Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06915/13
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:10/03/2013
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:PROCEDIMENTO CAUTELAR.
ARRESTO.
PRESSUPOSTOS.
RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO.
Sumário:1. Em matéria tributária, ao arresto aplicam-se as disposições correspondentes do Código de Processo Civil, mas só na parte em que não for especialmente regulado no Código de Procedimento e de Processo Tributário;

2. O arresto deve ser decretado apenas em bens suficientes para garantir o direito em causa e legais acréscimos e não deve causar prejuízo de impossível ou difícil reparação ao arrestado;

3. Ao arresto contra bens do responsável subsidiário pelo pagamento do imposto, aplicam-se os mesmos pressupostos que para o arresto de bens do devedor originário, para além da alegação e da prova, esta ainda que perfunctória, a cargo da requerente, de que o mesmo se encontra em condições de contra ele vir a ser decretada (de futuro) a reversão da execução fiscal;

4. Em dívida de IVA repercutido a terceiros, por expressa disposição legal, existe a presunção de haver fundado receio da diminuição de garantia da sua cobrança.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. Fausto ………………, identificado nos autos, dizendo-se inconformado com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que decretou o arresto em bens seus, como responsável subsidiário pelo pagamento da dívida exequenda, veio da mesma recorrer para este Tribunal, formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


1ª - Refere o Mº Juiz "a quo", imediatamente após a tábua de factos que deu como sumariamente provados, que "a convicção do tribunal quanto aos factos indiciariamente provados, baseou-se nos documentos juntos aos autos, referidos «II OS FACTOS», com remissão para as folhas do processo onde se encontram" (fls.556).
2ª - Nada mais consta do despacho recorrido em relação à fundamentação da decisão proferida quanto à matéria de facto.
3ª - De harmonia com o preceituado no artigo 668°, nº 1, al. b), do CPC, a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto da decisão.
4ª - No caso em apreço o despacho recorrido não especifica os fundamentos em que se estriba, pelo que enferma de nulidade, por falta de fundamentação quanto à matéria de facto, nos termos do preceituado no normativo atrás aludido.
5ª - Para que possa decretar-se o arresto em relação a bens de responsáveis subsidiários, o fundado receio da diminuição de garantia de cobrança do crédito tem de verificar-se em relação aos actos por estes (responsáveis
subsidiários) praticados no seu património pessoal, que, em concreto, possam ind1ciar tal desiderato.
- Nos termos do nº 4 do artigo 136° do CPPT, impende sobre a Autoridade Tributária o ónus de alegar os factos que demonstrem o tributo ou a sua provável existência e os fundamentos do receio de diminuição de garantias de cobrança de créditos tributários, sendo que esse receio deve ser presente e actual, deve consistir num perigo logicamente justificado, uma probabilidade séria, de que os patrimónios dos titulares dos bens que servem de garantia à cobrança de créditos tributários (devedor originário, responsável solidário e responsável subsidiário) diminuam de valor a ponto de se tornarem insuficientes para a cobrança dos créditos tributários.
- Para afastar a possibilidade de arresto, basta que em relação a um só dos patrimónios (do devedor originário ou do responsável solidário ou subsidiário) se não verifique esse perigo de insuficiência para garantia do pagamento dos créditos tributários".
- No caso vertente, o requerimento de arresto é absolutamente omisso quanto a factos de que possa concluir-se pelo fundado receio de diminuição de garantia de cobrança de crédito invocado no que ao aqui Recorrente (alegado responsável subsidiário) se reporta, uma vez que não se alega um qualquer descaminho ou ocultação de bens ou sequer essa intenção.
- Não obstante alguma jurisprudência venha considerando que a presunção prevista no nº 5 do artigo 136º do CPPT se estende aos responsáveis subsidiários, para que a mesma opere é necessário que tenham sido alegados factos concretos nesse sentido, não bastando invocar em receio genérico e abstracto, não assente em qualquer facto, como sucede no caso vertente.
- A decisão recorrida é também absolutamente omissa quanto a tal requisito.
10ª - Não se mostrando demonstrado tal requisito nos autos, não podia ter-­se decretado o arresto, pelo que a decisão recorrida padece de erro de julgamento quanto à aplicação do direito. Mais:
11ª - O arresto foi decretado contra o aqui Recorrente, na qualidade de responsável subsidiário, por se ter considerado que este foi gerente de facto da devedora originária, face aos factos indiciariamente dados como provados.
12ª - 0 tribuna1 "a quo" considerou que o aqui Recorrente é Administrador de facto da sociedade "S….. - Sociedade ………….., S.A.", porque indiciariamente assim se depreende dos factos que em seguida elenca, constantes de fls. 551 e 552 (que aqui nos dispensamos de reproduzir).
13ª - Os documentos (que a sentença recorrida apelida de factos) elencados a fls. 551 e 552, não permitem depreender, mesmo indiciariamente, que o Recorrido é - ou foi - Administrador de facto da devedora originária, pelas razões supra explanadas.
14ª - O que, efectivamente, resulta dos documentos evidenciados na decisão recorrida é que o Recorrente foi Presidente da Mesa da Assembleia Geral da devedora originária e praticou actos na qualidade de procurador da Administração desta empresa.
15ª - Não se mostra, pois, demonstrado, ainda que apenas de forma indiciária, que o Recorrente seja - ou tenha sido - Administrador de facto da "S………., SA".
16ª - Ainda que assim não se entenda - no que não se concede -, a decisão recorrida sempre seria factualmente omissa quanto ao período da invocada administração de facto - facto imprescindível, atenta a limitação de responsabilidade que emerge do artigo 24° da LGT.
17ª - A decisão recorrida viola o preceituado no artigo 668º, nº 1, al. b), do CPC, pelo que deve ser declarada nula, com todas as legais consequências.
18ª - Ainda que assim não se entenda, viola, designadamente, o disposto nos artigos 136° e 214º do CPPT, 342° do Código Civil e 381° do CPC, pelo que deve ser revogada, absolvendo-se o aqui Recorrente do pedido, com
todas as legais consequências, como é aliás, de inteira Justiça!


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


Também a recorrida veio a apresentar as suas alegações e nesta a respectiva conclusão, a qual igualmente na íntegra se reproduz:


Por todo o exposto e sempre confiando no douto suprimento de V. Exas, deve, pois, ser negado provimento ao recurso.


O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, de turno, no seu parecer, apôs o seu, “visto”.


Por se tratarem de autos classificados de urgentes vêm os mesmos à Conferência sem prévia recolha dos vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se em relação ao ora recorrente, como responsável subsidiário, não se verificam todos os pressupostos de que depende o direito da AT a arrestar bens seus por dívidas de IVA e IRC da sociedade originária devedora; E se a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação da matéria de facto.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
1. A sociedade S….. -Sociedade …………, SA., antes designada "B………… – Lanifícios, SA, encontra-se matriculada na Conservatória do Registo Comercial de ……… com o n.º …………….., e da mesma constam os seguintes membros da Administração:
Presidente Conselho de Administração Rui ……….., desde o início da B…………., SA até à sentença de insolvência em 03/04/2009, à excepção do período compreendido entre 13/09/2007 e 11/4/2008 em que o cargo foi ocupado por Fernando …………………;
O cargo de vogal pertencia a José ………………., desde o início da actividade até 11/04/2008 e posteriormente por Maria ………………………..;
O Administrador de Insolvência, António ………………, exerceu as funções desde 03/4/2009 até 03/12/2009, data de aprovação do Plano de Insolvência (registado na Conservatória RC de ……….. em 17/12/2010);
Em 17/12/2010, foi registado como administrador único Nuno ……………….. cuja cessação de funções foi registada em 20/4/2012- cfr. fls. 46 a 54 dos presentes autos;
2. É Administrador de facto da sociedade, Fausto ………………………, pois, indiciariamente assim se depreende dos seguintes factos:
Da Acta n° 31 até à Acta 43 da originária devedora, todas, as Assembleias-gerais foram presididas por Fausto ……………….;
As alterações ao pacto social da STS de 22/11/2010 foram ordenadas por Fausto ………………………….;
Consta das cartas da Caixa de ………………… de 26/02/2000 (que as assinaturas que podem movimentar a conta n° 40068495719 são as de: Rui ………….. (administrador); Maria ………………….(administradora) e Fausto ………………………… (procurador);
Do resumo da posição financeira do banco B……….., relativo à conta de depósitos à ordem nºs ………….. e …………., consta que aquelas contas podem ser movimentadas por Rui Dias Cardoso (administrador); Maria ……………… (administradora) e Fausto …………………(procurador);
Resulta dos documentos referentes ao Banco Popular a ordem de pagamento/transferência bancária da quantia de € 211.330,57 para pagamento aos trabalhadores da empresa, assinada por Fausto Ricardo ……………;
O cheque n° ……………….. da conta n° …………….. da B…………., SA do Banco Popular datado de 02/12/2010 emitido à ordem de Nuno ………………, pela quantia de € 225,59, é assinado por Fausto …………………;
O cheque n° ………… da conta da CAM n° ………….. titulada pela STS, emitido em 19/10/2011 para pagamento aos CTT, é assinado por Fausto ………………………;
Resulta da correspondência da empresa Premiére ………….. de 2/11/2009, que Fausto …………………….. é denominado de Director Geral da B…………., SA.;
Pagamento ao IGEP- Direcção Geral de Economia do Centro, relativo à taxa anual de exploração da instalação eléctrica do ano de 2012, cheque n° …………….., de 20/4/2012, assina como Administrador Fausto ……………………..;
Requerimento do Registo Automóvel referente à venda do veículo Audi, matrícula ……………., assinado por Fausto ……………………… na qualidade de Administrador do vendedor S……….. e de gerente do comprador C…………., Lda.;
Carta de comunicação de regularização de IVA é assinada por Fausto ………………………………..;
- cfr. fls. 55 a 115 dos presentes autos;
3. Em 09/4/2010, foi proferida sentença de insolvência da B…………….- L………….., SA. - cfr. fls. 138 a 140 dos presentes autos;
4. Na sequência de acção de fiscalização externa, resultaram correcções meramente aritméticas, nos seguintes exercícios:
...
5. Tais valores em falta, de acordo com o projecto de relatório de inspecção indicia a prática do crime de Fraude Fiscal, por se entender que houve “Ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser relevados à Administração Tributária, como sejam nomeadamente a não inclusão no dossier fiscal de correspondência dos credores que regularizaram a seu favor o IVA de créditos incobráveis; Celebração de negócio simulado, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas, nomeadamente a inerente transferência do património para a firma relacionada com Rui ………….& Cª, Lda., sendo o documento comprovativo a escritura outorgada pelo Administrador Virtual Nuno ……… e pelo Administrador de ambas as empresas Rui ……………, liquidado p taxa normal, sendo a operação, designada na mesma de "Venda de todo o stock de ­produtos acabados e de matérias primas, 300 toneladas x € 1" quando na realidade o valor de custo das existências era de € 7.330.145,52 e as mesmas já não se encontravam nas instalações em meados do ano de 2009, porque não consta dos autos de arrolamento elaborado pelo administrador da insolvência. O objectivo deste negócio simulado foi o de obstar a aplicação de IVA à taxa normal sobre o valor tributável de € 7,330.145,52 em conformidade com o disposto no art. 16º nº2 al. b) do CIVA, donde resultaria o imposto de € 1.466.029,10 em vez do liquidado no negócio simulado de € 63.000,00" - cfr. fls. 323 e 324 dos presentes autos;
6. No decurso da acção de inspecção constatou-se que a S…-Sociedade ……….., SA., antes designada "B………. – L…………, SA " tem vindo a alienar o seu património. Assim em 2009, constavam do Activo Imobilizado/Activo Fixo Tangível de 2009 da empresa:
...
- cfr. fls. 294 dos presentes autos;
7. Em 2009, constavam os seguintes veículos registados no Activo Imobilizado do ano de 2009:
...
cfr. fls. 295 dos presentes autos;
8. O equipamento básico e administrativo foi alienado na totalidade à empresa Rui …………. & Ca., Lda. (Escritura de compra e venda de património mobiliário de 29/12/2010) com a entrega do valor de € 238.675,61, constando da escritura que o restante seria entregue no final do ano de 2012 - cfr. fls. 155 a 189 dos presentes autos;
9. O terreno de Seia, sob o artigo matricial n° U-4039, está registado no imobilizado pelo valor de € 6.617,95, sendo o seu valor patrimonial de €7.072,11- cfr. fls. 189 dos presentes autos;
10. Dos veículos registados no imobilizado da empresa em 2009, foram alienados a empresas pertencentes ao grupo da família ………….., à Creative ………… Company, Lda, e à S……… Company, Lda., apenas três se mantém no imobilizado da empresa - cfr. fls. 190 a 197 dos presentes autos;
11. A partir de Agosto de 2009 a S………, SA (anterior B……….., SA) deixou de ter ­produção têxtil e em 2010 celebrou contratos de cedência de exploração de equipamento às empresas "Silva …………….. - Comércio ……………, Lda." e à "T………….- Têxteis, Lda., empresas também pertencentes ao grupo da família …………. – cfr. fls. 399 a 411 e 492 a 508 dos presentes autos;
12. A empresa possuía à data da inspecção, em 20112, apenas, 3 veículos de matrícula ………; ………… e …………, que foram adquiridos respectivamente em 1993 pelo valor de € 560,78, em 1997 pelo valor de € 7,481,97 e, em 1997 pelo valor de € 1.747,54 - cfr. fls. 160 dos presentes autos;
13. O valor dos bens cujo arresto se requer está avaliado em € 115.000,00:
a) Conta bancária com NIB ………………………..;
b) Artigo urbano n° …………, fracção D, freguesia de Santa Maria (……..) concelho da ……………., com valor patrimonial actual de € 94.599,25, em que Fausto ………………….. conta como proprietário em ½ (cfr. fls. 527 dos autos);
c) Vencimento de Fausto …………………… na T………….- L………………….., SA. j
d) Veículos de marca Suzuki de matrícula …………… (2005); Alfa Romeo …………….. (2002), Land Rover de matrícula ……………. (1995) e Volvo de matrícula …………… (1993) (cfr. fls. 527 a 532)

II.2- FACTOS NÃO PROVADOS.
Com interesse para a decisão, não se provou vencimento auferido por Fausto ………………………., na empresa T……………….- L………………, SA.

II.3 - MOTIVAÇÃO.
A convicção do tribunal quanto aos factos indiciariamente provados, baseou-se nos documentos juntos aos autos, referidos «II OS FACTOS», com remissão para as folhas do processo onde se encontram.


4. Para decretar o arresto em bens do invocado responsável subsidiário pelo pagamento da dívida exequenda considerou a M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que se verificavam todos os pressupostos para tal arresto, como seja a existência (mais que certa) de tais créditos da Fazenda Pública, que existia o receio da perda da garantia patrimonial por parte do credor, a qual se presumia quanto ao IVA, que os tributos se encontravam em fase de liquidação, que existia a certeza da reversão da dívida contra o mesmo por falta de bens da sociedade originária devedora e que exerceu as correspondentes funções de gerente na mesma sociedade.

Para o arrestado e ora recorrente, para além do vício formal assacado à sentença recorrida, é contra a existência destes pressupostos para poder ser decretado o arresto em bens da sua titularidade, por tais dívidas fiscais da sociedade originária devedora, que vem a esgrimir argumentos tendentes a este Tribunal exercer um juízo de censura ao assim decidido em ordem à sua revogação, que nenhuma prova existe do fundado receio da perda da garantia patrimonial por banda do mesmo quanto ao seu património, nem mesmo indiciária – cfr. suas conclusões 5.ª e segs. – para além de não ter sido administrador de facto da sociedade originária devedora, mas tão só seu procurador – cfr. suas conclusões 11ª e segs. – não sendo por isso responsável subsidiário pelo pagamento de tais dívidas fiscais.

Vejamos então.
Nos termos do disposto nos art.ºs 136.º e 214.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), pode ser decretado o arresto de bens em caso de justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens, em ordem a garantir a satisfação do cumprimento da dívida exequenda e do acrescido, proveniente de impostos ou similares, que tanto pode incidir sobre bens do devedor, como do responsável solidário ou subsidiário, desde que em relação ao visado se verifiquem os respectivos pressupostos, onde desde logo na sua alínea a) do n.º1 daquele primeiro normativo figura o de haver o fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis, ou seja, em caso de a Fazenda Pública pretender arrestar bens do responsável solidário ou subsidiário pelo respectivo pagamento, tem de alegar e provar, ainda que indiciariamente, como é próprio das providências cautelares, algum facto certo e concreto que indicie ou exprima, quanto ao visado, que o mesmo se encontra a ter uma actuação que induz esse receio de diminuição da garantia de cobrança desses tributos, como expressamente se dispõe no n.º4 do mesmo art.º 136.º, a menos que se tratem de impostos que o devedor estivesse obrigado a reter ou a repercutir a terceiros e que não haja entregue nos prazos legais, em que tais circunstâncias se presumem nos termos do n.º5 do mesmo normativo, o que é o caso dos autos, mas apenas quanto ao IVA, tal como foi articulado na respectiva petição do arresto, foi decidido na respectiva sentença e sobre que o ora recorrente, na matéria das suas conclusões recursivas, nem esgrime quaisquer argumentos tendentes a infirmar esta parte do decidido, e alguns dos factos contidos nos diversos pontos da matéria de facto contida no n.º2 do probatório, como sejam os casos em que o mesmo interveio no nome e por conta da sociedade originária devedora intitulando-se seu administrador, indiciarem que o mesmo exerceu, de facto, as funções de gerente, durante todo aquele período temporal de dívida do IVA (2009 a 2012), pelo que a responsabilidade subsidiária pelo pagamento de tais dívidas se afigura como plausível, reunindo assim todos os requisitos para, nesta parte, a sentença recorrida ser confirmada, já que a mesma, manifestamente, também não enferma da invocada nulidade de falta de fundamentação da sua matéria de facto e nem de qualquer uma outra, já que a mesma, a final, não deixou de motivar os factos que considerou indiciariamente provados, por referência aos documentos de suporte que os atestam, como expressamente frisou, o que não pode deixar de ser considerado como fundamentação suficiente para o efeito, no caso, para além de que, como constitui jurisprudência corrente, tal nulidade só poder ocorrer quando tal falta seja absoluta(1), que não meramente insuficiente ou medíocre, pelo que também ao arrimo deste entendimento tal nulidade não era de decretar, sendo por isso de manter a sentença recorrida nesta parte do decidido.

Porém, o mesmo não acontece quanto à dívida exequenda relativa ao IRC, em que, inexistindo a presunção da existência das circunstâncias referidas na alínea a) do n.º1 do mesmo art.º 136.º, tem aplicação o regime regra do n.º4 do mesmo preceito, cabendo à Fazenda Pública alegar e provar os concretos indícios que levem a concluir pelo fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de tal imposto, quanto ao arrestado e ora recorrente, para que os seus bens pudessem ser arrestados, como o mesmo bem se pronuncia na matéria da suas conclusões recursivas atinentes, seguindo de resto, jurisprudência corrente deste TCAS, como no recurso n.º 3476/09 (2), cuja fundamentação para aqui se aporta enquanto discurso fundamentador do presente.

Nele se escreveu, além do mais:
“(...)
O arresto é decretado sem audiência da parte contrária – art.º 408.º n.º1 do CPC ex vi do art.º 139.º do CPPT – só se abrindo para o arrestado a via contraditória depois de ser notificado da decisão, podendo em alternativa este optar por uma das duas vias contenciosas possíveis: o recurso da decisão que decretou o arresto «quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido deferida» ou a oposição à mesma decisão, «quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução», nos termos do disposto nos art.ºs 388.º e 392.º n.º1 do CPC.

Sendo o arresto uma providência cautelar substanciada numa apreensão judicial de bens (art.º 406.º n.º2 do CPC) destina–se ela, além do mais, a garantir a cobrança dos créditos tributários, podendo ser requerida relativamente a bens do devedor de tributos ou do responsável solidário ou subsidiário.
Mas para tal devem verificar-se cumulativamente, as circunstâncias previstas na citada norma do art.º 136.º n.º1 do CPPT, de fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis e estar o tributo já liquidado ou em fase de liquidação.

Decorre deste regime legal que, à Fazenda Pública cabe provar os factos dos quais resultam, além da existência (ou provável existência) do tributo, que este esteja liquidado ou em fase de liquidação e que há receio de diminuição de garantias de créditos tributários.

Quanto ao invocado receio da diminuição da garantia de cobrança dos créditos em causa, a mesma tem de ser aferida em função do devedor originário desses tributos, relativamente ao arresto dos bens deste, como bem se fundamenta na sentença recorrida, e quanto ao responsável subsidiário, em função dos actos por este praticados que envolvam o receio dessa diminuição da garantia de cobrança desses créditos, como na mesma sentença recorrida também se fundamenta – No que se refere ao arresto de bens do responsável subsidiário...o arresto dos bens do responsável subsidiário desde que à semelhança do devedor originário haja fundado receio da diminuição da garantia de cobrança de créditos tributáveis e tais tributos estejam liquidados ou em fase de liquidação – doutrina que na parte decisória depois aplicou, para proceder ao arresto dos bens da ora recorrente, tendo tal matéria sido articulada pelo Exmo RFP, no art.º 25.º do requerimento de arresto, contrariamente ao invocado pela ora recorrente na matéria da sua conclusão IX.

Também não olhe a argumentação da ora recorrente contida nas conclusões XI e segs, de que só poderia haver lugar a arresto dos seus bens depois da reversão contra si operada no processo de execução fiscal em que a mesma passasse a ocupar (também) o lugar de executada.

Esse é um pressuposto que a lei não erige como fundamento para tal arresto ser decretado contra bens do responsável subsidiário pelo pagamento das dívidas (3), mas tão só que o mesmo se encontre em condições de vir a ser chamado através dessa reversão, como seja que o (futuro) revertido tenha sido gerente de direito e de facto da sociedade originária devedora no período a que respeitam tais dívidas e que a originária devedora não disponha de bens para satisfazer as mesma dívidas, o que no caso a ora recorrente nem coloca em causa que não ocorram, ainda que a prova aqui não possa ter o mesmo grau de certeza que na oposição à execução fiscal, bastando uma summaria cognitio no âmbito dos procedimentos cautelares em que nos encontramos.

De resto, nem faria sentido que tivesse ocorrido já tal reversão contra o responsável subsidiário pelo pagamento dos tributos para contra ele puderem ser também arrestados bens, quando a lei permite o arresto de bens relativamente a tributos ainda nem sequer liquidados – cfr. art.º 136.º, n.º1, b), do CPPT – que logo nunca poderiam ainda constituir uma qualquer quantia exequenda num processo de execução fiscal, já que apenas podem constituir título executivo as dívidas certas, líquidas e exigíveis – cfr. art.ºs 88.º e 162.º e segs do CPPT.
(...)”.

Volvendo ao caso dos presentes autos, do probatório firmado na sentença recorrida, nenhuma materialidade vemos nele fixada que nos leve a concluir, ainda que indiciariamente, que o ora recorrente tenha declarado ou efectuado qualquer acto no seu património de oneração ou dissipação dos seus bens, que possam preencher tal fundado receio da diminuição da garantia de cobrança deste imposto, ao contrário do invocado na sentença recorrida, que o afirma mas sem o demonstrar em relação ao recorrente, não servindo o preenchimento de tais requisitos em relação à sociedade devedora para arrestar bens do responsável subsidiário, como acima se frisou, que aliás a Fazenda Pública, em relação ao ora recorrente, a este respeito, nada articulou no seu requerimento inicial, como do seu art.º 13.º se pode colher, limitando-se a esgrimir um abstracto receio da dissipação desse património aquando da notificação para o direito de audição antes da reversão, o que é insuficiente, como se fundamentou supra, para preencher tal requisito, como nesta parte bem se pronuncia o recorrente.

Como o valor dos bens arrestados é de € 115.000,00 – cfr. ponto 13. da matéria provada – e mesmo só o valor da dívida de IVA é de montante muito superior a este – cfr. ponto 4. da mesma matéria – é de manter, na sua totalidade, o arresto dos bens efectuados, porque ainda assim, mesmo para pagar este imposto, o produto da venda dos mesmos a que houver lugar, presumivelmente, não chegará para a solver.


Procede assim, mas apenas em parte, a matéria das conclusões das alegações do recurso, sendo de lhe conceder parcial provimento e de revogar a sentença recorrida que neste sentido não decidiu quanto ao IRC, e de a manter no restante decidido.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em conceder parcial provimento ao recurso e em revogar a sentença recorrida na parte em que decretou o arresto quanto à dívida de IRC e em a manter no remanescente.


Custas por ambas as partes, na medida dos respectivos decaimentos.


Lisboa,3 de Outubro de 2013
Eugénio sequeira
Benjamim Barbosa
Anabela Russo

(1) Cfr. neste sentido, entre muitos outros, o acórdão do STA de 16-11-2011, recurso n.º 526/11.
(2)O qual teve por Relator o do presente, e seguido em outros, como no n.º 4290/10 e no n.º 4425/10.
(3)Cfr. neste sentido, para além dos acórdãos deste Tribunal citados na sentença recorrida, também o de 21.1.2004, recurso n.º 7350/02, que igualmente no mesmo sentido decidiu.