Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:3255/16.5BELRS-A
Secção:CT
Data do Acordão:09/28/2017
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:RECURSOS/ALÇADAS/REGRAS DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA/REGRAS PROCESSUAIS
Sumário:I – As regras que definem a alçada dos tribunais são regras de organização judiciária as quais têm (também) por função delimitar o âmbito das disposições que fixam a competência de determinados Tribunais (a competência para um tribunal decidir sem recurso e, concomitantemente, a competência de outro Tribunal para intervir na causa, em via de recurso), pelo que são as leis de organização judiciária e não as leis de processo o lugar próprio para definir a alçada.
II - As regras que disciplinam a admissibilidade dos recursos são regras processuais, as quais têm por função regular o acesso à fase dos recursos nos processos judiciais, pelo que o lugar próprio para as estabelecer são as leis de processo, e não as leis de organização judiciária.
III - Quando uma norma de organização judiciária estabelece que os Tribunais de determinada jurisdição têm alçada, isso significa que, em princípio, decidem sem recurso nos processos cujo valor não exceda o valor da alçada. Indirectamente, esta norma também constitui um obstáculo à admissibilidade do recurso dessa decisão.
IV - Quando uma norma de processo estabelece que determinado recurso é sempre admissível, independentemente do valor da causa, isso significa que, excepcionalmente, a alçada dos Tribunais não constitui obstáculo à admissibilidade dos recursos. Indirectamente, esta norma funciona também como uma excepção à influência da alçada, uma vez que, se um Tribunal de recurso pode intervir independentemente do valor da causa, também pode intervir dentro do limite do valor da alçada.
V - O artigo 280.º, n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário não contém uma norma de organização judiciária, não sendo sua função definir quando é que os Tribunais têm alçada mas quando é que determinados recursos são admissíveis (norma de processo).
VI - A norma que dispõe sobre as alçadas é o artigo 6.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e dela deriva que, em regra, os Tribunais da jurisdição administrativa e fiscal julgam sem recurso ordinário no limite da sua alçada. Indirectamente, dela deriva também que, em princípio, não cabe recurso ordinário das decisões dos Tribunais desta jurisdição nas causas de valor que se encontre dentro do valor da respectiva alçada.
VII – Do exposto em V e VI se conclui que o artigo 280.º, n.º 4 do Código de Procedimento e de Processo Tributário não constitui uma excepção à regra consagrada no artigo 6.º do ETAF esta regra, porque a sua função não é a de dizer quando é que a alçada não influencia a admissibilidade dos recursos, mas confirmar, com uma regra do processo, uma regra que indirectamente, já derivava do valor das alçadas.
VIII - A excepção à regra das alçadas nos Tribunais desta jurisdição consta do artigo 629.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
IX – Uma interpretação restritiva e literalista do preceituado no artigo 280.º, n.º 4, do CPPT - no sentido de que o valor da causa só assume relevo para efeitos de recurso nos processos de “impugnação judicial” e “ execução fiscal” - conduziria a que em processo judicial tributário, e desde que não estivéssemos no âmbito daquelas duas formas processuais, seria sempre admissível recurso jurisdicional, regra especial esta que o legislador processual tributário expressamente não consagrou, nem nunca quis consagrar, como nitidamente decorre da manutenção da redacção legal do n.º 4, do artigo 280.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, limitada ao valor da alçada, nos termos impostos pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:

I – Relatório

A Autoridade Tributária e Aduaneira, notificada da decisão proferida pelo relator deferindo a reclamação apresentada e determinando que o despacho de não admissão do recurso fosse substituído por outro que o admitisse, veio, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 643.º, nº 4 e 652.º, nº 3, ambos do CPC, impugnar aquela decisão, requerendo que sobre a matéria recaia acórdão que revogue a decisão daquele relator e mantida a decisão do Tribunal a quo.

Como fundamento da sua pretensão alegou, em conclusão, que:

«I - A AT vem reclamar, nos termos do artigo 652°, n°3 do CPC, para a conferência do despacho proferido pelo Ex.mo Senhor Juiz Desembargador Relator, em 05/07/2017, por o mesmo laborar em clamoroso erro de direito.

II - Sobre esta matéria o STA já se pronunciou várias vezes, por exemplo no âmbito dos processos n° 01291/15, de 24/02/2016, n°01181/16, de 18/01/2017, e n° 0141/17 de 03/05/2017 sendo a decisão sempre no mesmo sentido.

III -   Também a doutrina segue o mesmo sentido daquela jurisprudência, vide por todos "Recursos no Contencioso Tributário", de Cristina Flora e Catarina Reis, de 2015.

IV -   No presente caso, a data em que foi deduzida a acção de derrogação de sigilo bancário, a alçada dos tribunais tributários correspondia àquela que se encontrava estabelecida para os tribunais judiciais de 1ª instância, como resulta do artigo 105° da LGT, na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 82.°B/2014 de 31/12, isto é encontra-se fixada no valor de € 5.000, 00

V - O valor da acção atribuída pela Autora e fixada pelo Tribunal a quo foi de € 5.000,00, portanto o valor da causa não ultrapassa o valor da alçada fixada para os tribunais de primeira instância, logo, como muito bem decidiu o tribunal a quo, não é admissível o recurso.

VI - Nesse sentido, submetendo-se os presentes autos à conferência, para que sobre eles venha a recair o devido acórdão, deverá ser revogado o despacho proferido pelo Ex.mo Senhor Juiz Desembargador Relator e manter-se o despacho proferido pelo Tribunal a quo.

Termos em que se requer a submissão dos presentes autos à conferência, para que sobre eles venha a recair o devido acórdão, revogando-se o despacho proferido pelo Ex. mo Senhor Juiz Desembargador e mantendo-se a decisão do Tribunal a quo que decidiu correctamente, firmando-se no ordenamento jurídico nos seus exactos termos. Devendo, nesta decorrência, sobre o Recurso efectuado pela Autora manter-se a decisão de não subida por falta de alçada e, em consequência, a entidade pública demandada ser absolvida de todos os pedidos, com todas as legais consequências.».

A parte contrária, notificada nos termos e em cumprimento do disposto na parte final do nº 3 do art. 652 do CPC, nada disse.

Vêm, assim, sem vistos, os autos à conferência.

II - A decisão do relator de que se pretende, nos termos do nº 3 do art. 652 do Código de Processo Civil, que recaia um acórdão, é do seguinte teor:

“ Maria José de Oliveira vem, nos termos do artigo 643 nº 1 do CPC, reclamar do despacho de fls. 47 e 47v que não lhe admitiu o recurso interposto pelo requerimento de fls. 15 a 44 da sentença de fls. 63 a 72, pretendendo a revogação desse despacho e a admissibilidade do recurso, porquanto o presente processo não é nem um processo de impugnação judicial e muito menos um processo de execução fiscal, sendo que a regra segundo a qual das decisões dos TT de 1ª instância apenas cabe recurso quando o valor da causa seja superior à alçada do Tribunal de que se recorre só se aplica no âmbito dos processos de impugnação judicial e de execução fiscal, o que não é o caso por estarmos perante um processo especial de derrogação de sigilo bancário.

O recurso não foi admitido nos termos do despacho de fls. 47 e 47v por o valor da causa (€ 5000,00) não ultrapassar o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1ª instância, sendo certo que no requerimento de interposição do recurso não foi referida qualquer circunstância capaz de fazer apelo à situação a que se refere o nº 5 do art. 280 do CPPT.

Cumpre apreciar e decidir, sendo que os autos se mostram devidamente instruídos.

Dúvidas não existem de que estamos perante um processo especial  de derrogação do sigilo bancário regulado nos termos dos art. 146-A, B e D do CPPT que é tramitado como processo urgente face ao disposto no art. 146-D do CPPT.

Se se tratasse de impugnação judicial ou de execução fiscal subscreveríamos a posição que não admitiu o recurso face ao valor do processo.

Sucede que o processo em causa (processo especial de derrogação do sigilo bancário) não é nenhuma impugnação judicial nem nenhuma execução fiscal, antes um processo judicial tributário incluído na al. q) do nº 1 do art. 97 do CPPT (outros meios processuais previstos na lei), pelo que não tem cabimento, na situação em apreço, fazer apelo ao disposto no nº 4 do art. 280 do CPPT para não admitir o recurso, pois que não se trata de situação hipotizada nesse normativo. O valor da causa não é obstáculo à admissão do recurso no presente processo e daí que não se possa manter o despacho reclamado por o valor da causa não ultrapassar o valor da alçada fixada para os TT de 1ª instância, sendo que a norma aplicável é a do nº 1 do art. 280 do CPPT (Das decisões dos TT de 1ª instância cabe recurso…)

Não existe qualquer obstáculo formal à admissão do recurso, pelo que procede a reclamação apresentada devendo os autos baixarem para que seja proferido despacho de admissão do recurso com notificação do mesmo às partes, sendo que o prazo para as contra-alegações só começa  a correr após a notificação do despacho de admissão ao recorrido.

Termos em que se defere a reclamação apresentada, devendo o despacho de não admissão do recurso ser substituído por outro que admita o recurso, baixando, para o efeito, os autos à 1ª instância onde deverão ser feitas as notificações respectivas e a tramitação subsequente á admissão do recurso antes da remessa ao T. Superior.

Sem custas.

Notifique e registe.

Lx., 6.7.017”. (cfr. fls. 74 e 75 dos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

III - O despacho reclamado que não admitiu o recurso é do seguinte teor:

“O requerimento de interposição de recurso apresentada Autora está em tempo, e a Autora encontra-se dotada de legitimidade por ser parte vencida na ação (n.° l e 3 do Art° 280.° e 283°, ambos do CPPT).

Todavia, em Novembro de 2016, data em que foi deduzida a ação de derrogação de sigilo bancário, a alçada dos tribunais tributários correspondia àquela que se encontrava estabelecida para os tribunais judiciais de l .a instância (Art.° 105° da LGT com a redação que lhe foi conferida pela Lei n.° 82-B/2014 de 31/12), i.e., encontra-se fixada no valor de €5.000,00.
Quanto à admissibilidade do recurso postula o n.° 4 do Art° 280.° do CPPT na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 82-B/2014, de 31/l2, que não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de l .a instância proferidas em processo de impugnação judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassar o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1ª instância (sublinhado nosso).

Refere ainda o n.° 5 que a existência de alçadas não prejudica o direito ao recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisões que perfilhem solução oposta relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência substancial de regulamentação jurídica, com mais de três sentenças do mesmo ou outro tribunal de igual grau ou com uma decisão de tribunal de hierarquia superior

No caso em apreço o valor da acção atribuído pela autora e fixado pelo tribunal foi de € 5000,00, portanto o valor da causa não ultrapassa o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1ª instância, sendo certo que no requerimento de interposição do recurso não foi referida qualquer circunstância capaz de fazer apelo à situação a que se refere o citado nº 5 do art. 280 do CPPT, razão pela qual não se admite o recurso. Notifique”.

IV – O Direito

Conforme resulta do ponto I do presente acórdão, a Administração tributária e Aduaneira discorda da decisão do relator transcrita no ponto II supra por, em seu entender, a mesma laborar em clamoroso erro de direito.

Em abono deste seu entendimento convoca abundante jurisprudência (a título de exemplo refere os acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo nos processos nº 01291/15, de 24/02/2016, n°01181/16, de 18/01/2017, e n° 0141/17 de 03/05/2017) que, alega, decidiram sempre no sentido por si pugnado e doutrina (designadamente a defendida por Cristina Flora e Margarida Reis, in "Recursos no Contencioso Tributário", Almedina, 2015).

No despacho do relator que ora se encontra impugnado, o entendimento perfilhado foi, como se vê do ponto II supra, e em resumo nosso, que estando nós perante um processo especial de derrogação do sigilo bancário regulado nos termos dos art. 146-A, B e D do CPPT que é tramitado como processo urgente face ao disposto no art. 146-D do CPPT, não pode entender-se como subsumível à regra consagrada no n.º 4, do artigo 280.º, do CPPT, isto é, como constituindo um processo limitado para efeitos de interposição de recurso pelo valor do processo, ou seja, que neste tipo de processos é sempre admissível recurso.

Vejamos.

A questão colocada suscita a distinção entre as regras sobre alçadas e as regras sobre a admissibilidade dos recursos.

As regras que definem a alçada dos tribunais são regras de organização judiciária. A sua função é ainda a de delimitar o âmbito das disposições que fixam a competência de determinados Tribunais (a competência para um tribunal decidir sem recurso e, concomitantemente, a competência de outro Tribunal para intervir na causa, em via de recurso). Pelo que o lugar próprio para definir a alçada são as leis de organização judiciária, e não as leis do processo.

As regras que disciplinam a admissibilidade dos recursos são regras processuais. A sua função é a de regular o acesso à fase dos recursos nos processos judiciais. Pelo que o lugar próprio para as estabelecer são as leis de processo, e não as leis de organização judiciária.

É bem verdade que as regras que disciplinam a admissibilidade dos recursos também delimitam, por vezes, as situações em que o Tribunal de recurso pode intervir. Mas fazem-no indirectamente. Mesmo quando apelam às leis da alçada, situam-se «na intersecção do valor do processo ou do valor da sucumbência com a alçada dos tribunais» (cit. António Santos Abrantes Geraldes, in «Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014 - 2.ª edição, pág. 37).

Quando uma norma de organização judiciária estabelece que os Tribunais de determinada jurisdição têm alçada, isso significa que, em princípio, decidem sem recurso nos processos cujo valor não exceda o valor da alçada. Indirectamente, esta norma também constitui um obstáculo à admissibilidade do recurso dessa decisão. Porque se um Tribunal de recurso não pode intervir, também não pode ser admitido o recurso para esse Tribunal.

Quando uma norma de processo estabelece que determinado recurso é sempre admissível, independentemente do valor da causa, isso significa que, excepcionalmente, a alçada dos Tribunais não constitui obstáculo à admissibilidade dos recursos. Indirectamente, esta norma funciona também como uma excepção à influência da alçada, uma vez que, se um Tribunal de recurso pode intervir independentemente do valor da causa, também pode intervir dentro do limite do valor da alçada.

Ora, para nós, o artigo 280.º, n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário não contém uma norma de organização judiciária. A sua função não é a de dizer quando os Tribunais têm alçada mas quando é que determinados recursos são admissíveis. É uma norma de processo.

A norma que dispõe sobre as alçadas é o artigo 6.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e dela deriva que, em princípio, os Tribunais da jurisdição administrativa e fiscal julgam sem recurso ordinário no limite da sua alçada. Indirectamente, dela deriva também que, em princípio, não cabe recurso ordinário das decisões dos Tribunais desta jurisdição nas causas de valor que se encontre dentro do valor da respectiva alçada.

O artigo 280.º, n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário não constitui, pois, uma excepção a esta regra, porque a sua função não é a de dizer quando é que a alçada não influencia a admissibilidade dos recursos, mas confirmar, com uma regra do processo, uma regra que indirectamente, já derivava do valor das alçadas.

A excepção à regra das alçadas nos Tribunais desta jurisdição consta do artigo 629.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, o qual, sob a epígrafe de “Decisões que admitem recurso”, dispõe que:

«1 - O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.

2 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso:

a) Com fundamento na violação das regras de competência internacional, das regras de competência em razão da matéria ou da hierarquia, ou na ofensa de caso julgado;

b) Das decisões respeitantes ao valor da causa ou dos incidentes, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre;

c) Das decisões proferidas, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça;

d) Do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.

3 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso para a Relação:

a) Nas ações em que se aprecie a validade, a subsistência ou a cessação de contratos de arrendamento, com exceção dos arrendamentos para habitação não permanente ou para fins especiais transitórios;

b) Das decisões respeitantes ao valor da causa nos procedimentos cautelares, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre;

c) Das decisões de indeferimento liminar da petição de ação ou do requerimento inicial de procedimento cautelar.».

Ou seja, o argumento de que do artigo 280.º, n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário deriva, a contrario, que cabe recurso das decisões de outros processos independentemente da alçada seria válido se não existisse norma genérica que regulasse a influência das alçadas na organização dos tribunais desta jurisdição.

Ora, o recurso dos autos não é interposto ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil, com fundamento em que o valor da causa excede a alçada do Tribunal de que se recorre. Pelo que, e tendo em conta que o valor da causa se encontra dentro do valor da alçada, o recurso não deve, como não foi em 1ª instância, ser admitido.

Diga-se, por fim, ainda, e em abono da tese que ora se defende, que mesmo que se não perfilhasse o entendimento supra expendido com as razões adiantadas, nem por isso a interpretação restritiva e literalista acolhida no despacho impugnado seria de sufragar, porque a expressa referência a “impugnação judicial” e “ execução fiscal” não pode, à luz da regra geral supra definida, de ser entendida como esgotando o objecto do normativo em questão, mas, sim, como abrangendo todos os processos judiciais tributários e as decisões neles proferidas desde que não se subsumam a nenhuma das excepções previstas na lei processual civil.

Aliás, a não ser assim, teríamos de concluir que em processo judicial tributário, é sempre admissível recurso, salvo se se estiver no âmbito de processos de impugnação judicial ou de acções ou incidentes suscitados na sequência de processos de execução fiscal (com uma consequente protecção legal acrescida de uma multiplicidade de formas de processo sem que se logre encontrar qualquer justificação), regra especial esta que o legislador processual tributário expressamente não consagrou, nem nunca quis consagrar, como nitidamente decorre da manutenção da redacção legal do n.º 4, do artigo 280.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, limitada ao valor da alçada, nos termos impostos pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro.

Em suma, em nosso entender, a generalidade dos processos da competência dos Tribunais Tributários, e não apenas os processos de impugnação judicial e de execução fiscal, têm alçada e, consequentemente, sendo o valor do processo de derrogação do sigilo bancário inferior à alçada do Tribunal de que se recorre, não deve o recurso jurisdicional ser admitido.

VI – Decisão

Termos em que acordam, em conferência, os Juízes deste Tribunal, atendendo à impugnação apresentada, em revogar o despacho do relator que determinou que fosse admitido o recurso jurisdicional e, consequentemente, em confirmar a decisão de não admissão do recurso jurisdicional proferida pelo Tribunal a quo.

Custas pela Reclamante, ....

Registe e notifique.

Lisboa, 28 de Setembro de 2017


                                                           _______________________________________

 [Anabela Russo – relatora por vencimento]

                                                           ___________________________________

[Lurdes Toscano]

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[Joaquim Gameiro - com voto de vencido*]


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Discordo da posição que obteve vencimento, sendo, no meu entender, de manter a decisão impugnada, com base na seguinte fundamentação:

No presente caso, na data em que foi deduzida a acção de derrogação de sigilo bancário, a alçada dos tribunais tributários correspondia àquela que se encontrava estabelecida para os tribunais judiciais de 1ª instância, como resulta do artigo l 05º da LGT, na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 82.ºB/2014 de 31/12, isto é encontra-se fixada no valor de € 5.000, 00. Entende a impugnante que o valor da acção atribuída pela Autora e fixada pelo Tribunal a quo foi de € 5.000,00, pelo que não ultrapassa o valor da alçada fixada para os tribunais de primeira instância, logo, como muito bem decidiu o tribunal a quo, não é admissível o recurso.

Afigura-se-nos que não assiste qualquer razão à impugnante que labora em clamoroso erro ao invocar os acórdãos que refere bem como a doutrina, pois que a invocação que é feita não contempla a situação em apreço dado que é referente a processos de impugnação e de execução fiscal e o processo em causa (processo especial de derrogação do sigilo bancário) não é nenhuma impugnação jud icial nem nenhuma execução fiscal.

Nos invocados processos nº 01291/15, de 24/02/2016 e nº 0141117 de 03/05/2017 estavam em causa decisões proferidas em oposições a execuções fiscais de valor inferior ao da alçada dos TT de 1ª instância e no processo nºO 1181/16, de 18/01/2017, estava em causa decisão proferida em processo de impugnação judicial de valor inferior ao da alçada dos TT de 1ª instância, sendo que quanto a esses processos a norma aplicável para efeitos de recurso era a do nº 4 e ou do nº 5 do art. 280 do CPPT como se entendeu nesses recursos. A doutrina invocada vai no mesmo sentido do propugnado nos ac. invocados.

Só que na situação em apreço não se trata de qualquer impugnação judicial ou de qualquer execução fiscal. Trata-se de outro tipo de processo (processo judicial tributário incluído na al. q) do nº 1 do art. 97 do CPPT - outros meios processuais previstos na lei), a que, para efeitos de recurso, não se aplica o disposto no nº 4 e ou 5 do art. 280 do CPPT., mas sim o nº 1 do art. 280 do CPPT.
Tal como se entendeu na decisão impugnada, não tem cabimento, na situação em apreço, fazer apelo ao disposto no nº 4 do art. 280 do CPPT para não admitir o recurso, pois que não se trata de situação hipotizada nesse normativo. O valor da causa não é obstáculo à admissão do recurso no presente processo, sendo que a norma aplicável é a do nº 1 do art. 280 do CPPT (Das decisões dos TT de 1ª instância cabe recurso...), donde a improcedência da impugnação, sendo, pois, de manter a decisão impugnada.