Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08693/15
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:06/18/2015
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:SELECÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO/ ERRO DE JULGAMENTO/OMISSÃO DE PRONÚNCIA/LIQUIDAÇÃO/NOTIFICAÇÃO
Sumário:
I - O Tribunal deve e só deve levar ao probatório os factos que, segundo as várias soluções plausíveis de direito, julgue relevantes para apreciar do mérito da ou das questões que lhe são colocadas, sendo que, quando esses factos relevantes se encontram suportados em documentos, o probatório deve acolhê-los através da reprodução integral ou parcial do seu exacto teor (admitindo-se, hoje pacificamente, que os possa dar integralmente como reproduzidos), dos quais, posteriormente, na apreciação daquelas questões e para a decisão destas, extrairá as ilações que julgue devidas.
II – Tendo o Tribunal previamente decidido que o meio processual utilizado (Oposição Judicial) não era o próprio para conhecer de parte dos vícios invocados, afastando expressamente da sua apreciação o mérito sobre as questões que os mesmos co-envolviam, a factualidade que haja sido invocada para sustentar tais vícios e as ilações que da mesma possam ser extraídas não são idóneas a sustentar o erro de julgamento à selecção da matéria de facto realizada tendo em vista a apreciação do mérito dos vícios/fundamentos julgados como admissíveis de apreciação no meio processual utilizado.
III - O vício de omissão de pronúncia traduz a violação pelo decisor do poder-dever a que está estritamente vinculado de conhecer de todas as questões que lhe sejam submetidas pelas partes, com excepção daquelas que sejam de conhecimento oficioso ou que vejam a respectiva solução prejudicada pela que haja sido dada a outra ou outras entretanto apreciadas.
IV - Para efeitos de apreciação de nulidade da sentença por omissão de pronúncia deve ter-se presente que são questões as que se reconduzam à determinação das premissas fundamentais de que a parte pretende extrair uma conclusão em que fundamente o seu pedido e argumentos os raciocínios teoréticos desenvolvidos para a verificação de cada uma das premissas.
V- Se o Tribunal não conheceu do mérito de determinados vícios por julgar que o meio processual era impróprio para deles conhecer, é forçoso concluir que a sentença não padece de nulidade por omissão de pronúncia, ainda que a essa decisão possa ser imputado erro de julgamento.
VI- Se no ofício, confessadamente recebido pelo Oponente constam, no campo reservado a “Assunto”, a expressão “Liquidação de IMT”; a expressa advertência de que estava a ser notificado “da liquidação do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMIT)”, as razões de facto e direito pelas quais aquela notificação/liquidação lhe estava a ser efectuada; o apuramento do imposto a pagar antecedido do termo "Liquidação" e com a indicação do seu modo de cálculo e respectivos juros compensatórios; a indicação expressa do prazo de pagamento; as advertências relativas às consequências de não pagamento dentro do prazo indicado e o meio de o realizar, bem como os meios legais de reacção legalmente ao seu dispor para o caso de discordar da notificação que lhe estava a ser realizada, não pode deixar de entende-se que o referido ofício consubstancia ele mesmo uma liquidação, ainda que realizada sem recurso aos hoje tão vulgarizados programas informáticos - tipo utilizados pela Administração Tributária.
VII- Tendo a Recorrente sido notificada dessa liquidação a 27 de Julho de 2009 e não tendo procedido, dentro do prazo que para tanto dispunha e lhe foi notificado, ao pagamento do tributo, é legitima a extracção de certidão de dívida e a subsequente instauração de processo executivo tendo em vista a sua cobrança coerciva
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I - Relatório

……………………………….., Lda., inconformada com sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou improcedente a oposição que deduziu contra a execução fiscal nº ………………………., instaurada pelo Serviço de Finanças de Portimão para cobrança coerciva de dívida proveniente de IMT do ano de 2004, dela veio interpor o presente recurso.

Tendo alegado, aí concluiu nos seguintes termos:

«1. A Sentença recorrida incorre em erro de apreciação da prova documenta constante dos autos ao não dar por provado que a o Chefe Adjunto do Serviço de Finanças de Portimão procedeu à emissão de uma nota de demonstração da liquidação de IMT e que não a remeteu à Recorrente juntamente com o ofício n°07286, de 14/7/2009, em violação do disposto nos n.°s 4 e 5 do art. 607° do CPC.

2. A decisão recorrida incorre também em erro de julgamento, em violação do dispos­to nos n.°s 4 e 5 do art.607° do CPC, ao não dar por provado que apenas na nota de demonstração da liquidação consta a justificação para a aplicação da taxa de 6,5%, de IMT, pelo facto de o imóvel em causa ter diferentes afectações - al. d) do n°1 do artigo 17° do CIMT.

3. A Sentença recorrida incorre em erro de julgamento, em violação do disposto nos n.°s 4 e 5 do art. 607° do CPC, ao não dar por assente que a citação não era acom­panhada de cópia do título executivo, nem constava da mesma a proveniência da dívida, nem a identidade da entidade promotora da execução.

4. A Sentença recorrida deverá ser anulada por omissão de pronúncia, por efeito do disposto na al. d) do n°1 do art.6015.° do CPC, pois não aprecia a alegação da Recorrente de que o ofício remetido à Oponente não poderia nunca conter a liquidação de IMT, ou reportar-se à mesma, ocorrendo assim falta de notificação da liquidação de imposto, visto que apenas os Serviços centrais poderiam proceder à sua emissão, não tendo o Adjunto do Serviço de Finanças competência para a respectiva emis­são.

5. A Sentença recorrida enferma ainda de nulidade, nos termos da al. d) do n°1 do art 615° do CPC, por omissão de pronúncia na medida que não se pronuncia sobre o documento constante de fl. 74 dos autos, correspondendo a fl. 46 da informação que o Serviço de Finanças de Portimão juntou aos autos, designado por "LIQUIDAÇÃO DE IMT DEMONSTRAÇÃO", nem sobre a ausência do seu envio à Re­corrente.

6. A Sentença recorrida enferma de erro de interpretação jurídica, pois interpretou o disposto no n°1 do art.165° do CPPT no sentido de que: caso a citação não seja acompanhada da cópia do título executivo, nem contenha os elementos constantes das als. a), c), d) e e) do n°1 do artigo 163° do CPPT, será nula, sem atender ao facto de que, caso a falta dos mencionados elementos seja susceptível de ser suprida por prova documental, a citação não será nula, mas apenas ilegal.

7. A Sentença recorrida comete omissão de pronúncia, nos termos da al. d) do n°1 do art. 6015.° do CPC, pois não aprecia o vício de ilegalidade imputado pela Recorren­te à citação, pelo facto de a mesma não ser acompanhada de cópia do título executi­vo e de não indicar a natureza e proveniência da dívida, nem identificar a entidade promotora da execução, em virtude de não compreender que as mencionadas faltas não são nulidades, pelo facto de puderem ser supridas por prova documental.

8. A Sentença recorrida comete erro de julgamento pelo facto de não declarar a ilegalidade da citação, em virtude de a mesma não ser acompanhada de cópia do título executivo, não indicar a proveniência da dívida, nem identificar a entidade promo­tora da execução, em violação do disposto nos arts. 190° n°1, 163° n°1 e 165° n°1 al. b) ab contrario, todos do CPPT.

9. A decisão recorrida é ilegal por erro de julgamento, quanto à falta de notificação da liquidação à Recorrente, pois é falso que o ofício 07286 remetido à Recorrente con­tenha a liquidação de IMT, já que a liquidação consta antes da nota de demonstra­ção da liquidação de IMT que é um documento autónomo.

10. A nota de demonstração da liquidação de IMT nunca foi enviada à Recorrente, pelo que a Sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, ao não dar por provada a procedência da Oposição nos termos das als. e) e i) do nº1do art.204.° do CPPT.

11. A Sentença recorrida comete erro de julgamento pois, pois ao contrário do que consta da mesma, o Ofício 07286 remetido à Recorrente contém apenas parte da fundamentação da liquidação, mas não a substituiu, o que deverá conduzir à anula­ção da mencionada decisão judicial.

12. Ao contrário do invocado na Sentença recorrida, cometendo esta erro de julgamento, o Ofício 07286 não contém a justificação para a aplicação da taxa de 6,5%, para apuramento do IMT a liquidar adicionalmente à Recorrente, sendo que a mesma apenas consta da demonstração da liquidação de IMT - al. d) do n°1 do art.17° do CIMT, por estar em causa um imóvel com diferentes afectações, o que deve igual­mente conduzir à anulação da decisão recorrida e à procedência da Oposição apre­sentada, nos termos das als. e) e i) do nº1 do art. 204° do CPPT.

13. A Recorrente deverá ser indemnizada pela garantia bancária prestada nos autos.

TERMOS EM QUE DEVE PROCEDER O PRESENTE RECURSO E CONSEQUENTEMENTE SER DECLARADA NU­LA E/OU ANULADA A SENTENÇA RECORRIDA, SENDO JULGADA PROCEDENTE A OPOSIÇÃO, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, NOMEDAMENTE COM A EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO VERTENTE E INDEMNIZA­ÇÃO DA RECORRENTE PELA GARANTIA BANCÁRIA PRESTADA PARA SUSPENDER A EXECUÇÃO».

Admitido o recurso e notificada a Fazenda Pública, não foram apresentadas contra-alegações.

Neste Tribunal Central, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no qual se pronunciou, a final, no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os «Vistos» dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre agora decidir.

II – Objecto do recurso

Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remate a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art.639°, n°1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 635°, n°2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (n°3 do mesmo art. 635°), razão pela qual todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos por seguro que o seu objecto está circunscrito às seguintes questões:

- Saber se a sentença recorrida é nula por não se ter pronunciado sobre: (i) a alegação da Recorrente de que o ofício remetido à Oponente não poderia nunca conter a liquidação de IMT ou reportar-se à mesma; (ii) o documento constante de fl. 74 dos autos, correspondendo a fl. 46 da informação que o Serviço de Finanças de Portimão juntou aos autos, designado por "LIQUIDAÇÃO DE IMT DEMONSTRAÇÃO"; (iii) a ausência do seu envio à Re­corrente (iv) o vício de ilegalidade imputado pela Recorren­te à citação, pelo facto de a mesma não ser acompanhada de cópia do título executi­vo e de não indicar a natureza e proveniência da dívida, nem identificar a entidade promotora da execução, em virtude de não compreender que as mencionadas faltas não são nulidades, pelo facto de puderem ser supridas por prova documental.

- Saber se a sentença recorrida errou no julgamento realizado ao não dar como provado que: (i) o Chefe Adjunto do Serviço de Finanças de Portimão procedeu à emissão de uma nota de demonstração da liquidação de IMT e que não a remeteu à Recorrente juntamente com o ofício n°07286, de 14/7/2009, (ii) apenas na nota de demonstração da liquidação consta a justificação para a aplicação da taxa de 6,5%, de IMT, pelo facto de o imóvel em causa ter diferentes afectações, (iii) a citação não era acom­panhada de cópia do título executivo, nem constava da mesma a proveniência da dívida, nem a identidade da entidade promotora da execução.

- Saber se na sentença recorrida foi cometido erro de julgamento na interpretação e aplicação do direito no que respeita ao erro na forma de processo e à notificação da liquidação e, consequentemente, ao ter julgado improcedente a presente Oposição.

Ill – Fundamentação de Facto

O julgamento relativo à matéria de facto realizado pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé encontra-se sedimentado na sentença objecto de recurso nos seguintes termos (que aqui se reproduzem):

«III - FUNDAMENTAÇÃO

1. De Facto:

Com interesse para a decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito, considera-se provada a factualidade que se passa a subordinar por alíneas:

A) Em 27.07.2009, a Oponente foi notificada do ofício n°7286, de 14.07.2009, registado com aviso de receção, com o teor que se extrai:

«Assunto: Liquidação de IMT

Nos termos do nº 4 do art. 31° do código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMIT) e do artigo 36°do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) fica notificado da liquidação do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMIT), com fundamento no n°1 do art. 12° do CIMT e al. a) do n°1 do art. 27° do Decreto -Lei 287/2003 de 12/11, relativo à transmissão abaixo.

Adquiriu o prédio urbano, sito no Poço, ……….. , inscrito na matriz predial da freguesia de ……….., concelho de ……………. sob o artigo ………, com o valor patrimonial tributário de €1.130.075,91, pelo preço do €473.858,00 conforme escritura de compra e venda lavrada no Notariado Privativo da ………………………, em 2004/06/25. O artigo tratava-se de um prédio em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente possuindo 23 divisões independentes, da P-A até à P-X. Em 2004/08/20 a empresa entregou modelo 1 do IMI do prédio constituído em regime da Propriedade Horizontal com o motivo prédio/melhorado/reconstruído e respectiva escritura da Constituição da Propriedade horizontal. Essa declaração do IMI deu origem ao artigo 5642, as fracções passaram a ser 19.

Como o prédio foi modificado foi-lhe dado destino diferente pelo que a isenção caduca nos termos do n°5 do artigo 11° do Código do IMT. Assim sendo deveria o sujeito passivo ter solicitado a liquidação do IMT referente ao artigo ……… nos termos do artigo 34° do CIMT após a alteração efectuada, pelo que será efectuada oficiosamente.

Liquidação:

€1.130.095, 91 x 6,5% = €73.454,93

Juros Compensatórios €14.167,75. Correspondente a 1760 dias, a contar de 30-08-2004 até 24-06-2009, data em que pediu liquidação de IMT de algumas fracções do artigo ……..

Assim fica notificado para no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da recepção do presente oficio, nos termos do nº6 do art°36°do CIMT, solicitar, neste Serviço de Finanças, guias para pagamento no valor de €87.622,68 (oitenta e sete mil seiscentos e vinte e dois euros e sessenta e oito cêntimos) referente a IMT e Juros Compensatórios. Na mesma data o pedido de redução de coima será considerado e emitidas as guias respectivas.

Mais fica ciente de que se o pagamento não se fizer no referido prazo se procederá à extracção de certidão de dívida para efeitos de cobrança coerciva, sem prejuízo do direito de reclamação ou impugnação a que se referem os artigos 43° do CIMT e 68° e 99° do CPPT. Da liquidação de IMT, poderá reclamar no prazo de 120 dias (art. 70° do CPPT) ou impugnar no prazo de 90 dias (art. 102 do CPPT), com os fundamentos referidos no art. ° 99 do CPPT.

Por Deleg. do Chefe do Serviço e Finanças em substituição

Jorge……………………….

I.T, Nível 2 Aviso n° 14054 do D.R. IISérie n° 149 de 2007.08.03»

- cfr. doc. 2 junto com a p.i. e fls. 76/77 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, e ainda por confissão no art°10° da p.i..

B) Em 14.12.2005, foi instaurado no Serviço de Finanças de Portimão, contra a ora Oponente, o processo de execução fiscal n°………………….., para cobrança coerciva da dívida de IMT a que se refere a al. A), e acrescido - cfr. fls. 26 e 27 dos autos.

C) A Oponente foi citada em 21.12.2009 - cfr. doc. 1 junto com a p.i..

D) Em 21.01.2010 a oposição deu entrada no Serviço de Finanças - cfr. fls. 2 dos autos.

*

Não se provaram quaisquer outros factos com relevo para a decisão do mérito da causa.

Motivação de facto:

A decisão da matéria de facto provada efectuou-se com base no exame dos documentos, não impugnados, que constam dos autos, referenciados em cada uma das alíneas do probatório, bem como na posição assumida pelas partes nos respetivos articulados.».

IV – Fundamentação de Direito

Da leitura das conclusões de que fizemos a devida transcrição no ponto I supra, constatamos sem dificuldade que o inconformismo da Recorrente quanto ao julgado se situa em três planos ou vertentes: (i) erro de julgamento de facto, por na sentença recorrida não terem ficado assentes como provados factos que a Recorrente expressamente indica; (ii) erro de julgamento de direito por, face a esses factos e aos demais factos constantes do probatório, em como tendo em consideração os normativos que invoca, ser indiscutível que o julgamento final só podia ser de procedência da Oposição e, por fim, (iii) nulidade da sentença por padecer a vários títulos de omissão de pronúncia.

Considerando que no caso concreto o próprio conhecimento da nulidade da sentença por omissão de pronúncia está dependente, pelo menos ao nível da fundamentação da decisão que sobre essa questão entendemos dever ser proferida, da estabilização da matéria de facto, é pelo erro de julgamento de que alegadamente padece o probatório que iniciaremos a apreciação das questões em concurso, após o que se conhecerá das nulidades arguidas e do erro de direito também invocado.

Antes, porém importa proceder a uma correcção à matéria constante do probatório a qual enferma manifestamente de um lapso material.

Efectivamente, consta da factualidade vertida em B) do ponto III supra, a data de 14-12-2005.

Porém, a data correcta, como, para além do mais, resulta dos documentos de fls. 26 e 27 dos autos para que nessa factualidade se remete, é 14-12-2009.

Assim, face ao exposto e ao abrigo do disposto no artigo 662.º do Código de Processo Civil, altera-se a redacção imprimida ao facto apurado em relevo, o qual passará a deter a seguinte redacção:

«B) Em 14.12.2009 foi instaurado no Serviço de Finanças de Portimão, contra a ora Oponente, o processo de execução fiscal n°…………………., para cobrança coerciva da dívida de IMT a que se refere a al. A), e acrescido - cfr. fls. 26 e 27 dos autos.».

Posto isto, apreciemos dos fundamentos do recurso.

Assim:

4.1. Do erro de julgamento sobre a matéria de facto imputado ao julgado

Para a Recorrente o Tribunal a quo errou ao não dar como provado que o Chefe Adjunto do Serviço de Finanças de Portimão procedeu à emissão de uma nota de demonstração da liquidação de IMT e que não a remeteu à Recorrente juntamente com o ofício n°07286, de 14/7/2009; que apenas na nota de demonstração da liquidação consta a justificação para a aplicação da taxa de 6,5%, de IMT, pelo facto de o imóvel em causa ter diferentes afectações e que a citação não era acom­panhada de cópia do título executivo, nem constava da mesma a proveniência da dívida, nem a identidade da entidade promotora da execução.

Deixemos já assente, porque pacífico face à lei e ao entendimento que desta a doutrina e a jurisprudência vem desde há muito fazendo, que os factos que o Tribunal deve levar ao probatório são os factos que, segundo as várias soluções plausíveis de direito, são relevantes para apreciar do mérito da ou das questões que lhe são colocadas, sendo que, no que concerne a estes, sobretudo quando alicerçados em documentos, do ponto de vista técnico ou do rigor que a selecção da matéria de facto deve assumir, não cabe ao Tribunal verter no probatório conclusões de facto ou de direito, antes devendo limitar-se a dar como provado os mesmos documentos, isto é, o seu teor, mesmo que por remissão, deixando para a sede própria, isto é, para o momento de apreciação e decisão dessas questões, as ilações que desse factos entenda dever extrair.

No caso concreto, a Recorrente, como se vê da sua petição inicial e onde ficou delimitada a sua causa de pedir, invocou três vícios como fundamento da sua pretensão: (i) a falta de notificação válida da liquidação de imposto a que as dívidas do processo de execução se reportam; (ii) a nulidade insanável do processo executivo por a citação não vir acompanhada do título executivo nem reproduzir os seus elementos essenciais e (iii) a falta de competência do autor do acto para a sua prática.

No que se reporta às questões da nulidade por falta de título executivo e à incompetência do autor do acto, que se mostram associadas nesta impugnação do julgamento de facto ao não apuramento de «que a citação não era acom­panhada de cópia do título executivo, nem constava da mesma a proveniência da dívida, nem a identidade da entidade promotora da execução», impõe-se salientar, antes de mais, que o Tribunal a quo, em sede de conhecimento das excepções suscitadas, isto é, previamente à apreciação do mérito da pretensão, apreciando a questão do erro na forma de processo decidiu o seguinte:

«(i) Da nulidade da citação:
A Oponente vem alegar a nulidade da citação, em síntese, por não se mostrar acompanhada do título executivo nem reproduzir os respetivos elementos essenciais (art.°s 2.°, 32.° a 38.° da p.i).
Referindo-se ao ato de citação, está em causa uma irregularidade ou nulidade do mesmo, sendo certo que, as nulidades ou irregularidades no ato de citação não são fundamento legal de oposição, porquanto não afetam a execução no seu todo mas um ato praticado adentro da execução, posterior à sua instauração, e os atos posteriores a essa citação que dela dependam absolutamente. A sua confirmação não importa a extinção da execução mas - se for o caso - a repetição o ato de citação com cumprimento das formalidades omitidas — neste sentido, e quanto à falta de citação (com argumentação inteiramente aplicável à nulidade ou irregularidade da citação, por maioria de razão), cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado, 3.a edição rev. e aum., 2002, pág. 828 e jurisprudência ali citada.
O meio processual adequado para a arguição da nulidade ou irregularidade respectiva é o requerimento no próprio processo executivo, dirigido ao órgão de execução fiscal. Da decisão que recair sobre tal arguição cabe reclamação nos termos dos artigos 276.° e seguintes do CPPT.
Ocorre, pois, no que à nulidade da citação respeita, erro na forma do processo.
(ii) Da ilegalidade da liquidação.
É verdade que, nos artigos 3° a 18° a Oponente invoca diversa factualidade que, a ser procedente, poderia contender, em última instância, com a legalidade da liquidação de MT cujo pagamento se encontra a ser exigido coercivamente no âmbito da execução fiscal a que a presente oposição respeita, levando à sua anulação.
Sucede no entanto que, no pedido formulado a final não são retiradas consequências de tal alegação, porquanto não vem peticionada a anulação da liquidação, ou a declaração da ilegalidade da dívida exequenda (que surtiria o mesmo efeito prático).
Assim, e no que à referida matéria se respeita, o tribunal entende tal alegação como enquadramento iàctual da causa de pedir que constitui fundamento da oposição — a alegada falta de notificação da liquidação -, não ocorrendo, nessa medida, erro na forma do processo.
O mesmo não se pode dizer relativamente ao alegado nos art.°s 27° a 31° da p.i., em que a Oponente pretende retirar como consequência da alegada incompetência para a prática do ato de liquidação a ineficácia do mesmo. Não é assim.
Na verdade, a violação das regras relativas à competência para a prática de atos administrativos tem como desvalor a sua ilegalidade intrínseca, conduzindo à sua anulabilidade.
Diga-se ainda que o CPPT prevê, na alínea h) do n°1 do artigo 204°, como fundamento de oposição, a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, no entanto, a possibilidade de invocar a ilegalidade como fundamento de oposição é bastante restritiva, apenas podendo ser usada quando a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação. Está em causa uma norma que pretende acautelar as situações em que o sujeito passivo não dispõe de meios de impugnação contenciosa do ato de liquidação, como é o caso das contribuições para a segurança social, em que se permite a extração de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento, sem que haja um ato administrativo ou tributário prévio, definidor da obrigação (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, em Código do Procedimento e do Processo Tributário - Anotado e comentado, Vol. II, Áreas Editora, 2007, págs. 366 e367).
O mesmo é dizer que, a discussão da legalidade da liquidação da dívida exequenda, em sede do meio processual de oposição à execução fiscal, depende de se verificar um condicionalismo adicional: a lei não assegurar outro meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação.
Como refere, também, CASALTA NABAIS, em Direito Fiscal, 2.a ed., a págs. 323, a propósito do processo de oposição regulado pelo CPPT: "Como facilmente se compreenderá, na oposição à execução fiscal não é, em princípio, admitida a discussão da ilegalidade do ato tributário, que deve ser discutida no processo de impugnação, a menos que, como prescreve a alínea h) do preceito em causa, a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra esse ato".
O que significa que, relativamente às dívidas criadas por atos administrativos e ou tributários nunca existe a possibilidade de discutir a sua legalidade em concreto em sede de oposição à execução fiscal.
Pelo exposto, ocorre, no que à alegada incompetência se refere, a exceção de erro na forma do processo, estando em causa matéria que só em sede de impugnação judicial pode ser escrutinada - cfr. os artigos 97.° e 99.° do CPPT.
Por regra, o erro na forma do processo, importa a convolação na forma processual adequada (cfr. artigos 97°, n°3, da LGT e 98°, n°4, do CPPT e 193°, n°1 do CPC), se a isso nada obstar, designadamente a cumulação de pedidos para os quais sejam aplicáveis formas de processo distintas, que seria o caso, como vimos.
No entanto, se de entre os pedidos cumulados a forma processual utilizada for a correta para algum deles, então, prosseguem os autos para conhecer dos mesmos.
É o que sucede in casu, já que vem alegada a falta de notificação da liquidação em cobrança coerciva, que constitui fundamento de oposição nos termos do disposto na al. i) do n°1 do art.°204° do CPPT, pelo que se impõe ao tribunal o seu conhecimento.».
Em suma, o Tribunal a quo julgou que o meio processual em que se move a nossa decisão – Oposição Judicial – não é o meio próprio para invocar a nulidade da citação ou a incompetência nos termos em que a Oponente o fazia e, consequentemente, afastou expressamente da sua apreciação o mérito sobre tais questões.
Donde, qualquer factualidade invocada quanto a estes concretos vícios e as ilações que para efeito dessa apreciação alegadamente se mostram em falta (que é o que verdadeiramente traduz a alegação em causa) estão necessariamente votadas ao insucesso e não podem, de todo, sustentar o erro de julgamento invocado.
Diga-se, no entanto, que essa alegação da Recorrente, mesmo que juridicamente mal qualificada, pode ainda ser interpretada como uma imputação de erro de julgamento à decisão proferida quanto à excepção de erro na forma de processo, razão pela qual, na sede própria e nesse contexto jurídico – recursivo, se apreciará.
Relativamente à questão de o Tribunal ter omitido que o Chefe Adjunto do Serviço de Finanças de Portimão procedeu à emissão de uma nota de demonstração da liquidação de IMT, que não a remeteu à Recorrente juntamente com o ofício n°07286, de 14/7/2009 e que apenas na nota de demonstração da liquidação consta a justificação para a aplicação da taxa de 6,5%, de IMT é também de julgar totalmente improcedente o erro imputado ao julgado.
Efectivamente, e como deixámos já claramente exposto, as únicas questões colocadas pela Oponente em sede de petição foram a nulidade da citação por não vir acompanhada do título executivo nem conter as menções legalmente exigíveis, a incompetência do autor do acto e a falta de notificação das liquidações, questões para as quais - sobretudo para esta última que esgotava, para o Tribunal o mérito dos autos (pelas razões já apontadas) - aqueles factos são absolutamente irrelevantes.
Improcede, assim, in totum, o recurso sustentado no erro de julgamento sobre a matéria de facto.

4.2. Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia

Veio ainda a Recorrente pedir a este Tribunal de recurso que julgue a sentença nula por omissão de pronúncia por não ter apreciado (i) a alegação da Recorrente de que o ofício remetido à Oponente não poderia nunca conter a liquidação de IMT, ou reportar-se à mesma, ocorrendo assim falta de notificação da liquidação de imposto, visto que apenas os Serviços Centrais poderiam proceder à sua emissão, não tendo o Adjunto do Serviço de Finanças competência para a respectiva emis­são; (ii) não se ter pronunciado sobre o documento constante de fl. 74 dos autos, correspondendo a fl. 46 da informação que o Serviço de Finanças de Portimão juntou aos autos, designado por "LIQUIDAÇÃO DE IMT DEMONSTRAÇÃO", nem sobre a ausência do seu envio à Re­corrente e (iii) não ter apreciado o vício de ilegalidade imputado pela Recorren­te à citação pelo facto de a mesma não ter sido acompanhada de cópia do título executi­vo, não indicar a natureza e proveniência da dívida, nem identificar a entidade promotora da execução, em virtude de não compreender que as mencionadas faltas não são nulidades, pelo facto de puderem ser supridas por prova documental.

É pacífico que o vício de omissão de pronúncia, nos termos em que o mesmo se encontra legalmente previsto e tem vindo a ser jurisprudencial e doutrinalmente conformado tem que traduzir-se, para se julgar verificado, numa violação pelo decisor do poder-dever a que está estritamente vinculado de conhecer de todas as questões que lhe sejam submetidas pelas partes, com excepção, apenas, daquelas que sejam de conhecimento oficioso ou que vejam a respectiva solução prejudicada pela que haja sido dada a outra ou outras entretanto apreciadas. (1)

Acresce que, como igualmente vem sendo exteriorizado em múltiplos arestos, não devem confundir-se questões com as razões (de facto e de direito), os argumentos, os pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão.

Assim, e no entender deste Tribunal, serão questões as que se reconduzam à determinação das premissas fundamentais de que a parte pretende extrair uma conclusão em que fundamente o seu pedido. Recorrendo ao esquema do silogismo judiciário (em que a premissa maior é a lei, a menor são os factos e a conclusão é a decisão), teremos uma questão de facto quando está em causa a verificação do facto pressuposto que deva integrar a premissa menor e teremos uma questão de direito quando está em causa a determinação da norma que deva integrar a premissa maior ou do sentido que essa norma tem enquanto critério de resolução desse caso concreto.

Diversamente, são argumentos os raciocínios teoréticos desenvolvidos para a verificação de cada uma das premissas. Assim, para determinar se ocorreu uma determinada situação concreta podemos ser obrigados a reconstituir diversos acontecimentos cruzando-os entre si ou mediando-os com o recurso a regras da experiência ou juízos de probabilidade que, na sua instrumentalidade, ajudam ao reconhecê-la (juízos históricos). Mas a questão de facto permanece a mesma. Também para concluir sobre o alcance ou sentido abstracto da previsão normativa (juízo interpretativo) podemos desenvolver argumentos históricos, gramaticais, sistemáticos ou teleológicos, mas a questão de direito permanece a mesma
O que vimos expondo, conjugado com o teor da sentença recorrida em toda a sua integralidade, em especial tendo em consideração a decisão já transcrita quanto ao erro na forma de processo, permite-nos concluir, sem que qualquer dúvida nos assista, que não há qualquer omissão de pronúncia a assacar à sentença sob recurso por todas as questões terem sido equacionadas, ainda que, relativamente a parte delas, o Tribunal a quo, porque tenha entendido que a Oposição Judicial não era o meio próprio não tenha apreciado do mérito do seu fundamento.
A este propósito, e porque irrepreensível, permitimo-nos transcrever o despacho proferido pela Meritíssima Juiz a quo em obediência ao disposto no artigo 617.º n.º 1 do Código de Processo Civil:

«(…) no que respeita à alegada falta de pronúncia supra identificada em "ii", levada à Conclusão 7, resulta tal aspeto apreciado na parte "II" da sentença, dedicada ao saneamento dos autos, onde se refere, designadamente, que «... as nulidades ou irregularidades no ato de citação não são fundamento legal de oposição», concluindo pela existência de erro na forma do processo porquanto, «O meio processual adequado para a arguição da nulidade ou irregularidade respectiva é o requerimento no próprio processo executivo, dirigido ao órgão de execução fiscal».

Sobre a omissão identificada em "i" de que a sentença não aprecia a alegação da de que o ofício remetido à Oponente não poderia nunca conter a liquidação de IMT, ou reportar-se à mesma, concluiu o tribunal, na pág. 10 da sentença que «...resulta do teor do referido oficio que o mesmo integra, em si mesmo, o próprio ato tributário de liquidação de IMT cujo valor se encontra a ser cobrado coercivamente na execução fiscal de que os presentes autos são oposição», explicitando-se, de seguida, a razão pela qual assim se entendeu

Por fim, e quanto à alegada feita de pronúncia sobre o documento de fls. 74 dos autos, constata-se que o mesmo fez parte do processo de execução fiscal enxertado nos próprios autos de fls. 26 a 94, não resultando de parte alguma da petição inicial qualquer alegação sobre o mencionado documento em concreto, o mesmo sucedendo em relação à contestação, não impendendo sobre o tribunal o dever de pronúncia sobre todo e qualquer "papel" constante do processo instrutor (no caso do Processo de Execução Fiscal), mas apenas e só, conforme se começou por enunciar acima, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação» (negrito de nossa autoria).
E, porque assim é, forçosamente deverá concluir-se no sentido de que também com este fundamento o recurso jurisdicional interposto não merece provimento.

4.3. Enfrentemos agora os erros de julgamento imputados à sentença relativamente ao erro na forma de processo no que diz respeito à nulidade/ ilegalidade da citação por não vir acompanhada de cópia do respectivo título nem conter as menções constantes do artigo 163.º do CPPT e quanto à falta de notificação da liquidação.

4.3.1. Na sentença recorrida, como já transcrevemos supra, foi entendido que a Oposição Judicial não era o meio próprio para invocar a nulidade da citação.
A Recorrente, como evidencia a sua petição inicial, suportada na alegação de que a citação não tinha sido acompanhada do título executivo nem reproduzia os respectivos elementos essenciais o que constituía uma violação do preceituado no artigo 190.º do CPPT conclui «que a referida citação padecia de ilegalidade e irregularidade e nulidade insuprível por falta dos requisitos essenciais do título executivo nos termos da alínea b) n.º 1 do art. 165.º do CPPT».
Na decisão recorrida a Meritíssima Juiz, face ao invocado, entendeu que estava em causa um acto de citação no âmbito do processo de execução fiscal ao qual eram imputadas irregularidade e nulidades insusceptíveis de constituir fundamento legal de oposição por não afectarem a execução no seu todo, mas apenas um ato (o que estava a ser questionado) praticado na execução, posterior à sua instauração, e os atos posteriores a essa citação e que dela dependam absolutamente.
Tudo, para concluir que a ser confirmada a irregularidade, a ilegalidade ou a nulidade as consequências ou efeitos são a repetição do ato de citação com cumprimento das formalidades omitidas e não a extinção da execução, fim primacial da oposição judicial.
Mais adiantou a Meritíssima Juiz, na análise que faz da questão que vinha suscitada (erro na forma de processo), que o meio processual adequado para a arguição da nulidade ou irregularidade respectiva é o requerimento no próprio processo executivo, dirigido ao órgão de execução fiscal a que pode seguir-se uma reclamação interposta nos termos do artigo 276.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, caso o arguente da nulidade se não conforme com a decisão que eventualmente sobre a mesmas recaia.
Para a Recorrente a sentença recorrida enferma de erro de interpretação jurídica, pois interpretou o disposto no n°1 do art.165° do CPPT no sentido de que: caso a citação não seja acompanhada da cópia do título executivo, nem contenha os elementos constantes das als. a), c), d) e e) do n°1 do artigo 163° do CPPT, será nula, sem atender ao facto de que, caso a falta dos mencionados elementos seja susceptível de ser suprida por prova documental, a citação não será nula, mas apenas ilegal e que encerra erro de julgamento porque devia ter declarado a ilegalidade da citação por não ter sido acompanhada de cópia do título executivo, não indicar a proveniência da dívida, nem identificar a entidade promo­tora da execução, em violação do disposto nos arts. 190° n°1, 163° n°1 e 165° n°1 al. b) ab contrario, todos do CPPT.

Diga-se, desde já, que bem se julgou em 1ª instância, sendo absolutamente uniforme na jurisprudência e na doutrina o entendimento de que a nulidade da citação não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, antes devendo ser arguida em primeira linha perante o órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável.(2)

Aliás, em bom rigor, nem sequer logra este Tribunal compreender em que parte da decisão sindicada foi a Recorrente colher que a Meritíssima Juiz tenha interpretado o artigo 165.º do CPPT nos termos que enuncia, por na decisão, onde o referido preceito nem chega a ser mencionado, nada apontar nesse sentido.

O que a decisão afirma, insista-se, é que os vícios invocados não são fundamento de oposição e, insista-se de novo, não são, pelo que, também nesta parte se não julga que a sentença seja merecedora de qualquer censura.

4.3.2. Por último, apreciemos do alegado erro de julgamento por na sentença ter ficado decidido que não houve falta de notificação da liquidação, vício que foi arguido e sobre o qual o Tribunal efectivamente tinha de se pronunciar, sendo neste contexto que se apreciarão as alegações da Recorrente para o suportar: o ofício 7286 não continha a liquidação de IMT, a qual apenas foi notificada à Recorrente com a demonstração de liquidação de IMT, documento autónomo onde veio a constar a justificação para taxa de juro aplicada e que também nunca lhe foi enviado.
Nesse sentido, saliente-se antes de mais que não está impugnado nos autos, antes foi alegado (confessado) pela Recorrente no articulado inicial desta acção, que recebeu a 27 de Julho de 2009 o ofício n°7286 datado de 14 do mesmo mês e ano.
O teor do referido documento encontra-se dado como provado (e não impugnado neste recurso) na alínea A do probatório (cfr. ponto II supra).
Ora, como se disse na sentença recorrida, contrariamente ao invocado pela ora Recorrente, aquele ofício consubstancia ele mesmo o acto tributário de liquidação do IMT que se encontra a ser exigido no processo de execução a que a agora Recorrente deduziu a presente Oposição.
Tal conclusão resulta manifestamente comprovada:

- Da identificação do ''Assunto" a que se dedicava o ofício: "Liquidação de IMT”, da expressa advertência com que se inicia o texto da mesma; «Nos termos do nº 4 do art. 31° do código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMIT) e do artigo 36°do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) fica notificado da liquidação do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMIT), com fundamento no n°1 do art. 12° do CIMT e al. a) do n°1 do art. 27° do Decreto -Lei 287/2003 de 12/11, relativo à transmissão abaixo.”;

- Das razões de facto e de direito, vulgo, fundamentação, pelas quais aquela notificação/liquidação lhe estava a ser efectuada: «Adquiriu o prédio urbano, sito no Poço, ………….., inscrito na matriz predial da freguesia de ………, concelho de…………. sob o artigo …….., com o valor patrimonial tributário de €1.130.075,91, pelo preço do €473.858,00 conforme escritura de compra e venda lavrada no Notariado Privativo da…………………., em 2004/06/25. O artigo tratava-se de um prédio em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente possuindo 23 divisões independentes, da P-A até à P-X. Em 2004/08/20 a empresa entregou modelo 1 do IMI do prédio constituído em regime da Propriedade Horizontal com o motivo prédio/melhorado/reconstruído e respectiva escritura da Constituição da Propriedade horizontal. Essa declaração do IMI deu origem ao artigo 5642, as fracções passaram a ser 19.

Como o prédio foi modificado foi-lhe dado destino diferente pelo que a isenção caduca nos termos do n°5 do artigo 11° do Código do IMT. Assim sendo deveria o sujeito passivo ter solicitado a liquidação do IMT referente ao artigo 3734 nos termos do artigo 34° do CIMT após a alteração efectuada, pelo que será efectuada oficiosamente.»;

- Pelo apuramento do imposto a pagar antecedido do termo "Liquidação:" com indicação do seu cálculo e respectivos juros compensatórios, indicação expressa do prazo de pagamento, advertências quanto às consequências de não pagamento dentro do prazo indicado e o meio de o realizar, bem como os meios legais de reacção discordando da notificação que lhe estava a ser realizada.
«Liquidação:

€1.130.095, 91 x 6,5% = €73.454,93

Juros Compensatórios €14.167,75. Correspondente a 1760 dias, a contar de 30-08-2004 até 24-06-2009, data em que pediu liquidação de IMT de algumas fracções do artigo 5642.

Assim fica notificado para no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da recepção do presente oficio, nos termos do nº6 do art°36°do CIMT, solicitar, neste Serviço de Finanças, guias para pagamento no valor de €87.622,68 (oitenta e sete mil seiscentos e vinte e dois euros e sessenta e oito cêntimos) referente a IMT e Juros Compensatórios. Na mesma data o pedido de redução de coima será considerado e emitidas as guias respectivas.

Mais fica ciente de que se o pagamento não se fizer no referido prazo se procederá à extracção de certidão de dívida para efeitos de cobrança coerciva, sem prejuízo do direito de reclamação ou impugnação a que se referem os artigos 43° do CIMT e 68° e 99° do CPPT. Da liquidação de IMT, poderá reclamar no prazo de 120 dias (art. 70° do CPPT) ou impugnar no prazo de 90 dias (art. 102 do CPPT), com os fundamentos referidos no art. ° 99 do CPPT.».

Em suma, o ofício em referência, confessadamente recebido pela Recorrente, é uma verdadeira liquidação, ainda que realizada sem recurso aos hoje tão vulgarizados programas informáticos - tipo da DGSI, mas “manualmente”, que integra, onde se determina o valor tributável nos termos do n°1 do art°12.° do CIMT; de onde consta a indicação da taxa aplicada - a prevista no art.° 17.° do CIMT - e consequente imposto apurado e, ainda, onde são calculados os juros compensatórios devidos, conforme estipulado no art.° 33.° do mesmo Código.
Daí que, como muito bem se afirmou na sentença recorrida, qualquer destinatário médio, isto é, mesmo que não seja possuidor de especiais conhecimentos em matéria de liquidações, não teria qualquer dúvida em compreender que estava a ser destinatário de uma liquidação de IMI.
Considerando o exposto e que se mostra ainda provado que a Recorrente foi notificada dessa liquidação a 27 de Julho de 2009, é forçoso concluir que a liquidação em cobrança coerciva nos autos de execução apensos é eficaz por lhe ter sido validamente notificada e, consequentemente, nenhum reparo jurídico deve ser apontado, na ausência de pagamento voluntário do tributo, à extracção de dívida e instauração de processo executivo tendo em vista a sua cobrança coerciva.
Improcedem, assim, os alegados erros de julgamento de direito apontados á sentença e, com eles, in totum, o recurso interposto.

V- DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes que integram a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar integralmente improcedente o recurso jurisdicional interposto pela Oponente e, em conformidade, em manter integralmente na ordem jurídica a douta decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 18 de Junho de 2015


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(Anabela Russo)

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(Lurdes Toscano)

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(Ana Pinhol)


(1) Cfr., neste sentido, o também actualíssimo Ac. do STA de 20-2-2014, lavrado no processo n.º 742/12, mantendo doutrina há muito firmada.

(2) Neste sentido podem consultar múltiplos arestos do nosso mais Superior Tribunal, de que é seu mais recente exemplo o recentíssimo Acórdão de 4 de Março de 2015, proferido no processo n.º 1271/13, integralmente disponível em www.dgsi.pt. No mesmo sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, em «Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado», Áreas Editora, 6.ª edição, III volume, anotações 13 e 14 ao art. 165.º, págs. 144 a 147 e anotação 8 b) ao art. 190.º, págs. 369/371.