do imóvel que os reclamantes ofereceram como garantia, ainda que o mesmo estivesse há hipotecado à data em que ocorreu o “levantamento” bancário sindicado nos autos, o valor dos bens penhorados somado ao valor do bem a hipotecar, identificados nos autos, não era suficiente para garantir a totalidade da quantia exequenda e acrescidos.

Em síntese: nos autos, não foi requerida tempestivamente a constituição de garantia idónea, pelos executados, ora reclamantes, isto é, nos prazos e termos previstos no artigo 169.º, n.º1, pelo que, nos termos do disposto no n.º7 do mesmo preceito legal, o OEF teria que proceder à penhora dos depósitos bancários ou outros bens dos reclamantes, como o fez, uma vez que o processo de execução fiscal se não encontrava suspenso (artigos 52.º, n.º2 da LGT e 169.º do CPPT).

Aliás, as penhoras efectuadas são obrigatórias, face ao disposto no artigo 215.º, n.º1 do CPPT que é imperativo no sentido dos serviços de finanças, findo o prazo posterior à citação do executado em processo fiscal e independentemente de despacho, emitirem mandado para penhora, que deverá será cumprido no prazo de 15 dias.

Justamente os 15 dias estabelecidos pelos n.ºs 6 e 7 do artigo 169.º do CPPT que facultam ao executado a informação necessária para prestar a garantia referida no n.º 1 do citado preceito.

Ora, conforme resulta do probatório a penhora dos saldos bancários foi efectuada após o prazo referido no artigo 215.º, n.º1 do CPPT, tendo o serviço de finanças, advertido os reclamantes, no despacho de citação para prestarem garantia.

Por outro lado, conforme resulta dos factos assentes, além de se não encontrar prestada garantia, a penhora efectuada não garantia a totalidade da dívida exequenda e acrescidos, pelo que, nos termos conjugados dos artigos 169.º e 215.º do CPPT, a penhora é legal.

Igual conteúdo consta do artigo 199.º, n.º4 do CPPT que determina que, vale como garantia, a penhora já feita sobre os bens necessários para assegurar o pagamento da quantia exequenda e acrescido.

Assim, da conjugação das disposições, supra identificadas, decorre que, atento o valor da quantia exequenda, o montante efectivamente penhorado pelo OEF: montante dos depósitos bancários, penhorados à ordem do processo de execução fiscal, não valem como garantia, pois que o seu valor está longe de assegurar o pagamento da quantia exequenda e acrescidos.

E, ainda que se considerasse o valor da hipoteca a constituir sobre o bem imóvel, o seu valor estaria ainda muito aquém do montante da quantia exequenda e acrescidas.

Podia, pois “ser aplicado o valor dos saldos bancários”, para pagamento da quantia exequenda, sob pena de violação do disposto no artigo 169.º, nº1 do CPPT.

(…)”

Antes de avançarmos é importante deixar devidamente esclarecido que jamais os Reclamantes defenderam estar reunido um circunstancialismo determinante da suspensão da execução fiscal, por ter sido prestada garantia que assegurasse o pagamento integral da dívida exequenda. Da mesma forma, nunca os Reclamantes, ora Recorrentes, defenderam a ilegalidade da penhora do saldo bancário depositado na conta penhorada da titularidade dos executados.

Aquilo que suscita a discordância dos Reclamantes é – e continua a ser – apenas a questão de saber se, feita a penhora do saldo bancário dos executados, podia, ou não, o mesmo ser imediatamente aplicado no pagamento parcial da dívida (como aconteceu) ou se, pelo contrário, tal valor penhorado devia permanecer cativo/ indisponível, tendo presente que havia sido requerida a suspensão da execução, a prestação de garantia através de hipoteca voluntária e mantinha-se em discussão a legalidade da dívida exequenda.

É nosso entendimento que, contrariamente ao decidido pelo TAF de Sintra, o órgão da execução fiscal não podia ter procedido como procedeu, isto é, não podia, em dezembro de 2020, proceder ao pagamento parcial coercivo do processo executivo nº ……………., pelo montante de €140.232,83.

Comecemos por ter presente que: (i) foi emitida uma liquidação de IRS que não foi paga no prazo de pagamento voluntário (27/01/20) e, como tal, foi instaurada (em 25/02/20) uma execução fiscal com vista à sua cobrança coerciva; (ii) com a citação, em 8 e 27 de março de 2020, foi comunicado aos executados o valor da garantia a prestar para efeitos de suspensão da execução fiscal; e que (iii) em 25 de maio de 2020, os executados apresentaram reclamação graciosa da liquidação subjacente à dívida exequenda, sem que a garantia tivesse sido prestada.

Neste circunstancialismo factual, e considerando estar pendente um processo de execução fiscal sem garantia prestada (ou com dispensa da sua prestação), o órgão da execução fiscal procedeu à penhora, em agosto de 2020, do saldo da conta dos reclamantes, sediada na A ……………S.A., Sucursal em Portugal, pelo valor de € 180.296,24.

Tenhamos presente que, à data dos factos, o nº 7 do artigo 169º do CPPT, dispunha que “Caso no prazo de 15 dias, a contar da apresentação de qualquer dos meios de reacção previstos neste artigo, não tenha sido apresentada garantia idónea ou requerida a sua dispensa, procede-se de imediato à penhora”. Lembremos que os meios de reação previstos neste artigo são os indicados no nº 1 e, bem assim, a oposição, tal como resulta do disposto no nº10 do mesmo preceito.

Portanto, não estando a execução suspensa, procedeu-se – e bem – à penhora do saldo da conta bancária, penhora esta insuficiente para garantir a totalidade da dívida.

Sucede, porém, que, no mesmo dia em que foi notificada a penhora do saldo bancário, deu entrada no SF de um requerimento solicitando a atribuição de efeito suspensivo dos autos de execução fiscal, atenta a apresentação de reclamação graciosa, aí se peticionando também a prorrogação de prazo para a prestação de garantia, pedido que foi deferido por despacho de 17/08/20. Como os factos provados demonstram, em 11/09/20, os executados apresentaram novo requerimento manifestando a intenção de constituição de hipoteca voluntária a favor da ATA, sobre um imóvel, sito em P………., com o VPT de € 36.280,00, seguindo-se a junção de diversos elementos pertinentes à apreciação do pedido de prestação de garantia. Como se demonstra, a pretensão dos executados foi satisfeita em 29/12/20, através de despacho no qual se lê “Concordo. Face à informação e pareceres prestados e, com os fundamentos neles aduzidos, dá-se concordância à constituição da garantia, sob a forma de hipoteca voluntária sobre bem imóvel, sem prejuízo de ser aferida a suficiência da mesma, após sua efectivação, tendo em conta o valor da garantia a constituir e o respectivo valor líquido à data, alertando-se ainda o contribuinte, ao abrigo dos princípios da colaboração, boa fé e da proporcionalidade, dos condicionalismos previstos no artigo 199.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na avaliação das garantias, bem como da necessidade de proceder ao reforço da garantia, conforme o disposto no artigo 199.º do CPPT (…)”.

Temos, pois, que na pendência de um pedido de suspensão da execução fiscal, no qual estava em causa justamente a prestação de garantia através de hipoteca voluntária, o órgão da execução fiscal procedeu à aplicação do saldo bancário penhorado, procedendo ao pagamento parcial coercivo da dívida em execução fiscal (cfr. fls. 14/verso).

Ora, esta atuação do Órgão da Execução Fiscal não é legalmente aceitável, revelando-se, inclusive, absolutamente contraditória com anteriores tomadas de posição dos competentes serviços.

Como evidencia o acórdão deste TCA, de 28/03/19, proferido no processo nº 812/18.9BELRS: «A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objeto a legalidade da dívida exequenda, (…), desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que deve ser informado no processo pelo funcionário competente» (artigo 169.º/1, do CPPT).

O pedido de suspensão da execução origina um incidente, o qual termina com a decisão a proferir no mesmo por parte do órgão de execução fiscal competente (artigo 169.º/3, do CPPT)”.

Portanto, se está pendente um pedido de suspensão da execução fiscal, estando a ATA a analisar a idoneidade e suficiência da garantia oferecida (tendo em conta, inclusive, a penhora do saldo bancário que não se afigura ter sido contestada), não há justificação para que se proceda à aplicação dos saldos bancários penhorados, obtendo justamente o pagamento parcial coercivo da dívida e prosseguindo, assim, com uma execução fiscal que precisamente se pretende suspender.

A pendência da apreciação de tal requerimento obsta à prossecução da execução até à sua decisão (artigo 56º, nº1, da LGT e artigo 169º, nº3, do CPPT), devendo lembrar-se que a própria decisão que indefira tal pedido é - ela mesma – passível de contestação judicial.

Portanto, e tendo presente que a penhora do saldo bancário não foi contestada (mas apenas a sua efetiva utilização através do pagamento coercivo parcial da dívida) e considerando o pedido de suspensão pendente, não pode deixar de se concluir que a penhora se assume com garantia (artigo 199º, nº 4 do CPPT) e que o processo não pode avançar até à decisão do pedido que se mostra pendente de análise (situação, aliás, que ainda se mantém).

Daqui resulta que, contrariamente ao decidido, o ato contestado é ilegal (por violação dos preceitos legais citados) e não pode manter-se, devendo ser anulado, o que aqui se determina.

Ao julgar no sentido contrário, a sentença recorrida não pode manter-se, devendo, pois, ser revogada.

Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso e concede-se provimento ao recurso jurisdicional.


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III - Decisão

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em conceder provimento o recurso, revogar a sentença recorrida, julgar procedente a reclamação e anular o ato contestado.


Custas pela Recorrida, em ambas as instâncias.

Registe e Notifique.

Lisboa, 13/01/22


Catarina Almeida e Sousa

Isabel Fernandes

Jorge Cortês