Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:300/09.4BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:05/03/2018
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:PRESCRIÇÃO DE JUROS
Sumário:De acordo com o disposto na alínea d) do art. 310.º do CC, os juros de dívida não tributária prescrevem no prazo de 5 anos, contado, segundo a regra do art. 306.º do mesmo Código, a partir da exigibilidade da obrigação.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

PROCESSO N.º 300/09.4BEALM

I. RELATÓRIO

C. G. DE D., SA, (Exequente, ou abreviadamente CGD), vem recorrer da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada que, com o fundamento na prescrição da divida exequenda, julgou procedente o processo de oposição que M. N. P. R. deduziu à execução fiscal nº 2160200301…. instaurada pela CGD no Serviço de Finanças do Barreiro para cobrança coerciva de uma dívida proveniente de capital mutuado, juros de mora vencidos e custas, no valor total de 18.421,01€.

A Recorrente C. G. DE D., SA apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:

«CONCLUSÕES:

1. O presente recurso foi interposto da Douta Sentença proferida pelo M° Juiz a quo a fls. do processo, que julgou totalmente procedente a oposição deduzida pela Executada M. N. P. R., por considerar que a dívida se encontra prescrita.

2. Decidindo como decidiu, salvo o devido respeito, o M° Juiz a quo não fez correcta nem adequada aplicação do Direito.

3. A Apelante está, pois, convicta que Vossas Excelências, reapreciando a matéria dos autos e, subsumindo-a nas normas legais aplicáveis, tudo no mais alto e ponderado critério, não deixarão de revogar a Douta sentença proferida pelo Tribunal a quo.

4. Efectivamente, é notório que a dívida exequenda não se encontra prescrita.

5. Senão vejamos: os processos de execução instaurados pela C.G.D. e ainda pendentes nos Serviços de Finanças, por força do disposto no art°9°, n°5 do Decreto-Lei n° 287/93 de 20/08, conjugado com o disposto no art°61° do Decreto-Lei n°48953 de 05/04/69, regem-se, no que ao plano substantivo diz respeito, pelas regras de direito privado, dado que as dívidas exequendas emergem de contratos celebrados no âmbito da actividade da Caixa como Instituição de Crédito, à qual se aplica, como é sabido, o citado ramo de Direito.

6. Deste modo - e dado que o instituto da prescrição reveste indubitavelmente natureza substantiva -, às dívidas exequendas são aplicáveis as disposições do CC.

7. É que a dívida da Executada perante a C.G.D. é uma obrigação civil e não uma obrigação tributária, na medida em que a dívida não emerge de qualquer falta de liquidação de imposto.

8. Nessa medida, no regime de direito privado, a prescrição não é de conhecimento oficioso (já que é diferente de regime de prescrição previsto no CPPT, a qual se refere a uma obrigação tributária), e sempre carece de ser invocada judicial ou extrajudicialmente.

9. De facto, o prazo ordinário da prescrição é de 20 anos (cfr. art°309.° do CC).

10. A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente (cfr. art°323°, n°1 do mesmo diploma).

11. O prazo prescricional interrompe-se igualmente pelo reconhecimento do direito, efectuado perante o respectivo titular, por aquele contra quem o direito pode ser exercido (art°325°, n°1 do CC).

12.A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, salvo se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, casos em que o novo prazo não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigos 326.°, n° 1 e 327.°, n° 1 do CC).

13. Por outro lado, se a citação não se fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram cinco dias (artigo 323., n.° 2 do CC).

14. E, no caso concreto, face à interrupção do prazo prescricional, e tendo a interrupção resultado da citação, a prescrição não começa a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigos 326.°, n°1 e 327.°, n° 1, ambos do CC).

15. Nesse sentido, vai o douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Proc. n°0554/06, de 07/03/2007, em que foi relator António Calhau), o qual, numa situação em tudo semelhante, refere que: "De harmonia com o n°7 do artigo 323° CC, aqui aplicável por se tratar de dívida à C. G. de D., a prescrição, cujo prazo é de vinte anos (artigo 309° CC), interrompe-se pela citação..."; "O acto interruptivo aqui previsto é a citação e o seu efeito é a interrupção da prescrição, a qual inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir da sua verificação (artigo 326.° CC), sem prejuízo do disposto no número 1 do artigo 327° CC, o qual estabelece que se a interrupção resultar de citação ..., o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo"; E "Interrompido o prazo de prescrição, inutiliza-se o tempo decorrido anteriormente e inicia-se nova contagem do prazo prescricional a partir do acto interruptivo (artigo 326° CC), sem prejuízo, porém, de, tendo a interrupção resultado de citação, o novo prazo de prescrição não começar a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo …”.

16. No caso concreto, tal como ficou provado, o Recorrente foi citado na execução fiscal em 10.10.1989, citação esta que acarretou a interrupção do prazo de prescrição, nos termos do n°3 do artigo 323° do CC. E, como o acto que interrompeu foi a própria citação, só poderá iniciar-se a contagem de novo prazo a partir do momento em que transite em julgado a decisão que ponha termo ao processo.

17.Se este é o raciocínio relativamente à dívida de capital, o mesmo é aplicável à questão dos juros a que alude o art°310°, alínea d) do CC.

18. No entanto, a única diferença reside no prazo para a sua prescrição, o qual é de 5 anos para os juros.

19. E tendo a prescrição da dívida de capital resultado interrompida pela citação, o prazo para a prescrição dos juros não lhe fugirá à regra, só podendo, neste caso, considerar-se prescritos decorridos que sejam cinco anos desde a data em que tenha transitado em julgado a decisão que ponha termo ao processo.

20. Ora, nem num caso, nem noutro, transitou qualquer decisão em julgado que tenha posto termo ao processo.

21. Em suma, a prescrição dos juros interrompeu-se pela citação da executada e, por outro lado, o novo prazo não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo, o que ainda não sucedeu no caso em apreço.

22. Desta feita, não restam dúvidas de que a prescrição da dívida nunca ocorreu, na medida em que o prazo se interrompeu.

23. Por outro lado, cumpre esclarecer que a dívida da Executada perante a CGD não se mostra integralmente liquidada com o produto da venda do imóvel. Vejamos:

24.Tendo em conta que os mutuários deixaram de cumprir as obrigações emergentes do contrato aqui em apreço, a CGD instaurou a acção executiva em 18.08.1986, tendo peticionado a quantia de Esc. 2.563.909$00 (€12.788,72).

25.Em 27.12.1989, procedeu-se à venda judicial do imóvel penhorado, tendo o mesmo sido adjudicado pela CGD pelo valor de €19.079,02.

26. Ora, a dívida dos Executados, à referida data da venda executiva, era de Esc. 7.501.823$00 (€21.769,25) e não Esc. 2.563.909$00 (€12.788,72), conforme consta no ponto n°9 dos Factos provados constantes na Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo. Efectivamente, o referido valor de €12.788,72 corresponde à quantia em dívida aquando da instauração da execução e não tinha em consideração a actualização dos juros igualmente devidos.

27. Após a dedução das custas, a CGD aplicou ao empréstimo a quantia de €18.061,52, tendo aplicado tal valor à data da venda.

28. Todavia, pelo simples cálculo aritmético, ponderando o valor da dívida à data da venda (€21.769,25) e o valor que coube à CGD (€18.061,52), facilmente se consta que a dívida não resultou liquidada.

29. Tanto assim é que, após a aplicação do produto da venda, remanesceu em dívida, à data da venda, o montante global de €4.455,97.

30. Na verdade, a dívida da Executada perante a CGD continua a avolumar-se diariamente, totalizando, à data de 23.05.2014, a quantia global de €17.342,20.

31. Em síntese, foi no estrito cumprimento e respeito pelos princípios e preceitos legais que a ora Recorrente instaurou a acção executiva e requereu o prosseguimento da execução para cobrança do montante ainda em dívida.

32. Pelo que, o Tribunal a quo fez uma errada interpretação e adequada aplicação do direito, designadamente das citadas disposições legais, devendo por isso, ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo e ser ordenado o prosseguimento da execução.

Nestes termos, e nos que Vossas Excelências mui doutamente suprirão, dando provimento ao presente recurso de apelação, requer-se a revogação da sentença proferida pelo Douto Tribunal a quo, revogando-a por outra que ordene o prosseguimento da execução para cobrança do montante em dívida, sempre com inteira e sã

JUSTIÇA

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A Recorrida não apresentou contra-alegações.

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Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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As questões invocadas pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir são as seguintes:

_ Erro de julgamento de facto, porquanto a dívida exequenda não se mostra completamente liquidada, pois o facto que consta no ponto 9 refere-se à dívida à data da instauração da execução fiscal que não tinha em consideração os juros [conclusões 23 a 32];
_ Erro de julgamento de direito, porquanto a dívida não se encontra prescrita na medida em que o prazo de prescrição interrompe-se com a citação em 10/10/1989, prazo que não volta a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigos 326.º, n.º 1 e 327.º n.º 1, ambos do CC) [conclusões 1 a 22].

II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«III -FUNDAMENTAÇÃO

A) - DOS FACTOS PROVADOS

Compulsados os autos e analisada a prova documental, encontram-se assentes, por provados, os seguintes factos com interesse para a decisão de mérito:

1. Em 08/01/1982, foi celebrado entre J. I. V. M. P. e M. N. P. P. a C. G. de D. um contrato de Mutuo com hipoteca, sendo que os primeiros se confessam devedores à segunda da quantia de Esc.: 975.000$00 acrescida de Esc.: 1.588.909$00 de juros (cfr. doc. junto a fls. 58 dos autos e 6 a 17 do processo executivo junto aos autos);

2. Em 16/10/1986, foi instaurado o processo de execução fiscal n° 7../86 junto do 1° Juízo do Tribunal de 1ª Instância das Contribuições e Impostos, transitado para o Serviço de Finanças do Barreiro onde lhe coube o n°2160200301…. por dívidas à C. G. de D. decorrentes do contrato de mútuo identificado no ponto anterior, e juros contados desde 08/02/1982, no montante de Esc.: 1.588.909$00 em que são executados J. I. V. M. P. e M. N. P. P. (cfr. doc. junto a fls. 4 a 5 da cópia do processo executivo junto aos autos);

3. O executado J. I. V. M. P. foi citado em 13/09/1989 (cfr. doc. junto a fls. 80, verso, do processo executivo junto aos autos);

4. A oponente foi citada em 10/10/1989 (cfr. doc. junto a fls. 83, verso, do processo executivo junto aos autos);

5. Em 20/01/1988 foi efectuada a penhora da fracção adquirida (cfr. doc. junto a fls. 106, 110 e 114 a 122 do processo executivo junto aos autos);

6. Em 08/11/1989, procedeu-se à avaliação do imóvel (cfr. doc. junto a fls. 130 do processo executivo junto aos autos);

7. Por despacho de 14/11/1989 foi determinada a venda do imóvel (cfr.doc. junto a fls. 131 dos autos);

8. A C. G.de D., S.A. adquiriu o imóvel por Esc.: 3.825.000$00 (cfr. doc. junto a fls. 156 do processo executivo junto aos autos);

9. À data da venda o valor do processo era de Esc.: 2563.909$00 sendo que a conta de custas era de Esc.: 203.991$00 o que totaliza a quantia de Esc.:2.767.900$00, à qual ascendiam mais Esc:2.675.372$00 de juros de mora (cfr. docs. juntos a fls. 160 e 161 do processo executivo junto aos autos);

10. Em 6/02/1990, foi realizada um Auto de Diligência do qual consta que não existem mais bens para penhorar (cfr. doc. junto a fls. 163 dos autos);

11. A CGD em 12/11/1990, solicitou que fossem penhorados 1/3 dos vencimentos (cfr. doc. junto a fls. 168 do processo executivo junto aos autos);

12. Foi efectuada uma penhora de vencimentos em 19/08/1992 (cfr. doc. junto a fls. 175 do processo executivo junto aos autos);

13. Em 07/07/1999, foi solicitado pela CGD que se aplique o montante penhorado nos autos (cfr. doc. junto a fls. 199 do processo executivo junto aos autos);

14. Em 18/07/2007, foi ordenada uma penhora de salários (cfr. doc. junto a fls. 213 do processo executivo junto aos autos);

15. Em 13/08/2007, foi efectuado um pagamento no montante de € 1.130,28 (cfr. doc. junto a fls. 214 dos autos);

16. De 08/04/2008 é entregue uma penhora de salários (cfr. doc. junto a fls. 228 do processo executivo junto aos autos);

17. Por requerimento de 11/11/2008 a CGD vem informar que a executada aufere uma pensão pelo que requer a sua penhora (cfr. doc. junto a fls. 234 do processo executivo junto aos autos);

18. Por requerimento de 27/11/2008, a CGD vem informar que a executada é proprietária dum imóvel e requer que o mesmo seja penhorado (cfr. doc. junto a fls. 229 do processo executivo junto aos autos);

19. A executada foi citada após a penhora em 16/02/2009 (cfr. doc. junto a fls. 37 dos autos).

A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.

DOS FACTOS NÃO PROVADOS

Dos factos constantes da Reclamação, todos objectos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita».


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Com base na matéria de facto supra transcrita a Meritíssima Juíza do TAF de Almada julgou procedente a oposição à execução fiscal, entendendo, em síntese, que o prazo de prescrição da dívida, que é de 20 anos, não se completou por força da interrupção do prazo pela citação do Oponente, mas quanto aos juros que se encontram a ser exigidos nos autos de execução fiscal (sendo que subjaz o entendimento de que o produto da venda é suficiente para o pagamento da dívida e ainda parte de juros), estes se encontram prescritos pelo decurso do prazo de 5 anos.

A Recorrente CGD não concorda com essa decisão invocando, em síntese, erro de julgamento de facto porquanto a dívida exequenda não se mostra completamente liquidada, pois o facto que consta no ponto 9 refere-se à dívida à data da instauração da execução fiscal que não tinha em consideração os juros [conclusões 23 a 32] e erro de julgamento de direito porquanto a dívida não se encontra prescrita na medida em que o prazo de prescrição interrompe-se com a citação em 10/10/1989, prazo que não volta a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigos 326.º, n.º 1 e 327.º n.º 1, ambos do CC) [conclusões 1 a 22].

Relativamente ao erro de julgamento de facto está em causa o ponto 9 da matéria de facto, no qual foi dado como provado:

“9. À data da venda o valor do processo era de Esc.: 2563.909$00 sendo que a conta de custas era de Esc.: 203.991$00 o que totaliza a quantia de Esc.:2.767.900$00, à qual ascendiam mais Esc:2.675.372$00 de juros de mora (cfr. docs. juntos a fls. 160 e 161 do processo executivo junto aos autos);”

Com base nessa matéria de facto a Meritíssima juíza a quo entendeu que estaria em causa apenas a prescrição dos juros, pois o montante arrecadado (Esc. 3.825.000$) era suficiente para o pagamento da dívida exequenda (Esc. 2.563.909$00) e as custas (203.991$00), sobejando ainda o montante de Esc. 1.057.100$00 para o pagamento dos juros.

A Recorrente impugna aquele facto entendendo que “… a dívida dos Executados, à referida data da venda executiva, era de Esc. 7.501.823$00 (€21.769,25) e não Esc. 2.563.909$00 (€12.788,72), conforme consta no ponto n°9 dos Factos provados constantes na Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo. Efectivamente, o referido valor de €12.788,72 corresponde à quantia em dívida aquando da instauração da execução e não tinha em consideração a actualização dos juros igualmente devidos.” – conclusão 26.


No entanto, analisado o documento de fls. 160 com base no qual a Meritíssima Juíza do TAF de Almada deu como provado o facto, não se verifica qualquer erro de julgamento. Com efeito, trata-se da liquidação que foi efectuada no âmbito do processo de execução fiscal após a venda do imóvel, sendo que os valores dados como provados encontram-se em conformidade com esse documento.

Ora, a Recorrente não indica, conforme lhe compete nos termos do disposto no art. 640.º, n.º 1, alínea b) do CPC, quais os documentos junto aos autos que sustentam a sua impugnação da matéria de facto, e por conseguinte, improcede a impugnação da matéria de facto efectuada pela Recorrente [conclusões 23 a 32].

Vejamos, então o erro de julgamento de direito.

A Meritíssima Juíza do TT de Almada entendeu que “não decorrendo do probatório qualquer outro facto interruptivo da prescrição depois da citação da oponente, os juros que se encontram a ser exigidos nos presentes autos já se encontram prescritos desde, pelo menos, 10/10/1994”

A Recorrente não concorda com o decidido entendendo que o prazo de prescrição dos juros que é de 5 anos, interrompeu-se com a citação em 10/10/1989, prazo que não volta a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigos 326.º, n.º 1 e 327.º n.º 1, ambos do CC) [conclusões 1 a 22].

Apreciando.

Estando em causa uma dívida da C. G. de D. importa, desde logo, chamar à colação o regime de prescrição aplicável, sendo elucidativo a este respeito o acórdão do STA de 14/12/2016, proc. n.º 0193/14, no qual se escreveu o seguinte:

“Sendo inquestionável que a dívida em causa não tem natureza tributária, mas civil, pese embora possa ser cobrada coercivamente através do processo de execução fiscal, esse facto não implica que fique sujeita ao prazo ou ao regime de prescrição da dívida tributária.
Com efeito, como se exarou no acórdão desta Secção de Contencioso Tributário, de 1/3/2000, proc. nº 024545, «Com a possibilidade de cobrança dos créditos através do processo de execução fiscal, pretendeu-se dar à A………… um meio mais expedito de cobrança dos seus créditos, em atenção às suas funções de interesse público, e não alterar a natureza dos seus créditos nem o regime substantivo que os regula.
Por outro lado, a atribuição deste regime especial de cobrança, presumivelmente mais célere, visou privilegiar a A………… em relação às outras entidades com intervenção no comércio bancário, atento o interesse público subjacente a essa cobrança.
Sendo essa a finalidade dessa atribuição, seria incongruente que, concomitante e contraditoriamente, se fosse atribuir-lhe um estatuto diminuído a nível do direito substantivo (…) Para além disso, tal diminuição de estatuto, não baseada em qualquer circunstância que justifique uma discriminação negativa da A………… em relação às outras, entidades bancárias, teria de considera-se ofensiva do princípio constitucional da igualdade, consagrado no art. 13º da CRP.»

Assim sendo há que atentar no regime substantivo de prescrição que regula a dívida em causa que é disposto nos arts. 309º/310º e 323º e segs. do Código Civil
Ora, de harmonia com o n.º 1 do artigo 323.º CC, a prescrição, cujo prazo é de vinte anos (artigo 309.º CC), interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.

O acto interruptivo aqui previsto é a citação e o seu efeito é a interrupção da prescrição, a qual inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir da sua verificação (artigo 326.º CC).
Isto, porém, sem prejuízo do disposto no número 1 do artigo 327.º CC, o qual estabelece que se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.”

Estando em causa nos presentes autos juros, é de aplicar o disposto na alínea d) do art. 310.º do CC que dispõe no sentido de que os juros de dívida não tributária prescrevem no prazo de 5 anos, contado, segundo a regra do art. 306.º do mesmo Código, a partir da exigibilidade da obrigação. Nesse sentido no acórdão do STA de 06/08/2014, proc. 0807/14, escreveu-se o seguinte:

“(…) o Recorrente sustenta que a sentença fez errado julgamento quando não considerou prescritos os juros. Isto, porque a obrigação de juros sempre estaria prescrita, pois está sujeita ao prazo de 5 anos, contado a partir da data em que a obrigação se tornou exigível, nos termos das disposições combinadas dos arts. 306.º, n.º 1, e 310.º, alínea d), do CC.
Como sustenta o Recorrente, e tendo sempre presente que estamos perante obrigações que não têm natureza tributária, prescrevem no prazo de 5 anos os juros convencionais ou legais, ainda que ilíquidos [alínea d) do art. 310.º do CC], contado, segundo a regra do art. 306.º do mesmo Código, a partir da exigibilidade da obrigação. Isto, independentemente da natureza dos juros, mencionando expressamente a lei os juros convencionais ou legais e não distinguindo sequer entre juros moratórios, compensatórios ou outros.
No caso, como resulta do que acima deixámos dito, a sociedade deve considerar-se citada para a execução fiscal em 27 de Novembro de 1990, motivo por que apenas podem considerar-se prescritos juros vencidos antes de 27 de Novembro de 1985 (mais de cinco anos anteriormente à citação, que interrompeu o prazo), por, relativamente a eles, se mostrar decorrido o prazo de prescrição de 5 anos, mas já não os vencidos após essa data, como tem vindo a decidir este Supremo Tribunal Administrativo (Neste sentido, vide os seguintes acórdãos desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
– de 3 de Fevereiro de 2010, proferido no processo n.º 813/09, publicado no Apêndice ao Diário da República de 24 de Março de 2011 (
https://dre.pt/pdfgratisac/2010/32210.pdf), págs. 224 a 226, , também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/096b1fdc6d3908e2802576c7004e4add?OpenDocument;
– de 12 de Outubro de 2011, proferido no processo n.º 10/11, publicado no Apêndice ao Diário da República de 16 de Julho de 2012 (
https://dre.pt/pdfgratisac/2011/32240.pdf), págs. 1674 a 1680, , também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/e4173a2ca5106b088025792d0038acfa?OpenDocument;
– de 2 de Abril de 2014, proferido no processo n.º 247/14, ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/031f7affdb23bd9b80257cb000456798?OpenDocument.).”

Transpondo o regime exposto naquela jurisprudência para o caso dos autos, importa concluir que apenas se poderão considerar prescritos os juros de cinco anos antes da citação (10/10/89 – cfr. ponto 4 da matéria de facto provada), e já não os vencidos após essa data.

Assim sendo, a sentença recorrida, que assim não decidiu deverá ser revogada nessa parte, verificando-se apenas parcialmente prescrita a dívida de juros.

As partes foram notificadas para os termos e efeitos do disposto no art. 665.º, n.º 3 do CPC, considerando que na p.i. a Oponente para além da prescrição invocou a nulidade da citação, questão cujo conhecimento ficou prejudicado, e portanto apenas nessa medida se poderá considerar a pronúncia da CGD.

Sucede que: “No regime do Código de Procedimento e de Processo Tributário a nulidade da citação para a execução fiscal não serve de fundamento à respectiva oposição, devendo, antes, ser arguida no processo executivo, que prosseguirá depois de suprida a nulidade.”. Neste sentido, vide, Acórdão do Pleno do CT do STA de 28/02/2007, proc. n.º 0803/04.

No mesmo sentido, vide ainda, Ac. do STA de 06/06/2007 proc. n.º 091/07, sendo que neste: “I – A citação do responsável subsidiário deve conter os pressupostos e extensão da reversão – artigo 23.º, n.º 4, da LGT. II – Se a citação do interessado não contiver a fundamentação do despacho de reversão, o contribuinte deve invocar a nulidade ou irregularidade da citação, no prazo de contestação, sendo que do indeferimento desta arguição perante o órgão da execução fiscal, cabe reclamação para o tribunal tributário de 1.ª instância – artigos 198.º, n.º 2, do CPC, 276.º do CPPT e 103.º, n.º 2, da LGT. (…)”. Vide também, entre muitos outros, Ac. do STA de 10/02/2010, proc. n.º 01178/09, Ac. do STA de 07/05/2014, processo n.º 0283/14.

Assim sendo, e sem mais considerações por desnecessárias, face à jurisprudência uniformizada nesta matéria, conclui-se que não é de conhecer da nulidade da citação por não constituir fundamento de oposição, pelo que, quanto a este fundamento improcede a oposição.

Em suma, a sentença recorrida deverá ser parcialmente revogada.

3. Sumário do acórdão

De acordo com o disposto na alínea d) do art. 310.º do CC, os juros de dívida não tributária prescrevem no prazo de 5 anos, contado, segundo a regra do art. 306.º do mesmo Código, a partir da exigibilidade da obrigação.

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder parcial provimento ao recurso, e por conseguinte, revogar parcialmente a sentença recorrida, julgando-se parcialmente prescritas as dívidas de juros vencidas antes de 10/10/1989, e consequência, julga-se parcialmente procedente a oposição.

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Custas na proporção do decaimento que se fixa em 9/10 para a Recorrente e 1/10 para a Recorrida.
D.n.
Lisboa, 3 de Maio de 2018.

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Cristina Flora

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Ana Pinhol

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Joaquim Condesso