Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:11213/14
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:04/16/2015
Relator:ANTÓNIO VASCONCELOS
Descritores:ELABORAÇÃO DA CONTA DE CUSTAS – ARTIGOS 6º Nº 1, 11º E 31º Nº 1 DO REGULAMENTO DAS CUSTAS JUDICIAIS NA REDACÇÂO INTRODUZIDA PELO DECRETO –LEI Nº 52/2011, DE 13 DE ABRIL.
Sumário:O artigo 6º nº 1 do Regulamento das Custas Processuais, na redacção introduzida pelo Decreto – Lei nº 52/2011, de 13 de Abril, estipula que a taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e que a mesma é fixada em função não só do valor mas também da complexidade.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em Conferência , na Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo , do Tribunal Central Administrativo Sul:


NOVO …………………. PRODUTOS ………… , LDa., com sinais nos autos, inconformado com o despacho proferido pelo TAC de Lisboa, em 7 de Novembro de 2013, que determinou o indeferimento da reclamação apresentada da conta de custas judiciais, dele recorreu e, em sede de alegações, formulou as seguintes conclusões:

“1. A Recorrente foi notificada da sentença homologatória proferida pelo Tribunal a quo no dia 27 de Janeiro de 2012.

2. No dia 12 de Setembro de 2013, a Recorrente foi notificada do valor da conta de custas judiciais, momento em que verificou o quão elevado era o valor estabelecido a título de custas judiciais.
3. Ora, a Recorrente apenas e só poderia de facto questionar e, consequentemente, reclamar da conta de custas judiciais, após ter recebido a mesma.

4. Nos termos do artigo 31.º n.º 1 do RCP, a conta é sempre notificada aos mandatários para que, no prazo de 10 dias, reclamem da conta de custas.

5. No dia 20 de Setembro de 2013 deu entrada a reclamação da conta de custas judiciais por parte da ora Recorrente, ou seja, 8 dias após ter sido notificada da conta de custas judiciais.

6. Assim, a reclamação da conta de custas judiciais foi submetida tempestivamente.

7. Porém, veio o Tribunal a quo indeferir a respectiva reclamação sustendo ser de manter a conta de custas por a mesma se encontrar elaborada de acordo com a respectiva sentença, não havendo lugar à sua reforma.

8. Por seu lado, tendo transitado em julgado a sentença proferida nos presentes autos, esta também já não poderia ser alterada.

9. Ora, contrariamente ao sustentado no despacho que indeferiu a reclamação da conta de custas, a ora Recorrente não pôs em causa a douta sentença do Tribunal a quo, mas tão-somente o cálculo da conta de custas.

10. Com efeito, com base na sentença, a conta de custas deveria ter sido elaborada de forma diferente.

11. Pelo que, na sequência do indeferimento da reclamação da conta de custas judiciais, foi apresentado pela ora Recorrente um requerimento com um pedido de esclarecimentos sobre o despacho de indeferimento.

12. Uma vez mais, o douto Tribunal a quo considerou, remetendo para o conteúdo do primeiro despacho de indeferimento da reclamação da conta de custas judiciais, não respondendo ao pedido da ora Recorrente.

13. O valor da conta de custas, a cargo da Recorrente, foi determinado num valor extremamente elevado de € 7.998,64.

14. Isto apesar de a instância se ter extinta ainda antes de apresentada a contestação dos RR., na sequência do acordo de pagamento com o R. Centro Hospitalar …………, E.P.E.

15. Entende a Recorrente que a conta de custas é manifestamente desproporcional, atendendo ao artigo 6.º n.º 1 do RCP na redacção dada pelo Decreto – Lei nº 52/2011, de 13 de Abril, que estipula que a taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e que é fixada não só em função do valor mas também da complexidade.

16. Ora, esta afirmação é reforçada pelo recente acórdão do Tribunal constitucional nº 421/2013, publicado no dia 26 de Outubro de 2013, pelo qual o Tribunal Constitucional julgou inconstitucionais as normas contidas nos artigos 6.º e 11.º, conjugadas com a tabela I-A anexa, do RCP, na redacção introduzida pelo Decreto – Lei nº 52/2011, de 13 de Abril, quando interpretadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da acção sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante ad taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o caracter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título.

17. Sustentando esta posição, vem o Tribunal Constitucional dizer o seguinte: “(…) as normas conjugadas dos artigos 6.º, nº 1 e 11.º do RCP, e respectiva tabela I-A, na redacção aplicável, abstrai da complexidade processual para o efeito de fixação do valor da taxa de justiça, como defende o tribunal recorrido. Mas o problema da inconstitucionalidade apenas decorre da ausência de um limite máximo ao regime de tributação crescente em função do valor da acção, pois que ignora a complexidade dos autos para o efeito de evitar ou corrigir valores de tributação desproporcionados às acções de elevado valor que assumam, como é manifestamente o caso, uma tramitação reduzida.”.

18. Pode ainda ler-se o seguinte no Recurso do Tribunal Constitucional: “Procurou-se, por outro lado, considerando a motivação expressa no mesmo diploma preambular, adequar “o valor da taxa de justiça ao tipo de processo em causa e aos custos que, em concreto, cada processo acarreta para o sistema judicial, numa filosofia de justiça distributiva à qual não deve ser imune o sistema de custas processuais, enquanto modelo de financiamento dos tribunais e de repercussão dos custos da Justiça nos respectivos utilizadores”.”.

19. Ora, pelo facto dea instância se ter extinguido antes sequer de qualquer contestação ter sido apresentada, os actos processuais da instancia foram manifestamente reduzidos.

20. A própria sentença veio homologar o pedido da Recorrente com base num acordo de pagamento celebrado com o R. Centro …………, E.P.E.

21. Por esta razão, o valor da conta de custas judiciais deveria ser proporcional à complexidade da causa e não apenas ao valor da própria acção em si conforme a Tabela I-A anexa , do RCP.

22. Em suma, atento o exposto, o valor determinado para as custas judiciais deveria ter sido consideravelmente menor e adequado à situação em causa, atendendo especialmente à complexidade do processo e não unicamente à Tabela I-A anexa , do RCP.”

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Não foram apresentadas contra alegações.

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A Exma. Magistrada do Ministério Público junto deste TCAS emitiu douto parecer no sentido de ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e revogado o despacho recorrido.

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Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.

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Tudo visto, cumpre decidir.

Veio o presente recurso jurisdicional interposto do despacho proferido pelo TAC de Lisboa que determinou o indeferimento da reclamação apresentada da conta de custas judiciais.
No despacho em crise, datado de 7 de Novembro de 2013, a Mma. Juiz a quo , remetendo para a fundamentação de um precedente despacho, decidiu manter a conta das custas por entender que a mesma se encontra elaborada de acordo com a respectiva sentença homologatória, não havendo portanto lugar à sua reforma.

Discorda deste entendimento a Recorrente ao afirmar que a decisão recorrida viola o disposto nos artigos 6º nº 1, 11º e 31º nº 1 do actual Regulamento das Custas Processuais.

Vejamos o que se nos oferece dizer.

Em 27 de Janeiro de 2012 o Tribunal a quo proferiu sentença homologatória, fixando as custas a cargo da Autora (ora Recorrente).
Em 12 de Setembro de 2013 a ora Recorrente foi notificada do valor das custas judiciais no montante de €7.998,64.
Em 20 de Setembro de 2013 a ora Recorrente deu entrada de uma reclamação do cálculo da conta de custas que veio a ser indeferida com fundamento em que a Recorrente deixou transitar o decidido nos presentes autos, pelo que não pode a mesma ser alterada, sendo de manter a conta de custas tal como inicialmente elaborada.
Na sequência do indeferimento da reclamação de conta de custas judiciais e atento o conteúdo do respectivo despacho, foi apresentado pela ora Recorrente, em 24 de Outubro de 2013, um requerimento com um pedido de esclarecimento sobre o mesmo, tendo o Tribunal a quo, uma vez mais, remetido, por despacho datado de 7 de Novembro de 2013 (despacho recorrido), para o conteúdo do primeiro despacho de indeferimento da reclamação da conta de custas judiciais.

Como referimos supra, a ora Recorrente veio entender que a conta de custas é manifestamente desproporcional, na medida em que o artigo 6º nº 1 do Regulamento das Custas Processuais, na redacção introduzida pelo Decreto – Lei nº 52/2011, de 13 de Abril, estipula que a taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e que a mesma é fixada em função não só do valor mas também da complexidade.

Assiste inteira razão à Recorrente sendo de destacar a propósito a posição assumida pelo Tribunal Constitucional no recente Acórdão nº 421/2013, publicado em 26 de Outubro de 2013, que decidiu:
“(…) julgar inconstitucionais, por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20º da CRP, conjugado com o principio da proporcionalidade, decorrente dos artigos 2º e 18º nº 2, 2ª parte da CRP, as normas contidas nos artigos 6º e 11º, conjugadas com a tabela I-A anexa, do Regulamento das Custas Processuais, na redacção introduzida pelo Decreto – Lei nº 52/2011, de 13 de Abril, quando interpretadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da acção sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcional exigido a esse título”.

Sustentando esta posição o Tribunal Constitucional veio ainda adiantar o seguinte:
“(…) As normas conjugadas dos artigos 6º nº 1 e 11º do RCP e respectiva Tabela I-A, na redacção aplicada, abstrai da complexidade processual para o efeito de fixação do valor da taxa de justiça, como defende o tribunal recorrido. Mas o problema de inconstitucionalidade apenas decorre da ausência de um limite máximo ao regime de tributação crescente em função do valor da acção, pois que ignora a complexidade dos autos para o efeito de evitar ou corrigir valores de tributação desproporcionados às acções de elevado valor que assumam, como é manifestamente o caso, uma tramitação reduzida “ – cfr. Acórdão citado.

No Acórdão citado, o Tribunal Constitucional veio confirmar jurisprudência já anteriormente consolidada por aquele Tribunal relativamente a normas com o mesmo sentido das ora julgadas inconstitucionais, constantes do Código das Custas Judiciais, que antecedeu o Regulamento das Custas Processuais, para além de salientar que o actual Regulamento se encontra instruído de um sistema de taxação misto, assenta não só no valor da causa mas igualmente na complexidade da mesma.
Ora, a circunstância de nos presentes autos a instância se ter extinguido antes sequer de qualquer contestação ter sido apresentada, necessariamente os actos processuais foram manifestamente reduzidos. Acresce que a própria sentença veio homologar o pedido da ora Recorrente com base num acordo de pagamento celebrado com o Réu Centro Hospitalar ………, E.P.E.
Em conformidade, tendo em conta a jurisprudência assumida pelo Tribunal Constitucional e o sistema de taxação misto previsto no actual RCP, o pagamento de uma conta de custas no montante global de €7.998,64, da qual não resultou para a ora Recorrente um beneficio inerente, é manifestamente excessivo e desproporcional, pois que o serviço prestado pelo Tribunal a quo não ficou além de actos de distribuição e citação, ao qual acresceu a prolação de uma sentença homologatória .

Termos em que, procedendo na íntegra as conclusões da alegação da Recorrente, é de conceder provimento ao presente recurso jurisdicional e revogar o despacho recorrido com a consequente baixa dos autos à 1ª instância afim de ser ordenada a reforma da conta, reduzindo o seu montante, atendendo designadamente à falta de complexidade do caso sub judice .

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Acordam, pois, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo, deste TCAS, em conceder provimento ao presente recurso jurisdicional e revogar o despacho recorrido com a consequente baixa dos autos à 1ª instância, nos termos e para os efeitos sobreditos.

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Sem Custas.
Lisboa, 16 de Abril de 2015
António Vasconcelos
Catarina Jarmela
Conceição Silvestre