Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:591/12.3BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:06/19/2019
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:PROCESSO DISCIPLINAR, PRESCRIÇÃO, INFRAÇÃO
Sumário:
I. Em regra, o direito de instaurar o procedimento disciplinar prescreve decorridos que sejam 30 dias sobre o conhecimento da infração pelos superiores hierárquicos, relevando o conhecimento por qualquer superior hierárquico e não apenas o último na cadeia de hierarquia administrativa.
II. Se a infração apenas chegar ao conhecimento do superior hierárquico após um ano sobre a data em que tal infração tenha sido cometida, também já se encontra prescrito o direito à instauração do procedimento disciplinar, segundo o disposto no n.º 1 do citado artigo 6.º do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 09/09.
III. Estes prazos não são aplicáveis se a infração disciplinar envolver, simultaneamente, a prática de um crime, caso em os prazos de prescrição são os estabelecidos na lei penal.
IV. Não tendo sido possível inquirir a testemunha indicada na defesa, por a mesma à data se encontrar de baixa médica, vindo a falecer, não existiu qualquer recusa ou indeferimento na sua inquirição.
V. Não tendo sido inquirida não podia o mandatário do arguido ser notificado para estar presente.
VI. Procedendo, quer a acusação, quer o relatório final, ao enquadramento factual da actuação do trabalhador, considerando a gravidade dos factos praticados (furto e tentativa de furto de resíduos sólidos urbanos/sucata), cujos ilícitos se mostram tipificados na alínea b) do n.º 3 e do n.º 4 do artigo 3.º do regime disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 09/09, a sancionar com a pena de demissão, estão suficientemente preenchidos os tipos de infrações.
Votação:UNANIMIDADE [com declaração de voto]
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – RELATÓRIO

J....., devidamente identificado nos autos, veio interpor recurso jurisdicional do acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datado de 25/02/2014, que no âmbito da ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo, instaurada contra o Município de Cascais, julgou a ação improcedente, absolvendo a Entidade Demandada dos pedidos, de anulação da pena disciplinar de demissão e de condenação à reconstituição da carreira.


*

Formula o aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem:

A - Não se conforma o ora Agravante com a sentença recorrida, porquanto nela se entende considerar improcedente o requerido pelo Agravante, designadamente a anulação da deliberação da Câmara Municipal de Cascais, de 05 de Março de 2012 e respectiva condenação à adopção dos actos e operações necessários para reconstituir a situação que existiria se o acto anulado ou nulo não tivesse sido praticado;

B - Com o devido respeito, a douta sentença recorrida interpretou incorrectamente o direito aplicável ao caso sub judice, razão pela qual o ora Agravante não pode concordar com a posição ali defendida pois, ao julgar da presente forma, incorreu, no vício de erro de julgamento por erro de interpretação das normas jurídicas aplicáveis, pelas razões que a seguir se expressam;

C - O ora Agravante não aceitou a obstinação por parte da Câmara Municipal de Cascais na imputação da violação do dever funcional de isenção, não se coaduna, essa situação, de modo algum, com os factos anteriormente descritos, apresentando na sua defesa e na p.i. apresentada elementos suficientes para afastar essa acusação;

D - Em 16 de Março de 2012, o Recorrente requereu a suspensão de eficácia da deliberação de 5 de Março de 2012, da Câmara Municipal de Cascais, que corre seus termos na 3ª U.O. do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sob o n.0 294/12.9BESNT, tendo sido deferido, por sentença proferida em 07.05.2012, o pedido de adopção de providência cautelar de suspensão de eficácia da deliberação em causa;

E - O processo disciplinar infere de nulidade insuprível, prevista no nº 1 do artigo 37° do Estatuto Disciplinar, nº 3 do artigo 32° e nº 3 do artigo 269° ambos da CRP já que quando é constituído mandatário em processo disciplinar como foi o caso do A., a falta de notificação daquele “... para as diligências probatórias requeridas pela defesa, nomeadamente para a inquirição das testemunhas de defesa, integra a nulidade insuprível...” [vide Acórdão do TCA Sul de 13 de Janeiro de 2005, Proc. 12628, neste sentido Acórdão do STA de 22 de Janeiro de 1994, Acórdão do STA de 11 de Fevereiro de 1999, Rec. nº 38989, e Acórdão do STA (Pleno) de 27 de Abril de 1999, Rec. nº 28897];

F - O que logo se vislumbra um vício por violação de lei já que em sede de defesa o Agravante constituiu mandatário e requereu a inquirição de 1 testemunha para o apuramento da verdade, mas que efectivamente nunca foi notificada da audição da mesma;

G - Padecendo, igualmente, de nulidade insuprível (artigo 37° n.º 1 do Estatuto Disciplinar) se porventura a Recorrida optou por omitir a realização da diligência requerida pelo Recorrente e essencial para a descoberta da verdade, designadamente não procedendo à inquirição da testemunha indicada na defesa, nem eventualmente fundamentando, através de despacho do Instrutor, a recusa da realização desse diligência, sendo certo a mesma se revestia sempre de pertinência e necessidade;

H - A ora Recorrida teria sempre de comunicar e justificar fundamentadamente a impossibilidade de inquirição da única testemunha apresentada pelo Agravante, tanto mais que a defesa deste e, consequente, requerimento de inquirição de testemunha foi apresentada em 15 de Novembro de 2011, ou seja mais de um mês e meio antes do infeliz falecimento do Sr. J....., existindo possibilidade temporal de se proceder à sua inquirição, o que não sucedeu por responsabilidade exclusiva da Recorrida;

I - Acresce que o artigo 53° n.º 8 do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.0 58/2008, de 9 de Setembro, determina que o instrutor inquira as testemunhas e reúna os demais elementos de prova oferecidos pelo trabalhador no prazo de 20 dias, pelo que a Recorrida teria que, neste espaço de tempo, inquirir a testemunha indicada pelo Agravante, o que era possível, devendo sempre, de toda a maneira, comunicar de forma fundamentada a este a impossibilidade de inquirição, facultando-lhe a possibilidade de indicar outra testemunha em substituição, o que não fez;

J - Tal como referido na douta sentença recorrida, “o instrutor, expressamente, nada disse, requereu ou justificou, nem notificou o mandatário para se pronunciar sobre a não audição da testemunha doente e que depois faleceu” (sublinhado do Recorrente), mencionando ainda que “sendo verdade que o instrutor não concedeu a faculdade ao Autor de substituir por outra, também é verdade que o Autor não arrolou outras testemunhas e, após o falecimento da sua testemunha, nada requereu no processo”;

L - O Recorrente requereu a inquirição da sua testemunha em sede de defesa, testemunha essa que contrariamente ao entendido na douta sentença seria essencial e da maior importância para contrariar as diligências produzidas no processo, não tendo sido dada qualquer oportunidade ao Agravante para se pronunciar sobre a sua não inquirição, nem, essencialmente, requer qualquer outra diligência probatória, num processo com a gravidade do presente;

M - Posto isto, estamos, inquestionavelmente, perante um acto administrativo (Deliberação de 5 de Março de 2012) inválido (art. 133° do CPA), já que o processo disciplinar em causa sofre de nulidade (nº 1 do art. 42° do Estatuto Disciplinar) que é insuprível, o que invalida a prática legal do acto;

N - A que acresce o facto de a instauração do processo disciplinar movido contra o ora Agravante ter sido decidida por despacho do Sr. Presidente da Câmara Municipal da Cascais, de 14 de Outubro de 2011, situação consubstanciada pela participação realizada e enviada em 26 de Janeiro de 2011 pelo Conselho de Administração da E... – E…. (fls. 28), relativa a factos alegadamente ocorridos em 12.10.2010 e 23.12.2010, estando passados, portanto, mais de 30 dias entre a prática dos factos supostamente ocorridos e retratados na presente acusação, posterior tomada de conhecimento por superior hierárquico do então Arguido e a instauração do presente procedimento disciplinar e mais de um ano sobre os factos ocorridos em 12 de Outubro de 2010 e a instauração do procedimento disciplinar;

O - Manifestamente no caso sub judice os prazos acima indicados estão ultrapassados para os factos relatados na acusação, ocorridos repita-se em 12.10.2010 e 23.12.2010 e que foram do conhecimento de superior hierárquico do serviço do Agravante em 26.01.2011, factos que, contrariamente ao entendido na Sentença recorrida, configuram a prescrição do presente procedimento disciplinar;

P - No que concerne ao referido nos factos acusatórios, o Agravante não adere à interpretação realizada pela Câmara Municipal de Cascais do sucedido no dia em questão e que tem acolhimento pelo decidido pelo Tribunal;

Q - Para existir uma actuação culposa seria necessária, entre outros requisitos, a censurabilidade da conduta do Agravante a título de dolo ou culpa, algo que não será, no caso em apreço, possível atribuir, nem tão pouco é demonstrado de forma inequívoca;

R - Não apresentando a Recorrida no processo disciplinar, nomeadamente no relatório final elaborado, qualquer elemento ou facto inequívoco que configure a violação por parte do Recorrente de algum dever profissional a que está obrigado;

S - Inexistindo, dessa forma, fundamentos de direito que permitam a aplicação de uma sanção disciplinar e, por maioria de razão, a aplicação da pena de demissão, nos termos da alínea j) do n.º 1 artigo 18° e n.º 5 do artigo 10° do Estatuto Disciplinar, tanto mais que a pena de demissão, por ser a pena disciplinar mais grave prevista na Lei, tem, face à sua seriedade e o carácter gravoso, a absoluta necessidade de ser fundada num comportamento muito grave, por parte do trabalhador, aferível pela sua gravidade e consequências e ser baseado em provas irrefutáveis, o que de forma alguma acontece neste processo disciplinar, tornando uma eventual aplicação dessa sanção absolutamente desproporcional, inadequada e ilícita;

T - Em nenhuma altura do processo foi demonstrada pela Recorrida a vontade de produzir ou produção efectiva de resultados prejudiciais ao órgão ou serviço ou ao interesse geral, que o Agravante pudesse prever como efeito necessário de alguma conduta por si adoptada, nem tão pouco qualquer premeditação, não bastando a simples alusão e remissão para as normas legais, sendo necessária a inequívoca demonstração dessa mesmas alegadas circunstâncias agravantes especiais, que efectivamente no caso em apreço não sucederam;

U - Pelas razões de factos e de direito anteriormente descritas o ora Agravante impugna as acusações da violação dos deveres profissionais que são imputados na Acusação e que são confirmadas na Sentença recorrida;

V - Existiu, assim, uma clara errada apreciação por parte da Agravada dos factos e provas transportadas para o processo disciplinar, pelo que deveria proceder o vício de erro sobre os pressupostos quanto à violação dos deveres profissionais imputados;

X - Todos estes argumentos já utilizados pelo ora Agravante em sede de petição inicial e alegações finais, mas que não foram suficientes para sensibilizar a Meritíssimo Juiz do tribunal “a quo”, a aderir ao seu pedido.”.

Pede que seja concedido provimento ao recurso, sendo o Recorrido condenado a anular a deliberação de 05/03/12 e à adopção dos actos e operações necessários para reconstituir a situação que existiria se o acto anulado ou nulo não tivesse sido praticado.


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O ora Recorrido, notificado da admissão do recursão, não apresentou contra-alegações, nada tendo dito ou requerido.

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Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, foi emitido parecer no sentido da procedência do recurso.

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O processo vai, com vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas pelo Recorrente, resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de:

1. Erro de julgamento de direito, por falta de notificação do mandatário para as diligências probatórias requeridas pela defesa ou por falta de realização dessas diligências, enfermando o processo disciplinar de nulidade insuprível;

2. Erro de julgamento no tocante à prescrição do direito de instauração de procedimento disciplinar;

3. Erro de julgamento, por falta dos elementos constitutivos da infração disciplinar, não sendo apresentado qualquer facto ou elemento em que se traduza a violação de algum dever profissional.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:

A) Em 15.10.2010 o Presidente do Conselho de Administração da T..... participou ao Presidente do CA da E... o furto de resíduos sólidos no interior das instalações da T..... – ver fls 1 do processo administrativo apenso.

B) Em 3.11.2010 o Presidente do Conselho de Administração da T..... participou os factos ao Procurador da República junto do Tribunal Judicial de Cascais – ver processo administrativo apenso.

C) Em 18.1.2011 a E... lavrou auto de ocorrência sobre o furto de resíduos sólidos no interior das instalações da T....., no dia 12.10.2010 o furto de resíduos sólidos no interior das instalações da T....., que remeteu à Câmara Municipal de Cascais, instruído com lista de cargas e talões de pesagem – ver fls 15 a 30 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

D) O auto foi recebido no dia 26.1.2011 na Divisão dos Assuntos Jurídico da Câmara Municipal de Cascais – ver fls 31 do processo administrativo apenso.

E) A 12.5.2011 os serviços da Demandada pronunciaram-se sobre a ocorrência ou não de prescrição neste caso, e, a 1.6.2011, o assunto foi presente ao Presidente da Câmara Municipal – ver fls 32 a 41 do processo administrativo apenso.

F) Por despacho de 1.6.2011, do Presidente da Câmara Municipal de Cascais, foi instaurado processo disciplinar ao ora Autor J....., por furto de material informático no parque de Trajouce (T.....) – ver fls 41 do processo administrativo apenso.

G) Por despacho de 14.10.2011, o Presidente da Câmara Municipal de Cascais nomeou o Doutor M.....como instrutor do processo – ver fls 51 do processo administrativo apenso.

H) Entre os dias 20 e 25.10.2011, foram ouvidos P..... (diretor técnico e operacional da E...), A…. (colega de trabalho do Autor), Ó….. (cantoneiro – chefe de brigada) – ver fls 57, 58, 60 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

I) O arguido, aqui Autor, foi ouvido no dia 21.10.2011, a fls 66 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

J) A 31.10.2011 foi deduzida acusação contra o ora Autor e dois outros colegas (J..... e A….) nos termos que seguem:

Art 1º

O arguido J....., à data dos factos participados, desempenhava funções de cantoneiro na E... – Empresa Ambiente de Cascais EM, na recolha de monstros e sucata da via, numa equipe de três, constituída pelos trabalhadores da E... A…. (cantoneiro) e o J..... (motorista), todos arguidos no âmbito dos processos disciplinares nº 0104050…. e 0104050…...

Art 2º

Dia 12.10.2010, pelas 10,56h, no Ecoponto de Trajouce (Zona O), a equipa da viatura pesada da E... de recolha de resíduos sólidos urbanos (monstros), matrícula 69-32-ZA constituída pelo J…. (motorista), A…. (cantoneiro) e J….. (cantoneiro) foi intercetada pela Segurança da T....., à saída destas instalações (cfr doc 1).

Art 3º

A viatura 69-…. foi detetada pelas câmaras de segurança do Ecoparque numa zona isolada, em movimentos estranhos, pelo que à saída foi inspecionada.

Art 4º

A Segurança do Ecocentro verificou, surpreendida, que esta continha sucata no interior da caixa, carregada num aterro do Ecocentro em sítio isolado (doc 1 e 4).

Art 5º

Essa sucata (castiçais e um fogão impecável) não tinha sido descarregada nos contentores do Ecocentro, onde devia ter sido depositada e o seu peso era de 300Kg (doc 1 – carta de 15.10.201).

Art 6º

O peso de 300Kg comprova-se da consulta do peso registado para a tara dessa viatura (5880Kg), às 16h12m, com 280Kg acima do valor considerado «aceitável» (5.820Kg), já com inclusão do depósito de combustível cheio e tripulação (de três adultos – doc nº 4).

Art 7º

Esta viatura foi deixada passar a báscula, dentro das instalações, não a intercetando a Segurança, logo que levantou suspeitas, para evitar a alegação de motivos sobre o acondicionamento daqueles 300 Kg de sucata na caixa de carga (doc 4).

Art 8º

A viatura 69-32-ZA regressou atrás e descarregou os resíduos sólidos urbanos que levava, que, assim, não chegou a sair do Ecoparque, pelo que a recuperação dos resíduos resulta da reposição dos mesmos no Ecocentro (doc 1).

Art 9º

No entanto, isso não exclui a ilicitude da conduta da equipe da viatura 69- 3….. que, depois de intercetada, restituiu os resíduos e, assim, confirmaram a tentativa de furto daqueles resíduos, depositados em propriedade da T......

Art 10º

O condutor da viatura J..... alegou, então, à Segurança a necessidade de obter a tara do veículo, isto é, que tinha de regressar ao Ecocentro após a anterior pesagem para a saída, primeiro porque o veículo já tinha sido pesado à entrada, depois porque o material que este vinha pesar (pelo menos parte dele) não vinha no veículo quando entrou (doc 1 e doc 4).

Art 11º

Esta viatura 69-…. apresentou à saída do Ecoparque durante 5 meses (entre 1.6 e 16.10/2010), pesos muito díspares no que se refere à taxa pesada à saída (doc 3, doc 5, doc 6, doc 16).

Art 12º

Esta viatura pesada, cujo peso é de 5.820Kg (caixa Vazia) apresentou naqueles 5 meses, um total de 11.400Kg na balança, à saída do Ecocentro (mapa – doc 7).

Art 13º

Esta atividade ilícita durou até 16.10.2010, sendo organizada para desvio e comercialização de resíduos sólidos urbanos desativados (nomeadamente, cobre, aço inoxidável e material desativado).

Art 14º

A T..... recolheu as pesagens registadas no sistema de uma viatura escolhida aleatoriamente, primeiro, para obter uma amostra significativa e, segundo, para agir com a discrição necessária, pelo que, a metodologia adotada mostrou-se adequada aos objetivos traçados (cfr e-mail do seu presidente, pág 63).

Art 15º

Os arguidos vendiam para seu proveito esses resíduos sólidos urbanos que desviavam da T..... e outros resíduos que recolhiam, ilicitamente, diretamente da rua, num sucateiro da Abóboda (conforme declaração de testemunha, fls 58).

Art 16º

Por dia os arguidos faziam 3 baldes de sucata que não entrava na T..... (cfr declaração de testemunha – a fls 58).

Art 17º

Cada balde de sucata rendia cerca de 60 euros, num total de 180 euros diários (cfr declaração de testemunha – a fls 58).

Art 18º

Para desviar a sucata do seu percurso habitual, o arguido V…. tinha um outro esquema ilícito que envolvia uma sua carrinha Ford Transit de caixa aberta, branca, que encostava previamente ao passeio perto da bomba da Galp, em Alcoitão, frente à «Luta» (cfr declaração de testemunha – a fls 58).

Art 19º

E nessa carrinha de caixa aberta eles descarregavam o material que traziam no camião da E... 69-3….., utilizado na recolha de resíduos sólidos urbanos (cfr declaração de testemunha – a fls 58).

Art 20º

O arguido N…. ajudava o arguido J..... a depositar os resíduos/ sucata (monstros) que trazia na viatura de serviço 69-….. num terreno sito na Aldeia do….., por detrás do Bairro da…., quando o V…. vendeu a carrinha Ford Transit.

Art 21º

O J..... e o V… descarregavam a sucata e monstros da viatura 69-….. quando iam encher o depósito da mesma com combustível, para assim não ser detetada pelo sistema de GPS da T..... (cfr declaração de testemunha – fls 58).

Art 22º

Dentro do Ecoponto os arguidos mantinham um cúmplice (o A…., da T…..) que separava previamente a sucata mais valiosa (como o cobre), que depois carregavam na própria viatura de serviço 69-…. (doc 4).

Art 23º

Em 4.11.2010 o funcionário envolvido (A.....) foi suspenso preventivamente (pelo Presidente do Conselho de Administração da T.....) com proibição de entrada nas instalações (aguardando-se conclusão do processo crime).

Art 24º

Dia 23.12.2010 a viatura 69-… foi novamente intercetada pela Segurança da T....., após a passagem na báscula, à saída das instalações (cfr doc 7).

Art 25º

Tendo o técnico de Segurança e Saúde no Trabalho da T....., F....., verificado que transportava, dentro da cabina de condução, dois sacos, um com taças desportivas (de 34kg) e outro com fios eléctricos (doc 7), (aproximadamente 2 metros de fio), que fotografou (cfr depoimento de testemunha).

Art 26º

Só a equipe da viatura 69-… efetuou o carregamento de equipamento que estava no Ecocentro e tentou trazê-lo para fora das instalações da T..... – cfr declarações dos responsáveis da T..... e está documentado no CD.

Art 27º

Ao longo do tempo referido, os colaboradores da E... que prestaram serviço na viatura 69-…. foram quase sempre os mesmos (doc nº 17 e declarações do Viegas).

Art 28º

Em Junho o V….. trabalhou a partir de dia 2, em Julho só trabalhou dias 5, 6, 7, 26, 27, 28, em Agosto trabalhou de 2 a 13, em Setembro trabalhou dias 13, 14, 23, 24, 27, 28, 29, 30, em Outubro só não trabalhou dias 1, 4, 6, 7 e 13.

Art 29º

A E... mudou os ditos colaboradores da sua função, ao ter conhecimento do ocorrido, de forma a estes não se deslocarem ao Ecocentro da T..... (doc 17).

Art 30º

Atualmente e desde essa altura, os arguidos J..... e A..... fazem a limpeza de terrenos e o V..... é tratorista nas máquinas da praia (a fls 56).

Art 31º

Em relação aos furtos efetuados pela equipa da viatura 69-….., o Conselho de Administração da T..... apresentou Queixa-crime ao Procurador da República junto ao Tribunal judicial de Cascais, em 3.1.2010 (processo nº 3851/10.4TACSC – vide carta de 3.11.2010 – doc nº 3 e doc nº 9).

Art 32º

A investigação criminal decorre (…). Art 33º

Os furtos continuados duraram até 23.10.2010, isto é quase 5 meses (…).

Art 34º

O peso total dessa sucata furtada foi de 11.400Kg (mapa de pesagem: doc 4 e 16).

Art 35º

O valor económico dessa sucata a preços de mercado corresponde a cerca de 50.000 euros (face à média do preço da sucata no mercado) conforme participação ao Ministério Público de Cascais (doc 9).

Art 36º

Os arguidos beneficiaram economicamente dos furtos desta sucata.

Art 37º

Os arguidos viviam muito além das suas possibilidades (cfr declaração de testemunha a fls 58).

Art 38º

Os arguidos puseram também em causa a imagem e o prestígio da E..., da T..... e da Câmara Municipal de Cascais, pois a isenção dos trabalhadores em funções públicas é importante para a imagem daqueles e para uma boa prestação do serviço.

Art 39º

O arguido N..... sabia que a sucata que desviava da T..... não lhe pertencia e que ao retirá-la para si (quer da via pública quer do Ecocentro) e ao vende-la para si, agia sem autorização e contra a vontade do seu proprietário (T.....).

Art 40º

Tendo agido com o propósito de obter ganho com a venda de tal quantidade de sucata.

Art 41º

O arguido J..... agiu em co-autoria com os outros dois arguidos, o J..... e o R…, de forma livre, consciente e voluntária, sabendo que a sua conduta era proibida por lei disciplinar e penal.

Art 42º

O arguido praticou pois várias ações voluntárias, porque dominadas pela vontade autónoma, livre e típicas, porque subsumíveis a normas que se consubstanciam em infração disciplinar (al b) do nº 3 e nº 14 do art 3º da Lei nº 58/2008), ilícitas porque desvaliosas e contrárias à ordem pública e aos deveres funcionais inerentes ao exercício da função pública e culposas, isto é merecedoras de censura jurídica e por consequência puníveis nos termos da referida Lei.

Art 43º

Ao praticar os factos referidos supra, o arguido N..... agiu em clara violação do dever de isenção previsto na al b) do nº 3 e nº 4 do art 3º da Lei nº 58/2008.

Art 44º

Contra o arguido J..... milita como circunstância agravante especial, a produção efetiva de resultados prejudiciais à T....., à E... e assim ao serviço público, consequência prevista como efeito necessário dessa conduta, prevista respetivamente na al b) do nº 1 do art 31º do referido Estatuto.

Art 45º

A favor do arguido J..... milita a prestação de mais de 22 anos no exercício de funções públicas (na Câmara Municipal de Cascais), estando na E... desde a sua existência, circunstância atenuante especial, prevista na al a) do art 22º do referido Estatuto Disciplinar.

Art 46º

O arguido J..... aufere 566,41 euros como assistente operacional (cantoneiro) posição remuneratória 1 (nível 2), é casado, tem família a seu cargo (mulher e 3 filhas, uma menor), suportando despesas domésticas, contudo não provadas.

Art 47º

O arguido J..... incorre em infração disciplinar (al b) do nº 3 e nº 14 do art 3º da Lei nº 58/2008), bem como num crime de furto qualificado/ peculato, (…), pelo qual está a ser ouvido no Tribunal Judicial de Cascais (…).

Art 48º

O arguido N..... tem antecedentes disciplinares (proc. 101 405 02 50 de 9.2.2009), e não tem faltas injustificadas.

(…). – fls 67 a 69 do processo administrativo apenso e doc nº 2 junto com a petição inicial.

K) Por ofício de 2.11.2011 o Autor foi notificado da acusação – ver processo administrativo apenso.

L) Em 15.11.2011, apresentou defesa escrita, na qual concluiu pela prescrição do procedimento, ou, por inexistência de matéria que justifique a aplicação de uma pena disciplinar, ou, pela atenuação da pena aplicável e a sua suspensão. Também o Autor indicou como testemunha J..... – ver fls 75 a 89 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e doc nº 3 junto com a petição inicial.

M) A testemunha J..... esteve de baixa médica entre os dias 24.10.2011 a 22.11.2011, de 23.11.2011 a 21.12.2011 e de 22.12.2011 a 2.1.2012, vindo a falecer no dia 3.1.2012 – ver doc nº 1 junto com a contestação.

N) A 20.1.2012 foi elaborado relatório final, em que foi proposto aplicar ao Autor a pena de demissão – ver fls não numeradas do processo administrativo apenso.

O) No relatório final consta que não se provaram os seguintes factos da acusação:

Art 16º - Por dia os arguidos faziam 3 baldes de sucata, que não entrava na T..... (conforme declaração do chefe de brigada, testemunha de fls 60);

Art 17º - Cada balde de sucata rendia cerca de 60 euros, num total de 180 euros diários (conforme declaração do chefe de brigada, testemunha de fls 60).

P) Ato impugnado: Em reunião de Câmara de 5.3.2012 foi aprovado aplicar ao Autor a pena de demissão, prevista no art 18º, nº 1, al j) e art 10º, nº 5 da Lei nº 58/2008, de 9.9. – ver processo administrativo apenso e doc nº 1 junto com o requerimento inicial do processo cautelar apenso.

Q) A decisão disciplinar foi notificada ao Autor em 7.3.2012 – ver processo administrativo apenso e doc nº 1 junto com o requerimento inicial dos autos cautelares apensos.

R) Da nota biográfica do Autor consta como última classificação de serviço a do ano de 2005, de «Bom», com «8,0 valores», com indicação de inexistência de quaisquer outras avaliações posteriores ao ano de 2005 – ver fls 71 e 72 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.”.

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional, segundo a sua ordem lógica e de precedência.

1. Erro de julgamento no tocante à prescrição do direito de instauração de procedimento disciplinar

Nos termos da alegação do Recorrente a instauração do processo disciplinar foi decidida por despacho do Presidente da Câmara Municipal, de 14/10/2011, na sequência da participação realizada e enviada em 26/01/2011 pelo Conselho de Administração da E..., relativa a factos alegadamente ocorridos em 12/10/2010 e 23/12/2010, estando passados mais de 30 dias entre a prática dos factos ocorridos e tomada de conhecimento pelo superior hierárquico do arguido e a instauração do presente procedimento disciplinar, assim como decorrido mais de um ano sobre os factos ocorridos em 12/10/2010 e a instauração do procedimento disciplinar.

Os factos foram do conhecimento do superior hierárquico do serviço do Recorrente em 26/01/2011, configurando a prescrição do procedimento disciplinar.

Vejamos.

Tendo presente a factualidade assente extrai-se como factos provados nos autos, que não logram ser impugnados no presente recurso, que vêm imputadas ao ora Recorrente infrações continuadas, praticadas desde junho de 2010 até 23/12/2010, assim como que as mesmas integram a prática de um crime de furto.

Em 15/10/2010 o Presidente do Conselho de Administração da T..... participou ao Presidente do Conselho de Administração da E... o furto de resíduos sólidos no interior das instalações da T......

Em 03/11/2010 o Presidente do Conselho de Administração da T..... participou os factos ao Procurador da República junto do Tribunal Judicial de Cascais.

Em 18/01/2011 a E... lavrou auto de ocorrência sobre o furto de resíduos sólidos no interior das instalações da T..... no dia 12/10/2010, que remeteu à Câmara Municipal de Cascais, instruído com lista de cargas e talões de pesagem.

O citado auto foi recebido na Divisão dos Assuntos Jurídicos da Câmara Municipal de Cascais em 26/01/2011.

A 12/05/2011 os serviços da Demandada pronunciaram-se sobre a ocorrência ou não de prescrição neste caso, e a 01/06/2011, o assunto foi presente ao Presidente da Câmara Municipal.

Por despacho de 01/06/2011, do Presidente da Câmara Municipal de Cascais, foi instaurado processo disciplinar, nomeadamente, ao ora Autor, por furto de material informático no parque de Trajouce (T.....).

Assim, a infração praticada ao longo do último semestre do ano de 2010 foi participada ao Ministério Público e, em abstrato, integra a prática de crime de furto, cuja moldura penal eleva o prazo prescricional para dez anos, segundo o disposto no artigo 118.º do Código Penal.

Acresce resultar dos factos provados que o expediente relativo ao Autor foi presente ao Presidente da Câmara Municipal em 01/06/2011, o qual no mesmo dia determinou a instauração do processo disciplinar contra o Autor.

Nos termos previstos no artigo 6.º da Lei n.º 58/2008, de 09/09, que aprovou o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (ED), em vigor à data dos factos:

1 - O direito de instaurar procedimento disciplinar prescreve passado um ano sobre a data em que a infracção tenha sido cometida.

2 - Prescreve igualmente quando, conhecida a infracção por qualquer superior hierárquico, não seja instaurado o competente procedimento disciplinar no prazo de 30 dias.

3 - Quando o facto qualificado como infracção disciplinar seja também considerado infracção penal, aplicam-se ao direito de instaurar procedimento disciplinar os prazos de prescrição estabelecidos na lei penal.

(…)”.

Extrai-se do disposto no n.º 2 do citado artigo 6.º do Estatuto Disciplinar que, em regra, o direito de instaurar o procedimento disciplinar prescreve decorridos que sejam 30 dias sobre o conhecimento da infração pelos superiores hierárquicos, relevando na atualidade o conhecimento por qualquer superior hierárquico e não apenas o último na cadeia de hierarquia administrativa.

Se a infração apenas chegar ao conhecimento dos superiores hierárquicos após um ano sobre a data em que tal infração tenha sido cometida, também já se encontra prescrito o direito à instauração do procedimento disciplinar, segundo o disposto no n.º 1 do citado artigo 6.º.

Estes prazos não são, porém, os aplicáveis se a infração disciplinar envolver, simultaneamente, a prática de um crime, caso em os prazos prescricionais não são os previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 6.º do Estatuto Disciplinar, mas os prazos de prescrição estabelecidos na lei penal, isto é, os prazos mais longos, do artigo 118.º do Código Penal.

No presente caso encontra-se demonstrada a participação ao Ministério Público junto do Tribunal Judicial da Comarca de Cascais, pelos indícios da prática do crime de furto, pelo que, não existem dúvidas de que existe a imputação ao arguido de factos que integram a prática de um crime.

Nestes termos, tem aplicação do disposto no citado n.º 3 do artigo 6.º do Estatuto Disciplinar, pelo que, em consequência, não procede a alegada prescrição do direito de instauração do procedimento disciplinar, não incorrendo o acórdão recorrido no erro de julgamento que se mostra invocado.

Pelo que improcedem as conclusões do recurso quanto a tal questão.

2. Erro de julgamento de direito, por falta de notificação do mandatário para as diligências probatórias requeridas pela defesa ou por falta de realização dessas diligências, enfermando o processo disciplinar de nulidade insuprível

Sustenta ainda o ora Recorrente o erro de julgamento da decisão sob recurso, com o fundamento na sua nulidade insuprível do procedimento disciplinar, nos termos do do n.º 1 do artigo 37.º do Estatuto Disciplinar e o n.º 3 do artigo 32.º e n.º 3 do artigo 269.º da Constituição, por ter constituído mandatário no processo disciplinar e o mesmo não ter sido notificado das diligências probatórias requeridas pela defesa, nomeadamente para a inquirição das testemunhas de defesa.

No caso, o ora Recorrente constituiu mandatário e na sua defesa requereu a inquirição de uma testemunha, mas nunca foi notificado da sua audição.

Também padece de nulidade insuprível a circunstância de o Recorrido ter optado por omitir a realização da diligência requerida pelo Recorrente, não procedendo à sua inquirição, nem fundamentando a sua recusa.

O Recorrido teria de comunicar e justificar a impossibilidade de inquirição da única testemunha apresentada pelo ora Recorrente, tanto mais que tendo sido apresentado o requerimento para a sua inquirição em 15/11/2011, mais de um mês e meio antes do seu falecimento, existia possibilidade temporal de se proceder à sua inquirição.

O Recorrido teria que em 20 dias inquirir as testemunhas e reunir os demais elementos de prova oferecidos pelo trabalhador, nos termos do n.º 8 do artigo 53.º do Estatuto Disciplinar, devendo comunicar a impossibilidade de inquirição e facultar-lhe a possibilidade de indicar outra testemunha em substituição.

Vejamos.

Nos termos do julgamento da matéria de facto extrai-se que notificado da acusação, o Autor apresentou a sua defesa escrita em 15/11/2011, na qual indicou uma testemunha.

Essa testemunha esteve de baixa médica no período entre os dias 24/10/2011 a 02/01/2012, vindo a falecer no dia 03/01/2012.

Em 20/01/2012 foi elaborado o relatório final, que concluiu pela prova e pela não prova dos factos constantes da acusação.

Apreciando a questão suscitada em recurso, resulta o seguinte da fundamentação de direito do acórdão recorrido, que ora se transcreve, na parte relevante:

Compulsados os factos provados ficamos a saber que a testemunha indicada na defesa era o motorista da equipa da viatura 69-…., constituída pelo Autor, pelo A..... e por J....., que recolhia monstros e sucata da via.

Contra essa testemunha, J....., e contra os outros dois elementos da equipa, aqui Autor e A....., foram instaurados processos disciplinares, com os nº 0104050…, nº 010405… e nº 010405…..

Contra cada um deles foi deduzida acusação que lhes imputou a co-autoria de furtos de resíduos sólidos urbanos, de forma continuada.

A testemunha em causa foi arrolada no requerimento de 15.11.2011.

Sucede que a testemunha J..... esteve de baixa médica entre os dias 24.10.2011 a 22.11.2011, de 23.11.2011 a 21.12.2011 e de 22.12.2011 a 2.1.2012, vindo a falecer no dia 3.1.2012.

A testemunha em causa não foi ouvida.

Ora, nos termos do art 53º, nº 8 da Lei nº 58/20008, de 9.9 (…), a testemunha devia ter sido inquirida nos vinte dias seguintes a ser indicada.

Porém, quando foi arrolada, em 15.11.2011, a referida testemunha já estava doente, de baixa médica, acabando por falecer.

O que significa que ocorreu, de facto, uma impossibilidade de a ouvir.

Não existiu uma recusa de inquirição.

Ainda assim, o instrutor, expressamente, nada disse, requereu ou justificou, nem notificou o mandatário para se pronunciar sobre a não audição da testemunha doente e que depois faleceu.

Antes, em 20.1.2012, elaborou relatório final, com proposta de aplicação ao Autor de pena de demissão.

No relatório, o instrutor escreveu «existe abundante prova direta (relatórios precisos de pesagem da viatura, imagens vídeo, testemunhas).

A prova disponível obedece aos seguintes requisitos:

• existência de uma pluralidade de dados possíveis de serem plenamente provados ou absolutamente credíveis (peso das viaturas, depoimentos de trabalhadores da E... colegas dos arguidos);

• racionalidade da inferência obtida. No caso vertente, estamos perante uma situação em que ocorrem também dados indiciários. Ocorrem elementos indiciários no que concerne à autoria e modus operandi do processo de apropriação indevida da sucata, dentro das instalações do Ecocentro da T..... e na via pública. Trata-se de dados indiciários de inquestionável credibilidade e de especial relevo, qual seja o de que os arguidos desviaram da via pública e do Ecoparque de T…. e apropriaram-se, indevidamente, de sucata, alguma muito valiosa (ex cobre) subtraída na rua e no Ecoparque da T....., tendo-a vendido a um sucateiro da A…... Ora, a partir de tal dado indiciário, face à posição assumida pelos arguidos, … apontam as regras da experiência e a lógica que se conclua terem os três trabalhadores da E..., Autores do furto da sucata, agido em cooperação de esforços. Com efeito, de acordo com as regras da experiência, o instrutor que afere sobre a autoria a quem é imputado o furto de toneladas de resíduos sólidos urbanos, que comprovadamente não era seu, quando confrontado com dados precisos como o peso de toneladas de resíduos que saíam durante meses do Ecoparque não terá muitas dúvidas sobre a autoria e modo operandi na obtenção indevida desses resíduos.

Nesta conformidade, não há que alterar a acusação, considerando-se provados os factos ocorridos no dia 12.10.2010 e que durante quase 5 meses, os arguidos se apropriaram nas instalações do Ecocentro da T..... da T…., de 11,4 toneladas de resíduos sólidos urbanos de diferentes qualidades e valores.

E que o valor económico dessa sucata a preços de mercado corresponde a cerca de 50.000 euros face à média do preço da sucata no mercado.

E que o fizeram voluntária, livre e conscientemente, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam e ao apoderar-se dela o faziam contra a vontade e sem consentimento do seu legitimo proprietário, a T....., que também não consentiu que saísse das suas instalações daquela forma».

Destas passagens resulta assim, como refere a Demandada, que a omissão da audição da testemunha, co-autor dos factos e arguido em outro processo disciplinar, entretanto falecido, não privou o ora Autor do seu direito de defesa.

No processo disciplinar foi produzida «abundante» prova direta e constam elementos indiciários no que concerne à autoria e modus operandi do processo de apropriação indevida da sucata, dentro das instalações do Ecocentro da T..... e na via pública,

Ora, dispondo o art 37º, nº 1 do ED/2008 que é insuprível a nulidade que resulte de omissão de quaisquer diligências essenciais para a descoberta da verdade, nas circunstâncias do caso concreto, a defesa do arguido, com a não inquirição da única testemunha por si arrolada, por sinal, co-autor dos factos por que o nosso Autor foi acusado e punido, não acarreta a nulidade do procedimento disciplinar.

Com efeito, a Demandada não recusou a inquirição da testemunha em causa, ocorreu sim uma impossibilidade de a ouvir, primeiro, por estar de baixa e, de seguida, por ter falecido.

E, sendo verdade que o instrutor não concedeu a faculdade ao Autor de a substituir por outra, também é verdade que o Autor não arrolou outras testemunhas e, após o falecimento da sua testemunha, nada requereu no processo.

Portanto, nem a Demandada recusou a inquirição da testemunha de defesa, nem limitou a prova da defesa.

Acresce que o Autor não indicou outras diligências probatórias e as produzidas no processo sustentam suficientemente os factos imputados ao Autor.

Pelo que, no caso concreto, não ocorre omissão de formalidades essenciais em matéria de prova.

Improcedendo, por isso, a alegada violação do disposto no art 37º, nº 1 do Estatuto Disciplinar e nos arts 32º, nº 3 e 269º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa.”.

Este julgamento é para manter, por proceder a uma correta valoração dos factos e aplicação dos normativos de direito.

Quando o Autor apresentou a sua defesa escrita, requerendo a inquirição da testemunha, já esta se encontrava de baixa médica, o que senão impossibilitou de imediato a sua audição, pelo menos criou uma séria dificuldade.

Encontrando-se a testemunha em situação de baixa médica e, por isso, sem comparecer ao serviço, não se vê em que medida poderia ser de imediato realizada a sua inquirição, sem que fosse possível prever o desfecho da sua morte.

Acresce que o prazo de vinte dias para a inquirição da testemunha, nos termos previstos no n.º 8 do artigo 53.º do Estatuto Disciplinar constitui um prazo meramente ordenador, não se extraindo qualquer consequência do seu incumprimento.

Com o falecimento da testemunha ocorreu a verdadeira impossibilidade de a inquirir, não tendo existido qualquer recusa ou indeferimento da sua inquirição por parte do instrutor do processo disciplinar.

Não obstante assistia-lhe essa faculdade nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 53.º do Estatuto Disciplinar, nos termos dos quais, “as diligências requeridas pelo arguido podem ser recusadas em despacho do instrutor, devidamente fundamentado, quando manifestamente impertinentes e desnecessárias” e “o instrutor pode recusar a inquirição das testemunhas quando considere suficientemente provados os factos alegados pelo arguido”.

Não se tendo realizado a inquirição da testemunha, não podia o mandatário do Autor ter sido notificado para essa finalidade, não se aplicando o disposto nos n.ºs 5 e 7 do artigo 53.º do Estatuto Disciplinar, que determina que as diligências para a inquirição de testemunhas são sempre notificadas ao arguido e que o advogado do arguido pode estar presente e intervir na inquirição das testemunhas.

É, por isso, de recusar que no caso concreto tenha existido a omissão de qualquer ato ou formalidade por parte do instrutor, que comprometa o exercício do direito de defesa do arguido do processo disciplinar.

Neste sentido, carece de fundamento invocar o disposto no n.º 1 do artigo 37.º do Estatuto Disciplinar, que prescreve que é “insuprível a nulidade resultante da falta de audiência do arguido em artigos de acusação, bem como a que resulte de omissão de quaisquer diligências essenciais para a descoberta da verdade”, por não se verificar ter existido a omissão de quaisquer diligências relevantes para a descoberta da verdade.

Caso diferente seria se tivesse sido inquirida a testemunha sem que o mandatário do arguido tivesse sido notificado, o que não se verificou.

Acresce, com relevo, que a testemunha em causa não só era colega do ora Autor, como também era acusado de ser co-autor da prática dos factos ilícitos disciplinares e criminais.

Não tendo o instrutor comunicado ao arguido a impossibilidade de inquirir a testemunha, o certo é que o Autor também não logrou requerer a sua substituição ou indicar outras testemunhas, quando a isso não estava impedido.

Da factualidade apurada nos autos é de recusar que tenham sido coartados os direitos de defesa do arguido ou vedada a possibilidade de produzir a prova que entendesse, sendo certo que o arguido nada mais requereu ou promoveu em sua defesa, quando era livre para o fazer no momento próprio.

Por outro lado, como se refere no acórdão recorrido o relatório final que culmina com a proposta de sanção disciplinar, refere expressamente a existência de abundante prova direta, de entre a qual, relatórios precisos de pesagem da viatura, imagens de vídeo e testemunhas, que determinam a prova dos factos de que o arguido foi acusado e que ditam a sua condenação disciplinar.

Em face de todo o exposto, é de recusar procedência às conclusões do recurso, não se verificando fundamento para a nulidade insuprível do procedimento disciplinar, procedendo o acórdão a um correto julgamento dos factos e do direito aplicável.

3. Erro de julgamento, por falta dos elementos constitutivos da infração disciplinar, não sendo apresentado qualquer facto ou elemento em que se traduza a violação de algum dever profissional

Por último, alega o Recorrente o erro de julgamento por não ter ficado provado o dolo ou a culpa grave da conduta do Autor, além de não ser apresentado qualquer elemento de facto inequívoco que configure a violação por parte do Recorrente da violação de algum dever profissional.

Mais sustenta que inexistem fundamentos de direito que permitam a aplicação de uma sanção disciplinar e, por maioria de razão, a pena de demissão.

Sustenta que em nenhum momento foi demonstrada pela Recorrida a vontade de produzir ou a produção efetiva, de resultados prejudiciais ao órgão ou serviço.

Vejamos.

O acórdão recorrido manteve o ato impugnado, de aplicação da pena disciplinar de demissão, por de entre o demais decidido, os factos imputados ao arguido serem suficientes para suportar a violação dos deveres imputados e da consequente sanção disciplinar.

De forma a apreciar o fundamento do recurso, importa atender, com detalhe, aos factos que resultaram demonstrados provados e não provados no Relatório Final, que sustenta a aplicação da sanção disciplinar de demissão.

Como se disse no acórdão recorrido quanto à matéria de facto imputada ao Autor, cujo excerto ora se transcreve:

i) o Autor e dois colegas, J….. (motorista) e A..... (cantoneiro), todos do quadro de trabalhadores da Câmara Municipal de Cascais e afetos à E... – E….. de, SA, trabalhavam em equipe;

ii) fazendo-se transportar na viatura de matrícula 69-…..;

iii) esta equipa tinha como função recolher pelo concelho de Cascais material denominado de sucata (material informático, ferro, fios elétricos, cobre, aço inoxidável, etc.;

iv) posteriormente, depositar todo esse material no Ecocentro da T....., SA;

v) o Ecocentro da T..... está munido de câmaras de vigilância;

vi) a determinada altura, pela observação das imagens dessa câmara de vigilância, detetaram-se movimentos estranhos em redor da viatura pertencente à equipa do Autor;

vii) ao invés de estarem a descarregar sucata que recolhiam na rua, da viatura para o Ecocentro da T....., os funcionários, entre eles o Autor, estavam a carregar sucata do Ecocentro para a viatura;

viii) as viaturas que entram e saem do Ecoponto da T..... são pesadas à entrada e à saída;

ix) a segurança do Ecocentro da T....., no dia 12.10.2010, depois de observar as imagens nas quais o Autor e seus colegas aparecem realizando movimentos suspeitos, intersetou a viatura pertencente à equipa do Autor à saída e sujeitou-a a pesagem;

x) comparando a pesagem que a viatura registava à entrada para o Ecocentro da T..... e a pesagem que a viatura registava quando intercetada à saída, concluiu-se que a viatura ia sair com 300 Kg de material no seu interior;

xi) inspecionada a carrinha, verificou-se que esta equipe de funcionários, entre eles o Autor se preparava para sair das instalações do Ecocentro, levando um fogão e castiçais;

xii) O Autor e os seus colegas de equipa, se não tivessem sido intercetados, teriam ido ao Ecocentro da T..... abastecerem-se de sucata ao invés de a ir descarregar;

xiii) O que já haviam feito antes, por diversas vezes;

xiv) Pois, das listas de pesagem da viatura onde se faziam transportar, no período entre 1.6.2010 e 16.10.2010, o veículo à saída apresentava valores de pesagem superiores à soma da tara da viatura, peso de depósito de combustível e peso aproximado da tripulação ;

xv) O peso excedente apresentado pela viatura é o peso da carga que transporta;

xvi) Que naquele período correspondeu a um total de 11.400kg;

xvii) O Autor e os seus colegas descarregavam o material de sucata numa carrinha pertencente ao funcionário V..... que se encontrava estacionada em Alcoitão, perto da bomba de gasolina da Galp, frente à «L….»;

xviii) O Autor e seus colegas descarregavam, também, o material de sucata (monstros) que recolhiam e transportavam na viatura de matrícula 69-…., num terreno sito na Aldeia de…., por trás do Bairro….;

xix) Posteriormente, o material era vendido a sucateiros;

xx) No dia 23.12.2010, o Autor e seus colegas voltaram a ser intercetados pela segurança da T....., após a pesagem da báscula, à saída das instalações;

xxi) Dentro da cabine da viatura foram encontrados dois sacos, um com taças desportivas e outro com fios elétricos.

Estes factos descritos e imputados na acusação e no relatório final resultam da prova produzida e indicada em cada um dos artigos da matéria de facto.

E determinaram a punição do Autor por violação dos deveres de isenção, de zelo e de lealdade, previstos no art 3º, nº 2, al b), e), g) e nº 4, 7, 9 do ED.”.

Com base no que antecede, foi entendido pelo Recorrido que resultou demonstrado que o trabalhador da E..., ora Autor, afeto ao serviço de transportes da E... quis praticar e praticou em co-autoria com os colegas de trabalho, os furtos de resíduos sólidos urbanos, da forma continuada que os praticou, atividade que durou 5 meses, entre 01/06 e 16/10 de 2010, sendo organizada para desvio e comercialização de resíduos sólidos urbanos desativados (cobre, aço inoxidável e material desativado), obtendo proveito indevido dessa apropriação dos resíduos, no total de cerca de € 50.000,00, além do furto na forma tentada, no dia 12/10/2010, pelas 10H56 no Ecocentro do Ecoparque de….., quando a viatura foi intercetada.

Não só ficou inteiramente demonstrado a tentativa do furto no dia 12/10/2010 de 300 kg de material, como no dia 23/12/2010 voltaram a ser intercetados, encontrando-se material dentro da cabine da viatura, guardada em dois sacos.

Também se encontra demonstrado, através de mapas de pesagem da viatura, que durante cinco meses a viatura em causa apresentava um peso excessivo, estando o Autor integrado na equipa dessa viatura e participado em todos os atos com os demais colegas, nunca se tendo demarcado de qualquer atuação.

Mais se encontra demonstrado que existiu a retirada de material antes mesmo de entrar nas instalações, mediante retirada para uma outra viatura, sendo depois descarregado esse material.

Mesmo que não se tenha provado a quem se vendeu a mercadoria ou mesmo que se admita que a mesma não tivesse sido vendida e tivesse ficado na posse do arguido, não deixou a mercadoria de ser furtada, sendo retirada ou subtraída ilicitamente das instalações da T....., a qual ficou privada do seu respetivo valor económico.

Os factos descritos foram valorados como traduzindo a violação dos deveres gerais de prossecução do interesse público, de zelo e de lealdade e ainda dos deveres fundamentais de serviço público, de responsabilidade e competência, a que estão obrigados os trabalhadores da função pública, previstos na Carta Deontológica do Serviço Público.

Assim, analisados os factos, assim como a prova que foi produzida, é de entender no sentido de não assistir razão ao Recorrente, por os factos descritos permitirem a sua integração na violação dos deveres gerais imputados e, consequentemente, nas infrações disciplinares correspondentes, preenchendo os tipos de ilícito disciplinar pelos quais o arguido, ora Autor, foi sancionado.

Em face do que resulta do teor do Relatório Final, carece totalmente de sentido o alegado pelo Recorrente no presente recurso, por a factualidade pelo qual o arguido foi sancionado disciplinarmente se encontrar amplamente demonstrada através de diversos meios de prova.

Em face da prova produzida, resulta provada a prática dos atos ilícitos e, atenta a gravidade dos factos e a sua reiteração no tempo, também uma forte intensidade no grau de culpa do arguido, pelo que, o alegado no presente recurso apresenta-se desmentido nos termos do Relatório Final, em que se baseia o ato sancionatório, ora impugnado.

O ora Recorrente não só não só não conseguiu abalar a prova produzida no âmbito do procedimento disciplinar, como nenhum facto ou prova alega ou requer em juízo, de forma a pôr em causa a factualidade pelo qual foi sancionado.

Assim, atento o processo disciplinar no âmbito do qual foi praticado o ato sancionatório, ora impugnado, em face da concreta factualidade apurada com base nos meios de prova enunciados no Relatório Final, está amplamente demonstrada a violação pelo ora Recorrente dos deveres pelos quais foi sancionado, tal como decidido na decisão sob recurso.

Segundo o n.º 1 do artigo 3.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 09/09, “Considera-se infracção disciplinar o comportamento do trabalhador, por acção ou omissão, ainda que meramente culposo, que viole deveres gerais ou especiais inerentes à função que exerce.”.

Nos termos do n.º 2 do artigo 3.º do citado Estatuto Disciplinar, são deveres gerais dos trabalhadores:

a) O dever de prossecução do interesse público;

b) O dever de isenção;

c) …

d) …

e) O dever de zelo;

f) …

g) O dever de lealdade;

(…)”.

Nos termos do n.º 3 do citado artigo 3.º, o dever de prossecução do interesse público consiste na sua defesa, no respeito pela Constituição, pelas leis e pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.

O dever de isenção consiste em não retirar vantagens, diretas ou indiretas, pecuniárias ou outras, para si ou para terceiro, das funções que exerce, segundo o n.º 4 do artigo 3.º do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 09/09.

O dever de zelo consiste em conhecer e aplicar as normas legais e regulamentares e as ordens e instruções dos superiores hierárquicos, bem como exercer as funções de acordo com os objetivos que tenham sido fixados e utilizando as competências que tenham sido consideradas adequadas.

O dever de lealdade consiste em desempenhar as funções com subordinação aos objetivos do órgão ou serviço.

Acresce, com relevo, ser aplicável a alínea j) do n.º 1 do artigo 18.º do Estatuto Disciplinar, a qual prevê a pena de demissão quando se apure que “por em resultado da função que exercem, solicitem ou aceitem, directa ou indirectamente, dádivas, gratificações, participações em lucros ou outras vantagens patrimoniais, ainda que sem o fim de acelerar ou retardar qualquer serviço ou procedimento”.

Analisados os factos, assim como a prova que foi produzida, é de entender no sentido decidido pelo acórdão recorrido, de que, tal como resulta do ato impugnado, os factos dados como provados no processo disciplinar permitem concluir pela violação dos deveres gerais de isenção, de zelo e de lealdade e consequentemente, pela pena de demissão aplicada ao ora Recorrente.

Ao contrário do alegado no presente recurso, os factos descritos e que resultam provados permitem a sua integração na violação dos deveres gerais imputados e, consequentemente, nas infrações disciplinares correspondentes, preenchendo os tipos de ilícito disciplinar pelos quais o arguido, ora Autor foi sancionado.

Nestes termos, não procede a censura que é dirigida contra o acórdão recorrido, não enfermando de erro de julgamento quanto à interpretação e valoração dos factos e das provas produzidas no âmbito do procedimento disciplinar, improcedendo totalmente as conclusões do recurso, por não provadas.


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Em consequência, será de negar provimento ao recurso, por não provados os seus fundamentos, mantendo-se o acórdão recorrido, que julgou a ação administrativa improcedente, mantendo a deliberação impugnada, de aplicação da pena disciplinar de demissão ao Autor, ora Recorrente, na ordem jurídica.

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Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. Em regra, o direito de instaurar o procedimento disciplinar prescreve decorridos que sejam 30 dias sobre o conhecimento da infração pelos superiores hierárquicos, relevando o conhecimento por qualquer superior hierárquico e não apenas o último na cadeia de hierarquia administrativa.

II. Se a infração apenas chegar ao conhecimento do superior hierárquico após um ano sobre a data em que tal infração tenha sido cometida, também já se encontra prescrito o direito à instauração do procedimento disciplinar, segundo o disposto no n.º 1 do citado artigo 6.º do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 09/09.

III. Estes prazos não são aplicáveis se a infração disciplinar envolver, simultaneamente, a prática de um crime, caso em os prazos de prescrição são os estabelecidos na lei penal.

IV. Não tendo sido possível inquirir a testemunha indicada na defesa, por a mesma à data se encontrar de baixa médica, vindo a falecer, não existiu qualquer recusa ou indeferimento na sua inquirição.

V. Não tendo sido inquirida não podia o mandatário do arguido ser notificado para estar presente.

VI. Procedendo, quer a acusação, quer o relatório final, ao enquadramento factual da actuação do trabalhador, considerando a gravidade dos factos praticados (furto e tentativa de furto de resíduos sólidos urbanos/sucata), cujos ilícitos se mostram tipificados na alínea b) do n.º 3 e do n.º 4 do artigo 3.º do regime disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 09/09, a sancionar com a pena de demissão, estão suficientemente preenchidos os tipos de infrações.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, por não provados os seus fundamentos, mantendo-se o acórdão recorrido, que julgou a ação improcedente, mantendo o ato impugnado, de aplicação de pena de demissão na ordem jurídica.

Custas pelo Recorrente.

Registe e Notifique.

(Ana Celeste Carvalho - Relatora)

(Pedro Marques)

(Pedro Figueiredo)

[com declaração de voto]

DECLARAÇÃO DE VOTO:
Voto o sentido da decisão tomada, sem prejuízo de entender, quanto ao ponto I da fundamentação de direito, que a previsão do artigo 6.°, n.° 3, do ED, se aplica apenas ao prazo do artigo 6.°, n.° 1, e não ao prazo do artigo 6.°, n.° 2. É a lógica que subjaz aos atuais artigo 178, n.° 1, e 178.°, n.° 2, da LGI PP, de uma forma bastante mais clara.

Não obstante a posição adotada, da análise da matéria de facto provada não resulta assente que o procedimento disciplinar tenha sido instaurado mais de 30 dias depois do conhecimento da infração por superior hierárquico.