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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08889/15
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:12/16/2015
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”).
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
CONHECIMENTO EM SUBSTITUIÇÃO. ARTº.665, DO C.P.CIVIL.
FIXAÇÃO DO VALOR DA CAUSA. ARTº.97-A, DO C.P.P.T.
VALOR DA CAUSA NO MEIO PROCESSUAL ACESSÓRIO DE INTIMAÇÃO PARA PASSAGEM DE CERTIDÃO.
ALÇADA DOS T. C. ADMINISTRATIVOS.
CAUSAS DE EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA.
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE (CFR.ARTº.277, AL.E), DO C.P.CIVIL). NOÇÃO.
MEIO PROCESSUAL ACESSÓRIO DE INTIMAÇÃO PARA PASSAGEM DE CERTIDÃO.
ARTº.536, Nº.3, DO C.P.CIVIL.
RESPONSABILIDADE PELAS CUSTAS.
EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA DEVIDO A INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE.
Sumário:1. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr.artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil).

2. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma.

3. De acordo com o artº.665, do C. P. Civil, aplica-se no processo vertente a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, nos termos da qual os poderes de cognição deste Tribunal Central Administrativo Sul incluem todas as questões que ao tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, tudo ao abrigo do princípio da economia processual, o qual, no caso concreto, se sobrepõe à eventual preocupação de supressão de um grau de jurisdição.

4. Os critérios de fixação do valor da causa previstos neste artº.97-A, do C.P.P.T., não se aplicam a processos não impugnatórios, designadamente aos meios processuais acessórios de intimação para passagem de certidão (cfr.artº.147, do C.P.P.T.; artºs.104 a 108 do C.P.T.A.). Em relação a estes processos, deverá levar-se em consideração os critérios de fixação do valor da causa, para efeitos de custas, previstos no artº.12, do Regulamento das Custas Processuais, ou subsidiariamente, será o mesmo determinado de acordo com as regras do artº.31 e seg. do C.P.T.A., e do artº.296 e seg. do C.P.Civil.

5. No que, especificamente diz respeito ao meio processual acessório de intimação para passagem de certidão, deve levar-se em consideração o regime de fixação do valor da causa previsto no C.P.T.A. Com este tipo de processo o interessado pode aceder a informação procedimental que abrange não apenas a consulta de processos e passagem de certidões, mas também e ainda o pedido de informações e esclarecimentos, ou seja, configura-se como um meio processual destinado a tutelar o direito à informação constitucionalmente garantido nos termos do artº.268, nºs.1 e 2, da C.R.P. Ou seja, não se encontra correspondência económica para este direito que possa ser subsumida a qualquer um dos critérios enunciados nos artºs.32 e 33, do C.P.T.A. Há, assim, que fazer apelo ao disposto no artº.34, do mesmo diploma, norma que consagra um critério supletivo para fixação do valor e que se refere a bens imateriais. Dispõe o citado artº.34, nº.2, do C.P.T.A., que quando o valor da causa seja indeterminável, visto dizer respeito a processos respeitantes a bens imateriais, considera-se superior ao da alçada do T.C.A.

6. A alçada dos T. C. Administrativos corresponde à que se encontra estabelecida para os tribunais da Relação (cfr.artº.6, nº.4, do E.T.A.F.), sendo de € 30.000,00, pelo que o valor da causa nos processos a que se refere o artº.34, do C.P.T.A., é de € 30.000,01 (cfr. artº.303, nº.1, do C.P.Civil).

7. Entre as causas de extinção da instância do processo declarativo, as quais são aplicáveis à execução supletivamente, conforme dispõe o artº.551, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, vamos encontrar a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide (cfr.artº.277, al.e), do C.P.Civil).

8. Esta causa de extinção da instância contém dois requisitos que necessitam estar verificados para a sua aplicação. São eles, a inutilidade da lide, e que essa inutilidade decorra de facto posterior ao início da instância, para poder dizer-se que é superveniente, a qual dá lugar à mesma extinção da instância sem apreciação do mérito da causa.

9. Só se verifica a inutilidade superveniente da lide quando essa inutilidade for uma inutilidade jurídica. A utilidade da lide correlaciona-se, assim, com a possibilidade da obtenção de efeitos úteis da mesma pelo que a sua extinção só deve ser declarada quando se conclua que o seu prosseguimento não poderá trazer quaisquer consequências vantajosas para o autor/recorrente.

10. Especificamente quanto ao meio processual acessório de intimação para passagem de certidão a respectiva inutilidade superveniente da lide deve estar umbilicalmente ligada à constatação de que a certidão pedida pelo requerente já foi, entretanto, estruturada pela Administração Pública, tudo no âmbito do exercício do direito à informação, o qual é comummente identificado como um corolário dos princípios da publicidade e da transparência que devem nortear toda a actividade administrativa.

11. O artº.536, nº.3, do C.P.Civil, é inspirado pelo princípio de que, não havendo sucumbência, não é legítimo onerar o réu ou o demandado com o pagamento das custas da acção, por ele não ter dado origem ao facto determinante da inutilidade superveniente da lide, o que constitui corolário do princípio da causalidade na sua formulação negativa. Pelo contrário, se a inutilidade for imputável ao réu ou requerido, será este o responsável pela totalidade das custas.
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2. No caso concreto, é nosso entendimento que, não se podendo afirmar que a demanda do autor/recorrente, no momento em que apresentou o requerimento inicial do presente meio processual acessório de intimação para passagem de certidão, não era fundada, temos que concluir que a inutilidade superveniente que veio a ocorrer e que gerou a extinção da instância (traduzida na efectiva passagem da certidão pedida por parte do 8º. Serviço de Finanças de Lisboa, embora para lá do prazo máximo de cinco dias previsto na lei para o efeito - cfr.artº.24, nº.2, do C.P.P.T.) não pode deixar de ser imputável, para efeitos de apurar a responsabilidade pelas custas, à Fazenda Pública, nos termos do artº.536, nº.3, 2ª. parte, do C.P.C.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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"BANCO ………………., S.A.", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto decisão judicial proferida pela Mmª. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.40 a 42 dos autos a qual, no presente meio processual acessório de intimação para passagem de certidão, oportunamente por si deduzido, julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, mais condenando as partes nas custas em igual proporção (1/2 para cada).
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O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.108 a 118 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-Decidiu-se na sentença recorrida julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide e condenar o recorrente em metade do valor das custas devidas no processo, não tendo por outro lado sido fixado o valor da causa, conforme tinha sido peticionado pelo apelante;
2-Em conformidade, a sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 125 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e dos artigos 195 e 199 do Código de Processo Civil (ex vi da alínea e) do artigo 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário), o que deverá ser declarado para os efeitos relevantes, com as legais consequências;
3-O recorrente foi condenado no pagamento de metade do valor das custas da presente acção por na sentença se ter considerado que o mesmo teria dado causa parcial à inutilidade superveniente da lide, por, apesar de a entidade requerida não ter notificado ou por outra via informado o recorrente de que a certidão fora emitida "e atendendo a que a certidão não foi emitida no prazo legalmente previsto, nada obstava a que a requerente, antes de apresentar a presente acção, diligenciasse junto da requerida para se certificar de que a sua pretensão não se encontrava satisfeita, e de que a instauração da presente acção era necessária, pelo que há que concluir que ambas deram causa à acção para efeitos de custas";
4-O recorrente não aceita a conclusão do Tribunal a quo, já que considera que foi a actuação ilegal da entidade requerida que deu causa à acção e que a não condenação desta na totalidade das custas redunda num claro "benefício do infractor";
5-Com efeito, de uma primeira leitura do disposto no número 3 do artigo 536 do Código de Processo Civil resulta o princípio geral de que, nos casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor. No entanto, na mesma norma são expressamente excepcionados daquela regra geral os casos em que tal impossibilidade ou inutilidade seja imputável ao réu ou requerido, caso em que é este o responsável exclusivo pelo pagamento das custas;
6-Por sua vez, resulta do artigo 535 do Código de Processo Civil, a contrario, que a responsabilidade pelas custas apenas será do autor ou recorrente quando, cumulativamente, estejam reunidos dois requisitos: o réu ou requerido não tenha dado causa à acção (nos termos previstos no número 2 do referido preceito legal); e o réu ou requerido não conteste a acção;
7-No caso concreto, resulta claro que não estão verificados os dois requisitos cumulativos que permitiriam a condenação do recorrente no pagamento das custas, desde logo porque no quadro factual fixado na sentença se apura que foi a entidade requerida quem deu causa à acção e à sua inutilidade superveniente: a intimação para passagem de certidão foi apresentada por não ter sido linearmente cumprido o prazo de emissão da certidão requerida e por o Serviço de Finanças de Lisboa - 8, em violação do dever de colaboração que lhe compete (como aliás é expressamente reconhecido na sentença recorrida) e ao arrepio do mais elementar bom senso, não ter informado o recorrente de que a certidão fora emitida;
8-E não se diga, como se faz na sentença recorrida, que ao recorrente competia confirmar a emissão da certidão previamente à interposição da acção, já que tal obrigação não decorre de qualquer norma ou sequer de um dever de colaboração com a Administração Tributária;
9-Acresce que, nos termos do número 1 do artigo 36 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, "[o]s actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados", o que significa que a emissão da certidão não produziu quaisquer efeitos na esfera do recorrente na data em que a entidade requerida afirma ter a mesma ocorrido (24 de Setembro de 2014), situação que se mantinha em 29 de Setembro de 2014, data de interposição da presente acção;
10-Não competia assim ao recorrente assegurar-se de que a certidão não fora ainda emitida, recorde-se, numa data que ultrapassava há muito o prazo previsto na lei para o efeito, antes competia à entidade requerida ter emitido a certidão no prazo que a lei estabelece para o efeito e ter, em qualquer hipótese, notificado o recorrente de tal emissão, sob pena de ineficácia;
11-Não poderá assim ser imputada ao recorrente qualquer responsabilidade pela inutilidade superveniente da lide: tal inutilidade é integralmente imputável à entidade requerida, na medida em que foi o seu comportamento notoriamente ilegal de não cumprimento do prazo que a lei lhe impunha para a emissão da certidão e de não notificação ao recorrente de tal emissão que deu causa à acção;
12-O recorrente considera assim que a decisão que o condenou no pagamento de custas está viciada de erro de julgamento, já que não deu causa à presente acção no sentido relevante para aqueles efeitos;
13-Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Exa. suprirá, deverá a sentença proferida nestes autos ser declarada nula, por omissão de pronúncia, sendo substituída por outra na qual seja fixado o valor da causa, com as legais consequências. Mais deverá ser revogada a condenação do recorrente em metade das custas.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de se conceder provimento ao recurso (cfr.fls.126 a 129 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A decisão recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.41 dos presentes autos - numeração nossa):
1-Em 5 de Setembro de 2014, a sociedade requerente, "Banco …………………, S.A.", dirigiu ao 8º. Serviço de Finanças de Lisboa um pedido de certidão (cfr.documento junto a fls.7 e 8 do processo apenso);
2-Pelo 8º. Serviço de Finanças de Lisboa foi emitida, com data de 24/9/2014, a certidão requerida (cfr.documento junto a fls.14 dos presentes autos);
3-A requerente não foi notificada da emissão da certidão requerida (cfr.informação do 8º. Serviço de Finanças de Lisboa junta a fls.27 dos presentes autos);
4-Em 29/9/2014 deu entrada neste Tribunal o articulado que originou a presente acção de intimação para passagem de certidão (cfr.data de entrada aposta a fls.2 dos presentes autos).
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Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
5-No final do articulado identificado no nº.4 supra, a sociedade requerente pediu que o 8º. Serviço de Finanças de Lisboa seja intimado a passar a certidão requerida, mais solicitando, ao abrigo do artº.97-A, nº.2, do C.P.P.T., que o Tribunal fixe o valor à causa, uma vez que se trata de situação não enquadrada em qualquer das alíneas do nº.1, do mesmo normativo (cfr.articulado junto a fls.2 e 3 dos presentes autos).
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a decisão recorrida, em síntese, julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, mais condenando as partes nas custas em igual proporção (1/2 para cada), visto concluir que ambas deram causa à acção para esse efeito.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do julgado, alegando, em primeiro lugar, que o Tribunal "a quo" não fixou o valor da causa, conforme tinha sido peticionado pelo apelante. Que a decisão recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do artº.125, do C.P.P.T., o que deverá ser declarado para os efeitos relevantes, com as legais consequências (cfr.conclusões 1 e 2 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar uma nulidade da decisão recorrida, devido a omissão de pronúncia.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.7029/13).
Revertendo ao caso dos autos, o Mmº. Juiz “a quo” não se pronunciou sobre um dos pedidos formulados pelo recorrente no final da p.i. que originou o presente processo (requere, ao abrigo do artº.97-A, nº.2, do C.P.P.T., que o Tribunal fixe o valor à causa, uma vez que se trata de situação não enquadrada em qualquer das alíneas do nº.1, do mesmo normativo - cfr.nº.5 do probatório). Donde se conclui que a sentença incorreu em omissão de pronúncia e, consequentemente, na nulidade a que se refere o artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, e artº.125, nº.1, “in fine”, do C.P.P.Tributário.
Mais se dirá que a nulidade em análise abrange toda a decisão recorrida e contende com a totalidade do seu segmento decisório.
Em conclusão, deve julgar-se totalmente procedente o recurso sob apreciação e, em consequência, declarar a nulidade da sentença recorrida, ao que se procederá na parte dispositiva do presente acórdão.
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Haverá, agora, que saber se, de acordo com o artº.665, do C.P.C., na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, se pode aplicar no processo vertente a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, nos termos da qual os poderes de cognição deste Tribunal Central Administrativo Sul incluem todas as questões que ao Tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, tudo ao abrigo do princípio da economia processual, o qual, no caso concreto, se sobrepõe à eventual preocupação de supressão de um grau de jurisdição.
Pensamos que sim, sendo manifesta a desnecessidade de cumprimento do contraditório plasmado no artº.665, nº.3, do C.P.Civil.
Avancemos, portanto, para o conhecimento dos mencionados pedidos, começando pela fixação do valor da causa nos termos do artº.97-A, do C.P.P.T.
Os critérios de fixação do valor da causa previstos neste artº.97-A, do C.P.P.T., não se aplicam a processos não impugnatórios, designadamente aos meios processuais acessórios de intimação para passagem de certidão (cfr.artº.147, do C.P.P.T.; artºs.104 a 108 do C.P.T.A.). Em relação a estes processos, deverá levar-se em consideração os critérios de fixação do valor da causa, para efeitos de custas, previstos no artº.12, do Regulamento das Custas Processuais, ou subsidiariamente, será o mesmo determinado de acordo com as regras do artº.31 e seg. do C.P.T.A., e do artº.296 e seg. do C.P.Civil (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.75).
No que, especificamente diz respeito ao meio processual acessório de intimação para passagem de certidão, deve levar-se em consideração o regime de fixação do valor da causa previsto no C.P.T.A. Com este tipo de processo o interessado pode aceder a informação procedimental que abrange não apenas a consulta de processos e passagem de certidões, mas também e ainda o pedido de informações e esclarecimentos, ou seja, configura-se como um meio processual destinado a tutelar o direito à informação constitucionalmente garantido nos termos do artº.268, nºs.1 e 2, da C.R.P. Ou seja, não se encontra correspondência económica para este direito que possa ser subsumida a qualquer um dos critérios enunciados nos artºs.32 e 33, do C.P.T.A. Há, assim, que fazer apelo ao disposto no artº.34, do mesmo diploma, norma que consagra um critério supletivo para fixação do valor e que se refere a bens imateriais. Dispõe o citado artº.34, nº.2, do C.P.T.A., que quando o valor da causa seja indeterminável, visto dizer respeito a processos respeitantes a bens imateriais, considera-se superior ao da alçada do T.C.A. (cfr.ac.T.C.A.Norte-1ª.Secção, 2/4/2009, proc.1993/08.5BEPRT; Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao C.P.T.A., Almedina, 3ª.edição, 2010, pág.213 e seg.).
A alçada dos T. C. Administrativos corresponde à que se encontra estabelecida para os tribunais da Relação (cfr.artº.6, nº.4, do E.T.A.F.), sendo de € 30.000,00, pelo que o valor da causa nos processos a que se refere o artº.34, do C.P.T.A., é de € 30.000,01 (cfr. artº.303, nº.1, do C.P.Civil; Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, ob.cit., pág.216).
Revertendo ao caso dos autos, enquadrando-se na previsão do artº.34, do C.P.T.A., o presente meio processual acessório de intimação para passagem de certidão, o valor da causa a fixar é de € 30.000,01, ao que se procederá na parte dispositiva do presente acórdão.
Passemos ao exame da declaração de inutilidade superveniente da lide decidida pelo Tribunal "a quo".
Entre as causas de extinção da instância do processo declarativo, as quais são aplicáveis ao processo judicial tributário supletivamente (cfr.artº.2, al.e), do C.P.P.T.), vamos encontrar a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide (cfr.artº.277, al.e), do C.P.Civil).
Esta causa de extinção da instância contém dois requisitos que necessitam estar verificados para a sua aplicação. São eles, a inutilidade da lide, e que essa inutilidade decorra de facto posterior ao início da instância, para poder dizer-se que é superveniente, a qual dá lugar à mesma extinção da instância sem apreciação do mérito da causa.
Também neste sentido segue a doutrina e a jurisprudência, ao referirem que a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide se dá quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo ou, por outro lado, porque encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a causa deixa de interessar - além por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outros meios (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 9/1/2013, rec.1208/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7433/14; José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil anotado, I vol., pág.512; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.307 e seg.).
Só se verifica a inutilidade superveniente da lide quando essa inutilidade for uma inutilidade jurídica. A utilidade da lide correlaciona-se, assim, com a possibilidade da obtenção de efeitos úteis da mesma pelo que a sua extinção só deve ser declarada quando se conclua que o seu prosseguimento não poderá trazer quaisquer consequências vantajosas para o autor/recorrente.
No que diz respeito ao meio processual acessório de intimação para passagem de certidão a respectiva inutilidade superveniente da lide deve estar umbilicalmente ligada à constatação de que a certidão pedida pelo requerente já foi, entretanto, estruturada pela Administração Pública, tudo no âmbito do exercício do direito à informação, o qual é comummente identificado como um corolário dos princípios da publicidade e da transparência que devem nortear toda a actividade administrativa.
O direito à informação, dos particulares face à Administração, encontra consagração constitucional desde a versão inicial do nosso diploma fundamental, datada de 1976, estando actualmente consagrado nos artºs.37, nº.1, e 268, nºs.1 e 2, da Constituição da República, na versão introduzida pela Lei Constitucional 1/2001, de 12/12.
Tal direito dos administrados pode considerar-se de natureza análoga aos “direitos liberdades e garantias” e está subordinado ao mesmo regime destes (cfr.artºs.17 e 18, da Constituição da República). Concretizando, o citado artº.268, da Constituição, consagra no seu nº.1, um direito fundamental à informação dos particulares directamente interessados num determinado procedimento administrativo, o qual exclui qualquer direito ao segredo por parte da Administração, a não ser quando o mesmo revista o carácter de dever funcional (v.g.segredo de justiça). O direito à informação engloba ainda um “feixe” de direitos instrumentais, como é a possibilidade de consulta do processo, de transcrição de documentos, de passagem de certidões, etc., enfim, um verdadeiro direito à transparência documental. Por sua vez o nº.2, do referido artº.268, consagra o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, como consequência do princípio do arquivo aberto ou da administração aberta. Com as ressalvas legais em matéria de segurança interna e externa, investigação criminal e intimidade das pessoas, a Constituição torna, assim, claro que a liberdade de acesso é a regra, constituindo os arquivos e registos um património aberto da colectividade (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/2/2014, proc.7285/14; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.819 e seg., em anotação ao artº.268; Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao C.P.T.A., Almedina, 3ª.edição, 2010, pág.690 e seg., em anotação ao artº.104).
No que concerne ao direito à informação procedimental, isto é, o direito à informação administrativa dos directamente interessados num procedimento de cariz administrativo e que esteja pendente, está este consagrado, desde logo, no artº.268, nº.1, da Constituição da República.
"In casu", conforme se conclui do exame da factualidade provada (cfr.nºs.1 e 2 do probatório), deve concluir-se pela verificação dos pressupostos do decretamento da extinção da presente instância devido a inutilidade superveniente da lide, dado que a certidão pedida pelo recorrente já foi, entretanto, estruturada pelo 8º. Serviço de Finanças de Lisboa, o que se decretará na parte dispositiva do presente acórdão.
Por último, cumpre examinar a decisão de condenação em custas no âmbito do presente processo.
O Tribunal "a quo", na decisão declarada nula por esta instância judicial de controlo, condenou as partes nas custas em igual proporção (1/2 para cada), visto concluir que ambas deram causa à acção, tudo conforme supra exarado.
Entende o recorrente que as custas do presente processo devem ser imputadas à entidade requerida, na medida em que foi o seu comportamento notoriamente ilegal de não cumprimento do prazo que a lei lhe impunha para a emissão da certidão e de não notificação ao recorrente de tal emissão que deu causa à acção.
As duas vertentes essenciais da conta ou liquidação de custas são a taxa de justiça e os encargos (as custas de parte têm um tratamento próprio e autónomo - cfr.artºs.25 e 26, do R.C.P.), conforme resulta do artº.529, do C.P.Civil, tal como do artº.3, nº.1, do R.C.P. Em relação a qualquer destas vertentes das custas se deve aplicar, necessariamente, a prévia decisão judicial que implicou a condenação em custas, da qual deriva o próprio acto de contagem (cfr.artº.30, nº.1, do R.C.P.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 13/3/2014, proc.7373/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/4/2015, proc.8416/15; Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais anotado e comentado, Almedina, 4ª. edição, 2012, pág.424).
No caso "sub judice" o que está em causa será estudar qual a parte que deve ser responsabilizada pelo pagamento das custas no âmbito do presente processo, no qual se decretou a extinção da instância devido a inutilidade superveniente da lide.
Para tanto deverá levar-se em consideração o artº.536, do C.P.Civil, do qual consta:
Artº.536
(Repartição das custas)
1 - Quando a demanda do autor ou requerente ou a oposição do réu ou requerido eram fundadas no momento em que foram intentadas ou deduzidas e deixaram de o ser por circunstâncias supervenientes a estes não imputáveis, as custas são repartidas entre aqueles em partes iguais.
2 - Considera-se que ocorreu uma alteração das circunstâncias não imputável às partes quando:
a) A pretensão do autor ou requerido ou oposição do réu ou requerente se houverem fundado em disposição legal entretanto alterada ou revogada;
b) Quando ocorra uma reversão de jurisprudência constante em que se haja fundado a pretensão do autor ou requerente ou oposição do réu ou requerido;
c) Quando ocorra, no decurso do processo, prescrição ou amnistia;
d) Quando, em processo de execução, o património que serviria de garantia aos credores se tiver dissipado por facto não imputável ao executado;
e) Quando se trate de ação tendente à satisfação de obrigações pecuniárias e venha a ocorrer a declaração de insolvência do réu ou executado, desde que, à data da propositura da ação, não fosse previsível para o autor a referida insolvência.
3 - Nos restantes casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, caso em que é este o responsável pela totalidade das custas.
4 - Considera-se, designadamente, que é imputável ao réu ou requerido a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou requerente, fora dos casos previstos no n.º 2 do artigo anterior e salvo se, em caso de acordo, as partes acordem a repartição das custas.

Não se enquadrando o caso dos autos no âmbito da previsão dos nºs.1 e 2 do preceito, deverá levar-se em consideração os ditames constantes do nº.3 da norma.
O que este nº.3 prescreve é inspirado pelo princípio de que, não havendo sucumbência, não é legítimo onerar o réu ou o demandado com o pagamento das custas da acção, por ele não ter dado origem ao facto determinante da inutilidade superveniente da lide, o que constitui corolário do princípio da causalidade na sua formulação negativa. Pelo contrário, se a inutilidade for imputável ao réu ou requerido, será este o responsável pela totalidade das custas (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/10/2014, proc.7948/14; Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais anotado e comentado, Almedina, 5ª. edição, 2013, pág.96 e seg.).
No caso concreto, é nosso entendimento que, não se podendo afirmar que a demanda do autor/recorrente, no momento em que apresentou o requerimento inicial do presente meio processual acessório de intimação para passagem de certidão, não era fundada, temos que concluir que a inutilidade superveniente que veio a ocorrer e que gerou a extinção da instância (traduzida na efectiva passagem da certidão pedida por parte do 8º. Serviço de Finanças de Lisboa, embora para lá do prazo máximo de cinco dias previsto na lei para o efeito - cfr.artº.24, nº.2, do C.P.P.T.) não pode deixar de ser imputável, para efeitos de apurar a responsabilidade pelas custas, à Fazenda Pública, nos termos do artº.536, nº.3, 2ª. parte, do C.P.C., o que se decretará.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, concede-se provimento ao recurso deduzido (no que se refere ao segmento de nulidade da decisão recorrida devido a omissão de pronúncia) e, nessa medida, revoga-se a decisão recorrida, mais se conhecendo dos pedidos formulados no processo conforme supra se deixou expresso, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
X
DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
1-CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO e declarar a nulidade da sentença recorrida, devido a omissão de pronúncia, ao abrigo do artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário;
2-CONHECENDO EM SUBSTITUIÇÃO:
a) Fixar o valor da causa em € 30.000,01 e;
b) Julgar extinta a presente instância devido a inutilidade superveniente da lide.
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Condena-se a Fazenda Pública em custas.
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 16 de Dezembro de 2015


(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)