Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04848/09
Secção:Contencioso Administrativo - 2º Juízo
Data do Acordão:04/02/2009
Relator:Fonseca da Paz
Descritores:SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
AL. A) DO Nº 1 DO ART. 120º. DO CPTA.
EFEITOS DA DIA
PREJUÍZOS EVENTUAIS
Sumário:I - Nos termos da al. a) do nº 1 do art. 120º. do CPTA, o “fumus boni iuris” deve-se considerar verificado nas situações excepcionais de invalidade ostensiva ou grosseira do acto administrativo.
II - Existindo um plano de pormenor específico para enquadrar o projecto “Parque do Alqueva” que estabeleceu uma área de protecção designada por “Estrutura Ecológica Principal” e dispondo a DIA que aquele empreendimento carece de uma DIUP por “afectar áreas de povoamento de azinheiras”, não constituem ilegalidades ostensivas da DIA a falta fundamentação, a violação do art. 1º., nº 3, al. b), do D.L. nº. 69/2000, de 3/5, nem o facto de não terem sido estudadas alternativas à localização daquele empreendimento.
III - A DIA constitui um acto integrado num subprocedimento que reveste a natureza de um acto intercalar, embora projecte os seus efeitos sobre o procedimento global.
IV – O abate de 6484 azinheiras não constitui um efeito directo e imediato da DIA, que nada decide quanto a essa questão, pelo que aquele dano será meramente eventual ou conjectural por resultar da prática de outros actos integrados no mesmo procedimento legal.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª. SECÇÃO, 2º. JUÍZO, DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1. A Quercus Associação Nacional de Conservação da Natureza, inconformada com a sentença do TAC de Lisboa, que julgou improcedente o processo cautelar que havia intentado contra o Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Rural e em que era contrainteressada a “S ..., SA”, dela recorreu para este Tribunal, formulando, na respectiva alegação, as seguintes conclusões:
“I Do resumo não técnico do EIA do projecto do Parque Alqueva consta que “Não foi, assim, contemplada no EIA a análise de soluções alternativas”;
II Os documentos nos. 6 a 8 juntos com o requerimento inicial contém elementos que a sentença recorrida omitiu. A redacção do Facto G deverá, assim, ser alterada e decomposta da forma que passa a indicar-se:
G Em 23/4/2008, a SAIP enviou para Circunscrição Florestal do Sul um ofício, cujo o seguinte conteúdo:
“Junto remetemos 2 exemplares do requerimento de abate relativo ao nº. máximo de árvores e área máxima de abate correspondente, de acordo com o quadro anexo ao Plano de Pormenor, bem como a proposta de medidas de compensação que nos propomos implementar (…).
Dado que a DIUP está a decorrer a nível Minesterial e de acordo com a posição assumida pela DGRF de não propô-la mas a ela não se opor, solicitamos ver aprovada pela vossa tutela as medidas compensatórias nos termos do art. 8º. do D.L. nº 169/2001 (…)”
G1 Nos requerimentos de abate de azinheiras entregues pela SAIP na exCircunscrição Florestal do Sul, esta procede à identificação da área total de cada uma das Herdades, a área a intervencionar em cada uma delas e a identificação do número e das espécies a abater.
G2 Herdade do Roncão delRei:
Área total 739 ha;
Área de intervenção 739 ha;
Espécie a abater azinheiras em povoamento;
Nº. de árvores a abater 1346.
G3 Herdades do Pastoro e Pastorinho:
Área total 477 ha
Área de intervenção 477 há
Espécie a abater – azinheiras em povoamento;
Nº de árvores a abater 2799.
G4 Herdades das Areias e Cebolinhos:
Área total 858 ha;
Área de intervenção 858 ha;
Espécie a abater azinheiras em povoamento;
Nº. de árvores a abater 2339.
III Os documentos juntos aos autos contém factos relevantes para a boa decisão da causa e que não constam do probatório, pelo que de acordo com o preceituado na al. a) do nº 1 do art. 712º. do C.P.C., deverá ser ordenada a sua ampliação para que este passe a incluír os factos indicados no supra Grupos III e IV; a alteração do facto G da matéria de facto assente conforme indicado no Grupo IV;
IV O Facto F do probatório encontra-se incorrectamente fixado, pois dos docs. nos. 6 a 9 juntos com o requerimento inicial resultam os factos acima alinhados no Grupo IV que aqui se dão por integralmente reproduzidos e não os pretensos factos vertidos na aludida al. F) e não qualquer Requerimento de Imprescindível Utilidade Pública (RIUP). Ao ter fixado tal matéria na al F) do probatório o Tribunal “a quo” cometeu erro de julgamento por errada apreciação da prova (nº 3 do art. 659º. do CPC);
V Ora, contrariamente à forma como são apelidados na sentença factos J, K, M, N, O, P, Q, R, S e T estes não são factos mas sim meras conclusões desprovidas de suporte documental e factual, razão pela qual o Tribunal, ao ter fixado tal matéria, cometeu erro de julgamento por errada apreciação da prova;
VI Encontra-se documentalmente provado nos presentes autos que não foram estudadas e discutidas publicamente “soluções alternativas” ao actual projecto Parque Alqueva;
VII A não observância do estudo e análise de alternativas, formalidades essenciais ao procedimento de AIA, inquina a DIA suspendenda de nulidade (arts. 20º nº 3 do D.L. nº. 69/2000);
VIII A sentença recorrida, ao considerar que a não avaliação de soluções alternativas ao projecto Parque Alqueva não inquinava de nulidade a DIA, violou por erro de julgamento o preceituado na al c) do art. 2º., nº 3 do art. 12º., art. 14º. e nº 3 do art. 20º., todos do D.L. 69/2000, de 3/5, bem como os arts. 2º., 9º., al. d), 66º nº 2 e 109º da CRP;
IX De acordo com o Anexo II, nº 1, al a), do D.L. nº 69/2000, de 3/5, estão sujeitos a avaliação de impacte ambiental os projectos de desflorestação destinados à conversão para outro tipo de utilização de terras, com uma área igual ou superior a 50 hectares;
X A área das Herdades a serem intervencionadas é superior a 50 ha. O EIA não avaliou os impactes resultantes da desflorestação de cada uma das herdades para depois avaliar qual o impacte resultante dessa desflorestação para os recursos naturais na área onde se encontram as 3 herdades;
XI A desflorestação das referidas Herdades deveria ter sido submetida a AIA e não apenas os projectos parcelares que se pretendem executar, pois o que se consegue obter são os impactes parcelares de cada um dos subprojectos e não o impacte global resultante do processo de desflorestação das 3 herdades;
XII A DIA, ao sancionar o procedimento de AIA em causa nos presentes autos sem previamente obrigar à realização da avaliação dos impactes resultantes da desflorestação das Herdades na sua globalidade e não apenas nos seus impactes parcelares, violou o art. 1º. nº 3 al. b) e o Anexo II, nº 1, al. a) do D.L. nº 69/2000, de 3/5, razão pela qual é nula;
XIII A sentença recorrida, ao considerar que a desflorestação de 2074 hectares não carecia de AIA autónomo do AIA realizado para os subprojectos, ou ainda por ter considerado que esta avaliação estava efectuada Facto J violou por erro de julgamento o preceituado o art. 1º. nº 3 al. b) e o Anexo II, nº 1, al. a) do D.L. nº 69/2000, de 3/5;
XIV A fundamentação de facto e de direito da DIA é constituída por afirmações vagas e genéricas mediante as quais se pretende justificar o injustificável o reconhecimento de um empreendimento turístico imobiliário como um empreendimento de relevante e imprescindível utilidade pública não satisfazem os requisitos da fundamentação previstos nos arts. 124º. e segs. do CPA, razão pela qual a DIA é anulável;
XV O Tribunal recorrido não se pronunciou sobre a questão colocada pela ora recorrente a falta de fundamentação da DIA optando antes por se pronunciar sobre questões não submetidas ao seu julgamento a falta de fundamentação da DIUP razão pela qual, e de acordo com o preceituado na al. d) do nº 1 do art. 668º. do CPC, a sentença é nula;
XVI Consequentemente e de acordo com o antecedentemente alegado, a sentença recorrida ao considerar que não se verificava o preenchimento dos requisitos exigidos pela al. a) do nº 1 do art. 120º. do CPTA, errou por erro de julgamento o preceituado nos arts. 1º., nº 3, al. b) e o Anexo II, nº 1, al. a), al e) do art. 2º., nº 3 do art. 12º, art. 14º. e nº 3 do art. 20º. todos do D.L. nº 69/2000, de 3/5, bem como os arts. 2º., 9º. al. d), 66º. nº 2 e 109º. da CRP;
XVII A DIA suspendenda é apta a causar de uma forma encadeada em sucessivos procedimentos administrativos autorizativos que com ela tem que se conformar os prejuízos alegados pela recorrente nos arts. 73º. a 118º. do requerimento inicial;
XVIII Contrariamente ao defendido pela sentença recorrida, resulta da matéria de facto provada que o abate das 6484 azinheiras está iminente e que defesas dos valores prosseguidos pela recorrente nos presentes autos carecem da tutela cautelar urgente requerida;
XIX As alterações climáticas e as consequências delas decorrentes constituem factos notórios, isto é, factos do conhecimento geral (art. 514º nº 1 do CPC), razão pela qual foi, com manifesta surpresa que a recorrente viu rotulada a alegação dos factos vertidos nos arts. 102º. a 111º. dos requerimento inicial como se de um “juízo que para além de meramente conclusivo, é mesmo puramente especulativo” se tratasse;
XX Sucede, porém, que esta conclusão vertida na sentença em causa foi extraída a partir da consideração de um facto inexistente: a existência da autorização de abate (“atendendo aos termos em que se demonstrou, afinal ter sido autorizado o abate”);
XXI Todavia e contrariamente ao entendimento perfilhado pela sentença, dúvidas não existem que da não suspensão da DIA e da consequente não paralisação dos procedimentos que dela se encontram umbilicalmente dependentes, resultarão danos de impossível reconstituição para os interesses que a ora recorrente prossegue nos presentes autos, pois, o abate das azinheiras, bem como das restantes espécies existentes no local irá causar, inevitável e irreversivelmente, alterações nos ecossistemas das Herdades, bem como no ecossistema local;
XXII Resulta dos factos provados com as correcções referidas no supra Grupos III e IV, que a emissão das diversas licenças administrativas necessárias à execução do projecto Parque Alqueva, a serem prolatadas ao abrigo da presente DIA irão sê-lo sem que previamente se tenha procedido à avaliação de alternativas, facto este que coloca em causa o núcleo essencial do direito ao ambiente, o qual é um direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias (art. 17º. da CRP);
XXIII Actualmente, não existe, ainda, qualquer situação de irreversibilidade ou de facto consumado, razão pela qual o decretamento da providência ora requerida revestir toda a utilidade para a defesa do ambiente e qualidade de vida, pelo que a não suspensão da DIA retirará toda a utilidade à acção principal já instaurada;
XXIV A sentença recorrida, ao considerar que não se encontrava preenchido o requisito do “fumus boni iuris” e ao não conhecer do “periculum in mora” resultante da demora, normal, do julgamento da acção principal, errou por erro de julgamento e apreciação da prova existente nos autos, o preceituado na al. b) do nº 1 do art. 120º. do CPTA”.
Apenas contraalegou a recorrida “SAIP” que concluiu pela improcedência do recurso.
O digno Magistrado do M.P. emitiu o seguinte parecer:
“A sentença recorrida enuncia com clareza e exactidão a materialidade factual apurada e aplica-lhe correctamente o direito. A decisão sob recurso limita-se a aplicar, e bem, o disposto no art. 120º. nº 1 b) do CPTA.
Neste contexto, o recurso jurisdicional não merece provimento”.
Sem vistos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
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2.1. Consideramos provados os seguintes factos:
a) Em 26/11/2007, por iniciativa da Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz, perante a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), iniciou-se o procedimento de avaliação de impacte ambiental (AIA) do projecto designado por “Parque Alqueva” que tinha como promotor a recorrida “S...”;
b) Em 18/4/2008, findo o processo de AIA, foi emitida, pelo Secretário de Estado do Ambiente, a DIA “Favorável Condicionada” sobre o aludido projecto do “Parque Alqueva”, nos termos constantes de fls. 59 a 73 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
c) No Diário da República, nº 161, 2ª Série, de 21/8/2008, foi publicado o Despacho nº 21807/2008, de 5/8/2008, cujo teor aqui se dá por reproduzido e onde se concluíu o seguinte:
“(...) Assim, encontrando-se reunidos os requisitos legais aplicáveis e considerando-se demonstrado o interesse económico e social do empreendimento, bem como a inexistência de alternativas válidas para a sua localização, nos termos do disposto no art. 6º. do D.L. nº 169/2001, de 25/3, na redacção dada pelo D.L. nº 155/2004, de 30/6:
1 É declarada a imprescindível utilidade pública do empreendimento Parque Alqueva para os efeitos previstos nos arts. 2º. e 3º. do D.L. nº 169/2001, de 25/3, na redacção dada pelo D.L. nº. 155/2004, de 30/6.
2 A autorização de abate de azinheiras fica condicionada, nos termos do nº 1 do art. 8º. do referido diploma, à execução das medidas compensatórias propostas, de acordo com o projecto de compensação, respectivo plano de gestão e cronograma, a aprovar pela DirecçãoGeral dos Recursos Florestais”;
d) Em 28/4/2008, deu entrada, na Circunscrição Florestal do Sul da Direcção Geral dos Recursos Florestais, pedidos da recorrida “S..”, a solicitar autorização para proceder ao abate de azinheiras, nos termos constantes de fls. 95 a 97 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
e) Sobre o pedido referido na alínea anterior foi emitida a informação nº 9/08, de 12/9/2008, que consta de fls. 98 e 99 dos autos, e cujo teor aqui se dá por reproduzido;
f) Sobre a informação aludida na alínea anterior, o Director Regional das Florestas do Alentejo proferiu o seguinte despacho, datado de 15/9/2008:
“Concordo.
Proponho a aprovação do abate de acordo com as condicionantes previstas na informação presente que mereceram o parecer positivo do …
À consideração do Presidente da AFN”;
g) O projecto do “Parque Alqueva”, objecto do EIA, está enquadrado pelo Plano de Pormenor do Parque Alqueva (PPPA) aprovado em 15/10/2007, cujo regulamento consta de fls. 257 a 302 dos autos;
h) O Resumo Não Técnico do EIA do projecto do “Parque Alqueva” consta de fls. 77 a 93 dos autos, dando-se o seu teor aqui por reproduzido.
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2.2. O ora recorrente intentou, no TAC, processo cautelar, onde pedia que fosse decretada a suspensão de eficácia da DIA referida na al. b) dos factos provados “circunscrita às áreas de povoamento de azinho”.
A sentença recorrida, depois de julgar improcedentes as excepções suscitadas, entendeu que a providência cautelar requerida não poderia ser decretada ao abrigo da al. a) do nº 1 do art. 120º. do CPTA por as as ilegalidades invocadas não serem manifestas nem da al. b) do mesmo preceito dado que, embora se verificasse o requisito do “fumus boni iuris”, não estava demonstrada a verificação do requisito do “periculum in mora” , tendo, por isso, concluído pelo seu indeferimento.
Nas conclusões I a V da sua alegação a recorrente impugna a matéria fáctica considerada provada pela sentença.
E cremos que com razão.
Vejamos porquê:
O que consta do Resumo Não Técnico do EIA do projecto do “Parque Alqueva” está provado por força do documento de fls. 77 a 93 dos autos (cfr. al. h) dos factos que consideramos provados);
Os documentos de fls. 94 a 97 dos autos comprovam a formulação de pedidos para se proceder ao abate de azinheiras nos termos em que aí são requeridos (cfr. al. d) dos factos que consideramos provados);
O facto que foi dado por provado em F do probatório não está demonstrado por qualquer documento constante dos autos, sendo certo que os que aí são indicados não correspondem a qualquer requerimento da recorrida SAIP a pedir a declaração de imprescindível utilidade pública para o empreendimento nem a uma memória descritiva e justificativa para demonstração do interesse económico e social desse empreendimento;
É conclusiva a matéria que foi dada por provada em R, S e T do probatório fixado pela sentença;
Por não se poderem considerar admitidos pela recorrente, nem estarem documentalmente provados, não deveriam ter sido dados como provados os factos constantes de H, G, O, P e Q do probatório;
São completamente irrelevantes para a decisão da causa os factos que a sentença considerou provados em J e K.
Assim sendo, acolhendo a pretensão da recorrente, procedeu-se à alteração da matéria fáctica considerada provada pela sentença recorrida.
Na conclusão XV da sua alegação, a recorrente imputa à sentença a nulidade de “omissão de pronúncia” vertida na al. d) do nº 1 do art. 668º. do C.P. Civil, entendendo que esta não se pronunciou sobre a questão de falta de fundamentação da DIA.
Mas não tem razão.
Efectivamente, mesmo que se admita que, para efeitos do disposto na al. a) do nº 1 do art. 120º. do CPTA, o Tribunal tem de se pronunciar especificamente sobre cada uma das ilegalidades invocadas, no caso em apreço essa pronúncia ocorreu, por a sentença ter considerado que ela não se verificava.
Assim, o que pode ter ocorrido é a inidoneidade dos fundamentos que conduziram à decisão, geradora de erro de julgamento e não de nulidade da sentença.
Nas conclusões VI a XIV e XVI da sua alegação, a recorrente imputa à sentença a violação da al. a) do nº 1 do art. 120º. do CPTA, por entender que os vícios que imputou à DIA justificavam que a suspensão de eficácia requerida fosse decretada ao abrigo deste preceito.
Vejamos se lhe assiste razão.
Nos termos do referido art. 120º., nº 1, al. a), o “fumus boni iuris” (ou aparência do direito) é o único factor relevante para a concessão da providência cautelar e deve-se considerar verificado nas situações excepcionais de invalidade ostensiva ou grosseira do acto administrativo.
A situação de evidência a que alude este normativo, sendo excepcional, só deve ser aplicada quando se configurar um caso idêntico aos que aí são exemplificados, isto é, uma situação em relação à qual notoriamente a pretensão formulada no processo principal obterá provimento (cfr. Isabel Celeste M. Fonseca in C.J.A., nº. 52, pág. 58).
Neste âmbito é, pois, necessário uma grande contenção da parte do juiz: como é evidente, se essa contenção faltar e o juiz despender esforços desproporcionados para esgotar, em sede cautelar, a apreciação das questões atinentes ao fundo da causa, ele tenderá a ser conduzido com maior (e indesejável) frequência à aplicação do nº. 1 al. a). Na verdade, na generalidade dos casos, a solução a dar a qualquer questão jurídica torna-se evidente após uma análise exaustiva (cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Fernandes Cadilha in “Comentário ao CPTA”, 2005, pág. 603).
Um dos vícios que a recorrente imputou à DIA foi a de não terem sido estudadas alternativas à localização do empreendimento turístico em causa, o que a inquinaria de nulidade, nos termos do nº 3 do art. 20º. do D.L. nº. 69/2000, de 3/5, republicado pelo D.L. nº 197/2005, de 8/11 (diploma a que pertencem todas as disposições legais que venham a ser citadas sem menção de origem).
Mas essa invalidade, para além de não ser susceptível de se enquadrar no art. 20º nº 3 que apenas se refere aos actos praticados com desrespeito dos nos 1 e 2 desse preceito e aos de autorização e licenciamento sem prévio cumprimento do art. 28º. , nunca se poderá considerar ostensiva.
Efectivamente, existindo um plano de pormenor específico para enquadrar o “Parque do Alqueva” a que a recorrida SAIP estava vinculada, parecem não existir “soluções alternativas razoáveis” que, nos termos do nº 1 do Anexo III, tenham de ser descritas no EIA.
Um outro vício invocado pela recorrente consistiu na violação do art. 1º., nº 3, al. b) e do Anexo II, nº 1, al. a), por a DIA não ter obrigado à realização da avaliação dos impactes resultantes da desflorestação das Herdades na sua globalidade e não apenas nos seus impactes parcelares.
Ora, para além de não se poder considerar evidente que não tenha sido efectuada a avaliação dos impactes resultantes da desflorestação das Herdades na sua globalidade, também é duvidoso que no caso se esteja perante uma “desflorestação”, quando o Plano de Pormenor estabeleceu uma área de protecção designada por “Estrutura Ecológica Principal”, onde não são admitidas intervenções urbanísticas nem o abate de árvores, mas apenas acções de valorização do património natural existente (cfr. arts. 17º. e 18º. do Regulamento do Plano de Pormenor do Parque Alqueva) e que segundo a recorrida SAIP, corresponderá a cerca de 40% do total da área de intervenção do Projecto.
Assim, também a verificação deste vício não se pode considerar ostensiva.
Finalmente, a recorrente imputou à DIA um vício de forma por falta de fundamentação, em virtude de do seu texto não resultarem as razões pelas quais o empreendimento em causa carecia de uma declaração de imprescindível utilidade pública.
Porém, referindo-se nesse acto “que o empreendimento carece de uma declaração de imprescindível utilidade pública, conforme previsto no art. 2 do D.L. nº 169/2001, de 25/5, na redacção actual, por afectar áreas de povoamento de azinheiras”, afigura-se-nos que dele resulta, de forma sucinta mas clara, a motivação dessa exigência, o que obsta a que se considere ostensiva a alegada falta de fundamentação.
Assim sendo, entendemos que a DIA não enferma de nenhuma das ilegalidades grosseiras que lhe foram imputadas, motivo por que a providência cautelar requerida não pode ser decretada ao abrigo da al. a) do nº 1 do art. 120º. do CPTA.
Nas conclusões XVII a XXIV a recorrente imputou à sentença a violação da al. b) do referido art. 120º. nº 1, por não ter considerado preenchido o requisito do “fumus boni iuris” e não ter conhecido do “periculum in mora”, invocando que o acto suspendendo é apto a causar os prejuízos que alegou.
Vejamos se lhe assiste razão.
Em 1º. lugar, deve-se referir que, ao contrário do que sustenta a recorrente, a sentença considerou verificado o requisito do “fumus boni iuris” na sua versão negativa (cfr. fls. 603) e conheceu do “periculum in mora”.
O que entendeu foi que este último requisito não se verificava, por a DIA não ser causa adequada dos prejuízos alegados, atento à insusceptibilidade de, por si só e directamente, originar o abate das 6484 azinheiras na zona de intervenção do Parque Alqueva.
Para analisar o requisito do “periculum in mora”, importa averiguar os prejuízos para o ambiente que provavelmente adviriam da imediata execução do acto suspendendo, o que implica atentar no tipo legal deste.
É que a determinação dos efeitos produzidos por esse acto constitui um antecedente necessário para apurar da probabilidade de esses efeitos originarem os prejuízos invocados.
O acto em causa limitou-se à emissão de uma DIA “Favorável Condicionada” sobre o projecto do “Parque Alqueva”.
Tratando-se de um acto integrado num subprocedimento, reveste a natureza de um acto intercalar ou de trâmite que, no entanto, projecta os seus efeitos sobre o procedimento global (cfr. art. 20º.).
Porém, é indubitável que o abate das 6484 azinheiras não constitui um efeito directo e imediato da DIA que nada decide quanto a essa questão. Conforme resulta da matéria fáctica provada (cfr. als. c) a f), serão outros actos administrativos, também integrados no procedimento global, que terão esse efeito.
Assim, existindo diversos actos de trâmite integrados num procedimento mais vasto, terão de se definir rigorosamente os efeitos produzidos por cada um deles para se apurar as consequências danosas que eles poderão ter.
A circunstância de a DIA projectar os seus efeitos sobre o procedimento global não significa que a ela se possam imputar efeitos que terão de resultar de outros actos posteriores.
Portanto, tal como entendeu a sentença, afigura-se-nos que os prejuízos invocados pela recorrente serão meramente eventuais ou conjecturais, por resultarem da prática de outros actos integrados no mesmo procedimento global
Improcede, pois, o presente recurso jurisdicional.
x
3. Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Sem Custas, por a recorrente dela estar isenta (cfr. arts. 10º e 11º., da Lei nº. 35/98, de 18/7).
Entrelinhei: 2ª. Série, de pedidos e que

Lisboa, 2 de Abril de 2009

as.) José Francisco Fonseca da Paz (Relator)
Rui Fernando Belfo Pereira
Maria Cristina Gallego dos Santos