Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08716/15
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:07/10/2015
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
NOTIFICAÇÃO COMO REQUISITO DE PERFEIÇÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO DE LIQUIDAÇÃO.
FALTA DE NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO ENQUANTO FUNDAMENTO DE OPOSIÇÃO A EXECUÇÃO FISCAL.
REQUISITOS DA NOTIFICAÇÃO PREVISTOS NO ARTº.36, Nº.2, DO C.P.P.T.
Sumário:1. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).

2. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

3. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.

4. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.

5. A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação.

6. No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A.).

7. De acordo com a interpretação jurisprudencial do quadro normativo existente, à qual se adere, fica aberta, na fase executiva, pelos meios legais de oposição, a discussão da falta ou de eventuais vícios da notificação, designadamente por inexigibilidade da dívida, ao abrigo do disposto no mencionado artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário). Em resumo, o regime processual de defesa do contribuinte, nestas situações será o seguinte:
A-Se é instaurada uma execução fiscal e não foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, o sujeito passivo pode sempre opor-se à execução ao abrigo da alínea i), do nº.1, do artº.204, do C.P.P.T., invocando a ineficácia do acto, que impede que a dívida seja exigível, sendo indiferente, para este efeito, que o acto de liquidação enferme de qualquer vício, inclusivamente o de extemporaneidade da liquidação;
B-Já se foi instaurada uma execução e efectuada notificação válida do acto de liquidação, mas a notificação foi realizada fora do prazo de caducidade previsto no artº.45, nº.1, da L.G.T. (ou outro prazo especial que for aplicável), o contribuinte pode opor-se à execução ao abrigo da alínea e), do nº.1, deste artº.204, do C.P.P.T. (trata-se de situação que, no seu teor literal, poderia caber na mencionada alínea i), pois não se engloba nela a apreciação da legalidade da própria liquidação nem é matéria da exclusiva competência da entidade que emite o título, mas que era dela afastada à face do entendimento jurisprudencial referido formado na vigência do C.P.T., reconduzindo-se a utilidade da alínea e) ao afastamento da aplicabilidade deste entendimento; a possibilidade de oposição ao abrigo da alínea e) existirá independentemente de a própria liquidação ser extemporânea, isto é, de ela própria ser ilegal, pois não está em causa no processo de oposição à execução fiscal a apreciação da legalidade da liquidação, mas a sua oponibilidade ao seu destinatário);
C-Por último, se foi efectuada uma liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo, mas não foi ainda instaurada execução, o contribuinte pode impugnar judicialmente a liquidação, invocando a ilegalidade da sua extemporaneidade, porém, se o não fizer e não pagar a quantia liquidada, não ficará impedido de se opor à execução, ao abrigo da alínea e) referida, visto que, além da ilegalidade da liquidação, ocorrer também a sua inexigibilidade por falta de tempestiva notificação.

8. A falta de qualquer dos requisitos da notificação previstos no artº.36, nº.2, do C.P.P.T., não implica, necessariamente, a invalidade da notificação. Tal só acontece relativamente à falta de indicação do autor do acto, do seu sentido, da sua data e, sendo caso disso, a indicação de que o mesmo foi praticado no uso de delegação ou subdelegação de poderes. Somente neste caso o vício do acto de notificação será nulo (cfr.artº.39, nº.11, do C.P.P.T.). Já se a falta se reportar a qualquer outro requisito, o vício que afecta a notificação ficará sanado se não for pedida a notificação dos requisitos omitidos ou a passagem de certidão que a contenha, nos termos do artº.37, do C.P.P.T. Por outro lado, as consequências da inobservância dos requisitos referidos devem conexionar-se com a finalidade que justifica a sua exigência, pois, se esta for atingida mesmo sem tal observância, não se justificará que se mantenha a exigência. Assim, por exemplo, será irrelevante para efeitos de determinar a invalidade da notificação e a consequente ineficácia do acto a falta de indicação dos meios de defesa e prazo para reagir ao acto notificado, quando o interessado usa os meios adequados, tempestivamente.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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"C……… - PORTUGUESA ………., S.A.", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.110 a 116 do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedente a presente oposição, intentada pelo recorrente, na qualidade de executado, visando a execução fiscal nº……………., a qual corre seus termos no 5º. Serviço de Finanças de Lisboa, tendo por objecto a cobrança coerciva de dívida de taxa incidente sobre a ampliação de posto de combustível no montante total de € 5.766,44.
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O recorrente termina as alegações (cfr.fls.129 a 141 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Constitui o objecto dos presentes autos de recurso a decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou a oposição à execução fiscal improcedente com base, sumariamente, e no que se refere no fundamento de que "Na verdade a própria oponente vem assumir que teve conhecimento da liquidação no prazo de pagamento voluntário tendo até deduzido reclamação perante a entidade liquidadora tendo tido conhecimento da decisão que sobre a mesma recaiu e bem assim da intenção daquela entidade proceder à instauração da execução";
2- A recorrente foi notificada, no dia 30 de Dezembro de 2009 do ofício DRSTB-SAI/2 , emanado pela EP, de 30 de Dezembro de 2009, referente a um projecto de decisão de liquidação de uma taxa no montante de € 5.449,20, alegadamente devida pela legalização do número de mangueiras existentes no PAC de C……..-A……. e mais € 3,00 a título de imposto de selo perfazendo tudo o valor total de € 5.452.20 (cfr.doc. 2 da oposição à execução junto aos autos pela recorrente);
3-Após a recepção desse projecto de decisão respondeu a recorrente, ao abrigo do direito de audição prévia nos termos do artigo 60 da Lei Geral Tributária (LGT), e não mediante qualquer tipo de reclamação, manifestando a sua discordância relativamente ao projecto de decisão;
4-A argumentação aí expendida não viria contudo a ser considerada pela EP - Estradas ………….., que decidiu manter o projecto de decisão, acto decisório esse notificado no dia 4 de Março de 2011 e que claramente não se trata da notificação do acto de liquidação, mas sim de um acto que decide "face ao que vai dito, nega-se provimento ao requerimento para arquivamento do presente processo solicitando-se o cumprimento da notificação enviada a V.Exas. através da carta n° DRSTB-SAI/2, de 30-12-2009 " - cfr.doc. 4 junto à oposição à execução fiscal pela ora recorrente - ou seja, que decide manter o projecto de decisão final - que também esse padece de ilegalidades várias, conforme melhor se expandiram supra, razão pela qual resultará preenchido o fundamento de falta de notificação da liquidação do tributo, fundamento este taxativamente previsto no artigo 204, n° 1, al. e), do CPPT;
5-Ora, decidiu a recorrente intentar uma acção de oposição à execução fiscal, esta última a correr termos no Serviço de Finanças de Lisboa sob o n° ……………, tendo invocado como fundamento para tal o disposto no artigo 203, n.º 1 e 204, n.º 1 alínea e) do CPPT, por ter inexistido, no caso dos autos, manifesta falta de notificação de liquidação de uma taxa;
6- O Tribunal a quo decidiu, contudo, que tal oposição deveria improceder, tendo como principal fundamento o facto de considerar que "a própria oponente vem assumir que teve conhecimento da liquidação no prazo do pagamento voluntário tendo até deduzido reclamação perante a entidade liquidadora tendo tido conhecimento da decisão que sobre a mesma recaiu e bem assim da intenção daquela entidade proceder à instauração";
7-Ora, tal não é verdade, como vimos, porquanto;
8- Em primeiro lugar, não se pode considerar o acto decisório final como sendo um acto de liquidação, por não cumprir com quanto estabelecido no artigo 36, n.º 2 do CPPT, a saber, não identifica a decisão, a fundamentação, os meios de defesa, o modo de pagamento, o prazo para pagamento e a cominação se tal não ocorrer;
9- Mesmo que se quisesse recorrer a quanto disposto no artigo 37 do CPPT tal não seria também possível por tudo quanto antes melhor explicado;
10- Ademais, quer no âmbito das taxas alegadamente devidas pela instalação de publicidade, quer por legalização das mangueiras, e em casos em tudo idênticos ao dos autos, sempre a EP sempre procedeu à notificação do acto de liquidação, de per si considerado como tal, pelo que o acto tributário sobre o qual incide a oposição à execução não consiste em qualquer acto de liquidação, pelo que padece a sentença ora recorrida de claro vício de erro de julgamento quanto à matéria de facto, designadamente à fixada nos pontos 2. , 3., e 4 . da sentença proferida pelo Tribunal a quo, sendo por isso nula, e devendo, como tal, ser revogada;
11-Assim sendo, face ao exposto, jamais poderia o Tribunal a quo ter considerado que a oponente assumiu ter tido conhecimento de uma liquidação, o que não ocorreu, uma vez que tal como já se referiu, a mesma implica sempre a emanação de um acto administrativo expresso com os requisitos previstos no artigo 36, n.º 2 do CPPT;
12-E, em face do supra exposto, a própria recorrida, em casos em tudo idênticos ao dos autos, veio adoptar (e bem) um procedimento totalmente diferente do praticado neste caso, este sim em conformidade com a lei;
13-TERMOS EM QUE E NOS MELHORES DE DIREITO, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DECLARANDO-SE ANULÁVEL A SENTENÇA ORA RECORRIDA POR VÍCIO DE JULGAMENTO QUANTO À FIXAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO, DECLARANDO-SE TAMBÉM PROCEDENTE A OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO INTENTADA PELA RECORRENTE, NOS TERMOS PETICIONADOS, TUDO COM AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS QUE DAÍ EMERGEM.
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Contra-alegou a sociedade recorrida (cfr.fls.159 a 164 dos autos), a qual termina estruturando as seguintes Conclusões:
1-A sentença recorrida não enferma de qualquer erro de julgamento de facto ou de direito, ao invés constitui uma decisão logicamente correcta e conforme à lei;
2 -Os documentos juntos aos autos permitiam ao Tribunal recorrido, fundamentadamente, dar como provada a matéria de facto assente;
3 -A sentença não enferma de qualquer vício designadamente o de errónea fixação da matéria de facto;
4-A decisão recorrida, ao julgar que no caso sub judice não se verifica a falta de notificação da liquidação do tributo, e portanto o fundamento de oposição à execução fiscal, fez correcta aplicação do direito aos factos;
5 -A notificação datada de 3/3/2011 (doc.4 junto à p.i.), enviada pela EP à ora recorrente, consubstancia um acto de notificação de liquidação da taxa;
6-No doc. 4 junto à p.i. reitera-se a fundamentação constante do doc. 2 junto à p.i., explicitando-a mais detalhadamente, e consta a liquidação, feita exactamente nos termos que constam desse mesmo doc.2;
7-A EP manteve, entre outros aspectos, mas para o que aqui releva, a liquidação da taxa devida pela ampliação do PAC, correspondente a € 5.452,20;
8-A notificação datada de 3/3/2011 (doc.4 junto à p.i.) contém a decisão e os seus fundamentos, consubstanciada no indeferimento das discordâncias deduzidas em sede de direito de audição sobre, entre outras, a liquidação da taxa devida pela ampliação do PAC;
9-A notificação para a qual o doc. 4 junto à p.i. remete contém as disposições legais aplicáveis, a qualificação do facto tributário, o apuramento do tributo, e a factualidade subjacente à liquidação;
10-A falta dos demais requisitos indicados no n.º 2 do artigo 36.º do CPPT não implica a invalidade da notificação, não constituindo aliás fundamento de oposição à execução fiscal, conforme entendimento jurisdicional doutrinal sobre a matéria;
11-Nestes termos e nos mais de Direito requer-se a V.Exas que seja julgado totalmente improcedente o presente recurso instaurado pela oponente confirmando-se, integralmente, a douta sentença recorrida.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do parcial provimento do presente recurso (cfr.fls.181 a 183 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.112 e 113 dos autos):
1-O processo executivo a que se opõem os autos tem o nº………………….. e foi instaurado em 23/12/2011, no 5º. Serviço de Finanças de Lisboa, contra a sociedade “C…….. - Portuguesa …………, S.A.” por dívidas fiscais de 2009 - taxas devidas pela legalização do número de mangueiras existentes no posto de abastecimento de combustível situado na EN ………… ao Km 35 + 725 (cfr.informação exarada a fls.77 dos presentes autos; documento junto a fls.1-a dos presentes autos);
2-A sociedade executada/oponente teve conhecimento do montante a pagar referente à taxa supra em 30/12/2009, por carta que lhe foi dirigida por "E…… - Estradas ………….. S.A.", Delegação Regional de Setúbal (cfr.factualidade admitida no ponto 8 da p.i.; documento junto a fls.24 a 26 dos presentes autos);
3- Em 14/01/2010 a oponente apresentou requerimento de exercício do direito de audição prévia junto da entidade liquidadora, no qual termina pedindo o arquivamento do procedimento que originou a liquidação em causa (cfr.factualidade admitida no ponto 9 da p.i.; documento junto a fls.27 a 39 dos presentes autos);
4-Em 4/03/2011 teve conhecimento, por carta que lhe foi dirigida pela "E….. - Estradas …………. S.A.", do indeferimento do requerimento identificado no nº.3, mais solicitando a entidade liquidadora o cumprimento do ofício de notificação que lhe fora dirigido em 30/12/2009 (cfr.factualidade admitida no ponto 10 da p.i.; documento junto a fls.42 a 44 dos presentes autos);
5-A entidade liquidadora, "E……. - Estradas …………… S.A.", Delegação Regional de Setúbal, dirigiu ainda à oponente carta datada de 5/12/2011, que esta junta como documento nº.5 à petição inicial com o conteúdo que a seguir parcialmente se transcreve:
“(…)
foi solicitado, a coberto das nossas cartas n.º 2 de 30 de Dezembro de 2009 e n.º 21460, de 3 de Março de 2011, o pagamento voluntário do valor de € 5.449,20 a título de taxa devida pela legalização do número de mangueiras existentes no Posto de Abastecimento de Combustível situado ao Km 35 + 725 da EN …………, sob jurisdição da E….. - Estradas …………, S.A.
Dado que até ao presente momento tal pagamento não se verificou, informamos V. Exa., que o processo vai ser nesta data remetido ao órgão competente para execução fiscal, vencendo juros a partir de 8 de Março de 2011.
(…)”
(cfr.documento junto a fls.45 dos presentes autos).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, que em face das possíveis decisões de direito importe registar como não provados…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…No tocante aos factos provados e não provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental constante dos autos, em concreto, no teor dos documentos indicados em cada uma das alíneas do probatório…”.
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Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
6-A carta identificada no nº.2 do probatório, além do mais, fazia referência à ampliação do Posto de Abastecimento de Combustível situado ao Km 35 + 725 da EN ………, ampliação essa sujeita ao pagamento da taxa a que se refere o artº.15, nº.1, al.l), do dec.lei 13/71, de 23/1, na redacção do dec.lei 25/2004, de 24/1, taxa essa que, no caso concreto, era no montante de € 5.449,20, atento o número de mangueiras existente no mesmo PAC, acrescido de € 3,00, a título de imposto de selo, tudo na quantia total de € 5.452,20 (cfr.documento junto a fls.24 a 26 dos presentes autos).
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar improcedente a oposição deduzida, mais ordenando o prosseguimento da execução fiscal.
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Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O apelante aduz, em primeiro lugar e em sinopse, que padece a sentença recorrida de claro vício de erro de julgamento quanto à matéria de facto, designadamente à fixada nos pontos 2, 3 e 4 do probatório (cfr.conclusão 10 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Apuremos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
Tal ónus rigoroso deve considerar-se mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5555/12; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 27/02/2014, proc.7205/13).
No caso concreto, defende o recorrente que não se encontra devidamente fixada a factualidade constante dos pontos 2, 3 e 4 do probatório, embora não cumpra o ónus previsto no citado artº.640, nº.1, do C.P.Civil, desde logo, quanto aos concretos meios probatórios constantes do processo, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida.
Concluindo, este Tribunal não tem obrigação de conhecer do presente esteio da apelação.
Argui o recorrente, igualmente e em síntese, que o acto tributário sobre o qual incide a oposição à execução não consiste em qualquer acto de liquidação. Que não podia o Tribunal "a quo" ter concluído que a apelante assumiu ter tido conhecimento de uma liquidação, uma vez que a mesma implica sempre a emanação de um acto administrativo expresso com os requisitos previstos no artº.36, nº.2, do C.P.P.T., o que não se verificou no caso concreto (cfr.conclusões 6 a 12 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Apuremos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Se bem percebemos o recorrente, defende ele que a sociedade recorrida não emitiu qualquer liquidação e, por outro lado, que não procedeu à sua notificação na forma legal.
Desde logo, se dirá que nos encontramos perante processo de oposição a execução fiscal, espécie processual cuja lista de fundamentos é de natureza taxativa, conforme se retira do corpo do artº.204, nº.1, do C.P.P.T.
Atento o referido, não pode constituir fundamento do presente processo a discussão em redor da existência, ou não, de uma liquidação que consubstancie a dívida exequenda identificada nos nºs.1, 5 e 6 do probatório.
Passemos, então, ao exame da alegada falta de notificação na forma legal, enquanto fundamento possível de oposição a execução fiscal.
A Constituição da República Portuguesa, após a revisão introduzida pela Lei Constitucional nº.1/82, de 30/9, prevê no seu artº.268, nº.3, que os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados na forma prevista na lei (lei ordinária), assim impondo à Administração um dever de dar conhecimento aos interessados, mediante uma comunicação oficial e formal, do teor dos actos praticados, comunicação essa que deve incluir também a própria fundamentação do acto que do mesmo faz parte integrante (cfr.J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4ª. Edição revista, II volume, Coimbra Editora, 2010, pág.824 e seg.).
A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; Alberto Pinheiro Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Almedina, 1972, pág.239 a 242; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.94 e seg.; Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.309 a 311).
No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7443/14).
De acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, há muito se fixou o entendimento de que a falta de notificação da liquidação, enquanto elemento integrante da eficácia externa da mesma, é fundamento de oposição a enquadrar no artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário), dado não colidir com a apreciação da legalidade da própria liquidação, não representar interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título, poder ser provado por documento e constituir facto modificativo posterior à liquidação e anterior à emissão da certidão executiva. Face a esta interpretação jurisprudencial do quadro normativo existente, à qual se adere, fica aberta, na fase executiva, pelos meios legais de oposição, a discussão da falta ou de eventuais vícios da notificação, designadamente por inexigibilidade da dívida, ao abrigo do disposto no mencionado artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário).
Em resumo, o regime processual da defesa do contribuinte, nestas situações será o seguinte:
1-Se é instaurada uma execução fiscal e não foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, o sujeito passivo pode sempre opor-se à execução ao abrigo da alínea i), do nº.1, do artº.204, do C.P.P.T., invocando a ineficácia do acto, que impede que a dívida seja exigível, sendo indiferente, para este efeito, que o acto de liquidação enferme de qualquer vício, inclusivamente o de extemporaneidade da liquidação;
2-Já se foi instaurada uma execução e efectuada notificação válida do acto de liquidação, mas a notificação foi realizada fora do prazo de caducidade previsto no artº. 45, nº.1, da L.G.T. (ou outro prazo especial que for aplicável), o contribuinte pode opor-se à execução ao abrigo da alínea e), do nº.1, deste artº.204, do C.P.P.T. (trata-se de situação que, no seu teor literal, poderia caber na mencionada alínea i), pois não se engloba nela a apreciação da legalidade da própria liquidação nem é matéria da exclusiva competência da entidade que emite o título, mas que era dela afastada à face do entendimento jurisprudencial referido formado na vigência do C.P.T., reconduzindo-se a utilidade da alínea e) ao afastamento da aplicabilidade deste entendimento; a possibilidade de oposição ao abrigo da alínea e) existirá independentemente de a própria liquidação ser extemporânea, isto é, de ela própria ser ilegal, pois não está em causa no processo de oposição à execução fiscal a apreciação da legalidade da liquidação, mas a sua oponibilidade ao seu destinatário);
3-Por último, se foi efectuada uma liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo, mas não foi ainda instaurada execução, o contribuinte pode impugnar judicialmente a liquidação, invocando a ilegalidade da sua extemporaneidade, porém, se o não fizer e não pagar a quantia liquidada, não ficará impedido de se opor à execução, ao abrigo da alínea e) referida, visto que, além da ilegalidade da liquidação, ocorre também a sua inexigibilidade por falta de tempestiva notificação (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/9/2011, rec.473/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/01/2014, proc.7016/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.489 e seg.).
No caso vertente, de acordo com a matéria de facto provada (cfr.nºs.2, 4 e 6 do probatório), deve concluir-se que a notificação da liquidação que constitui a dívida exequenda se sedimentou na ordem jurídica em 4/03/2011, data em que o mesmo tomou conhecimento da manutenção do acto tributário que lhe fora inicialmente notificado através de ofício de 30/12/2009.
Mais se deve recordar que a notificação que, alegadamente, não reúna todos os requisitos exigidos por lei, não deixará de produzir efeitos relativamente a tudo o que levou ao conhecimento do destinatário (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 29/10/2014, rec.1381/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.349 e seg.).
Por outro lado, a falta de qualquer dos requisitos da notificação previstos no artº.36, nº.2, do C.P.P.T., não implica, necessariamente, a invalidade da notificação. Tal só acontece relativamente à falta de indicação do autor do acto, do seu sentido, da sua data e, sendo caso disso, a indicação de que o mesmo foi praticado no uso de delegação ou subdelegação de poderes. Somente neste caso o vício do acto de notificação será nulo (cfr.artº.39, nº.11, do C.P.P.T.). Já se a falta se reportar a qualquer outro requisito, o vício que afecta a notificação ficará sanado se não for pedida a notificação dos requisitos omitidos ou a passagem de certidão que a contenha, nos termos do artº.37, do C.P.P.T. Por outro lado, as consequências da inobservância dos requisitos referidos devem conexionar-se com a finalidade que justifica a sua exigência, pois, se esta for atingida mesmo sem tal observância, não se justificará que se mantenha a exigência. Assim, por exemplo, será irrelevante para efeitos de determinar a invalidade da notificação e a consequente ineficácia do acto a falta de indicação dos meios de defesa e prazo para reagir ao acto notificado, quando o interessado usa os meios adequados, tempestivamente (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.343 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, não estando em causa nenhum dos vectores que podem levar à nulidade do acto de notificação (cfr.artº.39, nº.11, do C.P.P.T.), todos os outros, a existirem, se devem considerar sanados.
Sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente esteio da apelação e confirma-se a decisão do Tribunal "a quo", também neste segmento.
Atento o relatado, julga-se improcedente o recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 10 de Julho de 2015


(Joaquim Condesso - Relator)

(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)

(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)