Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04487/11
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:02/22/2011
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IMPUGNAÇÃO DE IRS. ADIANTAMENTO POR CONTA DE LUCROS.
Sumário:· O montante de proveito de uma sociedade directamente depositado na conta bancária pessoal de um seu gerente, que o não fez relevar na sociedade, tem de se entender que o foi a título de adiantamento por conta de lucros e que constitui um rendimento deste, a tributar em sede de IRS, categoria E, como rendimento de capitais, de englobamento obrigatório no rendimento colectável.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

1. A FAZENDA PÚBLICA, veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do TAF de Sintra, pela qual foi julgada procedente a impugnação judicial deduzida por A... contra o acto de liquidação do IRS do ano de 1995.
São estas as conclusões das alegações do recurso e que definem respectivo objecto:
“I -Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou parcialmente procedente a Impugnação Judicial deduzida por A... na sequência do deferimento parcial da reclamação graciosa da liquidação adicional de IRS n°5323521499 do ano de 1995, no montante de €20.608,45, na parte relativa à correcção atinente à omissão de rendimentos da Categoria E.
II -A decisão de anular a correcção efectuada pela Administração Fiscal assenta no entendimento segundo o qual " (...) não se encontra demonstrada a existência do facto tributário, por inexistirem os lançamentos em conta corrente do sócio, aqui Impugnante, na sociedade B... - Sociedade de Comércio de Veículos, Lda., não podendo a presunção funcionar em relação a si, ainda que os montantes em causa respeitem a cheques emitidos pela sociedade em nome do Impugnante e depositados deste, mas o que só por si por si não tem a virtualidade de fazer funcionar a presunção legal contra o Impugnante, pelo que através dela não é possível alcançar o facto desconhecido e era este que constituía a base da incidência do imposto, no caso. Ora, sendo inquestionável que a existência dos referidos lançamentos nas contas correntes dos sócios das sociedades é um pressuposto inultrapassável à existência da presunção legal ali contemplada, em favor da Administração Fiscal, prova que logrou fazer, teria então, que recolher elementos suficientes que comprovassem que aquela quantia havia sido distribuída pelos sócios, de forma a fundamentar a sua actuação, o que não logrou fazer."
III -No âmbito da acção inspectiva efectuada à sociedade "B... - Sociedade de Comércio de Veículos, Lda.", detectou a Inspecção Tributária a emissão à ordem dos sócios-gerentes, entre eles o Impugnante, de diversos cheques resultantes da omissão de vendas na contabilidade da empresa, os quais foram depositados em contas extra contabilísticas de que eram titulares os mesmos sócios.
IV -Ora, constatou a Inspecção que a emissão dos cheques a favor do Impugnante, e do outro sócio, resultou de omissões na contabilidade da empresa, e que a contabilidade desta não revelava a existência de movimentos anteriores que justificassem a emissão desses cheques.
V -Assim, concluiu, e bem, a Inspecção que inexistindo qualquer transacção anterior, subjacente à movimentação dos montantes em causa, tais cheques são resultado de verbas não contabilizadas como proveitos, tratando-se, pois, de rendimento obtido pela sociedade e colocado à disposição do sócio -gerente, o qual será tributado em sede de IRS, a título de adiantamento por conta de lucros, nos termos da alínea h), do n°1, do artigo 6° do CIRS, como rendimento da categoria E.
VI -Assim, demonstrou a Inspecção a ocorrência dos pressupostos legais que legitimam a correcção ao rendimento declarado pelo Impugnante, dado que o mesmo recebeu importâncias pertença da sociedade e que reverteram para a sua esfera pessoal, sem que tenham sido objecto de contabilização na esfera jurídica da sociedade.
VII -Com efeito, não consta do Relatório qualquer referência à presunção do artigo 7°, n°4, do CIRS, fundamentando-se a correcção no que dispõe a alínea h), do n°1, do artigo 6° do CIRS, e encontrando-se claramente demonstrado, sem necessidade de fazer apelo à presunção, que houve distribuição aos sócios de quantias a título de adiantamento por conta de lucros, através de cheques emitidos pela sociedade e depositados em contas extra contabilísticas.
VIII -Aliás, é o próprio Impugnante que admite, na petição, a existência de contas extra contabilísticas, utilizadas pela e na actividade da B..., e que foi beneficiário de certas importâncias, não obstante não estar em condições de determinar o montante de que beneficiou, factos relativamente aos quais não faz a douta sentença qualquer referência.
IX -Mas, admitindo que a correcção em causa tem por base a presunção do artigo 7°, n°4, do CIRS, cumpre referir que, ao contrário do que defende a sentença, as contas bancárias dos sócios funcionavam como verdadeiras contas correntes de distribuição de lucros da sociedade, a título de adiantamentos, conforme, aliás, resulta dos artigos 20° a 26° da petição inicial em que o Impugnante, sem contrariar a existência das contas, se insurge, tão só, contra a forma como a Inspectora faz a imputação dos rendimento aos sócios;
X -O que permite provar que as importâncias movimentadas através dos cheques beneficiaram os sócios, os quais obtiveram lucros sem que a sociedade suportasse os impostos a que estava obrigada;
XI -Encontrando-se, desta forma, cabalmente demonstrada a existência do facto tributário gerador dos rendimentos de capitais, sujeito a IRS nos termos do art. 6°, n°1, alínea h), do respectivo Código.
XII -E perante a demonstração da existência dos pressupostos legais que legitimam a correcção ao rendimento declarado pelo Impugnante, dado que o mesmo recebeu importâncias pertença da sociedade e que reverteram para a sua esfera pessoal sem que tenham sido objecto de tributação em sede de IRC, restava ao Impugnante a prova de que tais importâncias haviam sido recebidas a outro título, ou por outros, ou que as mesmas tinham sido transferidas para a sociedade, prova que não logrou fazer;
XIII -Limitando-se o Impugnante a afirmar que os actuais sócios da B... se recusaram a fornecer-lhe os documentos de suporte dos movimentos da conta extra contabilística, o que não é suficiente para cumprir o ónus da prova que sobre si impende.
XIV -Com efeito, nenhuma prova foi feita de que não ocorreu adiantamento por conta de lucros, nem em sede de procedimento inspectivo, nem em sede de reclamação graciosa ou da presente impugnação, não cumprindo o Impugnante o ónus da prova que lhe é imposto pelo artigo 74°, n°1, da LGT, o qual determina que o ónus da prova dos factos constitutivos do direito invocado cabe àquele que os invocar, de acordo, aliás, com a norma geral do artigo 342° do CC, que dispõe «àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado».
XV -Assim, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão judicial na parte na parte relativa à correcção atinente à omissão de rendimentos da Categoria E, por padecer a mesma de um erro de julgamento facto e de direito e por violação dos artigos 6°, n°1, alínea h), e 7°, n°4, do CIRS.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada na parte ora contestada, com as devidas consequências legais.
POREM V. EX.AS, DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.”
O recorrido não contra -alegou.
O EPGA pronunciou-se no sentido de que o recurso merece provimento.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
*
2. -A sentença recorrida deu como assentes os seguintes factos com relevância para a decisão:
“A) Em 14.03.1996 o impugnante apresentou a declaração de rendimentos Mod. 1 de IRS, referente ano de 1995. (Doc. fls. 61 do p.a. em apenso)
B) Na declaração de rendimentos a que alude a al. A) do probatório, o impugnante declarou ter auferido, a título de rendimentos de categoria A (trabalho dependente) €68.250,87, tendo sido indicados, no quadro referente a abatimentos, €1.116,05 relativos a despesas de saúde; €4.013,67 referentes a despesas de educação de dependentes não deficientes; €1.496,01 respeitantes a seguros de vida e acidentes pessoais e contribuições para regimes complementares de segurança social, e €2.907,99 relativos a donativos. (Doc. fls. 64, 67 e 68 do p.a. em apenso)
C) Com base na declaração apresentada foi efectuada a liquidação n°4111484489, de 05.07.1996, na qual se apurou imposto a pagar montante de € 5.406,69. (Doc. fls. 70 do p.a. em apenso)
D) Em cumprimento da Ordem de Serviço n°35369 de 19.01.99, a Administração levou a efeito uma acção de fiscalização ao impugnante, na sequência da qual elaborou o Relatório Final do qual se destaca:
" 1. Rendimento de Capital Categoria E
Como consequência da inspecção ao exercício de 1995 à firma "B.... — Sociedade de Comercio de Veículos Lda", em que o sujeito passivo em analise era sócio gerente, e na qual se detectou a emissão de cheques a favor do mesmo, resultantes de omissão de vendas na contabilidade da referida firma, cheques estes depositados em contas extra contabilísticas, n°207/32569/000.6 e 207/35035/000.0 de que são titulares os sócios gerentes, Manuel A... e Joaquim Calem, foi aberta Ordem de Serviço, para inspecção aos dois contribuintes referidos.
Os cheques emitidos ao sócio gerente em análise, devidamente identificados em mapa resumo anexo, (que se juntam alguns exemplares dos cheques emitidos acompanhados das notas de lançamento internas que deram, origem à contabilização), ascendem a 7.510.000$00, considerados como rendimentos de capitais e como tal enquadrados na alínea h) do n.º 1 do art. 6° do CIRS, que deveriam ser sujeitos a retenção por parte da empresa, por respeitarem a "adiantamento por conta de lucros", ao abrigo do n°1 art.94° do referido código.
Pelo descrito, será o sujeito passivo tributado em sede de IRS em Rendimento de. Capitais Categoria E, pelos rendimentos auferidos no valor de 7.510.000$.
2. Obras de arte
Tendo sido detectado, aquando da inspecção à B..., de oras de arte vendidas à firma C..., procedeu-se de acordo com o Despacho de 00/O4/17, afim de verificar da sua permanência naquela empresa.
Aquelas encontravam-se registadas no imobilizado da firma C..., pelo que fomos informados que as referidas obras se encontravam expostas no stand de vendas do Estoril.
Tendo-nos deslocado ao local detectamos que, uma das obras designada por "prato de Picasso", vendido por 600 000$ através da factura 1091 de 95-09-30, não se encontrava no local.
Na C..., fomos informados no serviço de contabilidade que segundo os sócios gerentes, o " Prato Picasso" tinha sido substituído por outros quadros, o que foi confirmado, por conversa telefónica tida por nós com o sócio gerente A...: este referiu ainda que aquele prato se tinha partido.
Não se encontrando aquele bem do imobilizado nas instalações da empresa, mas em caso do sócio A..., aquele não poderá ser substituído pelo que quer que seja, por outro tipo de bens, nem desviado para uso próprio. Assim por este acto, deve o sujeito passivo ser tributado por posse de um bem que era pertença da empresa.
Esta situação obriga à tributação de rendimentos em espécie nos termos n°2 do artigo 1º do CIRS, no montante.
3- Abatimentos c Donativos
O sujeito Passivo na sua declaração Modelo l de IRS fez constar no quadro 14- Abatimentos e Donativos o Lotai de 1.911.339$00, relativamente a:
Campo-235 Despesas Saúde 323.7 34$00
Campo-242 Despesas Educação 804.669$00
Campo-245 Prémios de Seguro299.92S$00
Campo-251 Donativos583.000$00

Relativamente a todos estes custos não foi exibido qualquer documentos comprovativo, pelo que não os possuir, conforme declarou em Termo de Declarações" pelo que irão ser corrigidos, caso não sejam exibidos em audição prévia.
4. Exercício do direito à audição prévia nos termos do artigo 60° da LGT e artigo 60° do RCIT.
O sujeito passivo ao exercer o direito à audição prévia por escrito, refuta todas as correcções que lhe foram propostas através do projecto de conclusões de relatório, sem no entanto ter apresentado qualquer prova que contrariasse aquelas correcções.
(...)
Os elementos a que o sujeito passivo se refere não fazem parte da contabilidade, respeitam sim a elementos unicamente do conhecimento dos sócios (resultantes das tais contas extracontabilisticas). Competindo deste modo aos sujeito passivo apresentar provas que contrariassem os valores que lhe foram imputados.
Do descrito, manter-se-á a correcção proposta relativamente à tributação em sede de IRS -Rendimentos de Capitais — Categoria E, no valor de 7.510.000$.
Relativamente aos restantes pontos, ou seja:
Obras de arte — tributado como rendimentos da categoria A — rendimento em espécie e abatimentos e Donativos — artigo 55° do CIRS, não foram apresentados quaisquer comprovativos pelo que se mantém as correcções propostas." (Doc. fls. 85 a 93 do p.a. em apenso)
E) Com base no Relatório Final de Inspecção, foram efectuadas as seguintes correcções:
.Rendimentos enquadrados na al. h) do n°1 do art 6° do CIRS - O impugnante foi tributado em sede de IRS, rendimentos de capitais, categoria E, pelos rendimentos auferidos no valor de €37.459,72 ( Esc. 7510.000$00);
.Rendimentos enquadrados no n°2 do art. 1° do CIRS - O impugnante foi tributado em sede de IRS, rendimentos do trabalho dependente, categoria A, pelos rendimentos em espécie auferidos no valor de €2.992.78 ( Esc. 600.000$00);
.Abatimentos e donativos declarados pelo impugnante no montante global de € 9.533,72 ( Esc. 1.911.339$00):
RUBRICA MONTANTE
Despesas com a saúde
€11 16,05
223,747$
Despesas com a educação€4.013,67804.669$
Prémios de Seguro€ 1496,01299923$
Donativos€ 2.907,99583.00$
Total€9.533,721911339$

F)Com base nas correcções efectuadas, em 27.10.200 a Administração Fiscal emitiu a liquidação adicional de IRS n.° 5323521499, no valor de €20.608,45.
G) Em 20.03.01, o Impugnante deduziu reclamação graciosa contra a liquidação adicional de IRS a que alude a ai.F) do probatório. (Doc. fls. 3 a 6 do p.a. em apenso)
H) Por despachos proferidos a 04.05.2004, 10.08.2004 e 22.1.2004 da autoria do Chefe de Divisão da Direcção de Justiça Administrativa, por subdelegação de competências, foi a reclamação graciosa a que alude a al. F) do probatório, deferida parcialmente. (Doc. fls. 128 a 138, 142 e 146 a 148 do p.a. em apenso)
I) Em resultado do deferimento parcial a que alude a Al. I) do probatório, não foram atendidos:
Rubrica Valor corrigido pelos SIT e reclamado Valor não atendido
Rendimentos de Capitais € 37.459,72 € 37.459,72
Rendimentos em espécie € 2.992,78 € 2.992,78
Abatimentos e donativos € 9533,72 €423,55
Despesas com a saúde € 11 16,05 € 1116,05
Despesas com a educação €4013,67 €83,01
Prémios de seguro € 1496,01 € 873,70
Donativos € 2907,99 € 2159,79
Total € 49.986,22 € 44685,05

J) Em 11.03.2005, foi emitida a liquidação de IRS n.° 5330052288, concretizando os despachos a que alude a al. G) do probatório. (Doc. fls. 155 do p.a. em apenso)
L) Em 18.12.95, o Impugnante emitiu à ordem do Banco Alimentar Contra Fome o cheque n.° 968761459, sob a conta n.° 800367366 do Banco Pinto & Souto Mayor no montante de Esc. 20.000.000$00. (Doc. fls. 11 do p.a. em apenso)
M) Em 29.12.95, o Banco Alimentar Contra a Fome emitiu a favor do Impugnante o recibo n.° 9009, no montante de Esc. 20.000.000$00. (Doc. fls. 9 dos autos)
N) Em, 18.10.95, a Cercica - Cooperativa para a Educação e Reabilitação de Crianças Inadaptadas de Cascais solicitou, ao Impugnante mediante oficio n.°007/LS/95, o pagamento da quota no montante de 60.000$00. (Doc. fls. 12 do p.a. em apenso)
O) Em 31.10.95, o Impugnante emitiu a favor da Cercica — Cooperativa para a Educação e Reabilitação de Crianças Inadaptadas de Cascais o cheque n.° 3669833028, sob o Banco Espírito Santo no montante de Esc. 60.000$00. (Doc. fls. 13 do p.a. em apenso
P) Em 13.11.95, a Cercica — Cooperativa para a Educação e Reabilitação de Crianças Inadaptadas de Cascais enviou ao Impugnante o recibo n°1876, no valor de 60.000$00, referente ao pagamento da quota anual. (Doc. fls. 11 dos autos)
Q) Dá-se como integralmente reproduzida para todos os efeitos legais a carta subscrita pelo Impugnante e dirigida à Fundação AMI. (Doc. fls. 14 do p.a. em apenso)
R) Em 16.08.95, o Impugnante emitiu à ordem da Paroquia Nossa Senhora da Assunção o cheque n°9662813390, sob o Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa no montante de 200.000$00. (Doc. fls. 15 do p.a. em apenso)
S) Em 31.08.1995, a Paroquia Nossa Senhora da Assunção emitiu o recibo declarando ter recebido do Impugnante a quantia de 200.000$00, para apoio de obras materiais da Comunidade Paroquial. (Doc. fls. 13 dos autos)
T) Em 95.03.30, o Impugnante emitiu à ordem da Liga de Amigos do Hospital de D. Estefânia o cheque n°7362813080, sob o Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa no montante de 50.000$00. (Doc. fls. 17 do p.a. em apenso)
U) Em 12.07.95, a Liga de Amigos do Hospital de D. Estefânia emitiu a favor do Impugnante o recibo n°1239, no montante de 50.000$00. (Doc. fls. 15 do p.a. em apenso)
V) Em, 30.12.95, o Comité Português para a Unicef emitiu a favor do Impugnante o recibo n.° 152931, no montante de 50.000$00, e do qual conta designadamente o seguinte: " Redutível nos impostos nos termos do Decreto — Lei n.º 74/99, de 16 de Março." (Doc. fls, 10 do p.a. em apenso)
X) Em 15.05.05, o Comité Português para a Unicef emitiu a favor do Impugnante o recibo n.° 4213no montante de 50.000$00. (Doc. fls. 14 dos autos)
Z) Em 07.03.97, a Companhia de Seguros Mundial Confiança, S.A emitiu o recibo n.°1237443 - ramo acidentes de trabalho -, no montante de 87.631$00. (Doc. fls. 35 dos autos)
AÃ) Dá-se como integralmente reproduzida para todos os efeitos legais a declaração emitida a 02.07.2000, da qual se extrai: "Em Novembro de 1995 a C... entregou um prato de cerâmica com cerca de 30 cm de diâmetro, cujo motivo era um desenho " Tipo Picasso", estando este contabilizado em 600.000$00 (seiscentos mil escudos), a A... entregando o referido um quadro a óleo com cerca de 80x60cm, cujo motivo é a costa algarvia, assinado por Carlos Ramos, avaliado na mesma quantia.
Passados G (seis) anos, descobre-se que por esquecimento dos serviços de contabilidade nunca foram feitos os lançamentos contabilísticos com vista a abater o "prato" do imobilizado, e a lançar o "óleo" do mesmo. Esta situação é reforçada com o facto do referido óleo, se encontrar exposto no stand da C... desde 1995 (conforme fotocópia). " (Doc. fls. 36 do p.a. em apenso)
AB) O Impugnante permutou com a C... um prato de cerâmica com um quadro da autoria de Carlos Ramos. (Cfr. depoimento das testemunhas D...e E...)
AC) O quadro referido na al. AB) do probatório encontra-se nas instalações da C.... (Cfr. depoimento das testemunhas D...e E...)
AD) Em 19.11.2004, deu entrada no Serviço de Finanças de Sintra- 4 a petição inicial que originou os presentes autos. (Cfr. carimbo aposto a fls. 2 dos autos)
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FACTOS NÃO PROVADOS
Inexistem factos não provados com interesse para a decisão da causa.
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MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos, não impugnados, que constam dos autos e do p.a. em apenso e depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
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3. -A questão a decidir, consiste em saber se em relação à correcção relativa a rendimentos de capitais pode operar a presunção ínsita no artigo 7.°/4 do CIRS, uma vez que não foi feito qualquer lançamento em conta corrente do recorrido, mas, tão-somente em conta extra-contabilística, solução jurídica professada na sentença recorrida.
Na verdade, para julgar procedente a presente impugnação judicial nessa parte, considerou a M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que a presunção legal consagrada no citado n.° 4 do art. 7.° do CIRS restringe-se aos casos em que são feitos lançamentos nas contas correntes dos sócios, o que não ocorreu no caso ajuizado, pelo que a Administração Fiscal não beneficia dessa presunção legal, sendo que não se encontra demonstrada a existência do facto tributário, por inexistirem os lançamentos em conta corrente do sócio, aqui Impugnante, na sociedade B... — Sociedade de Comércio de Veículos, Lda, não podendo a presunção funcionar em relação a si, ainda que os montantes em causa respeitem a cheques emitidos pela sociedade em nome do Impugnante e depositados deste, mas o que só por si não tem a virtualidade de fazer funcionar a presunção legal contra o Impugnante, pelo que através dela não é possível alcançar o facto desconhecido e era este que constituía a base da incidência do imposto, no caso. Por assim ser e porque entende ser inquestionável que a existências dos referidos lançamentos nas contas correntes dos sócios das sociedades é um pressuposto inultrapassável à existência da presunção legal ali contemplada, em favor da Administração Fiscal, prova que logrou fazer, teria então, que recolher elementos suficientes que comprovassem que aquela quantia havia sido distribuída pelos sócios, de forma a fundamentar a sua actuação, o que não logrou fazer, o que implica que a presunção de rendimentos obtidos e não declarados em sede de IRC, mas já não autoriza, nos termos do art 6° e 7° do CIRS que se presuma terem os respectivos valores sido atribuídos aos administradores, não podendo, por isso, permanecer a correcção efectuada.
Para a recorrente FP, de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, a Inspecção concluiu que, inexistindo qualquer transacção anterior, subjacente à movimentação dos montantes em causa, tais cheques são resultado de verbas não contabilizadas como proveitos, tratando-se, pois, de rendimento obtido pela sociedade e colocado à disposição do sócio -gerente, o qual será tributado em sede de IRS, a título de adiantamento por conta de lucros, nos termos da alínea h), do n°1, do artigo 6° do CIRS, como rendimento da categoria E. Donde que, a Inspecção demonstrou a ocorrência dos pressupostos legais que legitimam a correcção ao rendimento declarado pelo Impugnante, dado que o mesmo recebeu importâncias pertença da sociedade e que reverteram para a sua esfera pessoal, sem que tenham sido objecto de contabilização na esfera jurídica da sociedade. E tanto assim, que não consta do Relatório qualquer referência à presunção do artigo 7°, n°4, do CIRS, fundamentando-se a correcção no que dispõe a alínea h), do n°1, do artigo 6° do CIRS, e encontrando-se claramente demonstrado, sem necessidade de fazer apelo à presunção, que houve distribuição aos sócios de quantias a título de adiantamento por conta de lucros, através de cheques emitidos pela sociedade e depositados em contas extra contabilísticas.
Vejamos então.
Como consta da matéria provada a Fazenda Pública nunca fundamentou a correcção relativa à omissão dos rendimentos de capitais com base na presunção referida no artigo 7.°/4 do CIRS e utilizada pela sentença recorrida para mandar anular a mesma já que, como patenteia o probatório a o RIT em que o mesmo se baseia, a Administração Fiscal partiu de indícios concretos e provados para proceder à correcção.
Do probatório decorre com segurança que no âmbito da acção inspectiva de que foi alvo a Sociedade "B... -Sociedade de Comércio de Veículos, Lda.", da qual o impugnante era sócio, ao longo do exercício de 1995 foram emitidos cheques por parte dessa mesma sociedade a favor do recorrido, no montante de ESC. 7.510.000$00 (€37.459,72).
Resulta igualmente provado, através da análise da contabilidade da dita sociedade, que a emissão desses cheques resultou de omissões verificadas na respectiva contabilidade, pois esses cheques foram depositados em contas extra -contabilísticas da titularidade do recorrido.
Nesse sentido, vai também a confissão do próprio impugnante constante do artigo 22° da PI, em que reconhece que, apesar de extra -contabilística a conta em causa era, de facto, uma conta utilizada pela e na actividade da F....
Acresce que da análise da contabilidade da B... não existem movimentos anteriores que justifiquem a emissão de tais cheques.
Destarte, veio a Administração Tributária a considerar o montante em causa como adiantamento por conta de lucros, e consequentemente, como rendimentos de capitais, categoria E.
E tal enquadramento é o legalmente correcto.
Com efeito, por força do disposto no artigo 6.°/l/h), na redacção vigente à data do facto tributário, consideram-se como rendimentos de capitais os lucros das entidades sujeitas a IRC colocados à disposição dos respectivos associados ou titulares, incluindo adiantamentos por conta de lucros, com exclusão daqueles a que se refere o artigo 19.° do mesmo código.
Ora, pertencendo tal montante à sociedade, como proveito, como antes se explicitou, e dele se tendo apropriado o ora recorrido – em termos fiscais não pode deixar tal montante de lhe ser imputado como um seu rendimento, obtido em cada um destes exercícios, subsumível na alínea h) do art.º 6.º do CIRS, como rendimento da categoria E, como adiantamento por conta de lucros, já que também não se prova que tal montante proviesse de mútuo, prestação de trabalho ou do exercício de cargo social (art.º 7.º n.º4 do mesmo CIRS).
Realmente tal montante ingressou no património do impugnante, ora recorrida, já que o mesmo lhe foi depositado em conta bancária de que era titular e nenhuma prova foi efectuada que o tenha devolvido à mesma sociedade, onde não consta escriturado nas respectivas contas sociais.
Consequentemente, tendo a Administração Tributária demonstrado a legalidade do seu agir, incumbia ao recorrido o ónus de demonstrar que os montantes em causa, indiscutivelmente depositados na sua conta e por si recebidos, o foram a qualquer outro título, ou por outrem, ou que os mesmos foram transferidos para a B..., ónus que não cumpriu, de todo em todo já que se limitou a alegar que os actuais sócios da B... se recusaram a fornecer-lhe os documentos de suporte dos movimentos da conta extra -contabilística, o que é manifestamente curto para cumprir o ónus da prova que sobre ele impendia.
A ser assim, como é, tal como também entende o EPGA no seu douto parecer, a sentença recorrida é passível de censura pois não fez uma correcta análise apreciação da factualidade atinente e, bem assim, do Direito aplicável.
Improcedem assim, todas as conclusões do recurso sendo de lhe conceder provimento e de revogar a sentença na parte recorrida e que em sentido contrário decidiu.
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4. Nestes termos, acorda-se, em conceder provimento ao recurso e em revogar a sentença na parte recorrida.
Custas a cargo de ambas as partes na proporção do decaimento.
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Lisboa, 22.02.2011

(Gomes Correia) ___________________________

(Pereira Gameiro) __________________________

(Joaquim Condesso) ________________________