Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07096/11
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:10/06/2016
Relator:NUNO COUTINHO
Descritores:INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO
JUROS DE MORA
Sumário:I- Não tendo o A., na acção declarativa que intentou visando a condenação do R. no pagamento de indemnização por danos resultantes de conduta ilícita deste, peticionado a condenação no pagamento de juros de mora, não podia o Tribunal condenar o R. para além do pedido.

II – Tendo o A., em sede de incidente de liquidação de sentença, peticionado, no respectivo requerimento, a condenação no pagamento dos referidos juros, ainda que tal pedido não tenha sido formulado na parte final do requerimento de liquidação, não se mostra executada a sentença quando o R. apenas procedeu ao pagamento da quantia apurada em sede do referido incidente, excluída dos juros de mora.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – Relatório

Albertino ……………….. recorreu da sentença proferida pelo T.A.C. de Lisboa que julgou extinta a execução do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 03 de Novembro de 2005, proferido em sede de recurso jurisdicional (Processo nº 0803/05), que condenou o Estado Português a pagar ao ora recorrente a título de indemnização por danos patrimoniais a quantia que vier a ser liquidada em execução de sentença e a título de indemnização por danos não patrimoniais a quantia de 65 mil euros.

Formulou as seguintes conclusões:
I - A sentença recorrida deve ser anulada e substituída por nova sentença a produzir em cumprimento integral da execução do Acórdão que julgou a acção. Efectivamente,
II - A quantia de €406.887,68 que o R foi condenado a pagar ao A constitui obrigação pecuniária proveniente da prática de ilícitos da responsabilidade do executado devendo por isso ser acrescida de juros de mora à taxa de 4% ao ano contados desde a data da citação, segundo os termos do disposto no art.º 805, nº2-b) e n.º 3 do mesmo artigo do Código Civil, acrescidos ainda, automaticamente, de outros juros à taxa de 5% ao ano, provenientes de aplicação de sanção pecuniária compulsória prevista e regulada pelo disposto no art. N. º 829-A, n ° 4, do mesmo Cód Citado, contados desde o trânsito em julgado da sentença proferida pelo STA de condenação do executado.
III - A questão em tomo de saber se o pagamento da obrigação exequenda é ou não passivei de incidência de IRS não tem cabimento na presente acção, pelo que deve ser omitida nesta sede jurisdicional.
IV- A sentença recorrida violou, designadamente, o disposto nos citados artigos 805°, nº 2, b) e nº 3, e artigo 829°-A, nº 4, do Código Civil.”


Contra-alegou o Recorrido, formulando as seguintes conclusões:

“1-Nos presentes autos de liquidação em execução de sentença, em sede de recurso de decisão do TAC, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 14 de Fevereiro de 2008, transitado em julgado, liquidou no montante de € 406.887,68 a indemnização por danos patrimoniais a pagar pelo Estado Português em execução do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 03 de Novembro de 2005;
2 - Este acórdão do TCA Sul foi notificado ao Exequente por oficio de 15 de Fevereiro de 2008, e ao Executado por oficio de 18 de Fevereiro de 2008 (cf. fls. 304 e 305, do Processo de execução n.º 0550/01-C - cfr alínea N) dos factos provados.
3 - O Executado processou a favor do Exequente a quantia ilíquida de E 420.532,35, sendo € 406.887,68, a título de indemnização por danos patrimoniais; e E 13.644,67 de juros (cf. documento de fls. 319, do Processo de execução n." 0550/0l C, que aqui se dá por integralmente reproduzido) - cfr alínea O) dos factos provados.
4 - Em 20 de Julho de 2009 o Executado pagou ao Exequente, por transferência bancária, a quantia liquida de € 357 425,50, porquanto reteve na fonte € 63.079,85, a título de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (cf. documento de fls. 2119, do Processo de execução n.º 0550/01 - cfr alínea Q)dos factos provados; e documento de fls. 319, do Processo de execução n.0 0550/01 C) - alínea P) dos factos provados.
5 - Como resulta das disposições conjugadas dos art.ºs 804°, 805.º n.º 3, e 806°,n.º 1, do Código Civil, os juros são a indemnização devida em consequência da aplicação daquele princípio, relevando para tanto a data da constituição em mora.
6 - A jurisprudência e a doutrina têm vindo a entender que a data mais recente que o tribunal pode atender é o encerramento da discussão em primeira instância, isto é a da sentença transitada em julgado, por se entender que só nessa altura fica liquidada a indemnização, com base no princípio in illiquidis non fit mora.
7- Somente em sede de liquidação de execução de sentença foi possível alcançar um montante concreto e preciso que foi arbitrado ao Exequente; pelo que apenas sobre a data em que a decisão do TCA Sul transitou em julgado poderiam ser calculados juros de mora à taxa legal.

8 - Ora, o Executado pagou juros de mora desde o trânsito em julgado do acórdão do TCA Sul, conforme se mostra provado nos autos e o Exequente reconhece. É pois lícito concluir que se mostra extinta pelo pagamento a quantia exequenda, nesta parte.
9 - A sanção pecuniária compulsória constitui uma faculdade de que o tribunal pode lançar mão - mediante requerimento ou mesmo oficiosamente - para prevenir situações que ainda se perspectivam apenas como de eventual incumprimento das suas decisões.
10 - Outrossim, a sanção pecuniária compulsória só deve aplicar-se quando se justifique - art.º 3° n.º 2 do CPTA - sendo que no âmbito da execução administrativa para pagamento de quantia certa, regulado no artº 170º e ss. Do CPTA, não se prevê sequer a utilização desta sanção, face aos mecanismos coactivos alternativos aí previstos para cobrança de quantia certa.
11. In casu, uma vez que o Executado cumpriu espontaneamente a decisão judicial condenatória, em toda a linha, não se mostram minimamente preenchidos os pressupostos da eventual aplicação da sanção pecuniária compulsória.
12. Por todo o exposto, a sentença recorrida deverá ser plenamente confirmada e, em consequência, deverá declarar-se a extinção da execução, pelo seu integral cumprimento e negar-se provimento ao presente recurso do Exequente.

II) Na decisão recorrida foram dados como assentes os seguintes factos:

A) Em Julho de 2001, o ora Exequente propôs no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa acção de condenação contra o Estado português para obter indemnização por danos sofridos como agente diplomático com a categoria de embaixador pela forma como decorreu a sua carreira, tendo o Estado português, representado pelo Ministério Público, sido citado para contestar a acção em 05 de Julho de 2001 (cf. fls. 2 e 155,da acção n.º 0550/01).
B) A acção foi julgada Inteiramente improcedente por sentença de 07 de Fevereiro de 2005, com o fundamento que não fora praticado qualquer facto ilícito pelo réu (cf. fls. 662 a 709,da acção n.º 0560/01).
C) Inconformado com a decisão final de Improcedência, o ora Exequente dela Interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo (cf. fls. 712, da acção n.º 0550/01).
D) O recurso foi julgado procedente por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 03 de Novembro de 2005, proferido no processo n.º 803/05, que aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual se extrai o seguinte:
«...2.4. Quanto alegada ilicitude decorrente do comportamento administrativo que consistiu em manter o A. apôs o reconhecimento jurisdicional de que continuava adstrito ao quadro de pessoal diplomático, em finais de 1981, até 21 de Novembro de 1995, sem despacho formal de colocação nos serviços Internos do MNE, apesar dos seus pedidos de esclarecimento e alteração desta situação, sendo tratado de forma desconsiderante e destinando-lhe como local de trabalho uma sala destinada a arrumos de material de limpeza e não lhe distribuindo efectivas tarefas dos Serviços Jurídicos e de Tratados a que Informalmente se encontrava adstrito, bem como a manutenção da mesma situação de prática desocupação sem distribuição de serviço desde 21 de Novembro de 1995 atá aposentação em 31 de Julho de 2000, trata-se de factos susceptíveis de Integrar o ilícito de caracter geral previsto nos art.º 2.º e 6.º do DL 48061 uma vez que significam ofensa do respeito devido ao prestador de trabalho de uma forma grave e causadora de prejuízos, que encontra directa protecção nos comandos constitucionais do artigo 59.º n.º 1 al. b) e c), Isto é, os trabalhadores da carreira diplomática, tal como os demais, têm direito a que o trabalho seja organizado em condições socialmente dignificantes de forma a facultar a realização pessoal e a prestar o trabalho em condições de higiene e saúde.
No caso a falta de distribuição de tarefas, a falta de designação formal do serviço Interno a que estava afecto o recorrente, o comportamento em geral de desconsideração de o manter durante tantos anos “na prateleira " e até, de lhe atribuir um local de trabalho destinado a arrumas de material de limpeza, são violações caracterizadas do comando constitucional e sem dúvida que entram no conceito de actos que Infringem os princípios gerais de direito enunciados bem como os deveres de respeito e correcção para com o pessoal a que está obrigado um gestor dos recursos humanos normalmente diligente, cuidadoso e atento aos direitos de cada diplomata e sua situação concreta (art.º 6.º do DL 48051).
É por demais evidente que o dito artigo 6.º ao referir «os princípios gerais aplicáveis» abrange normas constitucionais que estabelecem princípios enformadores de todo o sistema jurídico como as do referido artigo 59.º

Os referidos comportamentos e omissões são ilícitas também se apreciadas do ponto de vista da responsabilidade contratual, por serem contrárias à boa-fé no cumprimento da obrigação de gestão segundo os cânones que seriam os de um bom gestor, atento e zeloso, Imposta pelo n.º 2 do artigo 762.º do CCiv., obrigação que impende sobre o empregador que no caso também releva na apreciação desta acção, visto que a regulação estatutária funde na mesma situação jurídica elementos contratuais e outros de caracter objectivo e fonte legal que para efeitos de determinação da Ilicitude dos comportamentos das partes pode entender-se que descaracterizam, ou ao menos fazem sobrelevar, as normas reguladoras da responsabilidade extracontratual, as quais passam a reclamar aplicação preferencial sobre as regras do contrato.
Tanto assim que muitos autores falam de quase-contrato e de situação estatutária preferentemente a relação contratual do funcionário com o empregador público, sem embargo de este aspecto da contratualização ter sempre um papel e uma presença que determina Importantes aspectos do regime jurídico desta relação administrativa sui generis.
De todo o modo os apontados comportamentos ilícitos foram causadores de prejuízos na esfera jurídica do atingido, sendo actuações necessariamente qualificáveis como culposas pela pertinácia e duf8ção temporal com que ocorreram, Independentemente da verificação da vontade psicológica de cada agente que teve intervenção na gestão de pessoal que conduziu à situação do A., não sendo ainda de descurar quanto a este ponto, embora se trate de matéria em grande medida conclusiva, mas capaz de permitir um relance sobre a situação de facto, que a sentença deu como provado sob a al. UU) que o tratamento dado ao A. pelo MNE desde a exoneração de embaixador de Portugal em Moçambique até à colocação nos Serviços Jurídicos e de Tratados, foi determinado por motivações de caracter corporativista, havendo o/ara vontade de o afastar do quadro diplomático a que pertencia.
Portanto, mostra-se caracterizada a Ilicitude da conduta do R. através dos seus agentes e serviços, tal como definida pelos artigos 2.º n.º 1 e 6.º do DL 48051, de 21.11.1967, ou ao menos culpa do serviço, atenta a disseminação ao longo do tempo e através de uma série de diferentes intervenientes em vários graus da organização administrativa, pelo que a sentença não pode manter-se nesta parte e consideram-se procedentes as conclusões do A sob os n.ºs 9, 10 e 11.
2.5. Provado que a ilicitude da manutenção do A em situação indefinida, sem tarefas efectivas e desconsiderado pelo modo já enunciado, resulta do probatório também que ele deveria ter sido colocado em serviços externos se a sua carreira tivesse decorrido em circunstâncias normais. E por outro lado, resulta do conhecimento comum que a falta dessa colocação em serviços externos tem como efeito a percepção de menores remunerações, pelo que o ilícito foi neste aspecto causa de danos ou prejuízos na esfera patrimonial do A. Porém, não se encontram provados factos alguns que permitam balizar estes danos de modo mais preciso, nem ensaiar uma tentativa de liquidação do respectivo montante. Sucede mesmo que o A não provou nenhum facto relativo a essas perdas de diferenças remuneratórias, por virtude da não colocação o em serviços externos, tendo pedido que ficassem esses aspectos para liquidação em execução de sentença.
E, não é agora possível com os restritos factos provados sobre esta matéria, estabelecer uma relação especificada e precisa dos comportamentos lesivos com períodos durante os quais o A. teria estado ou não colocado em serviço externo, e muito menos estabelecer as diferenças com o que teria ganho nessa situação.
Mas, admitindo que na execução de sentença requerida o A. possa fazer prova capaz de conduzir à liquidação de tais danos remete-se para liquidação em execução de sentença dos danos patrimoniais resultantes da não colocação do A. em serviços externos desde a sua exoneração como embaixador em Maputo.
Sô para o caso de não se mostrar possível tal liquidação será possível o Tribunal estabelecer uma quantia por previsão, baseada em critérios de conhecimento comum, de razoabilidade e de moderação, aplicados à situação concreta tal como resulta da matéria provada, isto é, por equidade, dos danos patrimoniais cujo exacto valor não pode ser averiguado, tal como prevê o artigo 566.º n.º 3 do CC/v.
2.6. Quanto aos danos morais atentos os factos provados, ou seja, que o A. foi prejudicado em todo o seu modo de vida e planos de futuro, sofreu ansiedade, angústia, frustração e revolta, a situação profissional ilicitamente atingida Incidiu negativamente na sua vida familiar que foi afectada ao ponto de conduzir ao divórcio do A. e ao corte de relações com os filhos, e considerando em especial que os comportamentos e os resultados lesivos se verificaram durante um período de tempo bastante superior a 20 anos, considera-se adequada à reparação do dano não patrimonial, dentro de critérios de grande moderação, a indemnização de 65 mil Euros, atentos os critérios e nos termos do artigo 496.º n.º 1 e 3, 1.ª parte; a culpa do agente e demais circunstâncias do caso.
IV- Decisão.
Em conformidade como exposto nega-se provimento ao recurso do EMMP e concede-se provimento ao recurso do A. em consequência do que se Julga a acção em parte procedente, estabelecendo-se a indemnização por danos patrimoniais que vier a ser liquidada em execução de sentença nos termos antes expostos e por danos não patrimoniais de 65 mil Euros, pelo que o R. vai, nessa medida, condenado no pedido.» (cf. fls. 776 a 799V, da acção n.º 0550/01).

E) Em 30 de Janeiro de 2006, o Exequente propôs contra o Estado português processo executivo, por apenso à acção n.º 0550/01, para pagamento da quantia de € 65.000,00, em que o Estado português foi condenado, a título de Indemnização por danos não patrimoniais, pelo Acórdão referido na Alínea D), supra, transitado em julgado em 21 de Novembro de 2005 (Processo de execução para pagamento de quantia certa nº 0550/01B).
F) Em 15 de Junho de 2006,o Executado pagou ao Exequente a quantia de €65.000,00 (Processo de execução para pagamento de quantia certa n.0 0550/018).
G) Por requerimento apresentado em 24 de Outubro de 2006, o Exequente disse que foi integralmente ressarcido pelo Estado português, devendo assim ser declarada a inutilidade superveniente da lide (Processo de execução para pagamento de quantia certa n.º 0550/018).
H) Por sentença de 08 de Novembro de 2006, proferida no processo executivo referido nas Alíneas anteriores, notificada ao Exequente por oficio de 17 de Novembro de 2006, foi declarada a extinção da Instância por Inutilidade superveniente da lide (Processo de execução para pagamento de quantia certa n.º 0550/01B).
I) Em 17 de Março de 2006, o Exequente Intentou contra o Estado português o presente processo executivo, com liquidação prévia da quantia exequenda, para execução do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 03 de Novembro de 2005, referido na Alínea D), supra, na parte em que condenou o Estado português a pagar ao Exequente a Indemnização por danos patrimoniais que vier a ser liquidada em execução de sentença (Processo de execução n.0 0550/01C).
J) A indemnização por danos patrimoniais, em que o Estado português foi condenado pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 03 de Novembro de 2005, referido na Alínea D), supra, foi fixada em €154.195,52, por decisão de 11 de Maio de 2007 (cf. 179 a 250, do Processo de execução n.0 0550/01/C).
K) Inconformado com a decisão que liquidou no montante de €154.195,52, a indemnização por danos patrimoniais, o Exequente dela Interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul, dando origem ao processo de recurso jurisdicional nº 03117/07 (cf. 254 e seguintes, do Processo de Execução nº 0550/01/C).
L) Por Acórdão de 14 de Fevereiro de 2008, proferido no processo n.0 03117/07, o Tribunal Central Administrativo Sul, concedeu parcial provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida e liquidando no montante de €406.887,68, a indemnização por danos patrimoniais a pagar pelo Estado Português em cumprimento do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 03 de Novembro de 2006, proferido processo de recurso jurisdicional n.º 0803/05, referido em D) supra (cf. fls.292 a 300V,do Processo de execução n.º 0550/01C).
M) Do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 14 de Fevereiro de 2008, proferido no recurso jurisdicional n.º 03117/07, que aqui se dá por Integralmente reproduzido, extrai-se o seguinte:
«Do transcrito ponto 2.4 do Acórdão exequendo, resulta claramente que foi considerado ilícito e causador de prejuízos na esfera jurídica do recorrente "...a manutenção da mesma situação de prática desocupação sem distribuição de serviço desde 21/11/95 atá â aposentação em 31/7/2000"
Por outro lado, no ponto 2.5. desse acórdão, depois de se admitir que em execução de sentença possa ser feita prova capaz de conduzir à liquidação dos danos patrimoniais "remete-se para liquidação em execução de sentença dos danos patrimoniais resultantes da não colocação do A em serviços externos desde a sua exoneração como embaixador em Maputo"
Assim, cremos ser indubitável que o Ac. do STA de 3/11/2005, quando condena o R. no pedido de pagamento da indemnização por danos patrimoniais que vier a ser liquidada em execução de sentença "nos termos antes expostos", refere-se aos danos que resultaram do facto de o A não ter sido colocado em serviços externos no parlado entre a sua exoneração como embaixador em Maputo (24/9/76) e a sua aposentação (31/7/2000).
Tem, pois, razão o recorrente quando alega que, para a liquidação dos danos patrimoniais, se devera atender ao período referido e não apenas àquele que decorreu entre 1/7/82 e 21/11/95.
Alega ainda o recorrente que ao tempo só existiam 25 embaixadores do quadro para um universo muito superior de embaixadas e que nas décadas de 80 e 90, ele era um dos embaixadores com mais antiguidade, pelo que se deveria considerar que entre 24/9/6 e 31/7/2000, ou seja, durante 23 anos e 10 meses, ele permaneceria nos serviços extemos.
Vejamos se assim se deve entender.
A sentença recorrida, partindo do pressuposto que o período a considerar era o que decorria entre 1/7/82 e 21/11/95 (correspondente, por arredondamento, a 13 anos e 6 meses) e considerando ser de impossível determinação o período em que o recorrente cumpriria serviço externo, o local onde tal teria lugar e o posto que ocuparia, entendeu ser verosímil que ele pudesse estar colocado em serviços externos em metade dos referidos 13 anos e 5 meses.
Tem razão a sentença quando refere ser de impossível determinação o período em que o recorrente cumpriria serviço externo por a legislação aplicável não fixar qualquer período em que tenha de se estar em serviço externo, limitando-se o art. 44.º do DL n.º 79/92, de 6/5 e o art. 48.º do DL n.º 40-A/98 de 27/2, a estabelecer períodos máximos de colocação nos serviços internos (de 8 e de 7 anos, respectivamente).
Os factos agora alegados pelo recorrente refentes à sua antiguidade e ao número de embaixadores então existentes, são irrelevantes por não constarem da matéria fáctica dada como provada na sentença que não foi impugnada no presente recurso jurisdicional.
Nos termos do n.º 3 do art. 566.º do C. Civil, quando o lesado não consiga fazer a prova do valor exacto dos danos, deve-se usar da equidade para o fixar, dentro dos limites considerados provados.
Assim, por se entender que seria violento que o lesado ficasse sem indemnização só por não poder ser averiguado com exactidão o seu valor, a lei admite que se possa usar da equidade, dentro da verosimilhança consentida pela prova, para proferir um julgamento quanto ao valor dos danos.
Nestes termos, considerando que a carreira de embaixador do recorrente se desenvolveu por cerca de 25 anos (foi nomeado embaixador dos serviços externos por decreto de 21/7/76 e aposentou-se em 31/7/2000) e atendendo aos períodos máximos de colocação nos serviços Internos atrás referidos, afigura-se­nos adequado fixar em 1/4 daqueles 25 anos (ou seja em 6 anos e 3 meses) o período de colocação nestes serviços.
Finalmente, quanto é redução a 1/4 do montante dos abonos devidos efectuada pela sentença com fundamento na equidade, o recorrente contesta-a, alegando que aqueles abonos não se destinavam a cobrir despesas e que, ainda que assim se não entendesse, ocorreram prejuízos, por ele, a esposa e os filhos não terem desfrutado das comodidades, prazeres e bem estar que lhe seriam proporcionados por tais despesas.
Vejamos se lhe assiste razão.
A sentença recorrida, depois de calcular, com referência ao período de 6 anos e 8 meses e meio, o montante dos abonos com despesas de representação do recorrente e da sua mulher e para educação e despesas escolares dos seus 4 filhos, procedeu à sua redução a ¼ por considerar que a finalidade de tais abonos era a de compensar os custos e incómodos relacionados com a deslocação dos diplomatas efectivamente colocados em serviço externo, sendo, por isso, razoável aquela redução quando não se esteve realmente em serviço externo.
Afigura-se-nos que, na verdade, os abonos de representação se destinam a suportar as despesas inerentes às exigências de representação que os embaixadores têm de efectuar, as quais cessam no momento em que estes se apresentam nos serviços Internos do Ministério. Constituem, pois, um reembolso de despesas efectivamente suportadas com a representação do Estado Português.
Quanto ao abono para educação e despesas escolares, destina-se a fazer face a despesas suportadas pela educação dos filhos no estrangeiro.
Assim, ao contrário do que afirma o recorrente, os aludidos abonos destinam-se a cobrir despesas resultantes da prestação efectiva de serviço externo, justificando­ se, por isso, a referida redução de 1/4 efectuada pela sentença.
Aliás, quanto ao abono para educação e despesas escolares - cuja fórmula de cálculo não é contestada no presente recurso -, deve-se notar que a redução também encontra justificação no facto de se ter considerado que o preenchimento dos seus pressupostos se verificou desde 24/9/76 até ao momento em que os filhos do recorrente completaram a licenciatura ou a idade de 24 anos, quando poderia não haver lugar à sua atribuição durante todo esse período por em parte dele ter ocorrido a colocação em serviço Interno.
Refira-se ainda, quanto aos prejuízos agora alegados pelo recorrente de não ter desfrutado das comodidades, prazeres e bem estar que lhe seriam proporcionados pelas despesas que os abonos se destinariam a cobrir que eles não estilo abrangidos pela condenação decretada pelo acórdão exequendo, tratando-se de danos não patrimoniais.
Assim, em face do que ficou referido quanto ao período de tempo a considerar como sendo de serviço externo (23 anos e 10 meses - 6 anos e 3 meses = 17 anos e 7 meses) e atendendo ao que ficou definido na sentença, procede-se ao cálculo da indemnização a arbitrar ao recorrente da seguinte forma:

- Abono com despesas de representação do recorrente:
€6.620,21x12 = €79 442,52 (montante anual)
€79 442,52 x 17anos e 7meses = €1.396 864,31
- Abono com despesas de representação da mulher:
€1.396.864,31x10% = €139.888.43
- Abono para educação e despesas escolares:
- Jonas (de 24/9/76 a 8/9/89)
€1.500 anuais x13 anos = €19.500.00

- Salomé (de 24/9/76 a 31/7/90)
€1.500 anuais x13 anos e 10meses = €20 750.00

- Eva (de 24/9/76 a 8/4/93)
€1.500 x 16 anos e 7 meses = €25.375.00
- Simão (de 24/9/76 a 8/4/93)
€1.500 x 16 anos e 7 meses = €25.375.00
Total: 1 396 864,31 + 139 686,43 + 91.000,00 (total do abono por educação e despesas escolares):4
= € 406.887.68
3. Pelo exposto, acordam em conceder parcial provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida e liquidando no montante de 406.887,68 Euros a indemnização por danos patrimoniais a pagar ao recorrente pelo Estado Português.» (cf. fls. 292 a 300V, do Processo de execução n.º 0550/01C).
N) O Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul que liquidou no montante de €406.887,68, a indemnização por danos patrimoniais a pagar pelo Estado Português em execução do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 03 de Novembro de 2005, referido na Alínea D) supra, foi notificado ao Exequente por ofício de 15 de Fevereiro de 2008, e ao Executado por ofício de 18 de Fevereiro de 2008 (cf. fls. 304 e 305, do Processo de execução n.º 0550/01C).
O) O Executado processou a favor do Exequente a quantia líquida de €420.532,35, sendo €406.887,68, a título de Indemnização por danos patrimoniais e €13.644,67, de juros (cf. documento de fls.319, do Processo de execução n.º 0550/01C, que aqui se dá por Integralmente reproduzido).
P) Em 20 de Julho de 2009, pagou ao Exequente, por transferência bancária, a quantia líquida de €357 425,60 (cf. documento de fls. 319, do Processo de execução n.º 0550/01C).
Q) O Executado reteve €63.079,85, a titulo de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (cf. documento de fls. 319, do Processo de execução n.º 0550/01C).

III) Fundamentação jurídica

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações importa entrar no conhecimento do mesmo e que se prende com a invocada violação dos artigos 805º, nº 2 alínea b) e nº 3 e artigo 829º-A nº 4 do Código Civil.

O cerne da razão de discordância do recorrente com a sentença recorrida está sintetizado na conclusão 2ª das alegações de recurso, que se transcreve:

“A quantia de €406 887,68 que o R foi condenado a pagar ao A constitui obrigação pecuniária proveniente da prática de ilícitos da responsabilidade do executado devendo por isso ser acrescida de juros de mora à taxa de 4% ao ano contados desde a data da citação, segundo os termos do disposto no art.º 805, nº2-b) e n.º 3 do mesmo artigo do Código Civil, acrescidos ainda, automaticamente, de outros juros à taxa de 5% ao ano, provenientes de aplicação de sanção pecuniária compulsória prevista e regulada pelo disposto no art. N. º 829-A, n ° 4, do mesmo Cód Citado, contados desde o trânsito em julgado da sentença proferida pelo STA de condenação do executado.”

Preceituam as normas, que o recorrente considera violadas pela sentença recorrida:
“Artigo 805º
1. O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.
2. Há, porém, mora do devedor independentemente de interpelação:
a) Se a obrigação tiver prazo certo;
b) Se a obrigação provier de facto ilícito.
(….)
3. Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que já haja então mora, nos termos da primeira parte deste artigo.”
Artigo 829-A
Sanção pecuniária compulsória
1. Nas obrigações de prestação de facto infungível positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.
2. A sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior será fixada segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar.
(…)
4 – Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indemnização a que houver lugar.”

A questão primordial que importa analisar consiste em saber se se mostra integralmente cumprido o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo – item D) dos factos assentes – que para além de ter condenado o Estado Português a pagar a quantia de 65.000 € a título de danos não patrimoniais – condenou o Estado no pagamento da indemnização por danos patrimoniais que fosse fixada em sede de execução de sentença.

Não estando em causa mostrar-se integralmente cumprido o referido Acórdão no que concerne pagamento da indemnização a título de danos não patrimoniais – cfr. itens E) a H) dos factos assentes – a questão está em saber se o Acórdão supra referido está integralmente cumprido, ou se, nos termos pretendidos pelo recorrente, são devidos juros de mora à taxa de 4% sobre o montante de indemnização por danos patrimoniais (406.887,68 €), desde a data da citação na acção declarativa de condenação intentada contra o recorrido, acrescidos automaticamente de juros à taxa de 5% ao ano, provenientes da aplicação da sanção pecuniária compulsória, estes contados desde o trânsito em julgado do Acórdão proferido pelo STA.

Decorre da matéria de facto assente que o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo – decisão exequenda – condenou o Estado Português a pagar ao ora Recorrente indemnização por danos patrimoniais que viesse a ser liquidada em sede de execução de sentença – cfr. alínea D) dos factos assentes.

Por decisão proferida pelo T.A.C. de Lisboa, em 11 de Maio de 2007, o montante dos danos patrimoniais foi fixado em 154.192,52 € - cfr. alínea J) dos factos assentes -; tendo o recorrente interposto recurso da referida decisão para este Tribunal – cfr. alínea K dos factos apurados – foi proferido Acórdão, por este Tribunal, em 14 de Fevereiro de 2008, no âmbito do Processo nº 03117/07, que, concedendo parcial provimento ao recurso, revogou a decisão recorrida e liquidou no montante de € 406.887, 68 a indemnização por danos patrimoniais a pagar pelo Estado Português em cumprimento do Acórdão proferido pelo STA – cfr. alíneas L) e M) dos factos apurados

A decisão recorrida considerou mostrar-se integralmente cumprido o Acórdão do STA com fundamento na circunstância de o mesmo não fazer qualquer alusão à condenação no pagamento de quaisquer juros pelo que considerou o julgado devidamente cumprido, decisão da qual discorda o recorrente.

Vejamos:

Constitui entendimento deste Tribunal que o cerne do presente recurso não passará, integralmente, pela circunstância de o Acórdão do STA não fazer alusão à condenação no pagamento de juros, sendo certo, aliás, que não tinha que fazer tal menção dado que, conforme se retira da p.i. da acção administrativa comum intentada pelo ora recorrente contra o Estado Português – que correu termos sob o nº 550/01 – não foi aí peticionado o pagamento de juros de mora, sendo inquestionável que o recorrente podia ter formulado tal pedido, face ao regime excepcional da 2ª parte do nº3 do art. 805º Código Civil, questão sobre a qual se debruçou o S.T.J. em Acórdão proferido em 14 de Julho de 2009, no âmbito do Processo nº 630-A/1996.S1, do qual se transcreve, parcialmente, o respectivo sumário:

(…)
“II) – A liquidação em execução de sentença é um incidente da instância declarativa com estreita e indissociável ligação à acção onde se reconheceu a existência do crédito, sem que se tivesse conseguido quantificá-lo, ou por não ter sido possível, ou porque, desde logo, o Autor formulou um pedido ilíquido ou genérico.
III) – Tendo a sentença que relegou para liquidação ulterior, incidental, o quantum indemnizatório pelos danos sofridos pelo lesado em função do acidente e da incapacidade que o afecta, apenas está em causa encontrar o valor da indemnização pelo dano futuro (lucro cessante).
IV) – O que se indemniza quanto não há perda de ganho, mormente de cariz salarial, é o chamado dano biológico, assim o que há que considerar como dano futuro é aquele dano que se repercute no bem estar da vítima, constituindo um dano patrimonial já que as lesões sofridas afectam o seu padrão de vida, seja qual for a sua idade.
V) - Liquidada uma indemnização com a inerente condenação do responsável a pagar uma quantia em dinheiro, estamos perante uma obrigação pecuniária.
VI) – Face ao regime excepcional da 2ª parte do nº3 do art. 805º Código Civil, e porque se está perante responsabilidade objectiva do devedor, não obstante o Autor ter formulado pedido ilíquido ou genérico, os juros de mora são devidos, em princípio, desde a citação da Ré para a acção declarativa, por a ela ser imputável a mora, se o credor/lesado peticionou esses juros na acção declarativa e a sentença condenou a Ré, mesmo que o montante certo apenas tenha sido apurado no incidente de liquidação.”

Partindo do pressuposto que o ora recorrente, na acção declarativa que culminou com a prolação do Acórdão proferido pelo S.T.A. em 3 de Novembro de 2005, não peticionou o pagamento de juros de mora, tais juros não são devidos, ao contrário do que pretende o recorrente, desde a data da citação do ora recorrido nos referidos autos.

Sobre a referida questão da necessidade da formulação de pedido de condenação em juros de mora importará recordar o recente Acórdão de Uniformização de Jurisprudência proferido pelo S.T.J. em 14 de Maio de 2015, Proc. 1520/04.3TBPBL.C1.S1-A, no qual se uniformizou a jurisprudência nos seguintes termos:
“Se o autor não formula na petição inicial, nem em ulterior ampliação, pedido de juros de mora, o tribunal não pode condenar o réu no pagamento desses juros.”

Assim, tendo presente que o recorrente não formulou pedido de pagamento de juros de mora na acção declarativa haverá que indagar se tal pedido foi posteriormente formulado, nomeadamente no incidente de liquidação prévia (da quantia exequenda).

Nos referidos autos de execução de sentença – Proc. 0550/01/C o ora recorrente formulou o seguinte pedido – cfr. parte final do requerimento executivo -: “Nestes termos, e atendendo ao decidido no acórdão exequendo, deve o Estado ser condenado a pagar ao exequente a quantia de 2.711.637,57 €”, pedido que, claramente, não contém qualquer pretensão de condenação do ora recorrido em juros de mora.

Contudo, analisado o requerimento executivo em apreço constata-se que o recorrente nos itens 5 a 13 propõe uma fórmula de calcular o abono médio mensal a que teria direito se não fosse a conduta julgada ilícita pelo S.T.A. no Acórdão exequendo – proferido a 3 de Novembro de 2005 – que passava pela consideração dos valores respeitantes ao abono mensal para sua representação, designado por abono de representação base – cfr. item 8 a) do requerimento executivo – pelo valor respeitante ao abono mensal para representação da sua esposa – cfr. item 8 alínea b) do requerimento em apreço – bem como pelos valores relativos ao abono mensal para cobrir as despesas de educação e escolares dos seus 4 filhos – cfr. item 8 alínea c) do aludido requerimento – para, com base nos valores que indicou e no número de anos que não exerceu funções nos serviços externos – 23 anos e 10 meses –, chegar a um valor global de 2.197.909,72 € - valor cujo pagamento peticionou a título de execução do Acórdão proferido pelo S.T.A. – cfr. item 13º do requerimento executivo.
Atentemos, agora, nos itens 15º e 16º do requerimento em apreço, em que o recorrente requerer a execução do Acórdão proferido pelo S.T.A., com liquidação prévia da quantia exequenda:

“15 – O actual montante mensal deste abono (de representação) corresponde ao poder de compra do montante que era pago aos embaixadores nos anos de 1976 a 2000, razão pela qual já está implícita a desvalorização da moeda e dos respectivos juros durante aquele período.

16 – A ser outro o cálculo do abono em questão desde já se declara não se prescindir da actualização anual da moeda e dos respectivos juros.”

Da conjugação dos supra referidos itens do requerimento inicial é de concluir que o ora recorrente formulou no item 16º um pedido subsidiário de condenação do recorrido em juros de mora, conclusão a que se chega pela interpretação do que expressamente resulta do que é o entendimento perfilhado pelo recorrente quanto à execução do Acórdão proferido pelo S.T.A. – que passaria pelo pagamento da quantia de 2.197.909,72 € - sendo que se outro fosse o entendimento do Tribunal quanto ao cálculo do(s) abono(s) então o recorrente não prescinde dos respectivos juros, pelo que se deve entender que, com a utilização de tal expressão, o recorrente formulou pedido subsidiário de condenação do recorrido em juros de mora.

O passo seguinte passará por indagar se o Tribunal seguiu a fórmula proposta pelo recorrente para execução integral do Acórdão proferido pelo S.T.A. para o que se deverá analisar o teor do Acórdão proferido por este Tribunal em 14 de Fevereiro de 2008 do qual se transcreve o seguinte passo:

“Do transcrito ponto 2.4 do Acórdão exequendo, resulta claramente que foi considerado ilícito e causador de prejuízos na esfera jurídica do recorrente "...a manutenção da mesma situação de prática desocupação sem distribuição de serviço desde 21/11/95 atá â aposentação em 31/7/2000"
Por outro lado, no ponto 2.5. desse acórdão, depois de se admitir que em execução de sentença possa ser feita prova capaz de conduzir â liquidação dos danos patrimoniais "remete-se para liquidação em execução de sentença dos danos patrimoniais resultantes da não colocação do A em serviços externos desde a sua exoneração como embaixador em Maputo"
Assim, cremos ser indubitável que o Ac. do STA de 3/11/2005, quando condena o R. no pedido de pagamento da indemnização por danos patrimoniais que vier a ser liquidada em execução de sentença "nos termos antes expostos", refere-se aos danos que resultaram do facto de o A não ter sido colocado em serviços externos no parlado entre a sua exoneração como embaixador em Maputo (24/9/76) e a sua aposentação (31/7/2000).
Tem, pois, razão o recorrente quando alega que, para a liquidação dos danos patrimoniais, se devera atender ao período referido e não apenas àquele que decorreu entre 1/7/82 e 21/11/95.
Alega ainda o recorrente que ao tempo só existiam 25 embaixadores do quadro para um universo multo superior de embaixadas e que nas décadas de 80 e 90, ele era um dos embaixadores com mais antiguidade, pelo que se deveria considerar que entre 24/9/6 e 31/7/2000, ou seja, durante 23 anos e 10 meses, ele permaneceria nos serviços extemos.
Vejamos se assim se deve entender.
A sentença recorrida, partindo do pressuposto que o período a considerar era o que decorria entre 1/7/82 e 21/11/95 (correspondente, por arredondamento, a 13 anos e 6 meses) e considerando ser de impossível determinação o período em que o recorrente cumpriria serviço externo, o local onde tal teria lugar e o posto que ocuparia, entendeu ser verosímil que ele pudesse estar colocado em serviços externos em metade dos referidos 13 anos e 5 meses.
Tem razão a sentença quando refere ser de impossível determinação o período em que o recorrente cumpriria serviço externo por a legislação aplicável não fixar qualquer período em que tenha de se estar em serviço externo, limitando-se o art. 44.º do DL n.º 79/92, de 6/5 e o art. 48.º do DL n.º 40-A/98 de 27/2, a estabelecer períodos máximos de colocação nos serviços internos (de 8 e de 7 anos, respectivamente).
Os factos agora alegados pelo recorrente refentes à sua antiguidade e ao número de embaixadores então existentes, são irrelevantes por não constarem da matéria fáctica dada como provada na sentença que não foi impugnada no presente recurso jurisdicional.
Nos termos do n.º 3 do art. 566.º do C. Civil, quando o lesado não consiga fazer a prova do valor exacto dos danos, deve-se usar da equidade para o fixar, dentro dos limites considerados provados.
Assim, por se entender que seria violento que o lesado ficasse sem indemnização só por não poder ser averiguado com exactidão o seu valor, a lei admite que se possa usar da equidade, dentro da verosimilhança consentida pela prova, para proferir um julgamento quanto ao valor dos danos.
Nestes termos, considerando que a carreira de embaixador do recorrente se desenvolveu por cerca de 25 anos (foi nomeado embaixador dos serviços externos por decreto de 21/7/76 e aposentou-se em 31/7/2000) e atendendo aos períodos máximos de colocação nos serviços Internos atrás referidos, afigura-se­nos adequado fixar em 1/4 daqueles 25 anos (ou seja em 6 anos e 3 meses) o período de colocação nestes serviços.
Finalmente, quanto à redução a 1/4 do montante dos abonos devidos efectuada pela sentença com fundamento na equidade, o recorrente contesta-a, alegando que aqueles abonos não se destinavam a cobrir despesas e que, ainda que assim se não entendesse, ocorreram prejuízos, por ele, a esposa e os filhos não terem desfrutado das comodidades, prazeres e bem estar que lhe seriam proporcionados por tais despesas.
Vejamos se lhe assiste razão.
A sentença recorrida, depois de calcular, com referência ao período de 6 anos e 8 meses e melo, o montante dos abonos com despesas de representação do recorrente e da sua mulher e para educação e despesas escolares dos seus 4 filhos, procedeu à sua redução a ¼ por considerar que a finalidade de tais abonos era a de compensar os custos e incómodos relacionados com a deslocação dos diplomatas efectivamente colocados em serviço externo, sendo, por isso, razoável aquela redução quando não se esteve realmente em serviço externo.
Afigura-se-nos que, na verdade, os abonos de representação se destinam a suportar as despesas inerentes às exigências de representação que os embaixadores têm de efectuar, as quais cessam no momento em que estes se apresentam nos serviços Internos do Ministério. Constituem, pois, um reembolso de despesas efectivamente suportadas com a representação do Estado Português.
Quanto ao abono para educação e despesas escolares, destina-se a fazer face a despesas suportadas pela educação dos filhos no estrangeiro.
Assim, ao contrário do que afirma o recorrente, os aludidos abonos destinam-se a cobrir despesas resultantes da prestação efectiva de serviço externo, justificando­se, por isso, a referida redução de 1/4 efectuada pela sentença.
Aliás, quanto ao abono para educação e despesas escolares - cuja fórmula de cálculo não é contestada no presente recurso -, deve-se notar que a redução também encontra justificação no facto de se ter considerado que o preenchimento dos seus pressupostos se verificou desde 24/9/76 até ao momento em que os filhos do recorrente completaram a licenciatura ou a Idade de 24 anos, quando poderia não haver lugar á sua atribuição durante todo esse período por em parte dele ter ocorrido a colocação em serviço interno.
Refira-se ainda, quanto aos prejuízos agora alegados pelo recorrente de não ter desfrutado das comodidades, prazeres e bem estar que lhe seriam proporcionados pelas despesas que os abonos se destinariam a cobrir que eles não estilo abrangidos pela condenação decretada pelo acórdão exequendo, tratando-se de danos não patrimoniais.
Assim, em face do que ficou referido quanto ao período de tempo a considerar como sendo de serviço externo (23 anos e 10 meses - 6 anos e 3 meses = 17 anos e 7 meses) e atendendo ao que ficou definido na sentença, procede-se ao cálculo da Indemnização a arbitrar ao recorrente da seguinte forma:

- Abono com despesas de representação do recorrente:
€6.620,21x12 = €79 442,52 (montante anual)
€79 442,52 x 17anos e 7meses = €1.396 864,31
- Abono com despesas de representação da mulher:
€1.396.864,31x10% = €139.888.43
- Abono para educação e despesas escolares:
- Jonas (de 24/9/76 a 8/9/89)
€1.500 anuais x13 anos = €19.500.00

- Salomé (de 24/9/76 a 31/7/90)
€1.500 anuais x13 anos e 10meses = €20 750.00

- Eva (de 24/9/76 a 8/4/93)
€1.500 x 16 anos e 7 meses = €25.375.00
- Simão (de 24/9/76 a 8/4/93)
€1.500 x 16 anos e 7 meses = €25.375.00
Total: 1 396 864,31 + 139 686,43 + 91.000,00 (total do abono por educação e despesas escolares):4
= € 406.887.68”
(…)

Resulta de forma imediata do Acórdão supra parcialmente transcrito, proferido por este Tribunal, que não foi seguido na íntegra a forma de cálculo proposta pelo recorrente para execução integral do Acórdão proferido pelo S.T.A. em 3 de Novembro de 2005, desde logo face à redacção de ¼ justificada pela circunstância de parte dos abonos em questão se destinarem a cobrir despesas resultantes da prestação efectiva de serviço externo, pelo que se deve entender que o recorrente, ao contrário do sustentado na decisão recorrida, terá direito ao pagamento de juros de mora, contados desde a citação do recorrido no incidente de liquidação Cfr., também quanto a esta questão, o já referido Acórdão proferido pelo S.T.J. em 14 de Julho de 2009, Proc. 630-A/1996.S1. – cfr. fls. 67 - citação que ocorreu no dia 4 de Abril de 2006 – cfr. fls. 69 dos presentes autos.

A última questão a analisar no presente recurso prende-se com a aplicação da sanção pecuniária compulsória prevista no nº 4 do artº 829-A do Código Civil, nos termos do qual “quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indemnização a que houver lugar.”

Peticionou o recorrente, também, a aplicação do supra referido preceito, posição que este Tribunal não sufraga, acolhendo na íntegra, a argumentação vertida em Acórdão proferido pelo Pleno da Secção de Contencioso Administrativo de 18 de Outubro de 2012, no âmbito do Proc. 045899A, de que se transcreve o seguinte:
(…)
“Alega, por fim, o mesmo Recorrente que, contrariamente ao decidido no acórdão recorrido, há lugar, no caso, à aplicação da sanção pecuniária compulsória, prevista no nº 4, do art. 829-A do CCivil.

Vejamos se lhe assiste razão.

Como se viu, o ora recorrente, no requerimento inicial de execução, pediu, além do mais, o «pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso no cumprimento da decisão judicial, em valor não inferior a 10% do salário mínimo nacional mais elevado em vigor à data da decisão condenatória que vier a ser proferida (v. artºs 3º/2 e 176º/4 do C.P.T.A.; cf. artº 829º-A do C. Civil».

Tal pretensão do ora recorrente enquadra-se, pois, na previsão do invocado art. 176/4 do CPTA, onde se dispõe que «4 – Na petição, o autor também pode pedir a fixação de um prazo para o cumprimento do dever de executar e a imposição de uma sanção pecuniária compulsória aos titulares dos órgãos incumbidos de proceder à execução, segundo o disposto no art. 169º», nos termos do qual «2 – A sanção pecuniária compulsória prevista no nº 1 é fixada segundo critérios de razoabilidade, podendo o seu montante diário oscilar entre os 5% e 10% do salário mínimo nacional mais elevado em vigor no momento».

Sobre essa específica pretensão, o acórdão recorrido, partindo da invocação de jurisprudência deste Pleno (ac. de 3.5.2007-Rº 30 373/92-A-20) – no sentido de que «a sanção pecuniária compulsória, prevista no art. 179, nº 3 e 169, nº 2 do CPTA, corresponde a uma faculdade, que o tribunal pode usar, a requerimento ou mesmo oficiosamente, para prevenir situações que, ainda se perspectivam, apenas, como de eventual incumprimento, não tendo, assim, como pressuposto um anterior comportamento culposo, que tivesse de ser invocado e demonstrado, da entidade responsável pela execução do julgado» – entendeu não existir «razão para usar da dita faculdade, no presente caso, em que está em causa o pagamento de quantias em dinheiro, já sujeito ao pagamento num prazo de trinta dias e com juros moratórios, em caso de atraso na respectiva liquidação».

O Recorrente não impugnou esta decisão, de não aplicação da sanção pecuniária compulsória, prevista no referido art. 169/2 do CPTA.

Porém, invocando o facto de estar em causa o pagamento de concreta quantia em dinheiro, alega, como se viu, que o acórdão recorrido deveria ter feito aplicação da sanção pecuniária compulsória, nos termos do indicado art. 829-A/4 (Artigo 829º-A (Sanção pecuniária compulsória):

4. Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros de mora à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescem aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indemnização a que houver lugar.) do CCivil.

Mas, não colhe tal alegação.

A sanção pecuniária compulsória, prevista no CPTA, tem natureza idêntica à da lei civil (art. 829-A, cit.), visando, tal como esta (Vd. relatório do DL 262/83, de 16.6, onde se refere que a sanção pecuniária compulsória visa, além do mais, «o reforço da soberania dos tribunais, o respeita pelas suas decisões e o prestígio da justiça»), assegurar a efectividade das decisões judiciais (art. 3/2 (Artigo 3º (Poderes dos tribunais administrativos):
1 – …
2 – Por forma a assegurar a efectividade da tutela, os tribunais administrativos podem fixar oficiosamente um prazo para o cumprimento dos deveres que imponham à Administração e aplicar, quando tal se justifique, sanções pecuniárias compulsórias.
3 – …) do CPTA).

Todavia, para além das relevantes diferenças entre elas, importa aqui notar que o CPTA estabelece, para a sanção pecuniária compulsória administrativa, um regime específico que, diversamente do que sucede com a invocada disposição daquele art. 829-A do CCivil, não contempla a possibilidade da respectiva aplicação para obter o cumprimento de sentenças de condenação em quantia certa, cuja execução, aliás, vem regulada (arts 170 a 172 CPTA) em capítulo subsequente ao preceito onde se estabelece o regime geral da sanção pecuniária compulsória (art. 169) (V., a este propósito, R. Esteves de Oliveira, Processo executivo: algumas questões, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2005, Coimbra Editora, pp 264, ss.).

Perante o que é de concluir que, ao contrário do que agora pretende o Recorrente, não tem aplicação no processo administrativo a disposição daquele nº 4 do art. 829-A do CCivil, que estabelece uma taxa adicional de 5% aos juros de mora devidos por incumprimento de sentença condenatória de pagamento em dinheiro corrente.

A este propósito, e na ausência de expressa previsão legal dessa aplicação, relativamente à Administração, deve fazer-se uma interpretação estrita da lei, na medida em que, como bem nota Vieira de Andrade (Vd. A Justiça Administrativa (Lições), 8ª ed., 433.), «estão em causa consequências gravosas para o património de particulares, sujeitas, por isso, a reserva de lei determinada (artigo 205º, nº 3, da Constituição)». Tenha-se presente que – tal como também salienta o mesmo Autor – uma das especificidades, que apresenta, no mundo administrativo, a sanção pecuniária compulsória, se manifesta na circunstância de não recair sobre o Estado ou os entes públicos, mas sobre os «titulares dos órgãos incumbidos da execução» (art. 169/1 do CPTA), ou seja, de não recair sobre o património do “devedor”, mas sobre o património do indivíduo que “representa” o devedor ou lhe administra os bens e interesses.”.

Este Tribunal acolhe na íntegra o entendimento expendido no Acórdão supra parcialmente transcrito, improcedendo este último fundamento de recurso.

III) Decisão
Assim, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul em conceder parcial provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida que julgou finda a execução, determinando que a execução integral do Acórdão proferido pelo S.T.A. em 3 de Novembro de 2005 pressupõe o pagamento de juros de mora à taxa legal de 4% contados desde o dia 4 de Abril de 2006, data da citação do recorrido para deduzir oposição no incidente de liquidação, contados até efectivo e integral pagamento dos mesmos.
Custas pelo recorrido e pelo recorrente, em partes iguais.
Lisboa, 6 de Outubro de 2016

Nuno Coutinho

José Gomes Correia

Paulo Vasconcelos