Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1255/11.0BESNT
Secção:CT-2º. JUÍZO
Data do Acordão:04/18/2018
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:REVERSÃO POR DÍVIDA DE COIMAS. ARTIGO 8.º DO RGIT.
Sumário:1)A responsabilidade tributária prevista no artigo 8.º do RGIT corresponde a uma responsabilidade de cariz ressarcitório, fundada numa conduta própria, posterior e autónoma relativamente àquela que motivou a aplicação da sanção à pessoa colectiva.
2)A reversão incide sobre as quantias pecuniárias a liquidar pela sociedade arguida, pelo que não contende, nem releva no quadro da responsabilidade contra- ordenacional desta última. Trata-se de uma responsabilidade legal pelo dano causado ao Estado pela falta de pagamento de quantias.
3)Cabe à Administração Tributária o ónus de demonstrar a culpa do revertido pela insuficiência do património da sociedade devedora originária, pelo que lhe cabe alegar, em sede do acto de reversão, a culpa do gerente por essa insuficiência como pressuposto necessário da efectivação da sua responsabilidade subsidiária.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I- Relatório
A Fazenda Pública interpõe o presente recurso jurisdicional contra a sentença proferida a fls. 129/147, que julgou procedente a Oposição à Execução Fiscal intentada por J. M. G. S. A. contra o processo de execução fiscal instaurado pelo serviço de finanças de S., por reversão de dívidas relativas a IVA, IRS e coimas, no valor total de € 12.048,16.
Nas alegações de recurso de fls. 170/180, a recorrente formula as conclusões seguintes:
«A - Vem o presente recurso reagir contra a douta Sentença que julgou procedente a Oposição à Execução Fiscal n.º 1... e apensos, deduzida por J. M. G. S. A., NIF 1..., revertido no processo de execução fiscal acima referenciado, o qual havia sido originariamente instaurado contra "S., LDA.", NIPC 5..., para cobrança de dívidas referentes a IVA, IRS e Coimas, já devidamente identificadas nos autos, no montante de €12.048,16 (doze mil e quarenta e oito euros e dezasseis cêntimos).
B - Consagra o n.º 1 do artigo 125.º do CPPT que "Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer".
C - A apreciação, pelo Juiz, de questões de que não deveria ter tomado conhecimento é que justifica plenamente a nulidade da sentença, pois que o excesso de pronúncia se traduz numa violação do princípio do dispositivo que contende com a liberdade e a autonomia das partes; dito de outro modo, ao Juiz apenas compete a resolução de questões que lhe tenham sido postas, vide, neste sentido, A. Reis, CPC Anotado (reimpressão), Coimbra Editora, vol. V, pág. 141, e A. Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, pág. 688.
D - Em primeiro lugar, compulsados os autos, verificamos que toda a argumentação aduzida pelo Oponente vai precisamente no sentido de se subtrair à efectivação da responsabilidade subsidiária com o fundamento de que "O aqui Oponente não fez suas quantias algumas da executada (...) não levou a efeito voluntariamente qualquer facto ilícito, culposo e danoso (...) Não foi por culpa do aqui Oponente que o património da executada se revelou insuficiente para o pagamento das dívidas...", vide, § 77º a 79.º da competente p.i.
E - Sabemos, contudo, que em matéria de reversão do processo de execução fiscal e nos termos do disposto no artigo 24.º da LGT, a questão relativa à culpa do revertido assume contornos jurídicos bem distintos da questão relativa à gerência de facto da sociedade devedora originária.
F - Por outro lado, com a devida vénia, o que o Oponente pretende demonstrar, perscrutado o seu petitório, é que a Administração Fiscal não logrou fazer a prova do exercício de facto da gerência da originária executada por parte do Oponente; isto é o Oponente tende, apenas, a expender que o ónus da prova relativamente ao exercício efectivo da gerência da sociedade originária executada impende sobre a Fazenda Pública, o que, a não acontecer, segundo pretende fazer crer, acarreta a falta de fundamentação do despacho de reversão.
G - No caso sub judice, a questão a resolver prendia-se, exclusivamente, com a prova da culpa do Oponente na insuficiência patrimonial da sociedade devedora originária e com a alegada falta de fundamentação do despacho de reversão em consequência da falta de prova, pela Administração Fiscal, do exercício de facto da gerência relativamente ao Oponente.
H - Ora, não tendo o Oponente suscitado a questão da gerência de facto, relativamente à sociedade devedora originária aquando da apresentação da competente p.i. de Oposição à execução fiscal, com o devido respeito, que é muito, nem sequer devia o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo ter emitido pronúncia sobre o assunto.
I - Por conclusivo e tratando-se de matéria já abordada pelos Tribunais Superiores, transcreve-se o sumário do acórdão do STA, de 28-05-2014, proferido no âmbito do recurso n.º 0458/12, que subscrevemos in totum e de acordo com o qual "Padece de nulidade por excesso de pronúncia (artº 725º, nº 7 do Código de Procedimento e Processo Tributário), por exceder os seus poderes de cognição quanto à causa de pedir, violando a regra da identidade de causa de pedir de causa de julgar, a sentença que, em processo de oposição à execução fiscal, conheceu de fundamento de oposição não invocado pelo oponente, nomeadamente a sua ilegitimidade por não ter exercido de facto a gerência da devedora originária".
J - Assim, verifica-se que a Douta Sentença, ora recorrida, se mostra ilegal, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 125.º do CPPT, o que acarreta a sua nulidade, o que se invoca para os devidos efeitos legais.
K - Sem prescindir, caso assim VENERADAMENTE não se entenda, durante o período a que respeitam as dívidas em crise, o Oponente era gerente da sociedade "S., LDA.", NIPC 5..., cfr. Certidão do Registo Comercial, já junta aos autos e que aqui se dá por inteiramente reproduzida para os devidos efeitos legais, e portanto, o registo constitui presunção de que existe a situação jurídica, nos precisos termos em que é definida artigo 11.º do Código do Registo Comercial (CRC).
L - Postula o n.º 1 do artigo 24.º da LGT que "Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si: a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação; b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento".
M - Não descuida esta Fazenda Pública que, na esteira de Jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores, lhe compete o onus probandi do exercício de facto da gerência por parte do Oponente; efectivamente, não olvidamos que não há qualquer disposição legal que estabeleça uma presunção legal relativa ao exercício da gerência de facto, designadamente que ela se presume a partir da gerência de direito.
N - Agora, o que não podemos descuidar é que, tal como é entendido no acórdão do STA de 10-12-2008, proc. n.º 861/08, "o facto de não existir uma presunção legal sobre esta matéria, não tem como corolário que o Tribunal com poderes para fixar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição nessa área, não possa utilizar as presunções judiciais que entender, com base nas regras da experiência comum". Na esteira do que se afirmou no acórdão de 10 de Dezembro de 2008 da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo com o n.º 861/08, diga-se que "eventualmente, com base na prova de que o revertido tinha a qualidade de gerente de direito e demais circunstâncias do caso, nomeadamente as posições assumida no processo e provas produzidas ou não pelo revertido e pela Fazenda Pública, o Tribunal que julga a matéria de facto pode concluir que um gerente de direito exerceu a gerência de facto, se entender que, nas circunstâncias do caso, há uma probabilidade forte («certeza jurídica») de esse exercício da gerência ter ocorrido e não haver razões para duvidar que ele tenha acontecido".
O - Desta forma, ainda que não seja possível partir-se do pressuposto de que quem figura como gerente de direito, se presume como tendo exercido, de facto, tais funções, sempre é possível ao Tribunal, em face das regras da experiência, entender que existe uma forte probabilidade de esse exercício efectivo (de facto) da gerência por parte do Oponente possa ter acontecido; sendo exactamente neste ponto que, em nossa modesta opinião, mal andou o Tribunal a quo, designadamente ao estribar que "tal como se considera que não se pode afirmar o efectivo exercício de gerência a partir da constatação de que o oponente foi indicado como representante legal da devedora originária nas declarações de rendimento dessa sociedade remetidas através da internet à Administração Tributária (…), igualmente não se pode considerar que, do facto do oponente constar como gerente para efeitos de IVA, resulta provada a gerência de facto do oponente, dado que nada permite concluir relativamente à prática efectiva de actos de gerência por parte do oponente".
P - Atendendo às circunstâncias do caso concreto, constatamos que: O ora Oponente procedeu à entrega, junto do órgão de execução fiscal, em 23-06-2010 e 01-09-2010, de documentos em nome e por conta da sociedade devedora originária, apondo a sua assinatura enquanto gerente da mesma, representando-a e exteriorizando a sua vontade, os quais se encontram devidamente elencados a alíneas b) e c) do probatório fixado na Douta Sentença;
- A sociedade devedora originária obrigava-se mediante a intervenção conjunta de dois gerentes, donde se conclui que o Oponente possuía uma intervenção pessoal e activa na sua vinculação, uma vez que a viabilidade funcional da devedora originária só podia ser concretizada com sua intervenção;
- Jamais foi carreado para os presentes autos qualquer elemento probatório que ateste a destituição ou renúncia do Oponente ao cargo de gerente da sociedade devedora originária;
- Compulsada a petição inicial, verifica-se que o próprio Oponente jamais sindicou jurisdicionalmente o exercício de facto das funções de gerência da sociedade devedora originária, apenas alegando que a Administração Fiscal não logrou provar tal exercício;
- O Oponente consta, para efeitos de IVA, como gerente da sociedade devedora originária, em conformidade com o postulado na alínea k) dos factos dados como provados na Douta Sentença, nunca tendo sido comunicada qualquer alteração a esse facto, o que sempre se impunha, caso tal alteração acontecesse, por força do postulado nos artigos 31º e 32.º do Código do IVA.
Q - Nenhumas dúvidas haverão de restar, com o devido respeito e ao contrário do que foi decidido pelo Tribunal a quo, que o Oponente figurava como gerente, de facto, da sociedade devedora originária; pelo que a Administração Tributária, ao contrário do entendido na Douta Sentença, ora recorrida, estava legitimada para operar o mecanismo de reversão por responsabilidade subsidiária do Oponente, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT.
R - Desta forma, com o devido respeito, a Douta Sentença, ao decidir como efectivamente o fez, estribou o seu entendimento numa errada interpretação dos factos em apreço, bem assim, desconsiderando os elementos probatórios carreados para os autos, as regras trazidas pela experiência comum e as demais circunstâncias do caso concreto, violando o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT.
X
Não há registo de contra-alegações.
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A Digna Magistrada do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (fls. 186), no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, vem o processo à conferência para decisão.
X
II- Fundamentação.
2.1.De Facto.
«a) Corre termos contra J. M. G. S. A., na qualidade de revertido, o Processo de Execução Fiscal n.º 1... e apensos, instaurado pelo Serviço de Finanças S., para cobrança coerciva de dívidas de IVA, de IRS e de coimas, respeitantes ao período de 2007 a 2009 - Cfr. PEF, apenso.
b) Em 23-06-2010 o ora Oponente apresentou requerimento, enquanto representante da devedora originária, "S., Lda", solicitando o pagamento em prestações nos termos do artigo 196.º do CPPT- Cfr. documento a fls. 26 do PEF apenso.
c) Em 01-09-2010, o ora Oponente requereu à Direcção-Geral dos Impostos, enquanto representante da devedora originária, S., Lda, o levantamento das penhoras existentes, tendo em conta o acordo de pagamento em prestações - Cfr. documento a fls. 95 dos autos.
d) A gerência da devedora originária, "S., Lda", pertencia ao ora
Oponente e a S. K. S. V., sendo que a pessoa colectiva se obrigava com a intervenção conjunta de dois gerentes - Cfr. documento a fls. 57 do PEF, apenso.

e) Em 13-07-2011 foi emitido despacho de reversão contra o ora Oponente, no âmbito do Processo de Execução n.º 1... e apensos, do qual se destaca o seguinte: "Fundamentos da reversão" "Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do seu cargo [art. 24.º/n.º1/b) LGT]. A situação líquida da empresa constante da declaração IES (Informação Empresarial Simplificada) é negativa, daí resultando indícios de fundada insuficiência de bens penhoráveis. No cadastro E. de Activos penhoráveis apenas consta um veículo. Art. 8 do RGIT." - Cfr. fls. 74 do PEF, apenso, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido.
f) Em 13-07-2011 foi o Oponente citado, na qualidade de revertido, nos termos
seguintes:
"Inexistência ou insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão prévia (artº 23.º, n.º 2 da LGT) Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do seu cargo [art. 24.º/n.º1/b) LGT]. A situação líquida da empresa constante da declaração IES (Informação Empresarial Simplificada) é negativa, daí resultando indícios de fundada insuficiência de bens penhoráveis. No cadastro E. de Activos penhoráveis apenas consta um veículo. Art. 8 do RGIT", com a referência que "juntam-se cópias de despacho e das certidões de dívida" - Cfr. fls. 78 do PEF, apenso.
g) Em 12-10-2010, no âmbito do processo nº 1.../2008.0..., foi
efectuada a penhora do veículo de marca R., com a matrícula 00-00-00 - Cfr. fls. 87 do PEF, apenso.

h) O veículo referido na alínea antecedente encontrava-se registado em nome da devedora originária - Cfr. Idem.
i) Em 06-02-2013 foi, no âmbito do Processo de Execução Fiscal referido em a), adjudicado o veículo penhorado, pelo valor de €5 166,00 - Cfr. fls. 128 do PEF, apenso.
j) Em 29-12-2009, foi apresentado requerimento executivo no Tribunal Judicial de L., pela devedora originária "S., Lda" para pagamento da quantia de €13 375,45 contra "R. - E. E., Lda" - Cfr. fls. 35 a 42.
k) No Sistema de Gestão de Contribuintes da Administração Tributaria consta, para efeitos de IVA, o ora Oponente como gerente da devedora originária, "S., Lda" - Cfr. Doc. n.º 3 junto à Contestação, a fls. 61 a 65 dos autos.»
X
Em sede de fundamentação da matéria de facto, consignou-se:
«A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou do exame dos documentos não impugnados e das informações oficiais constantes dos autos, conforme referido em cada uma das alíneas do probatório.»
X
Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
l) A sociedade devedora originária [SDO] – "S., Lda" – foi constituída em 28.04.2006 – fls. 57/62, do pef.
m) A sociedade devedora originária – "S., Lda" -, era uma sociedade por quotas, com a composição seguinte: i) €2.500,00 – J. M. S. A.; €2.500,00 – Z. S. A.; €2.500,00 – S. K. S. V. – fls. 57/62, do pef.
n) Em 23.06.2010, a SDO foi citada, através da pessoa do oponente, para os termos da execução fiscal n.º 1... e apensos, quantia exequenda: €19.912,69 – certidão de fls. 22, do pef.
o) Em 02.09.2010, o recorrido/oponente, J. M. S. A., dirigiu em nome da SDO, ao Chefe do Serviço de Finanças de S., pedido de levantamento das penhoras existentes nas execuções fiscais que correm termos contra a mesma –fls. 95 dos autos.
p) Em anexo à certidão de citação referida na alínea n) constam os elementos seguintes: IRS, ret/font, 2007 - €1.912,91; IRS, ret/font, 2008 - €124,00; IVA – 07-2008 a 09-2008 - €13.192,20; IRS, ret/font, 2008 - €103,00; Coima, 2009 - €60,69; outros encargos – 2009 - €48,00; Coima, 2009 - €60,69; outros encargos – 2009 - €48,00; Coima, 2009 - €131,30; outros encargos – 2009 - €48,00; Coima, 2008 - €422,94; outros encargos – 2008 - €48,00; Coima, 2008 - €216,48; outros encargos – 2008 - €48,00 – fls. 23 do pef.
q) Com o pedido de pagamento em prestações da dívida exequenda, referido em b), o oponente, em nome da SDO, apresentou como garantia o veículo R. 00-00-00, 2000 – fls. 26 do pef.
r) Em 03.09.2010,com base na informação dos serviços, o Chefe do Serviço de Finanças de S., com base nas informações referidas, exarou despacho de deferimento do pedido de levantamento das penhoras – fls. 36 do pef.
s) Em 15.06.2011, o Chefe de Finanças, com base na informação dos serviços, determinou a exclusão da executada do plano de pagamento em prestações e a prossecução dos autos de execução – fls. 55 do pef.2.
t) Do despacho de reversão referido em e), consta que “Face às diligências de fls. 18 a 72…” – fls. 93 do pef.
u) O órgão de execução fiscal procedeu à notificação de penhora de créditos em relação aos devedores da SDO seguintes: “I. – A. E. A., Lda.” (fls. 7 do pef); H. P. M. (fls. 8 do pef); “R. – E. E., Lda.” (fls. 9 do pef); “S. C. – S. U., Lda.” (fls. 10 do pef); “N Z P. E. R., Lda.” (fls. 51 do pef).
v) As notificações referidas na alínea anterior revelaram-se infrutíferas – “devolvidas / não reconhece a obrigação” – fls. 206/218.
x)Da certidão de dívida n.º 2008/3..., consta IRS/2007 - €2.100,00, data limite de pagamento – 20.11.2007 – fls. 229.
z) Da certidão de dívida n.º 2008/5..., consta Coima e outros encargos - €470,00 – data limite de pagamento – 05.05.2008 – fls. 230.
aa) Da certidão de dívida n.º 2008/1..., consta IRS/2008 - €103.00 – data limite de pagamento – 20.10.2008 – fls. 231.
bb) Da certidão de dívida n.º 2008/2..., consta IVA/2008 – data limite de pagamento – 17.11.2009 – fls. 232.
cc) Da certidão de dívida n.º 2008/5..., consta Coima e outros encargos - €264,48 – data limite de pagamento – 18.11.2008 – fls. 233.
dd) Da certidão de dívida n.º 2009/5..., consta IRS/2008 - €124,00 – data limite de pagamento 20.12.2008 – fls. 234.
ee) Da certidão de dívida n.º 2009/5..., consta Coima e outros encargos - €108,69 - data limite de pagamento - 15.04.2009 – fls. 235.
ff) Da certidão de dívida n.º 2009/5..., consta Coima e outros encargos - €108,69 - data limite de pagamento - 19.04.2009 – fls. 236.
gg) Da Certidão de dívida n.º 2009/5..., consta Coima e outros encargos - €179,30 - data limite de pagamento - 20.05.2009 – fls. 237.
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2.2. De Direito
2.2.1. Vem sindicada a sentença proferida a fls. 129/147, que julgou procedente a Oposição à Execução Fiscal intentada por J. M. G. S. A. contra o processo de execução fiscal instaurado pelo serviço de finanças de S., por reversão de dívidas relativas a IVA, IRS e coimas, no valor total de € 12.048,16.
2.2.2. A sentença julgou procedente a oposição com base na falta de demonstração da gerência efectiva do oponente durante o período relevante.
O presente segmento decisório é colocado sob censura por parte da recorrente, imputando ao mesmo o desvalor da nulidade por excesso de pronúncia (1), bem como erro de julgamento, porquanto o oponente terá sido gerente de facto durante o período relevante, sendo legítima a reversão operada com base no disposto no artigo 24.º/1/b), da LGT em causa nos autos (2).
2.2.3. A recorrente assaca à sentença sob recurso o desvalor da nulidade por excesso de pronúncia, porquanto a mesma apreciou questão que não terá sido alegada pela parte, a saber: a falta de demonstração do pressuposto da responsabilidade subsidiária do exercício efectivo da gerência por parte do oponente/revertido.
«É nula a sentença quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento» - artigo 615.º/1/d), do CPC.
«O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras» - artigo 608.º/2 do CPC.
«Haverá excesso de pronúncia se o tribunal, apesar de se limitar a apreciar um pedido que foi formulado, exceder os seus poderes de cognição quanto à causa de pedir, violando a regra da identidade de causa de pedir causa de julgar, por exemplo, anulando um acto com base em vício não invocado» (1)
No caso em exame, a presente oposição centra-se sobre o pedido de extinção da execução, «por ilegitimidade e inexistência de culpa». O articulado em apreço estrutura-se da forma seguinte: “Da falta de fundamentação do despacho que determinou a reversão”; “Da ilegitimidade do requerente relativamente à presente reversão e da inexistência de culpa”; na parte de “Direito” do mesmo, invoca-se a falta de demonstração da insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário.
Por seu turno, a sentença considerou que o pressuposto da gerência de facto do revertido no período relevante não se mostra comprovado, ónus que recai sobre a Fazenda Pública, o que constitui fundamento da ilegitimidade do oponente, o que acarreta a extinção da execução, quanto ao oponente.
Compulsado o teor das alegações vertidas na petição inicial de oposição (artigos 37.º a 55.º), verificamos que o recorrido/oponente contesta a demonstração por parte da exequente da verificação do pressuposto da gerência efectiva por conta do oponente/recorrido.
De onde se impõe concluir que o tribunal, ao conhecer da falta de demostração do pressuposto da reversão da gerência de facto, conheceu de questão de que cumpre conhecer (artigo 608.º/2, do CPC), não incorrendo, por isso, em excesso de pronúncia, o que determina a improcedência da presente imputação (artigo 615.º/1/d), do CPC).
Temos em que se impõe julgar improcedente o presente esteio de recurso.
2.2.4. A recorrente censura a sentença recorrida, por considerar que a mesma incorre em erro de julgamento quanto ao pressuposto da responsabilidade subsidiária da gerência efectiva.
Alega, em síntese, que: i) a sociedade devedora originária obrigava-se mediante a intervenção conjunta de dois gerentes, donde se conclui que o Oponente possuía uma intervenção pessoal e activa na sua vinculação, uma vez que a viabilidade funcional da devedora originária só podia ser concretizada com sua intervenção; ii) jamais foi carreado para os presentes autos qualquer elemento probatório que ateste a destituição ou renúncia do Oponente ao cargo de gerente da sociedade devedora originária; iii) o Oponente consta, para efeitos de IVA, como gerente da sociedade devedora originária, em conformidade com o postulado na alínea k) dos factos dados como provados na Douta Sentença, nunca tendo sido comunicada qualquer alteração a esse facto, o que sempre se impunha, caso tal alteração acontecesse, por força do postulado nos artigos 31º e 32.º do Código do IVA.
Vejamos.
O exercício da gerência efectiva por parte do revertido constitui pressuposto da efectivação da responsabilidade subsidiária.
A este propósito de referir que «compete à AT invocar como fundamento da reversão que o revertido exerceu efectivas funções como gerente no período a considerar. Se o não fizer, e se limitar a invocar a gerência de direito como fundamento da reversão, não pode o tribunal com competência para o julgamento da matéria de facto inferir a gerência efectiva da gerência de direito. [N]ão pode a Fazenda Pública pretender, ao abrigo da referida presunção judicial – que não constitui mais do que a possibilidade do uso das regras da experiência concedida ao julgador no julgamento da matéria de facto -, que ao abrigo dessa possibilidade concedida ao julgador, que fica dispensada de alegar essa gerência efectiva, o efectivo exercício de funções de gerência, como requisito para reverter a execução ao abrigo do artigo 24.º da LGT» (2)

Existe gerência de facto «quando alguém – ainda que de modo esporádico e apenas em relação a um único pelouro da empresa – exterioriza de algum modo a representação da vontade social por meio de actos substantivos e materiais, vinculando terceiros» [Ac. do TCA Sul, de 09.02.99, P. 00227/97]. O que importa não é a relação jurídico-civil entre o oponente e a sociedade, mas antes a relação entre ele a vida da sociedade, a ponto de se poder comprovar a imediação entre a vontade por si externada e a vontade a imputável à sociedade e, como consequência, aferir do grau de censurabilidade que a sua actuação implicou para a garantia patrimonial dos credores da mesma. Por outras palavras, o que releva é o exercício de representação da empresa face a terceiros (credores, trabalhadores, fisco, fornecedores, entidades bancárias) de acordo com o objecto social e mediante os quais o ente colectivo fique vinculado.
Se é verdade que «[d]a nomeação para gerente ou administrador (gerente de direito) de uma sociedade resulta uma parte da presunção natural ou judicial, baseada na experiência comum, de que o mesmo exercerá as correspondentes funções, por ser co-natural que quem é nomeado para um cargo o exerça na realidade; // Contudo, desde a prolação do acórdão do Pleno da Secção de CT do STA de 28-2-2007, no recurso n.º 1132/06, passou a ser jurisprudência corrente de que para integrar o conceito de tal gerência de facto ou efectiva cabia à AT provar para além dessa gerência de direito assente na nomeação para tal, de que o mesmo gerente tenha praticado em nome e por conta desse ente colectivo, concretos actos dos que normalmente por eles são praticados, vinculando-o com essa sua intervenção, sendo de julgar a oposição procedente quando nenhuns são provados» (3)

No caso em exame, do probatório resultam os elementos seguintes:
Estão em causa dívidas IVA, de IRS e de coimas, respeitantes ao período de 2007 a 2009 (4)

A sociedade devedora originária foi constituída em 28.04.2006 (5)

A sociedade devedora originária era uma sociedade por quotas, com a composição seguinte: i) €2.500,00 – J. M. S. A.; €2.500,00 – Z. S. A.; €2.500,00 – S. K. S. V. (6)

A gerência da devedora originária, "S., Lda", pertencia ao ora Oponente e a S. K. S. V., sendo que a pessoa colectiva se obrigava com a intervenção conjunta de dois gerentes (7)

No Sistema de Gestão de Contribuintes da Administração Tributaria consta, para efeitos de IVA, o ora Oponente como gerente da devedora originária, "S., Lda"(8)

Em 23.06.2010, o recorrido/oponente apresentou requerimento, enquanto representante da devedora originária, "S., Lda", solicitando o pagamento em prestações nos termos do artigo 196.º do CPPT (9)

Em 23.06.2010, o recorrido/oponente, assinou, em nome da sociedade devedora originária, o ofício de citação para os termos da presente execução fiscal (10)

Em 02.09.2010, o recorrido/oponente dirigiu em nome da sociedade devedora originária, ao Chefe do Serviço de Finanças de S., pedido de levantamento das penhoras existentes nas execuções fiscais que correm termos contra a mesma (11)

Dos elementos coligidos nos autos, resulta que o oponente foi gerente da sociedade devedora originária, desde a sua constituição até, pelo menos 2010, sendo a forma de obrigar da mesma através da assinatura dos dois gerentes. O oponente nunca participou a renúncia à gerência.
De onde se impõe concluir que o recorrido/oponente exerceu a gerência efectiva no período relevante, relativo às dívidas do período de 2007 a 2009.
Ao julgar em sentido discrepante, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, pelo que não se pode manter na ordem jurídica. Deve ser substituída por decisão que aprecie dos demais fundamentos da oposição.
2.2.5. Havendo elementos nos autos e observado o contraditório prévio, impõe-se o conhecimento dos demais fundamentos da oposição.
Pese embora a notificação de fls. 191/192, determinada por este TCAS, as partes não proferiram alegações complementares, nos termos do disposto no artigo 665.º/3, do CPC.
Na petição inicial de oposição, o oponente/recorrido invoca contra a reversão da presente execução os argumentos seguintes:
i) Falta de demonstração da insuficiência de bens penhoráveis da SDO.
ii) Falta de demonstração da culpa do responsável subsidiário no não pagamento das dívidas, no que respeita à reversão por dívidas tributárias.
iii) Inconstitucionalidade do artigo 8.º do RGIT, por violação dos princípios constitucionais da intransmissibilidade das penas (artigo 30.º/3, da CRP) e da presunção da inocência (artigo 32.º/2, da CRP), no que respeita à reversão por coimas.
iv) Falta de demonstração da culpa do revertido na insuficiência patrimonial da SDO, no que respeita à reversão por coimas.
2.2.6. Enquadramento
Está em causa a reversão contra o oponente do Processo de Execução Fiscal n.º 1... e apensos, instaurado pelo Serviço de Finanças de S., para cobrança coerciva de dívidas de IVA, de IRS e de coimas, respeitantes ao período de 2007 a 2009, ao abrigo do disposto no artigo 24.º/1/b), da LGT.
2.2.7. No que respeita à falta de demonstração da insuficiência de bens penhoráveis da SDO, cabe referir o seguinte.
«O conceito «fundada insuficiência» constante do nº2 do artigo 23º da LGT e da alínea b) do nº 2 do artigo 153º do CPPT, deve ser fixado objectivamente com recurso aos conhecimentos técnicos, de forma a obter uma avaliação rigorosa dos bens penhorados e penhoráveis do devedor originário, não podendo ser preenchido subjectivamente através da avaliação que o funcionário que lavra o auto de penhora faça sobre o valor dos bens penhorados.
Tratando-se de bens penhoráveis, incumbia à A. Fiscal averiguar sobre o seu estado e valor, para a partir daí poder extrair uma conclusão justificada e segura sobre a respectiva suficiência ou insuficiência para pagamento da dívida exequenda e sustentar a legalidade da reversão contra o devedor subsidiário.
Ao lançar mão do conceito indeterminado de “insuficiência” de bens, exigindo até que tal insuficiência seja “fundada”, a lei obriga a que o órgão da execução fiscal faça uma investigação aturada sobre a existência de bens no património do devedor originário ou dos responsáveis solidários.
Nos termos do artigo 23.º/2, da LGT, compete à Administração Fiscal o ónus da prova de que se verificam os factos que integram o fundamento, previsto na lei, para que possa chamar à execução os responsáveis subsidiários e reverter contra eles o processo executivo, cabendo-lhe, por isso, demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes» (12)

No caso em exame, está em causa a cobrança de dívidas no montante de € 12.048,16.
Dos elementos coligidos nos autos resulta que o órgão de execução fiscal realizou diligências que comprovam a fundada insuficiência patrimonial da executada originária, na medida em que os bens penhoráveis da mesma (e objecto de penhora) não garantem o cumprimento da dívida em execução. Ou seja, quer no que respeita ao veículo penhorado, (13) quer no que respeita aos alegados créditos sobre os terceiros, (14) o seu valor não permite perfazer a quantia objecto de execução. Matéria que não logra ser contestada por parte do revertido/oponente, dado que não apresenta elementos que a contradigam. De onde se extrai a comprovação da necessidade de recorrer ao património de terceiro para solver a dívida exequenda, no caso, o revertido, ou seja, existe fundada insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária para solver a dívida exequenda, pressuposto da reversão operada, pelo que o requisito em apreço mostra-se fundamentado.

Em face do exposto, impõe-se julgar improcedente a presente imputação.
2.2.8. No que respeita à alegada falta de culpa do oponente no não pagamento das dívidas tributárias, cumpre referir o seguinte.
O oponente invoca a falta de comprovação da sua culpa no não pagamento da dívida exequenda.
O regime estabelecido no artigo 24.º, n.º 1, alíneas a) e b), da LGT é o seguinte:
Nas hipóteses da alínea a), «[t]tratam-se das dívidas cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois, respondem patrimonialmente os administradores ou gerentes quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação». (15)

Nas hipóteses da alínea b), «[o]s administradores ou gerentes das empresas respondem pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo, quando não prove, que não lhes foi imputável a falta de pagamento» (16)

A distinção entre a alínea a) e a alínea b) do n.º 1, do artigo 24.º da LGT, no que respeita à repartição do ónus da prova, «parte da distinção fundamental entre “dívidas tributárias vencidas” no período do exercício do cargo e “dívidas tributárias vencidas” posteriormente» (17).

Assim, o ónus da prova da culpa da insuficiência patrimonial recai sobre a AT (alínea a)), enquanto que o ónus da prova da ausência de culpa no não pagamento atempado da obrigação tributária recai sobre o revertido (alínea b)).
No caso, não foram alegados factos concretos que interrompam o nexo de imputação da responsabilidade do oponente pelo não pagamento, enquanto gerente efectivo da SDO no período em que as dívidas foram postas a pagamento. Em face do incumprimento dos créditos tributários, o oponente podia e devia ter adoptado conduta no sentido de satisfação dos créditos em causa, obstando ao funcionamento de uma sociedade sem condições para assegurar as dívidas ao Estado, pelo que a falta de diligência no cumprimento das dívidas tributárias é-lhe imputável.
Em face do exposto, impõe-se julgar improcedente a presente imputação.
2.2.9. No que respeita à reversão por coimas, cumpre analisar, quer a argumentação relativa à inconstitucionalidade da reversão operada por referência às dívidas de coimas, quer a alegada falta de culpa do oponente no não pagamento das mesmas.
2.2.10. O oponente invoca que o artigo 8.º do RGIT (18) padece de inconstitucionalidade material por violação dos princípios constitucionais da intransmissibilidade das penas (artigo 30.º/3, da CRP) e da presunção da inocência (artigo 32.º/2, da CRP).

Vejamos.
A este propósito, dir-se-á que: «[n]ão [se coloca] em causa que o ente colectivo constitui um sujeito jurídico autónomo face aos administradores ou gerentes, sendo sobre ele que recai originariamente a responsabilidade tributária pelo imposto ou a responsabilidade civil pelo não pagamento da coima. No entanto, não podemos estranhar que a responsabilidade se dirija às pessoas concretas que ocupem uma posição de liderança dentro do ente colectivo, impondo àquelas o pagamento da coima, no caso de elas terem tido culpa na insuficiência patrimonial do ente colectivo que conduziu ao não pagamento» (19).

É que a responsabilidade tributária prevista no citado artigo 8.º do RGIT corresponde a «uma responsabilidade de cariz ressarcitório, fundada numa conduta própria, posterior e autónoma relativamente àquela que motivou a aplicação da sanção à pessoa colectiva. O chamamento do terceiro a responder pela quantia que não foi possível obter mediante execução do património do primitivo devedor resulta de ser imputada a uma sua conduta culposa a não satisfação das “relações de crédito emergentes da aplicação de multas ou coimas” às pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados a que a sanção foi aplicada. Não é a sanção aplicada pelo ilícito contra-ordenacional que se transmite, mas a responsabilidade culposa pela frustração da satisfação do crédito correspondente que se efectiva contra o gerente ou administrador que, incumprindo deveres funcionais, não providenciou no sentido de que a sociedade efectuasse o pagamento da coima em que estava definitivamente condenada e deixou criar uma situação em que o património desta se tornou insuficiente para assegurar a cobrança coerciva» (20)
Do exposto se infere que a reversão operada com base no disposto no artigo 8.º do RGIT, incide sobre as quantias pecuniárias a liquidar pela sociedade arguida, pelo que não contendem, nem relevam no quadro da responsabilidade contra-ordenacional desta última. Ao invés, trata-se de uma responsabilidade legal pelo dano causado ao Estado pela falta de pagamento das quantias em causa. O que afasta os argumentos da inconstitucionalidade material aventados.
Em face do exposto, não se vê como acompanhar a tese da inconstitucionalidade do preceito do artigo 8.º do RGIT, por violação dos princípios constitucionais da intransmissibilidade da pena e da presunção da inocência.
Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente imputação.
2.2.11. No que respeita à alegada falta de culpa do revertido no não pagamento das dívidas de coimas, cumpre referir o seguinte.
O oponente invoca a falta de demonstração da sua culpa no não pagamento das quantias em causa.
«O artigo 8.º do RGIT não consagra qualquer presunção de culpa e, portanto, é sobre a Administração Tributária que recai o ónus de demonstrar a culpa do revertido pela insuficiência do património social da originária devedora de que possa prevalecer-se a AT, pelo que lhe cabe alegar, em sede de acto de reversão, a culpa do gerente por essa insuficiência como pressuposto necessário da efectivação da sua responsabilidade subsidiária. (cfr. art. 342º, nº 1, do CC)» (21)

Dos elementos coligidos nos autos resulta que a exequente não alegou, nem demonstrou a culpa do revertido no não pagamento das dívidas de coimas. De onde se infere que a reversão da execução por dívidas de coimas ofende o preceito do artigo 8.º do RGIT, no qual se exige a alegação e demonstração da culpa do revertido no não pagamento das quantias em causa. Ónus que não foi observado pela parte onerada.

Em face do exposto, a oposição deve proceder quanto ao fundamento em presença.
Motivo porque se impõe julgar extinta a execução, quanto ao oponente, no que respeita às dívidas em apreço.

Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em julgar procedente o recurso, revogar a sentença recorrida e, em substituição, julgar improcedente a oposição, salvo quanto à reversão por coimas, determinando a extinção da execução, nesta parte, quanto ao oponente.
Custas pela recorrente e pelo recorrido em função do decaimento.
Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)


(1ª. Adjunta – Cristina Flora)

(2ª. Adjunta – Ana Pinhol)

1) Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado, Vol. II, 6ª Edição, p. 366.
2) Francisco Rothes, «Em torno da efectivação da responsabilidade dos gerentes – algumas notas motivadas por jurisprudência recente», I Congresso de Direito Fiscal, Vida Económica, pp. 45/64, maxime, p. 56/57.
3) Ac. do TCAS, de 20.09.2011, P. 04404/10.
4) Alíneas x) a gg), do probatório.
5) Alínea l) do probatório.
6) Alínea m), do probatório.
7) Alínea d), do probatório.
8) Alínea k); do probatório.
9) Alínea b); do probatório.
10) Alínea n); do probatório
11) Alínea o); do probatório
12) Acórdão TCAS, de 13.10.2016, P. 09123/15.
13) Alíneas g) a i), do probatório.
14) Alíneas t) a v), do probatório.
15) Paulo Marques, Responsabilidade Tributária dos gestores e dos técnicos oficiais de contas, A reversão do processo de execução fiscal, Coimbra Editora, 2011, pp. 154/15 16)Paulo Marques, Responsabilidade…, cit., pp. 167/168.
17)Ac. do STA, de 23.06.2010, P. 0304/10
18) O artigo 8.º do RGIT tem a redacção seguinte: «1. Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração em pessoas colectivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades fiscalmente equiparadas são subsidiariamente responsáveis: //a) Pelas multas ou coimas aplicadas a infracções por factos praticados no período do exercício do seu cargo ou por factos anteriores quando tiver sido por culpa sua que o património da sociedade ou pessoa colectiva se tornou insuficiente para o seu pagamento. // b) Pelas multas ou coimas devidas por factos anteriores quando a decisão definitiva que as aplicar for notificada durante o período o exercício do seu cargo e lhes seja imputável a falta de pagamento».
19) Paulo Marques, Pedro Correia Gonçalves e Rui Marques, Responsabilidade tributária e penal dos gestores, Advogados, Contabilistas e Auditores, Almedina, 2018, pp. 214/215.
20) Acórdão do TC, n.º 234/2009, de 12.05.2009.
21) Acórdão do TCAS, de 10.07.2015, P. 08731/15.