Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02974/09
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:05/05/2009
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:-RECURSO DE DECISÃO APLICATIVA DE COIMA.
- INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA.
- REJEIÇÃO POR INTEMPESTIVIDADE.
Sumário:I) -O legislador elegeu como razões para estatuir foro próprio para os Magistrados Judiciais e que são de interesse público relevante, as inerentes às exigências específicas do exercício da função judicial, por isso estabelecendo no artº 15º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, na redacção dada pelo artº 1º da Lei nº 143/99, de 31 de Agosto, que “Os magistrados judiciais gozam de foro próprio, sendo o “foro competente para o inquérito, a instrução e o julgamento dos magistrados judiciais por infracção penal, bem como os recursos em matéria contra-ordenacional, (…) o tribunal de categoria imediatamente superior àquela em que se encontra colocado o magistrado...”- cfr. nºs 1 e 2 do EMJ.
II) -Por esse prisma, o proferimento do despacho recorrido nas condições em que foi feito afrontou as regras de competência em razão da hierarquia porquanto o Tribunal de 1ª Instância era absolutamente incompetente para conhecer do recurso de contra-ordenação, sendo competente este TCAS (cfr. também o artº 16º nºs 1 e 2 do CPPT e o artº 101º do CPC).
III) -A incompetência absoluta (em razão da hierarquia) é uma excepção dilatória que conduz à absolvição da instância (artºs 101º, 106º, 288º nº 1 al. a), 493º nº 2 e 494, al. a) do CPC), é de conhecimento oficioso e pode ser arguida pelos interessados ou suscitada pelo Ministério Público até ao trânsito em julgado da decisão final (cfr. artº 16º nºs 1 e 2 do CPPT).
IV) –Como «in casu» foi suscitada pelo EPGA no seu douto parecer em que se requer a revogação do despacho recorrido e o consequente conhecimento do recurso contra-ordenacional em 1º grau de jurisdição, deve este Tribunal assumir a competência para tal conhecimento.
V) -O requerimento de interposição de recurso deve ser apresentado no Serviço de Finanças onde tiver sido instaurado o processo de contra-ordenação, no prazo de vinte (20) dias, atento o disposto no artº.80, nº.1, do R. G. l. Tributárias, sendo o cômputo do referido prazo computado nos termos do disposto no artº.60, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, e não sendo tal prazo de natureza judicial, pelo que não se lhe aplicam as regras privativas dos prazos judiciais, como são as constantes dos artºs.144, nº.1, e 145, nº.5, do C. P. Civil, embora se suspendendo aos sábados, domingos e feriados.
VI) -Havendo a arguida sido notificada pessoalmente da decisão de aplicação de coima no dia 03/10/2008 e tendo o presente recurso sido interposto no dia 03/11/2008, computado nos termos supra expostos a partir de 06/10/2008, excluindo-se os sábados e domingos dos 31 dias do mês de Outubro, o prazo de interposição de recurso teve o seu termo final no dia 31/10/20, pelo que tem de rejeitar-se liminarmente o recurso.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Central Administrativo:

I – H..........................., não se conformando com a sentença do Mº Juiz do TAF de Sintra que rejeitou liminarmente o requerimento de interposição de recurso que havia interposto da decisão lhe aplicou coima dela vem interpor recurso para esta Secção do TCAS, formulando as seguintes conclusões:
1. A contagem dos prazos de recurso em matéria de contra-ordenação rege-se pelo artigo 59°, n°3 do RGCO, cujo prazo [20 dias] se suspende aos sábados, domingos e feriados, nos termos do artigo 60°, n° 1 do RGCO.
2. O termo do prazo que recaia em dia durante o qual não for possível, durante o período normal, a apresentação do recurso transfere-se para o primeiro dia útil seguinte (artigo 60°, n°2 do RGCO).
3. Notificada a recorrente por carta com a/r expedida em 03/10/2008, [sexta feira] o início da contagem tem lugar no dia 06/10/2008, pelo que, excluindo-se os sábados e domingos dos 31 dias do mês de Outubro a apresentação da petição de recurso poderia ter sido apresentada até ao dia 31/10/2008.
4. Contudo, dispõe o artigo 145°, n°5 do CPC, aplicável ao processo de contra-ordenação, nos termos conjugados dos artigos 41° do RGCO e 4° do Código de Processo Penal, que independentemente de justo impedimento, os actos podem ser praticados dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento, até ao termo do 1° dia útil posterior ao da prática do acto, de uma multa de montante igual a um quarto da taxa de justiça inicial por cada dia de atraso.
5. Dispõe o n° 6 do artigo 145° que decorrido o referido prazo e ainda que não se encontre paga a multa a secretaria independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar multa de montante igual ao dobro da taxa de justiça inicial.
Pelo que, V. Ex.as
Julgando procedente o recurso e revogando a decisão, determinando que seja ordenado à Secretaria do TAF de Sintra para proceder nos termos do artigo 145.°, n.°6 do CPC Farão justiça.
Não houve contra-alegações.
O EPGA suscitou a excepção da incompetência hierárquica do tribunal “a quo” ditada em razão da qualidade da recorrente – Juíza de Direito – e, conhecendo este TCAS em primeiro grau de jurisdição, pronunciou-se no sentido de que o recurso não merece provimento, devendo rejeitar-se por intempestivo.
Os autos vêm à conferência depois de recolhidos os vistos legais.

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2. – Com relevo para a apreciação da matéria de excepcionalidade e para a decisão do recurso da decisão aplicativa da coima, dão-se como assentes os seguintes factos:
a) -A arguida, Juíza de Direito, interpôs recurso da decisão de aplicação de coima, proferida nos autos de contra-ordenação que correram termos no Serviço de Finanças de ..... - 2 sob o n.° ..................... (cfr. fls. 77 e 21 e ss).
b) -A arguida foi notificada da decisão de aplicação de coima pelo Serviço de Finanças de ........ -2 no dia 03/10/2008 (cf. fls. 38/39).
c) -O presente recurso foi interposto no dia 03/11/2008, data do registo nos CTT, cf. fls. 40/47.

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3. – Começaremos por conhecer da excepção da incompetência hierárquica do tribunal “a quo” ditada em razão da qualidade da recorrente – Juíza de Direito.
Na verdade, só em sede de recurso do despacho que rejeitou o recurso de contra-ordenação e em vista da junção do doc. de fls. 77, é que foi conhecida a qualidade da recorrente como Juíza de Direito.
Ora, o legislador elegeu como razões para estatuir foro próprio para os Magistrados Judiciais e que são de interesse público relevante, as inerentes às exigências específicas do exercício da função judicial, como se salienta no Ac. do STJ de 16/10/02, no Recurso nº 02P1854.
Por isso estabeleceu no artº 15º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, na redacção dada pelo artº 1º da Lei nº 143/99, de 31 de Agosto, que “Os magistrados judiciais gozam de foro próprio, sendo o “foro competente para o inquérito, a instrução e o julgamento dos magistrados judiciais por infracção penal, bem como os recursos em matéria contra-ordenacional, (…) o tribunal de categoria imediatamente superior àquela em que se encontra colocado o magistrado...”- cfr. nºs 1 e 2 do EMJ.
Por esse prisma, o proferimento da sentença nas condições em que foi feito afrontou as regras de competência em razão da hierarquia porquanto o Tribunal de 1ª Instância era absolutamente incompetente para conhecer do recurso de contra-ordenação, sendo competente este TCAS (cfr. também o artº 16º nºs 1 e 2 do CPPT e o artº 101º do CPC).
A incompetência absoluta é de conhecimento oficioso e pode ser arguida pelos interessados ou suscitada pelo Ministério Público até ao trânsito em julgado da decisão final.
A incompetência absoluta (em razão da hierarquia) é uma excepção dilatória que conduz à absolvição da instância (artºs 101º, 106º, 288º nº 1 al. a), 493º nº 2 e 494, al. a) do CPC).
«In casu» veio a ser suscitada pelo EPGA no seu douto parecer que, no ponto, inteiramente se acolhe, adrede no sentido da revogação da sentença e do consequente conhecimento do recurso contra-ordenacional em 1º grau de jurisdição, o que passa a fazer-se.

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Cabe agora efectuar despacho liminar de admissão ou rejeição do recurso apresentado (cfr.artº.63, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, aprovado pelo dec. lei 433/82, de 27/10, "ex vi" do art9.3, al.b), do R.G.I. Tributárias).
O requerimento de interposição de recurso deve ser apresentado no Serviço de Finanças onde tiver sido instaurado o processo de contra-ordenação, no prazo de vinte (20) dias, atento o disposto no artº.80, nº.1, do R. G. l. Tributárias, sendo o cômputo do referido prazo computado nos termos do disposto no artº.60, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, e não sendo tal prazo de natureza judicial, pelo que não se lhe aplicam as regras privativas dos prazos judiciais, como são as constantes dos artºs.144, nº.1, e 145, nº.5, do C. P. Civil, embora se suspendendo aos sábados, domingos e feriados (cfr. Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, Áreas Editora, 2001, pág.451; assento. S.T.J. nº2/94, de 10/3/1994, l série A do D.R., de 7/5/1994; ac.ST.A.-2ª.Secção, 19/5/1999, rec.23404).
"In casu", a arguida foi notificada da decisão de aplicação de coima no dia 03/10/2008 (cf. fls. 38/39) tendo o presente recurso sido interposto no dia 03/11/2008, data do registo nos CTT, cf. fls. 40/47.
Ora, computado nos termos supra expostos e a partir de 06/10/2008, excluindo-se os sábados e domingos dos 31 dias do mês de Outubro, o prazo de interposição de recurso teve o seu termo final no dia 31/10/2008 pelo que deve o mesmo ser rejeitado "in limine", devido a ter sido deduzido manifestamente fora de prazo, excepção peremptória de conhecimento oficioso e que obsta ao conhecimento do mérito da causa (cfr.artº.63, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas; ac.T.C.A.-2ª.Secção, 9/2/99, Antologia de Acórdãos, ano II, ns.2, pág.274 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª edição, 1997, pág.457), ao que se procederá na parte dispositiva do presente acórdão.

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3. -Nestes termos, acorda-se, em, conhecendo da excepção da incompetência hierárquica do TAF de Sintra suscitada pelo Ministério Público:
a) -Revogar o despacho que rejeitou o recurso do despacho aplicativo da coima;
b) -Conhecendo em 1º grau de jurisdição, rejeitar liminarmente o presente recurso, por ser intempestivo, nos termos do disposto no artigo 63°, n° 1, do RGCOC, aplicável ex vi do artigo 3°, al. b), do RGIT.
c) -Condenar a arguida, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC, cf. Artigos 92.º n.º1 do RGCO 87°, n° 1, al. c), do CCJ.
Notifique.
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Lisboa, 05/05/2009
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Rogério Martins)