Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2962/13.9BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:10/04/2018
Relator:CATARINA JARMELA
Descritores:PERSONALIDADE JUDICIÁRIA
Sumário:Numa acção administrativa comum para efectivação de responsabilidade contratual, instaurada contra um Ministério, a falta de personalidade judiciária do mesmo constitui uma excepção dilatória insanável e insuprível e importa a absolvição da instância do réu.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
I – RELATÓRIO
M…. intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa a presente acção administrativa comum contra o Ministério da Educação e Ciência, na qual peticionou o seguinte:
- o reconhecimento que a relação jurídico-laboral entre A e R. iniciada em 17 de Fevereiro de 2006 se trata de um contrato por tempo indeterminado, por assim se achar congruente com a subsunção da situação fáctica e jurídica em causa, ao quadro legal vigente nesta matéria, designadamente, por força da Diretiva 1999/70/CE, da Lei 59/2008 de 11 de Setembro, Lei 12-A/2008 de 27 de Fevereiro, Código do Trabalho e Constituição da República Portuguesa.
- que seja declarada a ilicitude da cessação do contrato de trabalho em causa, nos termos do art.º 271.º a) e c) da Lei 59/2008 de 11 de Setembro.
- que seja o Réu condenado a indemnizar a Autora por todos os danos causados a esta, nos termos do disposto no art.º 275 a) da Lei 59/2008 de 11 de Setembro, no valor de € 5.049,20 a título de danos patrimoniais e de €30000,00 a título de danos não patrimoniais.
- que seja o Réu condenado a Reintegrar a A. no seu posto de trabalho, por força do art. 275 b) do referido preceito OU a indemnizá-la nos termos do art. 278º da Lei 59/2008 de 11 de Setembro.
Subsidiariamente,
- que seja a rescisão por caducidade declarada ilícita e consequentemente,
- que seja o Réu condenado a pagar à Autora o valor da retribuição correspondente ao período de aviso prévio em falta no montante de € 1.262,30 (mil e duzentos e sessenta e dois euros e trinta cêntimos), nos termos do art.º 345 n.º 3 do Código do Trabalho.
- que seja o Réu, nos termos do n.º 4 do art.º 345 e 344º n.º 2 e 3 do Código do Trabalho, condenado a pagar à Autora a compensação ali prevista, no montante de € 2.945,37 (dois mil novecentos e quarenta e cinco euros e trinta e sete cêntimos)”.

Por decisão datada de 9 de Março de 2018 do referido tribunal foi julgada procedente a excepção dilatória de falta de personalidade judiciária do Ministério da Educação e Ciência e, em consequência, absolvido o réu da instância.

Inconformada, a autora interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul dessa decisão, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões:
«I. A Recorrente intentou acção administrativa comum contra o Ministério da Educação e Ciência.
II. A Recorrente celebrou um contrato de trabalho e posteriores renovações com o Ministério da Educação e Ciência.
III. A causa de pedir tinha por base a impugnação da exclusão da Recorrente do procedimento concursal e o seu consequente despedimento por parte do Recorrido.
IV. A Recorrente nunca foi convidada a rectificar a sua PI ou a suprir qualquer excepção.
V. A Recorrente requereu a intervenção principal provocada do Estado.
VI. O Tribunal a quo julgou procedente a excepção dilatória de falta de personalidade judiciária do Ministério da Educação e Ciência e a sua ilegitimidade passiva, a impossibilidade de sanação desta excepção e a inadmissibilidade da intervenção principal provocada requerida pela Recorrente.
VII. O Tribunal a quo absolveu o Recorrido da instância.
VIII. O art. 10º do CPTA, no n.º 1, refere que cada acção deve ser proposta contra a outra parte na relação material controvertida.
IX. Que foi o caso.
X. No contencioso administrativo a ilegitimidade passiva constitui um fundamento que “obsta ao prosseguimento do processo”, dando lugar à aplicação do regime dos artigos 87.º, 88.º e 89.º do CPTA.
XI. Num caso em que a petição inicial revela uma antinomia entre a entidade pública indicada como réu e a entidade pública identificada como sujeito da relação material controvertida, é de proferir despacho a convidar o autor a aperfeiçoar a petição quanto à identificação da entidade pública que pretende demandar.
XII. De acordo com o disposto no artigo 87.º, n.º 7, do CPTA, apenas deverá determinar-se a absolvição da instância no caso de falta de suprimento de excepções dilatórias ou de correcção, dentro do prazo que for estabelecido, das deficiências ou irregularidades da petição inicial, o que impõe ao juiz, sob pena de incorrer em nulidade processual, a prolação de prévio despacho com essa finalidade.
XIII. À ilegitimidade do Recorrido não se aplica a legislação processual civil, que é supletiva, porque existe disposição regulatória expressa no CPTA.
XIV. O Tribunal a quo devia ter convidado a Recorrente a aperfeiçoar a petição inicial, no que respeita à identificação da entidade pública demandada.
XV. O Tribunal a quo ao decidir da forma como decidiu, violou o disposto nos artigos 7.º e 87.º, n.ºs 1, al.s a) e b), e 2 e 7 do CPTA e incorreu, em nulidade processual.
XVI. A decisão recorrida deve ser revogada, baixar os autos à 1º instância, determinando-se o prosseguimento dos autos com o referido suprimento/rectificação.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, se fará inteira e sã Justiça».

O recorrido, notificado para o efeito, não apresentou contra-alegação de recurso.

O Ministério Público junto deste Tribunal notificado para os efeitos do disposto no art. 146º n.º 1, do CPTA, não emitiu parecer [pois, tendo sido junto a estes autos um parecer relativo a outro processo - ao proc. n.º 147/13.3 BEPDL (no qual foi emitido - conforme se constata através da consulta feita ao mesmo através do SITAF - o parecer que, por engano, também foi junto aos presentes autos) -, o mesmo tem de ser desconsiderado, tudo se passando como se o Ministério Público não tivesse emitido parecer nos presentes autos].
II – FUNDAMENTAÇÃO
Com interesse consideram-se assentes, por acordo, os seguintes factos:
1) Em 17.2.2006, entre a autora e o Ministério da Educação foi celebrado o contrato de trabalho a termo resolutivo certo, com início a 14.2.2006 e termo a 31.8.2006, nos termos constantes do Doc. n.º 1, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
2) Em 31.8.2006, entre a autora e o Ministério da Educação foi celebrado um averbamento ao contrato descrito em 1) no qual se previa a sua renovação até 31.8.2007, nos termos constantes do Doc. n.º 2, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
3) Em 31.8.2007, entre a autora e o Ministério da Educação foi celebrado um averbamento ao contrato descrito em 1) no qual se previa a sua renovação até 31.8.2008, nos termos constantes do Doc. n.º 3, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
4) Em 31.8.2008, entre a autora e o Ministério da Educação foi celebrado um averbamento ao contrato descrito em 1) no qual se previa a sua renovação até 31.8.2011, nos termos constantes do Doc. n.º 4, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
5) Em 24.2.2011 o Ministro de Estado e das Finanças proferiu o despacho constante do Doc. n.º 19, junto com a contestação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual se consignou designadamente o seguinte:
(…) dou parecer favorável, a título excecional, nos termos e para efeitos do nº 6 do artigo 6º da Lei 12-A/2008, de 27 de fevereiro, à abertura de procedimentos concursais que visem o recrutamento de 632 (seiscentos e trinta e dois) trabalhadores para exercício de funções não docentes, sendo que este número de postos de trabalho corresponde aos atuais postos de trabalho ocupados por trabalhadores detentores de uma relação jurídica por tempo determinado.
2. Autorizo, ainda, a título excecional e atento o interesse público subjacente à prossecução de competências essenciais ao regular funcionamento das escolas, a prorrogação dos atuais contratos de trabalho por tempo determinado até à conclusão dos referidos procedimentos concursais”.
6) A autora candidatou-se ao procedimento concursal comum de recrutamento para ocupação de dois postos de trabalho em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado para carreira e categoria de assistente técnico no Agrupamento de Escolas de Marvila, cujo aviso foi publicado no DR, 2ª Série, de 29.5.2012.
7) A autora foi excluída no concurso referido em 6) por ter obtido classificação inferior a 9,5 valores na prova de conhecimentos.
8) A autora cessou a sua actividade laboral para o Ministério da Educação no dia 25.3.2013, data em que teve conhecimento da classificação descrita em 7).
9) A petição inicial relativa à presente acção foi remetida pelo SITAF em 15.11.2013 (cfr. fls. 2, dos autos em suporte de papel).
*
Presente a factualidade antecedente, cumpre entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.

Antes de mais cabe esclarecer que in casu é aplicável o CPTA na redacção anterior à dada pelo DL 214-G/2015, de 2/10, já que, por um lado, a presente acção considera-se proposta em 15.11.2013 (cfr. art. 259º n.º 1, do CPC de 2013), e, por outro lado, as alterações introduzidas ao CPTA pelo referido DL 214-G/2015, de 2/10, só se aplicam às acções propostas após a entrada em vigor desse diploma legal (cfr. o respectivo art. 15º n.º 2).

Na decisão recorrida consignou-se nomeadamente o seguinte:
- “No caso dos autos, tendo presente a configuração dada pela Autora à relação material controvertida, constata-se que está em causa questão relativa à interpretação, validade e execução do contrato de trabalho celebrado entre a Autora e o Ministério da Educação em 17 de fevereiro de 2006, como a própria Autora reconhece quando refere na réplica que “(...) a A. teve uma Relação laboral com o Ministério da Educação”, “Facto esse que está na base do direito em que a A. se arroga nos presentes autos.”, logo, subsumível à alínea h) do n.º 2 do artigo 37.º do CPTA, tendo a Autora instaurado a adequada ação administrativa comum.
No entanto, importa apreciar se ao Ministério da Educação e Ciência é reconhecida personalidade judiciária nas ações em que se discuta a validade da celebração de contrato de trabalho a termo resolutivo certo, as condições e termos em que se desenvolveu a relação laboral e o pagamento de indemnização pelo alegado despedimento ilícito ou a indemnização pela falta de aviso prévio e compensação por caducidade do contrato de trabalho” (cfr. a respectiva pág. 6);
- “A instauração de uma ação administrativa comum que tenha por objeto uma relação contratual ou de responsabilidade, no âmbito da pessoa coletiva Estado, contra um seu ministério ou órgão, determina a absolvição da instância da entidade demandada com fundamento na falta do pressuposto processual da personalidade judiciária, exceção dilatória insuprível, como vem sendo defendido pela jurisprudência e pela doutrina, alicerçado no entendimento segundo o qual o artigo 11.º, n.º 2 do CPTA, não tem a virtualidade de conferir personalidade judiciária a quem não a possui no quadro das referidas ações administrativas comuns.
Como referido supra, a presente ação foi intentada contra o Ministério da Educação e Ciência e tem por objeto uma relação contratual.
Assim, neste tipo de ações (como é a presente) os Ministérios - cúpulas da administração pública - não têm personalidade judiciária, sendo que a personalidade jurídica e judiciária radica na pessoa coletiva Estado” (cfr. a respectiva pág. 7);
- “Pode haver personalidade judiciária sem personalidade jurídica, mas estes casos estão expressamente elencados, sendo certo que a personalidade judiciária do Ministério da Educação não é reconhecida para efeitos de ação relativa a relação contratual, pois nestas quem tem personalidade judiciária é o Estado Português, representado pelo Ministério Público” (cfr. a respectiva pág. 8);
- “Atento o exposto, conclui-se que o Ministério da Educação e Ciência não tem personalidade judiciária.
Sucede que, esta exceção não é passível de sanação (cfr. artigo 14.º, a contrario, do CPC), não se admitindo, assim, a intervenção principal provocada do Estado Português – cfr., neste sentido, entre outros, Acórdão do STA de 03/03/2010, proc. n.º 0278/09:
“III - Numa acção instaurada contra um Ministério a sanação da falta de personalidade judiciária não é possível, e não sendo sanável também não pode ser objecto de suprimento nos termos do disposto nos art°s 508°, n° 1, alo a), 265°, n° 2, ou dos artºs 325° e segs. do CPC, determinando a absolvição da instância, nos termos do preceituado no artigo 288º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil”; e ainda Acs. do TCA Sul de 19/01/2012, proc. n.º 07015/10, de 15/01/2015, proc. n.º 011502/14 e 12/02/2015, proc. n.º 011740/14.
A falta de personalidade judiciária do Ministério demandado constitui exceção dilatória insuprível, abstendo-se o Tribunal de conhecer do mérito da causa, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 278.º, n.º 1, alínea b) e 576.º, n.º 2 do CPC” (cfr. as respectivas págs. 10 e 11);
- “Nos termos e com os fundamentos expostos, julgo procedente a exceção dilatória de falta de personalidade judiciária do Ministério da Educação e Ciência e, em consequência, absolvo o Réu da instância” (cfr. a respectiva pág. 11).

Dito por outras palavras, na decisão recorrida entendeu-se que, atenta a configuração dada pela autora, ora recorrente, à relação matéria controvertida, está em causa na presente lide uma relação contratual, pelo que, tendo em conta o disposto no art. 11º n.º 2, do CPTA - de acordo com o qual nos processos que tenham por objecto relações contratuais quem tem personalidade judiciária é o Estado Português, representado pelo Ministério Público -, o Ministério da Educação e da Ciência, ora recorrido, não tem personalidade judiciária, excepção dilatória que não é passível de sanação, razão pela qual absolveu o mesmo da instância.

Na alegação de recurso e nas respectivas conclusões a recorrente não põe em causa que a presente acção deveria ter sido intentada contra o Estado Português e que o Ministério da Educação e Ciência carece de personalidade judiciária, apenas impugnando o entendimento plasmado na decisão recorrida de que a excepção de falta de personalidade judiciária não é susceptível de sanação, defendendo que deveria ter sido aceite o chamamento (intervenção principal provocada) do Estado Português que suscitou ou convidada a aperfeiçoar a petição inicial no que respeita à identificação da entidade pública demandada.

Assim, a única questão que cumpre apreciar neste recurso é a de saber se a decisão recorrida incorreu em erro ao considerar insanável a excepção de falta de personalidade judiciária do réu, ora recorrido, tendo presente que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões da alegação de recurso (cfr. arts. 608º nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, todos do CPC de 2013, ex vi art. 140º, do CPTA, sem prejuízo das questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração).

Antes de analisar esta questão cabe chamar a atenção para o facto de a recorrente apelidar - ao longo do corpo da alegação de recurso e ao longo das conclusões de recurso - a excepção dilatória julgada procedente pela decisão recorrida como “excepção dilatória de falta de personalidade judiciária do Ministério da Educação e Ciência e a sua ilegitimidade passiva”, “ilegitimidade do Recorrido” ou “ilegitimidade do Ministério da Educação e da Ciência” (cfr. n.ºs 5, 22 e 26, do corpo da alegação de recurso, e conclusões n.ºs VI e XIII).

Ora, cumpre esclarecer que a (única) excepção dilatória julgada procedente pela decisão recorrida foi a excepção de falta de personalidade judiciária do recorrido, Ministério da Educação e Ciência, pelo que é (apenas e somente) relativamente a esta excepção (de falta de personalidade judiciária) que cumpre determinar se a decisão recorrida incorreu em erro ao considerá-la insanável.

Vejamos, então, esta questão.

A personalidade judiciária consiste na susceptibilidade de ser parte (cfr. art. 11º n.º 1, do CPC de 2013).

A falta de personalidade judiciária é uma excepção que não é passível de sanação - excepto nos casos previstos no art. 14º, do CPC de 2013 (sucursais, agências, filiais, deligações ou representações), aqui inaplicáveis -, razão pela qual a decisão recorrida não incorreu em erro de julgamento ao não admitir a intervenção provocada do Estado Português ou o aperfeiçoamento da petição inicial [sendo de salientar que nunca poderia existir violação dos arts. 87º a 89º, do CPTA (na redacção anterior à dada pelo DL 214-G/2015, de 2/10, versão aqui aplicável, como supra referido), pois estes normativos legais são aplicáveis à acção administrativa especial e não à acção administrativa comum, e sendo certo que a presente acção segue a forma da acção administrativa comum], nem padece de nulidade processual.

Cumpre salientar que os tribunais superiores têm-se pronunciando de forma largamente maioritária no sentido de que a falta de personalidade judiciária é uma excepção dilatória insanável, entre outros:
- Acs. do STA de 3.3.2010, proc. 0278/09 [“III - Numa acção instaurada contra um Ministério a sanação da falta de personalidade judiciária não é possível, e não sendo sanável também não pode ser objecto de suprimento nos termos do disposto nos art°s 508°, n° 1, alo a), 265°, n° 2, ou dos artºs 325° e segs. do CPC, determinando a absolvição da instância, nos termos do preceituado no artigo 288º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil”], 1.10.2015, proc. n.º 556/15 [“III - Numa acção instaurada contra um Ministério a sanação da falta de personalidade judiciária não é possível, e não sendo sanável também não pode ser objecto de suprimento nos termos do disposto no artº 590º, nº 1, al. a) do CPC, determinando a absolvição da instância, nos termos do preceituado no artigo 278º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil”], e 4.2.2016, proc. n.º 1300/14 [“I - Os Ministérios não possuem personalidade judiciária para os termos de uma acção administrativa comum para efectivação de responsabilidade civil extracontratual. II - A falta desse pressuposto processual, sendo insanável, implica a absolvição do R. da instância.”];
- Acs. do TCA Sul de 19.1.2012, proc. n.º 7015/10, 15.1.2015, proc. n.º 11502/14, 12.2.2015, proc. n.º 11740/14, 30.4.2015, proc. n.º 11243/14 [“VI - A falta de personalidade judiciária dos Ministérios constitui uma excepção dilatória insanável e insuprível e importa a absolvição da instância do réu”], 2.2.2017, proc. n.º 12715/15, e 4.5.2017, proc. n.º 91558/12;
- Acs. do TCA Norte de 24.5.2007, proc. n.º 184/05.1BEPRT, 19.7.2007, proc. n.º 805/05.6BEPRT [“VI- A falta de personalidade judiciária dos Ministérios constitui uma excepção dilatória insanável e insuprível e importa a absolvição da instância do réu – Cfr. artºs 8º, 508º-1-a), 265º, 493º-2 e 494º-c) do CPC”], 11.11.2011, proc. n.º 161/07.8 BEBRG, 25.11.2011, proc. n.º 3586/10.8 BEPRT [“2 . Numa acção instaurada contra um Ministério, a sanação da falta de personalidade judiciária não é possível e não sendo sanável também não pode ser objecto de suprimento nos termos do disposto nos arts. 508.°, n.º 1, al. a), 265.°, n.° 2 ou dos arts. 325.° e ss. do CPC, determinando a absolvição da instância, nos termos do preceituado no art.º 288.º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Civil”], 7.12.2012, proc. n.º 2696/11.9BEPRT, 19.4.2013, proc. n.º 106/12.3BEVIS, 13.6.2014, proc. n.º 748/12.7BEAVR, 16.1.2015, proc. n.º 2834/12.4BEPRT, e 17.6.2016, proc. n.º 1488/15.0BEPRT-A [“I- No caso em concreto, tratando-se de acção que, sendo processada sob a forma de acção administrativa comum e que diz respeito a uma relação jurídica de responsabilidade civil extracontratual, deveria ter sido instaurada contra o Estado e não contra os aqui Réus. II- Daí que, nesta situação, não seja possível a sanação da falta de personalidade judiciária, pelo que também não pode ser objecto de suprimento nos termos do disposto nos artºs 6°/2, 316° e 590° do CPC, originando a absolvição da instância, de acordo com o preceituado no artº 278°/1, c) do Código de Processo Civil”].

Acresce que recentemente o STA prolatou Ac. de Uniformização de Jurisprudência neste mesmo sentido.

Com efeito, no Ac. do STA de 24.5.2018, proc. n.º 166/18, foi fixada a seguinte jurisprudência: “numa acção administrativa comum para efectivação de responsabilidade contratual ou extra-contratual, instaurada contra um Ministério, a sanação da falta de personalidade judiciária não é possível e não sendo sanável, também não pode ser objecto de suprimento, sendo determinante da absolvição da instância, nos termos do preceituado no artº 278º, nº 1, alínea c) do Código do Processo Civil” (sublinhados e sombreado nossos).

Para o efeito argumentou-se nesse Ac. de Uniformização de Jurisprudência de 24.5.2018 o seguinte:
Esta questão não é nova na jurisprudência, sendo francamente maioritária, para não dizer quase unânime, a posição que se inclina para a impossibilidade de sanação, até porque a personalidade judiciária constitui o pressuposto dos restantes pressupostos processuais relativos às partes, uma vez que, faltando personalidade judiciária estamos perante uma instância irregular, que não pode, neste tipo de acções ser sanada.
Na verdade, sobre esta questão a posição do STA tem sido de que tal sanação desta excepção dilatória, à luz das normas do processo civil não é possível, com excepção das situações tipificadas no artº 8º do Código Processo Civil [sucursais, agências, filiais, delegações ou representações], o que não é o caso dos autos, sendo que o Ac. deste STA proferido em 03/03/2010, in proc nº 0278/09, expressamente consignou: «Ora, atento o que se deixou já exposto sobre a importância do pressuposto processual da personalidade judiciária [pressuposto de outros pressupostos processuais relativos às partes, como ensina o Prof. Castro Mendes (Direito Processual Civil II, págs. 13 e 14)] e do que dimana nomeadamente do disposto nos artigos 5º a 8º, 23º e 265º, nº 2, do Código de Processo Civil, crê-se que a falta desse pressuposto processual é insanável, determinando a absolvição da instância, nos termos do preceituado no artigo 288º, nº 1, alínea c) do Código de Processo Civil. (…) E, não se vê de que forma a solução/interpretação para que se propende possa violar o direito de acesso à tutela jurisdicional efectiva, consagrado nos arts. 20º e 268º, nº 4 da CRP, pois que, independentemente do mais, tal tutela supõe que as partes se conformem com as limitações decorrentes da lei ordinária, designadamente das disposições imperativas do Código de Processo Civil, o que, como se viu, não foi o caso. (…) De resto, os enunciados princípios não podem deixar de coexistir com o princípio da autorresponsabilidade das partes inerente ao princípio dispositivo, o qual opera na escolha dos meios processuais e na fixação do objecto da pretensão da tutela judicial. (…) Em suma, fora da hipótese prevista no art. 8.º do CPC, a falta de personalidade judiciária … não é sanável …”.
E cremos que outra não pode deixar de ser a solução aplicável ao caso presente, sendo infundada a argumentação utilizada pelo recorrido quando se socorre do princípio vertido no artº 7º do CPTA, pois, quer o princípio da economia processual, quer o da prevalência das decisões de fundo sobre as decisões de forma, possuem limites na sua aplicação e, portanto, estes limites não podem ser excedidos, sob pena de violação expressa das normas imperativas e positivadas no Código do Processo Civil.
E o artº 278º, nº 1, al. c) do CPC [versão de 2013] é claro ao enunciar que «(…) o juiz deve abster-se de conhecer do pedido e absolver o réu da instância, quando entenda que alguma das partes é destituída de personalidade judiciária…».
E ao especificar no seu nº 3 que «As excepções dilatórias só subsistem enquanto a respectiva falta ou irregularidade não for sanada, nos termos do nº 2 do artº 6».
Ora este nº 2 do artº 6º do CPC apenas tem aplicação em relação aos pressupostos processuais susceptíveis de sanação, como decorre do próprio texto, assim como resulta do disposto no artº 14º do mesmo diploma legal, que só a falta de personalidade judiciária das sucursais, agências, filiais, delegações ou representações pode ser sanada.
E nem os invocados princípios da economia processual, da prevalência das decisões de fundo sobre as decisões de forma, invocados pelo recorrido, contribuem para o entendimento de uma possível sanação, dado que, como se referiu, a falta de personalidade judiciária constitui o pressuposto base dos demais pressupostos processuais relativos aos sujeitos processuais, originando, assim, uma instância ab initio irregular e sem possibilidade de ser salva.
Face ao exposto, procedem todos os argumentos trazidos no recurso dirigido a este Tribunal, sendo de concluir que, no caso presente, a excepção dilatória por falta de personalidade judiciária do R. Ministério da Educação e da Ciência [artº 577º, al. c) do CPC] é insusceptível de sanação.”.

Conclui-se, assim, que bem andou a decisão recorrida ao considerar insanável a falta de personalidade judiciária do recorrido, Ministério da Educação e Ciência, razão pela qual deverá a mesma ser mantida.
*
A recorrente ficou vencida no presente recurso jurisdicional, pelo que deverá suportar as respectivas custas (cfr. art. 527º n.ºs 1 e 2, do CPC de 2013, ex vi art. 1º, do CPTA), sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido, na modalidade de dispensa do pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo (cfr. fls. 30, dos autos em suporte de papel).
III - DECISÃO
Pelo exposto, acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul nos seguintes termos:
I – Negar provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, manter a decisão recorrida.
II – Condenar a recorrente nas custas relativas ao presente recurso jurisdicional, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido, na modalidade de dispensa do pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
III – Registe e notifique.
*
Lisboa, 4 de Outubro de 2018



(Catarina Gonçalves Jarmela - relatora)



(Maria Helena Canelas – 1ª adjunta)



(Cristina dos Santos – 2ª adjunta, em substituição)