Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:242/13.9BEBJA
Secção:CT
Data do Acordão:03/28/2019
Relator:ANA PINHOL
Descritores:RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
REVERSÃO
CULPA
Sumário:I. Nos termos do disposto no artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT, é sobre o gerente contra quem reverteu a execução fiscal que recai o ónus de alegar e demonstrar que não foi por culpa sua que não foi efectuado o pagamento das dívidas exequendas.

II. Nesta medida, o gerente tem pois que demonstrar que a devedora originária não tinha fundos para pagar os impostos e que a falta de meios financeiros não se deveu a qualquer conduta que lhe possa ser censurável.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES QUE CONSTITUEM A SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL



I.RELATÓRIO
A FAZENDA PÚBLICA (adiante recorrente) veio recorrer da decisão da Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja que julgou procedente a oposição deduzida contra a execução fiscal inicialmente instaurada contra a Sociedade «A..............., Lda» para cobrança coerciva de dívida de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do ano de 2006, no montante de 5.254,33€ e que reverteu contra José ................

A Recorrente apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:
«A
A reversão contra o ora oponente, foi efetuada com assento no disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT,

B
De cuja letra resulta uma presunção de responsabilidade subsidiária, por parte do revertido, na falta de pagamento dos impostos, cujo prazo terminou durante a sua gestão;

C
É assim ao responsável subsidiário que compete demonstrar que a devedora principal não tinha meios para pagar os impostos devidos, mas também que a inexistência desses meios não se deveu a qualquer conduta que lhe seja imputável e censurável,

D
Não incumbindo à Administração Tributária levar ao processo, quaisquer meios de prova da censurabilidade da conduta ou da responsabilidade pela falta de pagamento, mas sim ao revertido;

E
À AT incumbe demonstrar que o revertido foi efetivamente gerente de fato da devedora principal, no período em causa, o que é efetuado e nem sequer é contestado;

F
É bem verdade que o revertido tenta afastar essa responsabilidade, atribuindo-a quer o técnico oficial de contas, quer ainda à lamentável ocorrência, a nível familiar;

G
Mas, se por um lado, não é demonstrada a violação dolosa dos deveres que lhe incumbem, por parte do TOC, sempre a falta de pagamento dos impostos e a insuficiência de bens, é da responsabilidade de quem gere,

H
O que em momento algum é afastado!

I
É certo que o revertido se escuda na sua incapacidade para a gestão da empresa, dado o tipo de atividade desenvolvida e o óbito da sua filha,

J
Mas não é menos certo que resulta demonstrado que continuou a praticar atos de gestão da empresa, o que é manifestamente contraditório, com a alegada incapacidade resultante dos problemas emocionais que o afligiram,

K
Note-se que na esfera pessoal, o oponente adquiriu a quota restante da sociedade ao outro sócio,

L
E na esfera da empresa, enquanto gestor, não só continuou a usufruir de remuneração da empresa, conforme comunicado à AT, o que contraria a falta de cumprimento das obrigações por parte do TOC,

M
Mas também procedeu à alienação de património desta, como resulta da escritura de alienação, celebrada em 29 de Novembro de 2007,

N
Termos em que não vindo colocada em causa a gerência de fato da devedora principal pelo oponente, no período de pagamento dos impostos revertidos,

O
Não incumbindo à AT a prova da responsabilidade do revertido pela falta de pagamento desses impostos e também pela insuficiência do património,

P
Antes incumbindo ao revertido, a refutação dessa responsabilidade, como resulta da presunção ínsita na norma da alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º da LGT,

R
Trazendo a AT ao processo, elementos que contrariam a tese da suposta incapacidade gestionária do oponente, mas também da sua irresponsabilidade na insuficiência do património da devedora principal,

S
Tais como o auferir de remuneração, nos períodos em causa e também a alienação de património imobiliário da devedora principal,

T
Ressalvado o devido respeito pelo douto Tribunal “a quo”, que é muito, é manifesto que ao decidir no sentido em que o fez, fez errado julgamento dos fatos, impondo-se, Senhores Desembargadores, como é de Justiça, a revogação da sentença prolatada.
U
E em sua substituição, a emanação de douto Acórdão, que declarando improcedente a oposição deduzida, mantenha na ordem jurídica a reversão efetuada.».
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Neste Tribunal Central Administrativo, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer pronunciando-se, a final, no sentido da procedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
De acordo com o disposto no artigo 635.º, nº 4 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do Recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Com este pano de fundo, as questões apreciar e decidir consistem em saber:
- se a sentença recorrida padece de erro de julgamento na parte em que julgou que o ónus da prova relativamente à culpa do insuficiência do património cabe, na situação concreta, à Fazenda Pública;
- se a sentença recorrida face à factualidade apurada errou ao entender que o Oponente logrou demonstrar que a falta de pagamento dos tributos não é imputável à sua actuação.

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III. FUNDAMENTAÇÃO
A.DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a fundamentação respectiva que nos seguintes termos:
A) Em 17/07/2008 foi instaurado o processo de execução fiscal nº ............... contra a sociedade comercial em liquidação “A..............., Lda” por dívidas de IRC relativo ao exercício de 2006 e juros compensatórios conforme certidão de dívida que lhe está subjacente no montante de 5.254,33 euros;
B) A sociedade executada é detida totalmente por José ..............., sendo seu único gerente desde 09/06/2006;
C) Em 09/05/2013 foi exarado despacho referindo além do mais que:
“(…) Através da análise da instrução dos presentes autos constata-se a inexistência de bens pertencentes à executada e originária devedora “A..............., Lda” (…)
As informações oficiais prestadas referem o seguinte relativamente à mesma firma:
(…)
2. A sociedade não cessou a sua actividade para efeitos fiscais;
3. Até à presente data não se verificou a dissolução da sociedade;
(…)
6. Após as diligências efetuadas, nomeadamente consulta a todos os sistemas informáticos, para averiguação de existência de bens, verificou-se a insuficiência de bens da devedora originária decorrente da situação líquida negativa e em face de insolvência declarada pelo Tribunal;
7. Gerência (…) no términus do prazo legal de pagamento ou entrega do imposto em questão conforme cadastro da ATA;
8. Gerência de facto, decorrente da remuneração da categoria A auferida ao serviço da devedora originária no período em questão;
(…)
Perante a informação que antecede conclui-se que o sócio gerente de direito e de facto da executada e devedora originária, José ............... (…) foi e é responsável pelos actos decorrentes da actividade da devedora originária nomeadamente no que diz respeito ao período de origem das dívidas bem como ao tempo da liquidação e/ou cobrança das mesmas.
(…)
Face ao exposto, constatada a inexistência de bens da originária devedora e tendo como fundamento legal o disposto na al. a) do nº 2 do art. 153º do CPPT ordeno a reversão da execução contra o responsável subsidiário José ............... (…) nos termos dos arts. 23º e al. b) do nº 1 do 24º da LGT e do art. 8º do RGIT (…)A decisão agora produzida funda-se na presunção legal de culpa do gerente atrás identificado baseada nas informações oficiais e provas documentais inclusas nos autos. (…)”
D) O executado por reversão foi citado por ofício de 10/05/2013 cuja recepção não foi efetuada na própria pessoa;
E) A 21/04/2011 o então mandatário do oponente endereçou requerimento via email ao Serviço de Finanças de Santiago do Cacém relatando o falecimento da sua única filha em 04/09/2005 em virtude do que adoeceu, perdeu a vontade de viver e de cuidar de si, ficando sem capacidade para trabalhar, sobretudo na sociedade executada;
F) Informou, ainda, por esse meio “o então TOC não ter requerido a suspensão da actividade e fosse enviando o que tivesse de enviar para as Finanças a zero” e “optou por demandar a sociedade em tribunal, acusando-a de não lhe pagar serviços e logrou penhorar e apreender todo o património da sociedade e ficar mesmo com a chave do estabelecimento”;
G) Pelo mesmo meio identificou o processo em questão como sendo o 870/07.1 TBSTC e o Tribunal em que corria termos, requerendo que as Finanças a ele se dirigissem por forma a avocar o seu direito de preferência e obter pagamento pelos bens penhorados;
H) Novamente, a 15/04/2011, o mesmo mandatário requereu que a AT avocasse o direito de ser paga da dívida por parte da A..............., Lda pelo valor dos bens penhorados à ordem do citado processo judicial ficando suspenso o processo de reversão em curso contra o gerente da mesma e ora Oponente;
I) Em 18/05/2011 a sociedade executada apresentou-se à insolvência fazendo menção na petição inicial a dívida de IRC relativo aos anos de 2006 e 2007;
J) Na sentença declarativa, datada de 03/06/2011, ficou assente a dívida às Finanças relativa a IRC de 2006 e foi fixado o prazo de 30 dias para reclamação de créditos, foi agendada Assembleia de Credores e avocados todos os processos de execução fiscal pendentes;
K) O Chefe do Serviço de Finanças de Santiago do Cacém foi notificado desta sentença;
L) Não obstante, não esteve presente naquela Assembleia de Credores;
M) Por sentença de 15/03/2012 foi qualificada a insolvência como fortuita;
N) A liquidação de IRC em cobrança na execução foi remetida para notificação à sociedade executada através de carta registada com aviso de recepção que foi assinado pelo cônjuge do Oponente em 28/05/2008;
O) Em 19/06/2013 o Oponente deu entrada à petição inicial que deu origem aos presentes autos de oposição.
6.1.
Alicerçou-se a convicção do Tribunal na fixação dos factos provados nos documentos dos autos, designadamente constantes do apenso que constitui excerto do processo de execução fiscal, os quais não foram impugnados.
7.
FACTOS NÃO PROVADOS
Inexistem. As demais asserções da douta petição constituem conclusões de facto e/ou de direito ou são inócuas para a boa decisão da causa.»

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B. DO DIREITO
A execução fiscal, por dependência da qual foi deduzida a presente oposição, respeita a dívida de IRC do ano de 2006, inicialmente exigida à sociedade «A..............., LDA».
À luz da factualidade transcrita, a sentença recorrida julgou procedente a oposição por entender que o Oponente (doravante recorrido) logrou demonstrar que não foi por sua culpa que o património da devedora originária se tornou insuficiente para a satisfação da dívida exequenda.
Para assim decidir, o Tribunal a quo partiu da seguinte argumentação:
«Partiu em sede de despacho de reversão a responsabilidade do oponente de uma presunção de culpa pelo exercício do cargo e em sede de oposição não veio a Fazenda Pública, produzir alegações ou apresentar prova de factos consubstanciadores de que a sua actuação havia sido culposa.
Já do ponto de vista do oponente, apreciada a prova documental apresentada entende o Tribunal ter logrado o Oponente vindo demonstrar não ter agido com culpa ou falta de diligência - que lhe era claramente exigida - no caso concreto face aos circunstancialismos que estiveram subjacentes à sua vida pessoal e que se reflectiu na actividade da executada de que era único gerente.
Com efeito, exigindo-se-lhe na qualidade de gerente zelar pela prossecução do objecto da sociedade e obtenção dos correspondentes meios de pagamento foi produzida prova de que a ocorrência de fatalidade na sua vida pessoal conduziram a manifesta incapacidade para gerir a sociedade, especificamente por se tratar de agência funerária.
Não obstante a sua responsabilidade subsidiária enquanto gerente, o Oponente viu-se confrontado com a apresentação de declarações fiscais por parte do seu então TOC à sua revelia e ainda a interposição por parte deste de processo judicial que resultou na penhora de todos os bens da sociedade. Tal atuação, que caracteriza de insidiosa, é verdadeiramente a circunstância determinante, no entender do Tribunal, na insuficiência de património livre e desembaraçado para responder pelas dívidas fiscais.
Acresce, como resulta do probatório, que confrontado com a citada penhora universal dos bens da sociedade alertou o Oponente, na qualidade de gerente, por diversas ocasiões, a ATA para tal circunstância suscitando a conveniente reclamação de todos os créditos fiscais já conhecidos e a realização das diligências necessárias à avocação do direito de preferência de que goza o credor fiscal sobre os demais.
Analisadas estas dificuldades de que a sociedade foi alvo entende-se ter sido demonstrado suficientemente que o incumprimento das obrigações fiscais não resultou de culpa do Oponente, tentando zelar pela sua satisfação do modo descrito.
Como evidência da constatação da notoriedade de situação de ruptura da sociedade apresentou-a o Oponente à insolvência que se vem a mostrar fortuita, daí se concluindo porque não imputável ao gerente.».
A Fazenda Pública (doravante recorrente) não se conforma com o decidido, por duas ordens de razões.
A primeira, porque, segundo a jurisprudência, no âmbito do regime de responsabilidade subsidiária inscrito na alínea b) do n.º1 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária (LGT) recai sobre o administrador ou gerente o ónus de provar que a falta de pagamento lhe não foi imputável.
A segunda, porque a prova vertida no probatório mostra-se «(…) improcedente para afastar» a responsabilidade subsidiária do recorrido pela dívida exequenda.
Dito isto, vejamos se assiste razão à recorrente, analisando o regime da responsabilidade subsidiária instituído nesse preceito legal de molde a aferir num primeiro momento se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento por errada interpretação do regime estatuído na alínea b) do n.º1 do artigo 24.º da LGT (regime que não vem questionado no recurso).
Relativamente à primeira ordem de razões, importa referir que quanto ao âmbito de aplicação da alínea b) contida no artigo 24.º da LGT [Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.], é pacífico na jurisprudência, da qual se destaca o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14.02.2013, proferido no processo n.º 0642/12, no sentido de aquele dispositivo: « (…) abrange a responsabilidade dos gerentes que exerceram o cargo à data do pagamento das dívidas, independentemente de o terem exercido ou não no período da constituição da dívida (razão por que lhe caberá provar que não lhe é imputável essa falta de pagamento) (…)». (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Tal significa que, no caso presente fez a sentença recorrida uma errada interpretação normativa do preceito contido alínea b) contida no artigo 24.º da LGT, pois que contrariamente ao decidido, existe uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária.
Assim, em face do que ficou dito, e ao contrário do decidido, a Fazenda Pública não tinha de efectuar qualquer prova da culpa do recorrido na insuficiência do património da devedora originária, já que beneficiava a seu favor da presunção constante da acima citada alínea.
Deste modo, por força da existência da referida presunção legal o gerente contra quem venha a ser revertido processo de execução fiscal em execução do direito correspondente àquela obrigação de responsabilidade subsidiária, apenas se poderá eximir à mesma (no caso não vem questionado o exercício de facto de gerência) na medida demonstre não ter tido culpa na insuficiência patrimonial daquela sociedade, para satisfação dos respectivos créditos exequendos.
Relativamente à segunda ordem de razões invocada pela recorrente somos conduzidos a saber se face à factualidade provada o recorrido cumpriu, ou não, o ónus da prova da ausência de culpa pela falta do pagamento da dívida em cobrança coerciva.
No Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 15.10.2014, proferido no processo n.º 167/13, clarifica-se que: «[P]ara ilidir a presunção de culpa pela falta de cumprimento das obrigações tributárias, ou qualquer relação causal entre a sua actuação e a insuficiência patrimonial da empresa que geriu, sabido que aos gerentes é exigível uma postura responsável e ponderada, que corresponda a uma actuação que, de acordo com o exigível a um administrador critérios / colocado em idêntica situação e dentro da inerente discricionariedade técnica, se mostre, em princípio, como adequada ao alcance dos objectivos para que a sociedade se / constituiu — neste mesmo sentido, entre muitos outros, acórdão TCA Norte 7 Dez. 2005, Recurso 0086/01; acórdão TCA Norte 23 Fev, 2006, Recurso 0032/02; acórdão TCA Norte 16 Mar. 2006, Recurso 00 02/03; acórdão TCA Norte 6 Abr. 2006, Recurso 0021/02, disponíveis em www.dgsi.pt ( disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Neste entendimento, que sufragamos e apreciada a matéria de facto provada que subjaz à sentença recorrida pode concluir-se que não pode ter-se como demonstrada que a falta de pagamento da dívida exequenda não é imputável ao recorrido.
Com efeito, seguindo raciocínio lógico a partir de regras elementares de vivência comum temos como seguro que no exercício das suas funções os gerentes têm o dever de administrar a empresa de modo a que esta subsista e cresça, devendo cumprir os contratos celebrados, pagar as dívidas da sociedade e cobrar os seus créditos. Neste quadro, tornava-se necessário que o recorrido provasse que a falta de cumprimento da obrigação de pagamento das dívidas exequenda foi de todo alheia à sua vontade.
Diga-se, o que passaria pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censurável do recorrido.
Neste contexto, não tem qualquer relevância a prova da “penhora universal” dos bens da sociedade na sequência da instauração de execução pelo TOC, como entendeu o Tribunal de 1ª Instância. Na verdade, como consignou o Ministério Público no seu parecer «A penhora de todos os bens da sociedade (…) não se pode considerar, como fez a douta a sentença, que foi factor exógeno não imputável ao revertido enquanto gerente da sociedade, tendo em conta os deveres a que estava adstrito.».
De resto, tão pouco a matéria identificada na alínea F) do probatório se reconduz a uma situação de facto inesperada e incontrolável, pois que igualmente neste ponto, não há qualquer elemento de prova, indiciador que o recorrido demonstrou que agiu com cuidado e prudência de um bonus pater familiae no sentido de evitar essa situação.
Aliás, nunca tal circunstância (penhora dos bens da devedora originária) configuraria uma causa externa à gestão do recorrido, isto porque, o pagamento dos serviços prestados pelo TOC é naturalmente um acto intrínseco ao exercício normal da gerência.
De resto, não pode dizer-se, que a fatalidade que se abateu na vida pessoal do Recorrido é suficiente para afastar a presunção de culpa do gerente contida na alínea b) do nº 1 do art.º 24º da LGT, e, por consequência, suficiente para afastar a sua responsabilidade subsidiária pela falta de pagamento de dívida tributária da sociedade.
Com efeito, não obstante este Tribunal ser sensível ao impacto de uma tragédia pessoal como a ocorrida, atenta a factualidade assente, não impugnada, não resultou provado, ao contrário do referido pelo Tribunal a quo, que tenha ocorrido uma manifesta incapacidade para a gestão da sociedade. Ademais, sempre um gestor diligente deveria, em situações como a dos autos, reconhecendo a sua alegada incapacidade, tomar medidas para minimizar o impacto da mesma na vida da sociedade (por exemplo, delegando poderes em terceiro), o que não ocorreu.
Tudo leva, por conseguinte, a considerar que não tendo o recorrido invocado qualquer facto susceptível de elidir a presunção de culpa do artigo 24°, n.º 1, alínea b), da LGT, a oposição tem de improceder. O recorrido é, por isso, responsável pelo pagamento da dívida revertida contra si.
A sentença recorrida, que decidiu em sentido contrário, não pode manter-se, motivo por que, dando provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública, a revogaremos e julgamos improcedente a oposição à execução fiscal.

IV.CONCLUSÕES
I. Nos termos do disposto no artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT, é sobre o gerente contra quem reverteu a execução fiscal que recai o ónus de alegar e demonstrar que não foi por culpa sua que não foi efectuado o pagamento das dívidas exequendas.
II. Nesta medida, o gerente tem pois que demonstrar que a devedora originária não tinha fundos para pagar os impostos e que a falta de meios financeiros não se deveu a qualquer conduta que lhe possa ser censurável.
V. DECISÃO
Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a oposição à execução fiscal improcedente.

Custas pelo recorrido.

Lisboa, 28 de Março de 2019.


[Ana Pinhol]

[Tânia Meireles da Cunha]

[Isabel Fernandes]