Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:811/20.0BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:04/15/2021
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA
PROVA
ELEMENTOS NA POSSE DA AT
Sumário:
I. A dispensa de prestação de garantia depende da verificação cumulativa de dois requisitos: um objetivo: a situação causar prejuízo irreparável ou a manifesta falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido; e um subjetivo, consubstanciado na imputação da insuficiência ou inexistência de bens ao executado.

II. Cabe ao executado o ónus da prova de a situação causar prejuízo irreparável ou de se verificar manifesta falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I. RELATÓRIO

P..... (doravante Recorrente ou Reclamante) veio apresentar recurso da sentença proferida a 09.02.2021, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria, na qual foi julgada improcedente a reclamação de ato do órgão de execução fiscal por si apresentada, que teve por objeto o despacho proferido pelo Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Santarém, de 15.04.2020, no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º ....., que indeferiu o pedido de suspensão desse PEF e isenção de prestação de garantia.

O Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

“Termos em que se requer a V. Ex.ª seja o presente recurso e alegações aceite por estar em tempo, concedendo a douta decisão do tribunal ad quem provimento ao recurso por provado determinando a revogação da sentença recorrida substituindo-a por outra que determine estarem preenchidos os requisitos para a almejada isenção de prestação de garantia, nomeadamente por:

A – O ora recorrente invocou não dispor de meios económicos para a prestação de garantia no âmbito do caso em apreço, facto corroborado pela A.T., conforme se depreende da redacção do facto provado D que plasma a resposta da administração, chamando-se a atenção para o expresso nas alíneas 5ª, 6.ª e 7.ª dessa resposta.

B – O Mmº Juiz a quo dá razão à A.T., que indeferiu o pedido formulado pelo reclamante por este não ter efectuado qualquer prova que o sustentasse, “limitando-se a remeter para a informação já ao dispor da Administração.”

C – Ainda que assim possa ter sido, para além informação ao dispor da Administração, nenhuma outra poderia ter sido carreada pelo reclamante, nem é fundamentado, salvo melhor opinião, que outras informações poderiam ter sido transmitidas.

D – O artigo 7.º plasmado no facto provado D reflecte a posição da A.T. quanto á indagação que faz de bens móveis e imóveis do ora recorrente, dizendo que se dependesse apenas das informações constantes na base de dados, “A dispensa de garantia teria parecer afirmativo”.

E – Pelo que em face desta posição da A.T e observada a falta de concordância do reclamante quanto ao teor da douta sentença é imperativa alusão jurisprudencial, concretamente ao Acórdão emanado do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 14 de Fevereiro de 2019, lavrado no processo 1585/18.0BELRS, Relatora: Exma. Dra. Anabela Russo, que se debruça sobre matéria idêntica.

F – Do teor do acórdão e com relevância para o caso concreto, faz-se notar que a A.T. reconheceu a inexistência de bens móveis ou imóveis sujeitos a registo capazes de garantir a dívida, e nessa esteira, o indeferimento do pedido dependeria sempre da produção de prova quanto a transacções que o reclamante tivesse levado a efeito com o intuito de dissipação patrimonial e consequente frustração de créditos.

G – O Tribunal a quo ultrapassou assim esta necessidade da A.T. provar algo que é seu encargo, para mais, quando a própria A.T. reconhece que o recorrente efectivamente aparenta não deter meios económicos como alegou, e quando a mesma A.T. expressa, “No caso concreto, parece nada indicar que tenha havido dissipação de bens…”

H – Não é possível assim a obtenção de conformismo com a decisão tomada pelo douto Tribunal, já que os factos decretados, por si só imporiam decisão diversa, sem prejuízo do escasso acervo factual consignado em sentença. O certo é que esse acervo factual será sempre inidóneo para o sentido decisório seguido.

I – Notem V.Exas que a A.T. confirma as alegações de insuficiência económica do reclamante limitando-se a expressar que essas alegações contudo, só são possíveis de corroborar pela própria indagação que a A.T. fez. Acabando a dizer que outros elementos poderiam ter sido carreados, sem especificar quais.

J – Porém, entende o recorrente que uma vez feitas determinadas assunções pela A.T. nos artigos 5.º, 6.º e 7.º no âmbito da apreciação da garantia (facto provado D), a lei e a Jurisprudência determinam que a A.T. aceda ao ónus que sobre si impende, queira ter fundamentos para indeferir o pedido de isenção da prestação de garantia.

L- Ora, a necessidade de verificação desse pressuposto foi totalmente ultrapassada pelo Tribunal quo, que teria necessariamente, salvo melhor opinião, que pronunciar-se sobre esta factualidade e dar como não assente a ocorrência de dissipação patrimonial.

M- Assim não tendo sucedido, crê-se que a douta decisão deverá ser substituída por outra que decrete a verificação no caso concreto, dos requisitos necessários para a solicitada isenção de prestação de garantia”.

A Fazenda Pública (doravante Recorrida ou FP) não apresentou contra-alegações.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 288.º, n.º 1, do CPPT, que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Com dispensa dos vistos legais, atenta a sua natureza urgente (art.º 657.º, n.º 4, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT), vem o processo à conferência.

É a seguinte a questão a decidir:

a) Há erro de julgamento, em virtude de estarem reunidos os requisitos previstos no n.º 4 do art.º 52.º da Lei Geral Tributária (LGT)?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“ A)

Em 22/10/2019, os Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Santarém elaboraram relatório final do procedimento de inspeção que foi efetuado aos exercícios de 2015 e 2016 a P....., no qual se corrigiu o rendimento coletável do ano de 2015 para € 467.010,71 e do ano de 2016 para € 330.206,37. – (cfr. fls. 12 a 39 dos autos).


B)

Em 31/01/2020 a Autoridade Tributária e Aduaneira instaurou em nome de P..... o processo de execução fiscal n.º ....., por dívida de IRS e respetivos juros compensatórios do ano de 2015 no montante de € 334.582,77. – (cfr. docs. de fls. 70 a 73 dos autos).

C)

Em 18/03/2020 o ora Reclamante, por referência ao processo de execução fiscal identificado na alínea precedente, apresentou junto do Serviço de Finanças de Tomar pedido de suspensão e de isenção de prestação de garantia. - (facto alegado no artigo 1.º da petição inicial e não impugnado, provado por acordo).

D)

Com data de 14/04/2020 e sobre o requerimento referido na alínea que antecede, a Direção de Finanças de Santarém prestou informação onde consta, designadamente, o seguinte:

“(…) I - QUESTÕES PREVIAS

Ponto 1. A divida em questão no valor de € 340.702.65, é proveniente de IRS de 2015 e teve por base a ação inspetiva ....., que por ser relevante para a analise em causa, fica o relatório (RIT) a fazer parte integrante desta informação.

As ações inspetivas ao SP P....., efetuadas, tiveram origem nas ações de inspeção efetuadas à sociedade P..... LDA, NIF ....., constatando-se a existência de movimentos financeiros, sem qualquer suporte documental, com origem na sociedade para a esfera pessoal de P....., único sócio e gerente daquela sociedade, o que determinou a emissão das ordens de serviço n.º ..... e ....., para os anos de 2015 e 2016, respetivamente.

(…), para efeitos de garantia, que o montante a que respeita este pedido à presente data, é de € 340.702.65, para o processo em causa, sendo necessário o valor de € 426.481.54, conforme o nº 6 do artigo 199º do CPPT.

Ponto 2. Por petição entregue no SF de Tomar, e que fica a fazer parte integrante da presente informação, foi requerida a isenção de garantia, nos termos do nº 4 do artigo 52º da LGT, alegando:

“Não dispor de bens ou meios financeiros que lhe permitam prestar garantia nos autos de execução, seja por via da penhora, constituição de hipoteca legal, penhor mercantil ou caução bancária”.

Refere ainda que no que respeita à falta de meios económicos, não dispõe o executado de quaisquer bens susceptiveis de penhora, designadamente móveis ou imóveis, o que facilmente poderá ser averiguado pelos serviços e através das plataformas informáticas. Igualmente poderá ser confirmado que a insuficiência ou inexistência de bens susceptiveis de penhora não se fica a dever a atuação dolosa no intuito de frustrar os créditos do estado. Não dispõe o executado de depósitos bancários suficientes, de modo a que lhe fosse permitido pedir junto da instituição de crédito, garantia bancária.”

Conclui que desde que, não apurados nos autos, fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado, pensa que reúne as condições para que lhe seja o pedido de isenção da prestação de garantia, deferido.

(…)

IV - DA APRECIAÇÃO DA GARANTIA

Conforme vem sendo analisado, foi solicitada a dispensa de garantia e a suspensão do processo, com os fundamentos descritos no ponto 2.

A dispensa aqui solicitada será, pois, analisada, conforme dispõe o nº 4 do art.º 52º da LGT:

"4 - A administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado. (Redação da Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro) "

A Autoridade Tributária pode, a requerimento do executado, isenta-lo da prestação de garantia, desde que:

- A sua prestação lhe cause prejuízo irreparável;

- Ou se verifique manifesta falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens;

Desde que, nestas duas situações não existam fortes indícios de que se deveu a atuação dolosa do interessado, isto é, hoje no articulado previsto no artigo 52º, nº 4, in fine, da LGT, considera-se uma responsabilidade subjetiva, culposa, sendo o executado responsável se a insuficiência patrimonial resultar de uma conduta que lhe possa ser imputada e que ele pudesse ter evitado.

Pois que, naturalmente nenhum sentido fará, conceder a isenção da prestação de garantia a um executado que invoque prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos e que, por outro lado, tenha procedido, ele próprio, a uma prévia sonegação de rendimentos, ou dissipação de bens com o intuito de diminuir as garantias dos credores ou que se tenha colocado culposamente em situação de manifesta insuficiência económica para a prestação da garantia.

No caso em concreto, parece nada indicar que tenha havido dissipação de bens, uma vez que pela base de dados da Autoridade Tributária, o único bem existente é uma viatura do ano 2000, marca BMW.

Tendo bem presente o “declarado” pelo executado, parece ser evidente que existe por sua parte, uma total impossibilidade em prestar garantia idónea.

Pelo que, se a analise se circunscrevesse apenas ao que está espelhado na base de dados da autoridade Tributária, aliás como afirma, na petição, acerca da falta de bens móveis ou imoveis, ser averiguado facilmente pelos serviços e através das plataformas informáticas, a resposta seria obvia: A dispensa de garantia teria parecer afirmativo.

No entanto, considerando que o ónus da prova recai sobre quem invoque os factos, de acordo com n.º 1 do artigo 74.º da Lei Geral Tributaria, conjugado com o artigo 342.º do Código Civil, deveria a petição estar devidamente fundamentada, tanto de facto como de direito, acompanhada das respetivas provas documentais necessárias à sua apreciação.

Depois de lido o relatório (RIT) inspetivo e, sabendo que o executado em causa não declara efetivamente os possíveis rendimentos que aufere, não basta afirmar que não dispõe de depósitos bancários suficientes, ou rendimentos, e que tudo pode ser facilmente averiguado pela base de dados da AT….deverá antes demais, fazer prova de tudo o que afirma, isto é juntar todos os elementos documentais comprovativos da verificação dos pressupostos de que depende a concessão da dispensa.

10º

É que a base de dados da AT é constituída pelos bens moveis e imoveis que estão em nome dos contribuintes, bem como as declarações, os rendimentos e os direitos que cada contribuinte dá a conhecer à Autoridade Tributária.

11º

Concluindo-se que não pode a AT saber sobre o que não é comprovado ou fundamentado, sendo estas as rigorosas condições a observar para efeitos da dispensa de prestação de garantia, parece-nos que não deve ser concedida, concordando-se com o projeto de despacho do SF de Tomar.

V – CONCLUSÃO

Na sequencia e no âmbito da intensão de apresentação de contencioso administrativo, Reclamação Graciosa, veio o executado representado pelo seu mandatário, solicitar a dispensa de apresentação de garantia para suspensão de um processo de execução fiscal com o nº ....., num total de trinta processos.

Face ao exposto, não nos parece estarem verificados os pressupostos do nº 4 do artigo 52º da LGT, pelo que, tendo em conta a salvaguarda do interesse público de cobrança dos créditos tributários, sou de propor o indeferimento do pedido de isenção de garantia. (…).”. - (cfr. fls. 5 a 8 dos autos).


E)

Em 15/04/2020 o Diretor de Finanças de Santarém proferiu o seguinte despacho: “Visto. Concordo, conforme se propõe. Procedimentos subsequentes em conformidade. (…).”. - (cfr. fls. 1 dos autos).

F)

Em 25/08/2020, por oficio endereçado por carta registada com aviso de receção ao mandatário do Reclamante, foi notificado o despacho identificado na alínea antecedente. - (cfr. docs. de fls. 10 e 11 dos autos)”.

II.B. Refere-se, ainda, na sentença recorrida:

“FACTOS NÃO PROVADOS

Inexistem outros factos nos autos cuja não prova seja relevante para a decisão da causa”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame das informações e dos documentos, que não foram impugnados, constantes dos presentes autos, conforme se refere a propósito de cada uma das alíneas do probatório”.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Do erro de julgamento

Considera o Recorrente que o Tribunal a quo errou no seu julgamento, na medida em que, na sua perspetiva, reúnem-se os pressupostos para efeitos de deferimento da dispensa de prestação de garantia.

Antes de mais, refira-se que, apesar de o Recorrente, ao longo das suas alegações, fazer algumas menções a insuficiências da decisão proferida sobre a matéria de facto, a mesma não foi impugnada nos termos exigidos pelo art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, motivo pelo qual é atendendo a tal decisão que iremos efetuar a nossa apreciação.

Vejamos então.

Nos termos do art.º 52.º da LGT, é admissível a suspensão do processo de execução fiscal, designadamente em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação e oposição à execução, desde que prestada garantia idónea ou desde que a administração tributária (AT), a requerimento do executado, o isente de tal prestação (cfr. art.º 52.º, n.º 4).

O art.º 170.º do CPPT determina os termos do procedimento do pedido de dispensa em causa, decorrendo do seu n.º 3 que “[o] pedido a dirigir ao órgão da execução fiscal deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária”.

Como resulta do quadro normativo referido, a dispensa de prestação de garantia depende da verificação cumulativa de dois requisitos:

¾ Um requisito objetivo: a situação causar prejuízo irreparável ou a manifesta falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido;

¾ Um requisito subjetivo, consubstanciado na imputação da insuficiência ou inexistência de bens ao executado.

Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 04.11.2020 (Processo: 0289/20.9BEALM):

“Estamos (…) perante um procedimento administrativo tributário enxertado no processo de execução fiscal, sendo a respectiva decisão um verdadeiro acto administrativo (…). Esse procedimento da iniciativa do executado (cf. art. n.º 4 do art. 52.º da LGT, que diz «a requerimento do executado» e o art. 170.º do CPPT, que diz «deve o executado requerer») é um procedimento formal, que deve obedecer às regras legais; designadamente, deve seguir a forma escrita (cf. n.º 3 do art. 54.º da LGT), deve indicar o órgão a que se dirige, identificar o requerente, com indicação do nome e domicílio [cf. art. 102.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código do Procedimento Administrativo (CPA)], expor os fundamentos de facto e de direito em que se baseia o pedido e instruir o requerimento com a prova documental pertinente (cf. n.º 3 do art. 170.º do CPPT). (…)

(…) [O] procedimento de dispensa de prestação de garantia tem regras próprias de alegação e prova dos factos (cf. art. 52.º, n.º 4, da LGT e art. 170.º, n.º 1, do CPPT) (…): (….) [nele] está em causa a pretensão do executado a obter um efeito que se há-de ter como excepcional em sede de execução fiscal – a norma é a prestação da garantia em ordem a obter a suspensão da execução fiscal – e, portanto, o procedimento tem início a pedido do interessado e a decisão fica sujeita ao que foi pedido”.

Feito este introito, cumpre apreciar.

In casu, está, desde logo, a apreciação do primeiro dos requisitos indicados.

Como decorre da factualidade assente e é, aliás, assumido pelo Recorrente, o mesmo apresentou, junto dos serviços da AT, um pedido de dispensa de prestação de garantia, onde alega “[n]ão dispor de bens ou meios financeiros que lhe permitam prestar garantia nos autos de execução, seja por via da penhora, constituição de hipoteca legal, penhor mercantil ou caução bancária”. Tal pedido, como não é igualmente controvertido, não foi acompanhado de qualquer elemento documental, remetendo o ora Recorrente no seu requerimento para os elementos de que a própria AT dispunha.

Da análise do despacho reclamado, verifica-se que a AT efetuou o seguinte raciocínio:

¾ Na sua base de dados apenas identificou uma viatura do ano 2000, marca BMW;

¾ Das bases de dados da AT decorre a falta de bens móveis ou imóveis;

¾ No entanto, o requerimento não vem acompanhado de provas documentais, não bastando afirmar que não dispõe de depósitos bancários suficientes ou rendimentos, devendo ser tal provado.

Do que resulta deste despacho é que, realmente, atendendo em exclusivo aos elementos constantes das bases de dados ao dispor da AT, nas mesmas não existe registo de bens suficientes para efeitos de garantia. No entanto, a AT refere que não foram demonstradas realidades fáticas atinentes ao requerido, de onde destacamos as referentes aos depósitos bancários, que o Recorrente menciona, designadamente, não serem suficientes para efeitos de prestação de garantia.

Portanto, e desde já, ao contrário do que refere o Recorrente, não foi considerado que este não dispunha de meios económicos. Foi sim considerado que, de acordo exclusivamente com os elementos constantes das bases de dados da AT, tais meios inexistiam.

Não obstante, como decorre do despacho proferido e da sentença recorrida, as bases de dados da AT não abrangem todos os bens patrimoniais de um administrado, desde logo sendo de sublinhar que das mesmas não constam os elementos relativos a depósitos bancários de pessoas singulares.

Portanto, ao contrário do que refere o Recorrente, outra informação deveria ter sido por si carreada, designadamente a atinente a depósitos bancários, como decorre do despacho reclamado, onde se refere expressamente: “não basta afirmar que não dispõe de depósitos bancários suficientes, ou rendimentos, e que tudo pode ser facilmente averiguado pela base de dados da AT….deverá antes demais, fazer prova de tudo o que afirma, isto é juntar todos os elementos documentais comprovativos da verificação dos pressupostos de que depende a concessão da dispensa”. Logo, tal despacho está fundamentado nessa parte, ao contrário do que defende o Recorrente.

Refira-se, ademais, que a situação dos autos é distinta daqueloutra, mencionada pelo Recorrente, apreciada por este TCAS, no âmbito dos autos n.º 1585/18.0BELRS, nos quais, desde logo, o aí reclamante instruíra documentalmente o seu pedido com os elementos que permitiam aferir a sua situação económica, para além dos dados de que dispunha a AT – o que não sucedeu in casu –, sendo que a questão ali se centrava na atuação dolosa, o que também não é o caso.

Assim sendo, e em suma, não tendo sido juntos quaisquer elementos documentais por parte do Recorrente, remetendo apenas para os elementos de que a AT dispõe, não tendo, pois, sido facultada qualquer informação bancária que demonstrasse o por si alegado, não foi cumprido pelo Recorrente o seu ónus de demonstração da insuficiência patrimonial.

Como tal, carece de relevância apreciar o alegado, no que respeita à sua conduta dolosa, porquanto estamos, como referido, perante requisitos cumulativos, pelo que a não demonstração de um deles implica que resulte prejudicada a apreciação do outro.

Assim sendo, carece de razão o Recorrente.

Nos termos do art.º 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), “[n]as causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”.

Em sede de reclamação das decisões do órgão da execução fiscal, é, em 1.ª instância, aplicável a Tabela II do RCP, cuja previsão implica o pagamento de uma taxa de justiça fixa, apenas condicionada por dois intervalos (valor até 30.000,00 Eur. e valor superior a 30.000,00 Eur.), com a consequente não aplicação do mencionado art.º 6.º, n.º 7. Não obstante, em sede de recurso, é aplicável a Tabela I-B do RCP, motivo pelo qual há que atentar ao referido art.º 6.º, n.º 7.

In casu, atentas as questões em apreciação e a conduta processual das partes, determina-se que haja lugar à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, prevista no art.º 6.º, n.º 7, do RCP (sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido).

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

a) Negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida;

b) Custas pelo Recorrente, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça na presente instância, na parte em que exceda os 275.000,00 Eur., sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido;

c) Registe e notifique.


Lisboa, 15 de abril de 2021


[A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores António Patkoczy e Mário Rebelo]

Tânia Meireles da Cunh