Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2665/16.2BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:06/14/2018
Relator:SOFIA DAVID
Descritores:INCIDENTE DE DECLARAÇÃO DE INEFICÁCIA DE ACTOS DE EXECUÇÃO INDEVIDA; SINDICATO, LEGITIMIDADE ACTIVA;
PEDIDO DE SUSPENSÃO DE EFICÁCIA; ART.º 4.º, N.º 1, AL. F), DO REGULAMENTO DAS CUSTAS JUDICIAIS;
RENDIMENTOS AUFERIDOS PELO TRABALHADOR; FUMUS BONI IURIS; ART.º 102.º, N.º1, AL. A) E 3, DO ESTATUTO DA P.....;
ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE FACTO; PERICULUM IN MORA; PONDERAÇÃO DE INTERESSES; RISCO PARA A SAÚDE E A VIDA DO TRABALHADOR
Sumário:I - Para que o incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida se justifique, é preciso que existam actos de execução indevida, não bastando a verificação da mera existência de uma resolução fundamentada prolatada pela Administração;
II – Os Sindicatos têm legitimidade quer para litigar em defesa de interesses colectivos e em nome próprio, quer para litigar em defesa de interesses individuais dos seus associados e em representação destes;
III – Os rendimentos para os quais remete a al. h) do n.º 1 do art.º 4.º do RCJ, são os rendimentos ilíquidos efectivamente auferidos pelo trabalhador, não os rendimentos do seu agregado familiar;
IV – Nos termos da al. a) do n.º 1 e do n.º 3 do art.º 102.º do Estatuto da P....., aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19-10, a colocação a título excepcional de um trabalhador no CM do Porto, “por motivos de saúde do próprio”, extingue-se “com a cessação dos seus pressupostos”;
V -É provável que exista um erro nos pressupostos de facto, quando o acto suspendendo entendeu que se tinha verificado uma alteração na situação de saúde do trabalhador e se alicerça em documentos que assim não indicam expressamente, acrescendo que tal alteração de saúde vem contrariada pela prova feita em Tribunal;
VI - Está verificado o periculum in mora se a colocação de um trabalhador no CM de Lisboa pode agravar o seu estado de saúde, considerando que o mesmo é P..... e está a recuperar de choque pós-traumático, com risco de suicídio;
VI – Os danos que resultam para a Administração da colocação do trabalhador no CM do Porto são inferiores àqueles que possam envolver o risco para a saúde e a vida do trabalhador, considerando que nos autos ficou indiciariamente provado que a sua colocação no CM de Lisboa, onde ocorreu o acidente e afastado do suporte familiar, poderá agravar a sua patologia médica.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

I - RELATÓRIO

O Ministério da Administração Interna (MAI) interpôs recurso da sentença do TAC de Lisboa, que julgou procedente o pedido de suspensão de eficácia do despacho de 14-10-2016, do Director Nacional Adjunto (DNA) para a Unidade Orgânica de Recursos Humanos da Direcção Nacional (DN) da P… de S…. P… (P…), que revogou o seu anterior despacho de 21-06-2016, de deferimento do pedido de colocação a título excepcional de J… A… T… V… C… no Comando Metropolitano (CM) do Porto.

Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões: “1.ª O tribunal a quo não se pronunciou sobre questões que devia apreciar - o pedido de resolução fundamentada apresentado previsto no artigo 128.º do CPTA - violando o dever de conhecer todas as questões que lhe sejam submetidas pelas partes, violando o n.º 2, do artigo 608.º do CPC, constituindo nulidade da sentença por omissão de pronúncia nos termos previstos nas ai. d), do nº 1, do artigo 615º do CPC.
2.ª O ato suspendendo é legal e não merce censura porque a necessidade de estar junto da família, não foi nem podia ser in casu fundamento para a concessão dessa licença, uma vez que o pedido que lhe estava subjacente não é do reagrupamento familiar, previsto no disposto ai. b) do n.º1 do artigo 102.º do Estatuto da P....., mas sim por motivos de saúde do próprio, nos termos da ai. a) do mesmo numero e artigo, como o tribunal a quo deu como assente.
3. A decisão recorrida violou o artigo 120º nºl ai. a) e n.º 2 do CPTA pelo que deve ser revogada uma vez que não estão preenchidos os requisitos fumus boni iuris, periculum de mora e de ponderação dos interesses que seria causa de não provimento da providência cautelar;
4. 0 tribunal quo interpretou erroneamente direito o quando improcedeu a exceção dilatória sobre a falta de legitimidade ativa da recorrido, ora requerente, para representar em juízo o seu associado, nos termos do artigo 30.P do CPC, ex vi artigo 1.º do CPTA, e n.º1 do artigo 9º e al. c) n.º1 do artigo 55.º ambos do CPTA.
5.ºComo foi expendido anteriormente sobre a legitimidade ativa das associações sindicais, a requerente, ora recorrida, não tinha qualquer legitimidade ativa no caso em concreto, logo não estava isenta do pagamento da taxa d justiça, nos termos do n.º 3 do artigo 338.º da Lei n.º 34/2014 de 20 de junho.
6.0 O tribunal a quo interpretou erroneamente o direito e os pressuposto de facto quando dispensou de pagamento de taxa de justiça, ma vez que o requerente não era o representado da associação, logo não estava isento pelo disposto na ai. f) do n.0 1 do artigo 4.0 do RCP, nem pela ai. h) do mesmo número e artigo, porque o rendimento ilíquido deste era superior as 200UC, sedo no valor de € 22.247,93, (vinte e dois mil duzentos e quarenta e sete euros e noventa e três$ cêntimos).”

O Recorrido nas suas alegações apresentou as seguintes conclusões: ”1 - O Recorrido propôs a providência cautelar em representação de um seu associado, que identificou na correspondente petição, agindo na defesa colectiva de interesses individuais desse mesmo associado, a coberto da sua legitimidade processual, pelo que tem legitimidade activa;
II- O Recorrido propôs o procedimento cautelar em representação de trabalhador seu associado, que identificou, sendo que este é assistido, como se declarou, gratuitamente pelos serviços jurídicos do sindicato requerente e aufere rendimentos ilíquidos não superiores a 200 UC;
III- O trabalhador representado pela A. auferiu, no ano relevante (2015), o rendimento ilíquido de €16.017,67 e não o indicado pelo Recorrente (€ 22.247,93), pois que este valor é o resultado do somatório dos rendimentos do referido trabalhador e do seu cônjuge;
IV- O que releva para o disposto na alínea h) do n.º 1, do artigo 4.0 do RCP é o rendi mento do trabalhador representado e não o do conjunto do respectivo agregado familiar.
V- Pelo que, o A. beneficia, em conformidade com o decidido, da isenção da taxa de justiça prevista no artigo 4.º, n.º 1, alínea h), do RCP;
VI - A sentença recorrida não tinha, nem devia, pronunciar- se sobre a Resolução Fundamentada, pelo que não está eivada do vício de "Omissão de pronúncia ";
VII - A Sentença recorrida ajuizou, e bem, os critérios de atribuição da providência cautelar requerida, fundamentando exaustivamente a verificação de cada um deles, não merecendo censura;
VIII - Devendo, assim, ser mantida integralmente a Sentença recorrida, por não padecer dos vícios que lhe são assacados pelo Recorrente, e ser o Recurso julgado totalmente improcedente, com as legais consequências, com o que será feita JUSTIÇA.”

A DMMP apresentou a pronúncia no sentido da improcedência do recurso.

Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, vem o processo à conferência.

II – FUNDAMENTAÇÃO
II.1 – OS FACTOS

Em aplicação do art.º 663.º, n.º 6, do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art.º 1.º e 140.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), por não ter sido impugnada, remete-se a matéria de facto para os termos em que foi decidida pela 1.ª instância.

II.2 - O DIREITO

As questões a decidir neste processo, tal como vêm delimitadas pelas alegações e contra-alegações de recurso e respectivas conclusões, são:
- aferir da nulidade decisória por a decisão recorrida ter omitido qualquer apreciação sobre o incidente relativo à resolução fundamentada;
- aferir do erro decisório e da violação dos art.ºs. 30.º do CPC, ex vi art.º 1.º do CPTA, 9.º, n.º 1 e 55.º, n.º 1, al. c), do CPTA, por o A. ser parte ilegítima para representar em juízo o seu associado;
- aferir do erro decisório e da violação dos art.ºs 4.º, n.º 1, al. f), do Regulamento de Custas Judiciais (RCJ), porque o associado do A. apresentava um rendimento que não lhe permitiria a isenção de taxa de justiça que lhe foi concedida;
- aferir do erro decisório e da violação dos art.ºs. 120.º, n.º 1, al. a), do CPTA, por não existir erro nos pressupostos de facto, porque não haviam razões de saúde que justificassem a concessão de licença nos termos do art.º 102.º, n.º 1, al. a), do Estatuto da P… e porque não estavam preenchidos os requisitos fumus boni iuris, periculum in mora e a ponderação de interesses indicada no art.º 120.º, n.º 2, do CPTA.

Na contestação, no art.º 80.º, o R. e ora Recorrente indica que proferiu resolução fundamentada, juntando cópia da mesma aos autos.
Entretanto, o A. e Recorrido não veio requerer nenhum incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida.
Por conseguinte, face à tramitação dos presentes autos não se alcança inteiramente a alegação do R. e Recorrente quando invoca a omissão de pronúncia da decisão sindicada, por não apreciar do incidente sobre as razões em que se fundamenta a resolução fundamentada, quando tal incidente não foi suscitado pelas partes, designadamente pelo A. e ora Recorrido.
Face ao teor das alegações de recurso, parece que o Recorrente entende que sempre que a Administração Pública junte aos autos uma resolução fundamentada, isso constituiu automaticamente o incidente que vem indicado no art.º 128.º, n.º 4, do CPTA, pelo que o Tribunal tem de conhecer do mesmo.
Porém, o que resulta do art.º 128.º do CPTA é que “o interessado” – que, no caso, será o associado do Recorrido e não o Recorrente - pode suscitar o incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida. Por seu turno, não sendo suscitado tal incidente pelo interessado – pois essa invocação é uma faculdade sua, não um ónus – o Tribunal nada tem que conhecer relativamente à existência de eventuais actos de execução indevida.
Aliás, como bem contra-alega o Recorrido, para que tal incidente se justifique é preciso que existam actos de execução indevida, não bastando a verificação da mera existência de uma resolução fundamentada prolatada pela Administração.
Portanto, a alegação do Recorrente relativa à omissão de pronúncia falece manifestamente.

Igualmente, falece manifestamente o invocado erro na apreciação feita pelo Tribunal de 1.ª instância quanto à legitimidade do A. e Recorrido, pois o que o Recorrente advoga é que, no caso concreto, não existia legitimidade do Sindicato para a defesa de interesses colectivos, citando diversa jurisprudência sobre tal matéria.
Porém, na situação em apreço, como decorre dos termos da PI, o que está em causa é a legitimidade da ASPP para a defesa de interesses individuais de um associado seu. Ora, para esta defesa de interesses individuais, é indubitável que aquele Sindicato tem legitimidade activa – cf. art.ºs. 2.º, n.º 7, da Lei n.º 14/2002, de 19-02 e 55.º, n.º 1, al. a), do CPTA.
Quanto à defesa de interesses colectivos, não é afirmada na PI e não é feita nestes autos.
Saliente-se, igualmente, que a possibilidade de os Sindicados intentarem acções em nome próprio e em defesa de interesses colectivos, não afasta a sua legitimidade para também litigarem em defesa e representação dos interesses individuais dos seus associados.
Ou seja, a alegação do Recorrente falece porque os Sindicatos têm legitimidade quer para litigar em defesa de interesses colectivos e em nome próprio, quer para litigar em defesa de interesses individuais dos seus associados e em representação destes.

Da mesma forma claudica, manifestamente, o invocado erro decisório por o associado do A. não poder estar dispensado do pagamento de taxa de justiça, nos termos do art.ºs 4.º, n.º 1, al. f), do RCJ.
J…A… T… V… C… é patrocinado nesta acção por advogado da ASPP, que o representa de forma gratuita. O trabalhador apresentou um rendimento anual ilíquido no ano de 2016 de €16.017,17 (cf. declaração de IRS junta aos autos).
Logo, o associado do A. goza da isenção prevista no art.º art.ºs 4.º, n.º 1, al. h), do RCJ e foi isso mesmo que foi decidido, e bem, na decisão recorrida.
Nessa mesma decisão não aplicou a al. f) daquele preceito legal, mas a al. h), logicamente, porque estava em causa a defesa de interesses individuais de um associado do A. e não de interesses colectivos, a defender, em nome próprio pelo Sindicato.
Quanto aos rendimentos para os quais remete a al. h) do n.º 1 do art.º 4.º do RCJ, são os rendimentos ilíquidos efectivamente auferidos pelo trabalhador, não os rendimentos do seu agregado familiar (cf. neste sentido, entre outros, os Acs. do TRP n.º 1284/15.5T8MTS.P1, de 05-12-2016, TRE n.º 55/12.5TTEVR.E1, de 28-06-2012 ou do TRE n.º 12/12.1TTEVR.E1, de 05-07-2012).

Por último, também claudicam as alegações do Recorrente quando imputa um erro decisório à sentença recorrida, por considerar não se verificar um erro nos pressupostos de facto e por entender não estavam preenchidos os requisitos do fumus boni iuris, periculum in mora e a ponderação de interesses que exige o art.º 120.º, n.º 2, do CPTA.
Os critérios para a atribuição de quaisquer providências cautelares – conservatórias ou antecipatórias – estão inscritos no art.º 120.º n.º 1, do CPTA.
Determina o art.º 120.º, n.º 1, do CPTA, na redacção dada pelo Decreto-Lei n° 214-G/2015, de 02-10, que para o decretamento de qualquer providência cautelar devam verificar-se de forma cumulativa dois requisitos: o periculum in mora e o fumus boni iuris. Ou seja, terá de ficar indiciariamente provado nos autos que existe um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado, ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e, ainda, que é provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.
O fumus boni iuris que ora se exige encontra-se na sua formulação positiva, requerendo-se que haja uma séria possibilidade de procedência da pretensão principal, que seja "provável" a aparência do bom direito. Por seu turno, esta apreciação deve ser feita em termos de summario cognitio, com base em juízos de verosimilhança, de mera previsibilidade ou razoabilidade, face aos factos e alegações (indiciários) que são trazidos pelo Requerente para os autos.
A falta de qualquer um daqueles requisitos faz logo claudicar a providência cautelar que tenha sido requerida
Mas ainda que se preencherem os dois requisitos referidos, haverá, depois, que ponderar os interesses em confronto, nos termos do n.º 2 do art.º 120.º do indicado preceito.
Como decorre dos factos provados em 6) a 12), o Recorrente deferiu um pedido de colocação do associado do Recorrido, a título excepcional, no Comando Metropolitano (CM) do Porto, com base em razões médicas, por ser aconselhável à saúde do trabalhador estar acompanhado da família. Dos factos provados em 2) a 6), 10), 14), 22), 24) e 25), verifica-se, ainda, que o trabalhador, após acidente que sofreu quando prestava serviço do CM de Lisboa, passou a sofrer de síndroma pós-traumático, apresentando aquando da data do acto suspendendo, risco de suicídio. Face ao que ficou provado nos autos, a convivência diária com a família “é fundamental para a estabilidade da síndrome de stress pós-traumático” e “existe risco de suicídio (…) caso regresse ao comando metropolitano de Lisboa”.
Considerando este quadro factual, que vem assente na decisão recorrida sem impugnação do Recorrente, será manifesto que o acto suspendendo, quando revoga o anterior despacho do DNA da P…, de 21-06-2016, de deferimento do pedido de colocação a título excepcional de J… A… T… V… C… no CM do Porto, tendo por fundamento a alteração substancial dos factos – alegadamente porque o trabalhador foi considerado apto para as funções por documento médico e estava novamente armado – terá errado nessa consideração.
Na verdade, do teor da proposta que suportou o despacho suspendendo, deriva que a “aptidão” do trabalhador para o serviço era indicada com relação ao concreto serviço onde o mesmo estava a exercer funções – o CM do Porto. No que se refere ao correspondente exercício de funções no CM de Lisboa, a indicada proposta nada refere expressamente. Quanto à declaração médica para a qual se remete no acto suspendendo, é explícita: “O agente J… A… T… V… C…, 36 anos, está em condições de regressar à sua actividade profissional no Comando do Porto a partir de 1/9/16 e ser rearmado “ – cf. doc. 9 junto com a PI, assente no facto 14 da sentença recorrida.
Associado o teor daquela declaração médica com a restante factualidade apurada nos autos, designadamente com os factos provados em 2) a 6), 10), 14), 22), 24) e 25), torna-se evidente que o trabalhador, na data da prolação do despacho sindicado, mantinha-se com graves problemas de saúde, continuando a ser aconselhável o acompanhamento da sua família, que reside no Porto. Esse mesmo acompanhamento revelar-se-ia essencial, ou necessário, à melhoria do estado de saúde do referido trabalhador.
Portanto, ao contrário do que ficou implícito no despacho sindicado – porque nele não é afirmado peremptoriamente que o trabalhador estivesse em plenas condições de saúde e já apto para regressar ao CM de Lisboa – o estado de saúde de J...A...T...V...C... não se tinha alterado substancialmente, a ponto de deixar de haver razões para ser mantida a possibilidade de ser colocado, a título excepcional, no CM do Porto, “por motivos de saúde do próprio”, nos termos da al. a) do n.º 1, do art.º 102.º, do Estatuto da P....., aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19-10.
Nos termos do n.º 3 do indicado art.º 102.º “a colocação a título excecional é casuisticamente ponderada e pode ser concedida pelo diretor nacional, por períodos de três meses a um ano, extinguindo-se o direito à colocação com a cessação dos seus pressupostos.”
Ora, no caso em apreço, como acima se indicou, os referidos pressupostos quanto à saúde do trabalhador não se alteraram substancialmente. Ademais, atendendo à proposta em que aquela decisão se baseou e ao teor da correspondente declaração médica, para a qual se remete, também não se pode entender que a decisão do DN tivesse feito uma verdadeira ponderação casuística da situação, porquanto, nem sequer se atendeu ao facto de a declaração médica se referir expressamente pela aptidão para o início das funções, precisamente, no CM do Porto.
Nestes termos, é provável que a acção principal proceda, quando se aprecie da invocação do vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto, por a situação de saúde do trabalhador não se ter alterado substancialmente e os pressupostos para o anterior deferimento para a colocação a título excepcional de J...A...T...V...C... no CM do Porto não terem cessado, não estando, por isso, respeitado o art.º 102.º, n.º 3, do Estatuto da P......
Em suma, a decisão recorrida foi totalmente acertada quando entendeu verificado o requisito do fumus boni iuris, por ser provável a verificação de um vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto.

O Recorrente vem também alegar erro decisório por não estar verificado o periculum in mora. Neste aspecto, apenas refere que a decisão recorrida errou, afirmando que não há risco ou danos para o trabalhador em ser colocado no CM de Lisboa.
Porém, como decorre do antes dito, é evidente que face à situação de saúde do trabalhador – a recuperar de choque pós-traumático, com risco de suicídio - a sua colocação no CM de Lisboa, onde ocorreu o acidente que motivou aquele choque e longe da família, que lhe dá apoio, poderá agravar o seu estado de saúde.
Está, assim, verificado o indicado periculum in mora, havendo, também aqui, que confirmar a decisão recorrida.
No que concerne à ponderação de interesses, o Recorrente diz que a decisão recorrida errou na sua apreciação, porque há que atender ao princípio da legalidade e ao universo de outros profissionais que aguardam na lista o oferecimento da colocação no CM do Porto, interesses estes que prevalecem aos do associado do Recorrido.
Dispõe n.º 2 do artigo 120.º do CPTA que “a adopção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados, em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências”.
Ora, será mais que evidente que, na situação em apreço, os indicados danos para a Administração são inferiores aos que possam envolver o risco para a saúde e a vida do trabalhador, pois dos autos resultou provado que a sua colocação no CM de Lisboa, onde ocorreu o acidente e afastado do suporte familiar, poderá agravar a sua patologia médica, existindo o risco de suicídio.
Da parte da Administração, o único dano decorrente da concessão da providência deriva da colocação deste trabalhador no CM do Porto e não de outro que esteja a aguardar na lista a colocação no mesmo sítio. Tal dano é manifestamente inferior aos que resultarão para o associado do Recorrido na não procedência da providência. Atendendo ao risco de agravamento do estado de saúde do trabalhador e de suicídio, o dano que resultará para a P..... desse agravamento ou da perda de um agente seu é também superior àquele que ora invoca: a colocação de outro agente naquele lugar. Quanto à legalidade, como se viu, no caso em apreço é provável que a Administração esteja a actuar ilegalmente, pelo que o não deferimento desta providência apenas implicaria o perpetuar da sua conduta ilegal e não o inverso, isto é, não uma actuação em conformidade com esse princípio.
Portanto, também quanto a este aspecto, a decisão recorrida foi correcta e deve ser mantida nos seus precisos termos.
Em suma, o presente recurso improcede claramente.

III- DISPOSITIVO

Pelo exposto, acordam:
- negar provimento ao recurso interposto, mantendo a decisão recorrida nos seus precisos termos;
- custas pelo Recorrente (cf. art.ºs. 527.º n.ºs 1 e 2, do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2, do RCP e 189.º, n.º 2, do CPTA).

Lisboa, 14 de Junho de 2018.
(Sofia David)

(Nuno Coutinho)

(José Correia)